Covid-19. Especialistas em contratação pública alertam Governo para o aumento dos conflitos

01-05-2020
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Um conjunto de advogados, professores universitários da área da contratação pública e da arbitragem e alguns diretores jurídicos de empresas alertam o Governo para o aumento da litigância nesta área por causa do impacto da pandemia de covid-19 em várias atividades.

Numa carta enviada esta terça-feira a vários ministérios, a que o Expresso teve acesso, o grupo de quase sessenta especialistas lembra que as medidas no âmbito do estado de emergência estão a gerar perdas em múltiplas empresas que prestam serviços ao Estado e a impedir o cumprimento do que havia sido contratado. Num cenário que inclui eventuais pedidos de indemnização dos privados ao Estado, através do mecanismo de reequilíbrio financeiro dos contratos.

“Não haja dúvidas: a pandemia covid-19 e as medidas tomadas pelo Governo para combater essa mesma pandemia constituirão, na esmagadora maioria dos contratos públicos em execução, uma alteração anormal e imprevisível das circunstâncias. Do mesmo modo, também os casos em que os co-contratantes não consigam cumprir pontualmente as suas obrigações contratuais por causa da pandemia e das medidas governativas de emergência, terão justificação num evento de força maior”, sinalizam os signatários.

Estão em causa atividades como a segurança de organismos públicos, de serviços de limpeza, de alimentação, entre muitos outros. “O contexto em que vivemos já está a ter um impacto crítico em sectores essenciais para a economia portuguesa: basta pensar que o sector da construção dá sustento a 600 mil famílias e a contratação pública tem um peso de 16% no Produto Interno Bruto nacional”, refere a carta aberta.

Onde se acrescenta que “a estes valores, há que somar os empregos diretos e indiretos gerados pelos contratos de prestação de serviços estabelecidos com empresas que asseguram funções essenciais para a continuidade dos serviços públicos básicos como sejam a educação e saúde”.

Centenas de processos de renegociação

A missiva teve como destinatários os ministros da Economia, Justiça, Infraestruturas e da Modernização Administrativa e sinaliza não só um futuro de multiplicação de conflitos como identifica a necessidade de se criarem mecanismos de negociação mais flexíveis, bem como da possibilidade de recorrer a mecanismos alternativos aos tribunais para resolver estes desacordos, ou seja, o recurso à arbitragem.

É antecipado um cenário “de centenas de processos de renegociação” nos próximos meses “e a situação de emergência financeira destas empresas não suporta a morosidade da justiça dos tribunais”. E, por isso, há que “encontrar soluções céleres” para se chegar a um consenso ou, na nessa impossibilidade, para “dirimir os conflitos e prosseguir celeremente na execução dos contratos”.

Na carta é pedido aos ministros Pedro Siza Vieira, Francisca Van Dunem, Pedro Nuno Santos e Alexandra Leitão que seja levado a cabo um processo de negociação “generalizado” com o objetivo do reequilíbrio dos contratos celebrados, lembrando que “a legislação vigente tem regras e princípios precisamente para serem aplicados em casos de alteração de circunstâncias e de força maior, razão pela qual é tempo de permitir a aplicação desses normativos”. Uma pandemia é considerada um evento de força maior.

É ainda dito que “isso não será suficiente” nas situações que estão cobertas por legislação destinada a aplicar-se em tempos de normalidade e que, por isso, “carecem de um regime jurídico extraordinário, aplicável precisamente neste tempo extraordinário em que vivemos, nomeadamente todo o regime da modificação dos contratos e respetivos pressupostos e limites”. Para o grupo de especialistas urge uma discussão pública “urgente sobre a forma como será feita a renegociação destes contratos”.

Caso não sejam tomadas medidas, haverá uma vaga “sem precedentes de insolvências”.

Governo não quer pagar indemnizações

Entretanto, na semana passada, em comunicado do Conselho de Ministros, o Governo fez saber a aprovação de um diploma que prevê a suspensão das “cláusulas contratuais e disposições normativas que preveem o direito à reposição do equilíbrio financeiro ou a compensação por quebras de utilização em qualquer contrato de execução duradoura em que o Estado ou outra entidade pública sejam parte, incluindo parcerias público-privadas (PPP)”.

Na nota do Conselho de Ministros era ainda dito que “fora do período do estado de emergência, nos contratos em que se preveja expressamente o direito do contraente privado a ser compensado por quebras de utilização ou a ocorrência de uma pandemia como fundamento passível de originar uma pretensão de reposição do equilíbrio financeiro, estas só podem ser realizadas através da prorrogação do prazo de execução das prestações ou de vigência do contrato”. Ou seja, se a pandemia já veio colocar em cima de mesa possíveis conflitos à luz da legislação atual, as mexidas nas regras do jogo pelo Governo fazem antecipar mais desacordos.

O decreto-lei em causa deverá, em breve, ser publicado em Diário da República e aí serão conhecidas em detalhe as mudanças ao nível de eventuais indemnizações das empresas que têm contratos com entidades públicas.

Dois exemplos onde, certamente, haverá desentendimentos é a área das PPP rodoviárias, em que as concessionárias querem ativar o mecanismo de reequilíbrio financeiro para serem indemnizadas pelas perdas de tráfego, e da saúde já que nos hospitais com gestão privada se antecipam mais custos com o tratamento de doentes infetados com o novo coronavírus, bem como o incumprimento da produção definida nos respetivos contratos porque, para dar resposta à covid-19, foram obrigados a desmarcar todos os atos de saúde considerados não urgentes.

Em ambos os casos, uma situação de pandemia enquadra-se nos eventos de força maior que podem dar origem a um reequilíbrio financeiro, previsto neste tipo de contratos. Porém, como já foi referido, as regras estão prestes a mudar.

