Congresso do CDS. O medo do “partido da trotinete”, a luta pela relevância... e a ajuda do PSD

24-01-2020
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Os parcos 4,22% conquistados a 6 de outubro de 2019 ainda são uma espinha presa na garganta do CDS. Afinal, trata-se do pior resultado de que há registo, quer em percentagem como em número de votos, desde que o partido centrista nasceu – um legado pesado para qualquer um dos cinco candidatos que venha a suceder Assunção Cristas, no Congresso marcado para este fim de semana. Para um partido que vive com o complexo do “partido do táxi”, e num momento em que tem apenas cinco deputados, o risco de se tornar o partido da “trotinete” está presente. “Não é assim tão fácil um partido desaparecer, mas também não é automático que cresça. Pode cair de 4% para 3% ainda, correndo o risco de se tornar irrelevante”, diz André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, em declarações ao Expresso.

Falar sobre o futuro do CDS é “especulação”, avisa o politólogo António Costa Pinto. Todavia, com as legislativas de 2019, a realidade política à direita “alterou-se”, nota. “Estamos ainda sob o impacto de ter sido eleito o primeiro partido populista de direita desde o Estado Novo.” Será difícil que o CDS se evapore, mas isso “acontece”: em França, o partido populista de Marine Le Pen dissipou outras forças do mesmo espectro político, por exemplo. “O sistema partidário português à direita foi construído e consolidado em 1976. Sobreviveu com grande resiliência até ao ano passado. Assistiu incólume e nunca sofreu as oscilações como houve dentro do PS, e o surgimento e consolidação do Bloco de Esquerda”, lembra.

Ao futuro líder do CDS, aconselha-se “moderação no discurso”, diz André Azevedo Alves. No início desta semana, João Almeida, um dos candidatos à liderança, afirmou que o CDS não vai disputar o “campeonato dos pequeninos” – afastando-se assim do Chega e Iniciativa Liberal, partidos que aterraram na ala direita do Parlamento no ano passado. Nas palavras do centrista pode haver um excesso de confiança. “Nada garante que o CDS possa ter um peso superior ao que tem neste momento”, diz.

Tanto o partido de André Ventura como o de João Cotrim Figueiredo conseguiram 1,29% de votos nas últimas eleições. Neste momento, não se sabe ainda se estes dois partidos vão “limitar a recuperação eleitoral do CDS”, admite António Costa Pinto.

Em todo o caso, longe vão os tempos em que o CDS tinha 46 deputados na Assembleia da República. Foi em 1980, no segundo Governo da Aliança Democrática, que o CDS, sob a liderança de Diogo Freitas do Amaral, alcançou tal resultado. À época, para transportar todos os representantes centristas seria preciso um autocarro. Desde então, nunca mais o CDS conseguiu atingir a marca das quatro dezenas. Na primeira maioria absoluta de Cavaco Silva em 1987, mirrou até quatro deputados. E os últimos trinta anos, o melhor resultado que alcançou foi em 2011, com Paulo Portas no lugar de timoneiro e o país em plena crise económica: 24 deputados. No plano das analogias de veículos, um miniautocarro.

Há quatro anos, após a formação da geringonça e saída de Paulo Portas de cena, Assunção Cristas herdou uma bancada com 18 representantes. Este número, contudo, pode ter estado sempre enviesado, já que o PSD e CDS concorreram juntos nas legislativas de 2015. “Não sabemos quanto é que o CDS poderia ter tido se tivesse concorrido sozinho. Portas e Passos acusaram desgaste da governação. A queda do CDS, afinal, pode não ter sido de 11,40% (resultado de 2011), mas de 6% para 4%. O próprio ponto de partida podia já não ser substancial”, nota André Azevedo Alves.

Períodos de seca

Os períodos de escassez eleitoral não são novidade para o CDS. Em 1987, com 251 987 votos, Adriano Moreira viu o grupo parlamentar emagrecer em 18 deputados, sobrando apenas quatro representantes. Nas eleições seguintes, em 1991, Freitas do Amaral, com 254 317 votos, somente conseguiu eleger cinco. Mas o resultado das legislativas de 2019 merece destaque: Assunção Cristas apenas conseguiu arregimentar 216 448 votos, ou seja, menos 35 539 votos que 32 anos antes.

De acordo com António Costa Pinto, o futuro do CDS “vai depender muito do PSD”. Ou seja, se Rui Rio optar por uma estratégia de liderança e federação. “A incerteza passou para a direita do espetro político. Já era hora. O partido que sempre teve este problema foi o PS”, diz.

