Um mergulho ministerial entre ervas e cavalos marinhos

19-06-2020
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Com um sorriso de orelha a orelha, Ricardo Serrão Santos regressa ao barco. Os 20 minutos anteriores foram passados debaixo de água, de fato de mergulho e botija, a observar cavalos marinhos, chocos e pequenos peixes numa das pradarias marinhas submersas no Estuário do Sado. Foi o primeiro mergulho enquanto ministro e o primeiro detentor de uma pasta ministerial a meter-se em tal aventura. Mas não foi o primeiro mergulho do atual ministro do Mar.

Biólogo de formação, Ricardo Serrão Santos conta com um número vasto de aventuras debaixo de água. Não sabe quantas. Apenas recorda que a primeira vez que desceu de escafandro foi em 1979, “não muito longe deste sítio”, umas milhas mais para noroeste onde o Sado se encontra com o mar junto ao Portinho da Arrábida. Tinha então 25 anos e andava a estudar cabozes. No currículo não lhe faltam mergulhos, uns mais profundos do que outros. Da memória salta a descida num submarino MIR a 3000 metros no profundo e límpido azul do mar dos Açores, como um dos consultores científicos do documentário “Aliens of the Deep”, realizado por James Cameron em 2005. Os olhos brilham ao lembrar-se da aventura e das criaturas dos montes e das fontes hidrotermais que observou nas profundezas do Atlântico e do Pacífico e que o documentário 3D de Cameron fizeram chegar ao grande público.

NUNO BOTELHO

Voltemos ao Sado, onde a água não é tão límpida como a dos Açores. Estamos num rio em cujas margem se erguem construções urbanas e industriais e campos agrícolas. Além desta pressão humana, as dragagens recentes no rio criaram sobressaltos. Porém,a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) garante que não houve impactos nas pradarias. Uma das grandes ameaças agora "são os pedidos de licenciamento para novas área de ostreicultura”, alertam as biólogas Raquel Gaspar e Sílvia Tavares, dirigentes da cooperativa Ocean Alive. Foram elas que lançaram o convite ao ministro para conhecer in loco estas pradarias marinhas do Sado.

Foi a primeira vez que o ministro mergulhou nestas ervas marinhas, que classificou como “exuberantes”, apesar da pouca visibilidade devido à suspensão de fitoplâncton e de sedimentos que não permitiam ver nada a mais de um metro de distância. Contudo, Serrão Santos conseguiu ver cavalos marinhos, chocos e pequenos peixes que em seu entender ilustram bem “a importância destes ecossistemas como berçários de várias espécies marinhas, assim como de sumidouro de gases de efeito de estufa”. Por isso, diz, “é para amanhã” a sua inclusão no Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050. Não sabe é bem quando será esse amanhã, que terá de ser negociado com o seu colega que tutela o Ambiente e trabalhado pela APA numa revisão próxima.

A estratégia nacional para que Portucal cumpra o Acordo de Paris não inclui as pradarias marinhas nem os sapais. Contudo, a Ocean Alive quer alterar esta realidade. “O nosso objetivo é que o Governo inclua estes habitats numa revisão próxima da estratégia nacional para que em 2050 o balanço entre as emissões e as remoções dos gases de efeito de estufa seja nulo”, sublinha Raquel Gaspar.

“Estes ecossistemas têm uma capacidade de sequestro 30 a 40 vezes superior à das florestas”, lembra o investigador Rui Santos, do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve (CCMAR), que tem estudado as pradarias da Ria Formosa, no Algarve, e que também acompanhou este mergulho. Portugal tem perdido áreas de pradarias marinhas e de sapal devido às atividades humanas e é muito importante “preservar estes ecossistemas e reverter a sua destruição, com benefícios para a proteção costeira, a reciclagem de nutrientes (prevenindo a eutrofização das águas), a inversão da perda de biodiversidade e o combate às alterações climáticas”, sublinha Raquel Gaspar.

A pradaria onde o ministro mergulhou estende-se por uma língua de cerca de um quilómetro e conserva uma área de Cynodocea nodosa, uma das três espécies desta erva marinha existentes em Portugal. E “o Sado é a localização mundial mais a norte desta espécie”, sublinha a bióloga Ester Serrão. A investigadora do CCMAR da Universidade do Algarve tem trabalhado na recuperação das pradarias marinhas do Portinho da Arrábida e da Ria Formosa e lembra que “o melhor é preservá-las, pois replantá-las e recuperá-las dá muito trabalho”.

No relatório lançado pelo programa de Ambiente da Organização das Nações Unidas (UBNEP) no dia dos Oceanos — “Out of the Blue: The Value of Seagrasses to the Environment and to People”— é lembrada a importância destes ecossistemas e os riscos da sua destruição, já que “apesar de cobrirem apenas 0,1% do fundo do oceano têm capacidade para absorver e armazenar cerca de 18% do carbono depositado nos oceanos”, e assim ajudar a reduzir o que se concentra na atmosfera. Os investigadores calculam que desde finais do século XIX terão desaparecido cerca de 30% destas áreas de ervas marinhas e que se perca 7% deste habitat por ano.

Para o ministro do Mar este “é um importante relatório da ONU que vem dar visibilidade a um ecossistema até agora quase invisível”. E lembra que mostrar imagens destas pradarias e das profundezas dos oceanos “é uma forma de trazer estes ecossistemas ao coração das pessoas, com a razão”.

Para já, a Ocean Alive conseguiu pelo menos chamar a atenção da Administração do Porto de Setúbal para retirar um cabo submerso de amarração de barcos que danifica esta pradaria em concreto e alertar as autoridades para o risco do excesso de licenças de ostreicultura.

