A Destreza das Dúvidas: Depois de pousar a poeira...

23-12-2019
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Calculei, e bem, que na sequência das decisões do Ministério
da Educação sobre a avaliação dos alunos do ensino básico se iriam seguir
numerosas críticas nos diferentes meios de comunicação, e algumas (poucas)
dando-lhes apoio. Decidi, por isso, não elaborar o meu próprio comentário
enquanto não esfriasse o ímpeto contestatário, ou seja, enquanto a poeira não pousasse
e o ambiente ficasse mais sadio.

Das muitas coisas que se disseram retive particularmente
uma, de Manuela Ferreira Leite, que até foi Ministra da Educação em tempos
conturbados. A curta frase de Manuela Ferreira Leite foi esta, depois de
verberar as alterações feitas e como resposta a uma questão do entrevistador
sobre a hipótese de tais alterações até serem correctas: “Há opiniões para
todos os gostos”.

Inicialmente fiquei irritado, mas rapidamente acalmei: ela
até tem, parcialmente, razão. Se quisermos simplificar, na raiz dos problemas que
giram em torno da educação há uma questão central que se resolve com uma
opinião. A questão é: “Deve o sistema de educação de um país ser selectivo e
essencialmente meritocrático ou ser inclusivo e abrangente?” Seria redutor
dizer que quem pensa “à esquerda” tem uma opinião e quem pensa “à direita” tem
outra, porque isso não é verdade; mas reconhecer-se-á que o pensamento
conservador tende para a opinião de a escola dever ser selectiva e que um
pensamento mais progressista tende para a opinião de a escola dever ser
inclusiva.

Eu diria que até há relativamente pouco tempo os
responsáveis pela política educativa, fossem de que partido fossem, aceitavam a
escola abrangente, que, aliás, está implícita na Constituição e na Lei de Bases do Sistema Educativo. A grande
clivagem começou nos tempos do governo de Durão Barroso e acentuou-se com Nuno
Crato, que quebrou essa relativa harmonia de princípios. As medidas tomadas, e
a questão dos exames do 4º ano até não terá sido a mais gravosa, não podiam ser
toleradas não só porque iam contra uma “opinião”, mas porque objectivamente
punham em causa valores que um regime democrático não pode alienar.

Por que disse acima que inicialmente fiquei irritado com a
frase da Drª Manuela Ferreira Leite? É há que dizer que a educação não pode ser
deixada às “opiniões” que se tenham sobre ela. Desde há muito tempo que a
educação, nas suas várias dimensões, é objecto de investigação, reclamando-se
ser uma ciência – ou um conjunto de ciências. São ciências humanas – e como
tal, não são ciências exactas, mas podem ser ciências rigorosas. Acredito que
os colegas economistas estejam de acordo com este princípio que informa as
ciências humanas. É evidente que a investigação em educação tem e terá sempre
imensa dificuldade em generalizar, mas o mesmo e passa com a psicologia, com a
sociologia, com a história. Por isso, investigações sobre o mesmo tópico podem
conduzir a resultados diferentes, dependendo das variáveis que puderam ser ou
não controladas (se se tratar de uma investigação experimental, ou
quase-experimental) ou dos casos estudados, nos quais o aleatório pode
complicar (se se tratar de investigações de índole qualitativa).

Aceitando o que expus, há argumentos sólidos baseados em
investigações credíveis que justificam as medidas tomadas agora pelo ministro
Tiago Brandão Rodrigues. O facto de outras investigações terem chegado a resultados
diferentes não colhe; não se passa o mesmo noutras áreas do saber? Reitero que
teria preferido menos pressa na decisão, mas compreendo-a tendo em conta a
conjuntura. Por ouro lado, de um modo geral não houve grande contestação às
medidas tomadas por parte de professores, escolas, alunos, pais. O facto de os
alunos e professores que esperavam exame o verem anulado não constitui, em si,
um grande problema. Já o mesmo pode não acontecer se os professores do 2º e 8º
anos não quiserem entender o que a prova de aferição é – e continuarem a querer
treinar para ela como se de um exame se tratasse. Não sei que tipo de apoio o
Ministério vai prestar às escolas, mas ele é vital. Infelizmente no passado
esse apoio tem sido escasso e a minha dúvida é se vai ser possível inverter
essa tendência.