Ao nível histórico, as oscilações do CDS estão também intimamente relacionadas com o PSD. Costa Pinto lembra o “declínio eleitoral do CDS com Cavaco Silva” e a “dinâmica de opção.” “Há muitos anos que existe uma fluidez eleitoral entre o PSD e o CDS”, explica. O partido centrista, contudo, nunca conseguiu roubar eleitorado aos social-democratas, como pretendia Assunção Cristas, que chegou a anunciar em 2017 ser candidata a primeira-ministra.

O fantasma de Portas

Sobre o congresso do CDS deste fim de semana, paira o fantasma de Paulo Portas. “Grande parte dos quadros formados no partido nos últimos 20 anos estão ligados a Paulo Portas”, lembra André Azevedo Alves. Assunção Cristas não “descolou” desse passado, viveu ainda na influência de “um ‘portismo’ além de Portas”. “Ao contrário do que aconteceu no PSD com a saída de Passos Coelho, no CDS não há propriamente correntes alternativas”, diz.

Para o professor da Universidade Católica, um dos aspetos negativos dos anos de Paulo Portas foi “o partido perder muita implementação nacional, em detrimento de Lisboa. O PSD, mesmo em crise, continua a ter uma presença por todo o país.” O que justifica, em parte, o mau resultado das últimas eleições. Os cinco candidatos à liderança do CDS - João Almeida, Filipe Lobo D' Ávila, Francisco Rodrigues dos Santos “Chicão”, Abel Matos Santos e Carlos Meira - apresentaram “uma panóplia de propostas políticas que o CDS já foi no passado. Não há nada de novo”, aponta António Costa Pinto.

Segundo o politólogo, a candidatura de Carlos Meira “é de protesto”. Chicão aponta “para um modelo mais conservador, até algo populista”. João Almeida é o “herdeiro de Paulo Portas”. Dentro e fora do partido, não há consenso quem vá ganhar as eleições internas ou quem seria melhor nesse lugar.

Em entrevista ao “Observador”, Adolfo Mesquita Nunes, ex-vice presidente do CDS, anunciou, na semana passada, o apoio à candidatura de João Almeida. Já na quarta-feira, Bagão Félix revelou ao “Público” que se revia na candidatura de Francisco Rodrigues dos Santos. “É muito aliciante que o CDS tenha um líder que faça o aggiornamento, que provoque uma corrente de ar, um refrescar de ideias”, disse.

Os parcos 4,22% conquistados a 6 de outubro de 2019 ainda são uma espinha presa na garganta do CDS. Afinal, trata-se do pior resultado de que há registo, quer em percentagem como em número de votos, desde que o partido centrista nasceu – um legado pesado para qualquer um dos cinco candidatos que venha a suceder Assunção Cristas, no Congresso marcado para este fim de semana. Para um partido que vive com o complexo do “partido do táxi”, e num momento em que tem apenas cinco deputados, o risco de se tornar o partido da “trotinete” está presente. “Não é assim tão fácil um partido desaparecer, mas também não é automático que cresça. Pode cair de 4% para 3% ainda, correndo o risco de se tornar irrelevante”, diz André Azevedo Alves, professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, em declarações ao Expresso.

Falar sobre o futuro do CDS é “especulação”, avisa o politólogo António Costa Pinto. Todavia, com as legislativas de 2019, a realidade política à direita “alterou-se”, nota. “Estamos ainda sob o impacto de ter sido eleito o primeiro partido populista de direita desde o Estado Novo.” Será difícil que o CDS se evapore, mas isso “acontece”: em França, o partido populista de Marine Le Pen dissipou outras forças do mesmo espectro político, por exemplo. “O sistema partidário português à direita foi construído e consolidado em 1976. Sobreviveu com grande resiliência até ao ano passado. Assistiu incólume e nunca sofreu as oscilações como houve dentro do PS, e o surgimento e consolidação do Bloco de Esquerda”, lembra.

Ao futuro líder do CDS, aconselha-se “moderação no discurso”, diz André Azevedo Alves. No início desta semana, João Almeida, um dos candidatos à liderança, afirmou que o CDS não vai disputar o “campeonato dos pequeninos” – afastando-se assim do Chega e Iniciativa Liberal, partidos que aterraram na ala direita do Parlamento no ano passado. Nas palavras do centrista pode haver um excesso de confiança. “Nada garante que o CDS possa ter um peso superior ao que tem neste momento”, diz.

Tanto o partido de André Ventura como o de João Cotrim Figueiredo conseguiram 1,29% de votos nas últimas eleições. Neste momento, não se sabe ainda se estes dois partidos vão “limitar a recuperação eleitoral do CDS”, admite António Costa Pinto.