Um conjunto de advogados, professores universitários da área da contratação pública e da arbitragem e alguns diretores jurídicos de empresas alertam o Governo para o aumento da litigância nesta área por causa do impacto da pandemia de covid-19 em várias atividades.

Numa carta enviada esta terça-feira a vários ministérios, a que o Expresso teve acesso, o grupo de quase sessenta especialistas lembra que as medidas no âmbito do estado de emergência estão a gerar perdas em múltiplas empresas que prestam serviços ao Estado e a impedir o cumprimento do que havia sido contratado. Num cenário que inclui eventuais pedidos de indemnização dos privados ao Estado, através do mecanismo de reequilíbrio financeiro dos contratos.

“Não haja dúvidas: a pandemia covid-19 e as medidas tomadas pelo Governo para combater essa mesma pandemia constituirão, na esmagadora maioria dos contratos públicos em execução, uma alteração anormal e imprevisível das circunstâncias. Do mesmo modo, também os casos em que os co-contratantes não consigam cumprir pontualmente as suas obrigações contratuais por causa da pandemia e das medidas governativas de emergência, terão justificação num evento de força maior”, sinalizam os signatários.

Estão em causa atividades como a segurança de organismos públicos, de serviços de limpeza, de alimentação, entre muitos outros. “O contexto em que vivemos já está a ter um impacto crítico em sectores essenciais para a economia portuguesa: basta pensar que o sector da construção dá sustento a 600 mil famílias e a contratação pública tem um peso de 16% no Produto Interno Bruto nacional”, refere a carta aberta.

Onde se acrescenta que “a estes valores, há que somar os empregos diretos e indiretos gerados pelos contratos de prestação de serviços estabelecidos com empresas que asseguram funções essenciais para a continuidade dos serviços públicos básicos como sejam a educação e saúde”.

Centenas de processos de renegociação

A missiva teve como destinatários os ministros da Economia, Justiça, Infraestruturas e da Modernização Administrativa e sinaliza não só um futuro de multiplicação de conflitos como identifica a necessidade de se criarem mecanismos de negociação mais flexíveis, bem como da possibilidade de recorrer a mecanismos alternativos aos tribunais para resolver estes desacordos, ou seja, o recurso à arbitragem.

É antecipado um cenário “de centenas de processos de renegociação” nos próximos meses “e a situação de emergência financeira destas empresas não suporta a morosidade da justiça dos tribunais”. E, por isso, há que “encontrar soluções céleres” para se chegar a um consenso ou, na nessa impossibilidade, para “dirimir os conflitos e prosseguir celeremente na execução dos contratos”.

Na carta é pedido aos ministros Pedro Siza Vieira, Francisca Van Dunem, Pedro Nuno Santos e Alexandra Leitão que seja levado a cabo um processo de negociação “generalizado” com o objetivo do reequilíbrio dos contratos celebrados, lembrando que “a legislação vigente tem regras e princípios precisamente para serem aplicados em casos de alteração de circunstâncias e de força maior, razão pela qual é tempo de permitir a aplicação desses normativos”. Uma pandemia é considerada um evento de força maior.

É ainda dito que “isso não será suficiente” nas situações que estão cobertas por legislação destinada a aplicar-se em tempos de normalidade e que, por isso, “carecem de um regime jurídico extraordinário, aplicável precisamente neste tempo extraordinário em que vivemos, nomeadamente todo o regime da modificação dos contratos e respetivos pressupostos e limites”. Para o grupo de especialistas urge uma discussão pública “urgente sobre a forma como será feita a renegociação destes contratos”.

Caso não sejam tomadas medidas, haverá uma vaga “sem precedentes de insolvências”.

Governo não quer pagar indemnizações

Entretanto, na semana passada, em comunicado do Conselho de Ministros, o Governo fez saber a aprovação de um diploma que prevê a suspensão das “cláusulas contratuais e disposições normativas que preveem o direito à reposição do equilíbrio financeiro ou a compensação por quebras de utilização em qualquer contrato de execução duradoura em que o Estado ou outra entidade pública sejam parte, incluindo parcerias público-privadas (PPP)”.

Na nota do Conselho de Ministros era ainda dito que “fora do período do estado de emergência, nos contratos em que se preveja expressamente o direito do contraente privado a ser compensado por quebras de utilização ou a ocorrência de uma pandemia como fundamento passível de originar uma pretensão de reposição do equilíbrio financeiro, estas só podem ser realizadas através da prorrogação do prazo de execução das prestações ou de vigência do contrato”. Ou seja, se a pandemia já veio colocar em cima de mesa possíveis conflitos à luz da legislação atual, as mexidas nas regras do jogo pelo Governo fazem antecipar mais desacordos.

O decreto-lei em causa deverá, em breve, ser publicado em Diário da República e aí serão conhecidas em detalhe as mudanças ao nível de eventuais indemnizações das empresas que têm contratos com entidades públicas.

Dois exemplos onde, certamente, haverá desentendimentos é a área das PPP rodoviárias, em que as concessionárias querem ativar o mecanismo de reequilíbrio financeiro para serem indemnizadas pelas perdas de tráfego, e da saúde já que nos hospitais com gestão privada se antecipam mais custos com o tratamento de doentes infetados com o novo coronavírus, bem como o incumprimento da produção definida nos respetivos contratos porque, para dar resposta à covid-19, foram obrigados a desmarcar todos os atos de saúde considerados não urgentes.

Em ambos os casos, uma situação de pandemia enquadra-se nos eventos de força maior que podem dar origem a um reequilíbrio financeiro, previsto neste tipo de contratos. Porém, como já foi referido, as regras estão prestes a mudar.

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