“Querem o sindicalista confinado”. Como o PCP vê o “vírus do medo”

24-09-2020
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- Saímos de casa para trabalhar, criar mais valia, voltar a casa e aí ficamos calados, confinados, submetidos a essa exploração.

A constatação é de Ângelo Alves, que pertence ao Comité Central do PCP e participou, na manhã deste sábado, num dos debates que constavam do programa da “Festa do Avante!”. E, na verdade, basta uma pequena incursão por estes encontros para conhecer a filosofia com que o PCP encara a pandemia - de “vírus do medo”, como lhe chama - e os seus efeitos… nomeadamente no próprio partido, e na “ofensiva” de que diz estar a ser alvo.

Muitos virão à rentrée do PCP para assistir aos concertos, ver Lena d’Água em palco e ouvir as rimas de Capicua, mas a componente política está sempre presente: este sábado começou precisamente com um debate sobre o vírus do medo. Conclusões a retirar? A pandemia chegou para expor a pior face do capitalismo; o chamado “novo normal” não passa de uma forma de retirar liberdades e direitos aos trabalhadores, a que o PCP resiste; a comunicação social “manipulada” ajudou a “paralisar” a opinião pública com medo; e o partido está na mira do “sistema neoliberal”.

ana baiao

A prova de que o PCP resiste a esse restringir de direitos é precisamente a realização da Festa do “Avante!”, defendem os comunistas. E foi isso que Ângelo Alves explicou: “A forma como a festa foi tratada é um exemplo de como alguns tentam dissociar os direitos das pessoas: o direito à saúde é separado do direito à cultura, ao lazer, à participação política, à vida, para nos retirar a capacidade de defender os nossos direitos”. Uma “ofensiva anti-democrática” que pretende apresentar o tal “novo normal” como a única saída para o povo: “Este neoliberalismo está tão cheio de contradições que é preciso fazer-lhe uma lavagem de cara, um reset do sistema”.

A ideia de que houve uma estratégia - também da “comunicação social manipulada” - para ampliar o medo foi repetida intervenção após intervenção, enquanto o PCP era apresentado como o único partido que resiste a essa narrativa. Eugénio Rosa, economista e antigo deputado do PCP, fez uma longa intervenção em que tentou demonstrar isso mesmo, comparando o número de mortes por outras causas com o das vítimas da pandemia e concluindo: “O medo tem consequências dramáticas a nível social e económico. Houve uma campanha de grande manipulação da opinião pública para instalar e generalizar o medo, e efetivamente conseguiram isso”.

ana baiao

Ao lado, a deputada Alma Rivera concordava: “O que se coloca hoje é ultrapassar a paralisação que o medo provoca”. E Rui Fernandes, do Comité Central, subia o tom para “enfatizar o caráter reacionário, anti-democrático e mesmo fascizante” neste suposto alarmismo sobre a pandemia. Sempre com muitas ressalvas - “não pomos em causa a necessidade de segurança”, ouviu-se repetidamente - mas uma conclusão clara: “O pretexto é a pandemia. O alvo é o PCP”.

O "embrulho do medo"

À tarde, argumentos semelhantes. O nome dado a um outro debate não dava grandes pistas sobre o conteúdo - “Confiança e luta por uma vida melhor” - mas a assistência, que encheu as cadeiras distanciadas do Fórum para debates, ouviu um discurso semelhante ao da manhã. “Querem o sindicalista confinado”, garantiu Tiago Cunha, da CGTP. “A realização da Festa foi uma resposta importantíssima à ofensiva que nos quer silenciar”.

ana baiao

Ao lado, Fernanda Mateus, da comissão política do Comité Central, afinava pelo mesmo diapasão: “Todos nos lembramos da resignação e do fatalismo [da crise anterior]. É isso, embrulhado noutro embrulho: o do medo. Temos toda uma estratégia do grande capital, com um aumento da exploração, a abocanhar tudo o que era dos trabalhadores”. A mesma ideia: o surto é um pretexto e, sob “o manto da saúde”, “tudo é feito para convencer as pessoas de que o que é preciso é ter trabalho, mesmo sem direitos e rendimentos”. Ou, de resto, sem Festa do “Avante!”: “O tempo da pandemia não pode varrer a fruição saudável dos tempos livres”.

A aparição de Jerónimo

À hora a que Fernanda Mateus debatia com Tiago Cunha, mas também com João Oliveira, líder parlamentar do PCP, e António Filipe, deputado, passava Jerónimo de Sousa pelo espaço de debate - o que inevitavelmente acabou por roubar algum público, curioso para ver o secretário-geral, à iniciativa. Jerónimo, que falando aos jornalistas desafiou Marcelo Rebelo de Sousa a visitar a Festa e deixou recados orçamentais ao Governo, preparava-se para entrar em duas exposições - uma sobre a água e as levadas na Madeira, visitada ao lado do antigo candidato presidencial Edgar Silva, e outra sobre a pandemia e a política.

Não foi possível visitar a exposição ao mesmo tempo que Jerónimo, mas, percorrendo depois os corredores com cartazes escritos, a mensagem era a mesma: a pandemia é a “prova da natureza exploradora, opressora, agressiva e predadora” do capitalismo; o PCP defende a saúde “afirmando o direito à participação, à cultura e à vivência coletiva”; e “os direitos não estão confinados”.

ana baiao

Até ao encerramento da Festa, com o habitual comício de domingo, o conteúdo político do discurso do PCP ficará sobretudo por estes encontros entre dirigentes e militantes. Ainda assim, o debate que teve mais afluência - e o que criou o primeiro ajuntamento de várias centenas de pessoas na Quinta da Atalaia - foi claramente o que contou, ali ao lado, com a participação de Ricardo Araújo Pereira, que brincou: “Normalmente as pessoas dizem que eu sou demasiado comuna. O único sítio onde não sou é no Avante!”. As mensagens políticas do dia foram muitas... mas o humor ganhou em participação.