Em todo o caso, longe vão os tempos em que o CDS tinha 46 deputados na Assembleia da República. Foi em 1980, no segundo Governo da Aliança Democrática, que o CDS, sob a liderança de Diogo Freitas do Amaral, alcançou tal resultado. À época, para transportar todos os representantes centristas seria preciso um autocarro. Desde então, nunca mais o CDS conseguiu atingir a marca das quatro dezenas. Na primeira maioria absoluta de Cavaco Silva em 1987, mirrou até quatro deputados. E os últimos trinta anos, o melhor resultado que alcançou foi em 2011, com Paulo Portas no lugar de timoneiro e o país em plena crise económica: 24 deputados. No plano das analogias de veículos, um miniautocarro.

Há quatro anos, após a formação da geringonça e saída de Paulo Portas de cena, Assunção Cristas herdou uma bancada com 18 representantes. Este número, contudo, pode ter estado sempre enviesado, já que o PSD e CDS concorreram juntos nas legislativas de 2015. “Não sabemos quanto é que o CDS poderia ter tido se tivesse concorrido sozinho. Portas e Passos acusaram desgaste da governação. A queda do CDS, afinal, pode não ter sido de 11,40% (resultado de 2011), mas de 6% para 4%. O próprio ponto de partida podia já não ser substancial”, nota André Azevedo Alves.

Períodos de seca

Os períodos de escassez eleitoral não são novidade para o CDS. Em 1987, com 251 987 votos, Adriano Moreira viu o grupo parlamentar emagrecer em 18 deputados, sobrando apenas quatro representantes. Nas eleições seguintes, em 1991, Freitas do Amaral, com 254 317 votos, somente conseguiu eleger cinco. Mas o resultado das legislativas de 2019 merece destaque: Assunção Cristas apenas conseguiu arregimentar 216 448 votos, ou seja, menos 35 539 votos que 32 anos antes.

De acordo com António Costa Pinto, o futuro do CDS “vai depender muito do PSD”. Ou seja, se Rui Rio optar por uma estratégia de liderança e federação. “A incerteza passou para a direita do espetro político. Já era hora. O partido que sempre teve este problema foi o PS”, diz.

Ao nível histórico, as oscilações do CDS estão também intimamente relacionadas com o PSD. Costa Pinto lembra o “declínio eleitoral do CDS com Cavaco Silva” e a “dinâmica de opção.” “Há muitos anos que existe uma fluidez eleitoral entre o PSD e o CDS”, explica. O partido centrista, contudo, nunca conseguiu roubar eleitorado aos social-democratas, como pretendia Assunção Cristas, que chegou a anunciar em 2017 ser candidata a primeira-ministra.

O fantasma de Portas

Sobre o congresso do CDS deste fim de semana, paira o fantasma de Paulo Portas. “Grande parte dos quadros formados no partido nos últimos 20 anos estão ligados a Paulo Portas”, lembra André Azevedo Alves. Assunção Cristas não “descolou” desse passado, viveu ainda na influência de “um ‘portismo’ além de Portas”. “Ao contrário do que aconteceu no PSD com a saída de Passos Coelho, no CDS não há propriamente correntes alternativas”, diz.

Para o professor da Universidade Católica, um dos aspetos negativos dos anos de Paulo Portas foi “o partido perder muita implementação nacional, em detrimento de Lisboa. O PSD, mesmo em crise, continua a ter uma presença por todo o país.” O que justifica, em parte, o mau resultado das últimas eleições. Os cinco candidatos à liderança do CDS - João Almeida, Filipe Lobo D' Ávila, Francisco Rodrigues dos Santos “Chicão”, Abel Matos Santos e Carlos Meira - apresentaram “uma panóplia de propostas políticas que o CDS já foi no passado. Não há nada de novo”, aponta António Costa Pinto.

Segundo o politólogo, a candidatura de Carlos Meira “é de protesto”. Chicão aponta “para um modelo mais conservador, até algo populista”. João Almeida é o “herdeiro de Paulo Portas”. Dentro e fora do partido, não há consenso quem vá ganhar as eleições internas ou quem seria melhor nesse lugar.

Em entrevista ao “Observador”, Adolfo Mesquita Nunes, ex-vice presidente do CDS, anunciou, na semana passada, o apoio à candidatura de João Almeida. Já na quarta-feira, Bagão Félix revelou ao “Público” que se revia na candidatura de Francisco Rodrigues dos Santos. “É muito aliciante que o CDS tenha um líder que faça o aggiornamento, que provoque uma corrente de ar, um refrescar de ideias”, disse.

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