Calculei, e bem, que na sequência das decisões do Ministério
da Educação sobre a avaliação dos alunos do ensino básico se iriam seguir
numerosas críticas nos diferentes meios de comunicação, e algumas (poucas)
dando-lhes apoio. Decidi, por isso, não elaborar o meu próprio comentário
enquanto não esfriasse o ímpeto contestatário, ou seja, enquanto a poeira não pousasse
e o ambiente ficasse mais sadio.

Das muitas coisas que se disseram retive particularmente
uma, de Manuela Ferreira Leite, que até foi Ministra da Educação em tempos
conturbados. A curta frase de Manuela Ferreira Leite foi esta, depois de
verberar as alterações feitas e como resposta a uma questão do entrevistador
sobre a hipótese de tais alterações até serem correctas: “Há opiniões para
todos os gostos”.

Inicialmente fiquei irritado, mas rapidamente acalmei: ela
até tem, parcialmente, razão. Se quisermos simplificar, na raiz dos problemas que
giram em torno da educação há uma questão central que se resolve com uma
opinião. A questão é: “Deve o sistema de educação de um país ser selectivo e
essencialmente meritocrático ou ser inclusivo e abrangente?” Seria redutor
dizer que quem pensa “à esquerda” tem uma opinião e quem pensa “à direita” tem
outra, porque isso não é verdade; mas reconhecer-se-á que o pensamento
conservador tende para a opinião de a escola dever ser selectiva e que um
pensamento mais progressista tende para a opinião de a escola dever ser
inclusiva.

Eu diria que até há relativamente pouco tempo os
responsáveis pela política educativa, fossem de que partido fossem, aceitavam a
escola abrangente, que, aliás, está implícita na Constituição e na Lei de Bases do Sistema Educativo. A grande
clivagem começou nos tempos do governo de Durão Barroso e acentuou-se com Nuno
Crato, que quebrou essa relativa harmonia de princípios. As medidas tomadas, e
a questão dos exames do 4º ano até não terá sido a mais gravosa, não podiam ser
toleradas não só porque iam contra uma “opinião”, mas porque objectivamente
punham em causa valores que um regime democrático não pode alienar.

Por que disse acima que inicialmente fiquei irritado com a
frase da Drª Manuela Ferreira Leite? É há que dizer que a educação não pode ser
deixada às “opiniões” que se tenham sobre ela. Desde há muito tempo que a
educação, nas suas várias dimensões, é objecto de investigação, reclamando-se
ser uma ciência – ou um conjunto de ciências. São ciências humanas – e como
tal, não são ciências exactas, mas podem ser ciências rigorosas. Acredito que
os colegas economistas estejam de acordo com este princípio que informa as
ciências humanas. É evidente que a investigação em educação tem e terá sempre
imensa dificuldade em generalizar, mas o mesmo e passa com a psicologia, com a
sociologia, com a história. Por isso, investigações sobre o mesmo tópico podem
conduzir a resultados diferentes, dependendo das variáveis que puderam ser ou
não controladas (se se tratar de uma investigação experimental, ou
quase-experimental) ou dos casos estudados, nos quais o aleatório pode
complicar (se se tratar de investigações de índole qualitativa).

Aceitando o que expus, há argumentos sólidos baseados em
investigações credíveis que justificam as medidas tomadas agora pelo ministro
Tiago Brandão Rodrigues. O facto de outras investigações terem chegado a resultados
diferentes não colhe; não se passa o mesmo noutras áreas do saber? Reitero que
teria preferido menos pressa na decisão, mas compreendo-a tendo em conta a
conjuntura. Por ouro lado, de um modo geral não houve grande contestação às
medidas tomadas por parte de professores, escolas, alunos, pais. O facto de os
alunos e professores que esperavam exame o verem anulado não constitui, em si,
um grande problema. Já o mesmo pode não acontecer se os professores do 2º e 8º
anos não quiserem entender o que a prova de aferição é – e continuarem a querer
treinar para ela como se de um exame se tratasse. Não sei que tipo de apoio o
Ministério vai prestar às escolas, mas ele é vital. Infelizmente no passado
esse apoio tem sido escasso e a minha dúvida é se vai ser possível inverter
essa tendência.

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