Com um sorriso de orelha a orelha, Ricardo Serrão Santos regressa ao barco. Os 20 minutos anteriores foram passados debaixo de água, de fato de mergulho e botija, a observar cavalos marinhos, chocos e pequenos peixes numa das pradarias marinhas submersas no Estuário do Sado. Foi o primeiro mergulho enquanto ministro e o primeiro detentor de uma pasta ministerial a meter-se em tal aventura. Mas não foi o primeiro mergulho do atual ministro do Mar.

Biólogo de formação, Ricardo Serrão Santos conta com um número vasto de aventuras debaixo de água. Não sabe quantas. Apenas recorda que a primeira vez que desceu de escafandro foi em 1979, “não muito longe deste sítio”, umas milhas mais para noroeste onde o Sado se encontra com o mar junto ao Portinho da Arrábida. Tinha então 25 anos e andava a estudar cabozes. No currículo não lhe faltam mergulhos, uns mais profundos do que outros. Da memória salta a descida num submarino MIR a 3000 metros no profundo e límpido azul do mar dos Açores, como um dos consultores científicos do documentário “Aliens of the Deep”, realizado por James Cameron em 2005. Os olhos brilham ao lembrar-se da aventura e das criaturas dos montes e das fontes hidrotermais que observou nas profundezas do Atlântico e do Pacífico e que o documentário 3D de Cameron fizeram chegar ao grande público.

NUNO BOTELHO

Voltemos ao Sado, onde a água não é tão límpida como a dos Açores. Estamos num rio em cujas margem se erguem construções urbanas e industriais e campos agrícolas. Além desta pressão humana, as dragagens recentes no rio criaram sobressaltos. Porém,a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) garante que não houve impactos nas pradarias. Uma das grandes ameaças agora "são os pedidos de licenciamento para novas área de ostreicultura”, alertam as biólogas Raquel Gaspar e Sílvia Tavares, dirigentes da cooperativa Ocean Alive. Foram elas que lançaram o convite ao ministro para conhecer in loco estas pradarias marinhas do Sado.

Foi a primeira vez que o ministro mergulhou nestas ervas marinhas, que classificou como “exuberantes”, apesar da pouca visibilidade devido à suspensão de fitoplâncton e de sedimentos que não permitiam ver nada a mais de um metro de distância. Contudo, Serrão Santos conseguiu ver cavalos marinhos, chocos e pequenos peixes que em seu entender ilustram bem “a importância destes ecossistemas como berçários de várias espécies marinhas, assim como de sumidouro de gases de efeito de estufa”. Por isso, diz, “é para amanhã” a sua inclusão no Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050. Não sabe é bem quando será esse amanhã, que terá de ser negociado com o seu colega que tutela o Ambiente e trabalhado pela APA numa revisão próxima.

A estratégia nacional para que Portucal cumpra o Acordo de Paris não inclui as pradarias marinhas nem os sapais. Contudo, a Ocean Alive quer alterar esta realidade. “O nosso objetivo é que o Governo inclua estes habitats numa revisão próxima da estratégia nacional para que em 2050 o balanço entre as emissões e as remoções dos gases de efeito de estufa seja nulo”, sublinha Raquel Gaspar.

“Estes ecossistemas têm uma capacidade de sequestro 30 a 40 vezes superior à das florestas”, lembra o investigador Rui Santos, do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve (CCMAR), que tem estudado as pradarias da Ria Formosa, no Algarve, e que também acompanhou este mergulho. Portugal tem perdido áreas de pradarias marinhas e de sapal devido às atividades humanas e é muito importante “preservar estes ecossistemas e reverter a sua destruição, com benefícios para a proteção costeira, a reciclagem de nutrientes (prevenindo a eutrofização das águas), a inversão da perda de biodiversidade e o combate às alterações climáticas”, sublinha Raquel Gaspar.

A pradaria onde o ministro mergulhou estende-se por uma língua de cerca de um quilómetro e conserva uma área de Cynodocea nodosa, uma das três espécies desta erva marinha existentes em Portugal. E “o Sado é a localização mundial mais a norte desta espécie”, sublinha a bióloga Ester Serrão. A investigadora do CCMAR da Universidade do Algarve tem trabalhado na recuperação das pradarias marinhas do Portinho da Arrábida e da Ria Formosa e lembra que “o melhor é preservá-las, pois replantá-las e recuperá-las dá muito trabalho”.

No relatório lançado pelo programa de Ambiente da Organização das Nações Unidas (UBNEP) no dia dos Oceanos — “Out of the Blue: The Value of Seagrasses to the Environment and to People”— é lembrada a importância destes ecossistemas e os riscos da sua destruição, já que “apesar de cobrirem apenas 0,1% do fundo do oceano têm capacidade para absorver e armazenar cerca de 18% do carbono depositado nos oceanos”, e assim ajudar a reduzir o que se concentra na atmosfera. Os investigadores calculam que desde finais do século XIX terão desaparecido cerca de 30% destas áreas de ervas marinhas e que se perca 7% deste habitat por ano.

Para o ministro do Mar este “é um importante relatório da ONU que vem dar visibilidade a um ecossistema até agora quase invisível”. E lembra que mostrar imagens destas pradarias e das profundezas dos oceanos “é uma forma de trazer estes ecossistemas ao coração das pessoas, com a razão”.

Para já, a Ocean Alive conseguiu pelo menos chamar a atenção da Administração do Porto de Setúbal para retirar um cabo submerso de amarração de barcos que danifica esta pradaria em concreto e alertar as autoridades para o risco do excesso de licenças de ostreicultura.

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