- Saímos de casa para trabalhar, criar mais valia, voltar a casa e aí ficamos calados, confinados, submetidos a essa exploração.

A constatação é de Ângelo Alves, que pertence ao Comité Central do PCP e participou, na manhã deste sábado, num dos debates que constavam do programa da “Festa do Avante!”. E, na verdade, basta uma pequena incursão por estes encontros para conhecer a filosofia com que o PCP encara a pandemia - de “vírus do medo”, como lhe chama - e os seus efeitos… nomeadamente no próprio partido, e na “ofensiva” de que diz estar a ser alvo.

Muitos virão à rentrée do PCP para assistir aos concertos, ver Lena d’Água em palco e ouvir as rimas de Capicua, mas a componente política está sempre presente: este sábado começou precisamente com um debate sobre o vírus do medo. Conclusões a retirar? A pandemia chegou para expor a pior face do capitalismo; o chamado “novo normal” não passa de uma forma de retirar liberdades e direitos aos trabalhadores, a que o PCP resiste; a comunicação social “manipulada” ajudou a “paralisar” a opinião pública com medo; e o partido está na mira do “sistema neoliberal”.

ana baiao

A prova de que o PCP resiste a esse restringir de direitos é precisamente a realização da Festa do “Avante!”, defendem os comunistas. E foi isso que Ângelo Alves explicou: “A forma como a festa foi tratada é um exemplo de como alguns tentam dissociar os direitos das pessoas: o direito à saúde é separado do direito à cultura, ao lazer, à participação política, à vida, para nos retirar a capacidade de defender os nossos direitos”. Uma “ofensiva anti-democrática” que pretende apresentar o tal “novo normal” como a única saída para o povo: “Este neoliberalismo está tão cheio de contradições que é preciso fazer-lhe uma lavagem de cara, um reset do sistema”.

A ideia de que houve uma estratégia - também da “comunicação social manipulada” - para ampliar o medo foi repetida intervenção após intervenção, enquanto o PCP era apresentado como o único partido que resiste a essa narrativa. Eugénio Rosa, economista e antigo deputado do PCP, fez uma longa intervenção em que tentou demonstrar isso mesmo, comparando o número de mortes por outras causas com o das vítimas da pandemia e concluindo: “O medo tem consequências dramáticas a nível social e económico. Houve uma campanha de grande manipulação da opinião pública para instalar e generalizar o medo, e efetivamente conseguiram isso”.

ana baiao

Ao lado, a deputada Alma Rivera concordava: “O que se coloca hoje é ultrapassar a paralisação que o medo provoca”. E Rui Fernandes, do Comité Central, subia o tom para “enfatizar o caráter reacionário, anti-democrático e mesmo fascizante” neste suposto alarmismo sobre a pandemia. Sempre com muitas ressalvas - “não pomos em causa a necessidade de segurança”, ouviu-se repetidamente - mas uma conclusão clara: “O pretexto é a pandemia. O alvo é o PCP”.

O "embrulho do medo"

À tarde, argumentos semelhantes. O nome dado a um outro debate não dava grandes pistas sobre o conteúdo - “Confiança e luta por uma vida melhor” - mas a assistência, que encheu as cadeiras distanciadas do Fórum para debates, ouviu um discurso semelhante ao da manhã. “Querem o sindicalista confinado”, garantiu Tiago Cunha, da CGTP. “A realização da Festa foi uma resposta importantíssima à ofensiva que nos quer silenciar”.

ana baiao

Ao lado, Fernanda Mateus, da comissão política do Comité Central, afinava pelo mesmo diapasão: “Todos nos lembramos da resignação e do fatalismo [da crise anterior]. É isso, embrulhado noutro embrulho: o do medo. Temos toda uma estratégia do grande capital, com um aumento da exploração, a abocanhar tudo o que era dos trabalhadores”. A mesma ideia: o surto é um pretexto e, sob “o manto da saúde”, “tudo é feito para convencer as pessoas de que o que é preciso é ter trabalho, mesmo sem direitos e rendimentos”. Ou, de resto, sem Festa do “Avante!”: “O tempo da pandemia não pode varrer a fruição saudável dos tempos livres”.

A aparição de Jerónimo

À hora a que Fernanda Mateus debatia com Tiago Cunha, mas também com João Oliveira, líder parlamentar do PCP, e António Filipe, deputado, passava Jerónimo de Sousa pelo espaço de debate - o que inevitavelmente acabou por roubar algum público, curioso para ver o secretário-geral, à iniciativa. Jerónimo, que falando aos jornalistas desafiou Marcelo Rebelo de Sousa a visitar a Festa e deixou recados orçamentais ao Governo, preparava-se para entrar em duas exposições - uma sobre a água e as levadas na Madeira, visitada ao lado do antigo candidato presidencial Edgar Silva, e outra sobre a pandemia e a política.

Não foi possível visitar a exposição ao mesmo tempo que Jerónimo, mas, percorrendo depois os corredores com cartazes escritos, a mensagem era a mesma: a pandemia é a “prova da natureza exploradora, opressora, agressiva e predadora” do capitalismo; o PCP defende a saúde “afirmando o direito à participação, à cultura e à vivência coletiva”; e “os direitos não estão confinados”.

ana baiao

Até ao encerramento da Festa, com o habitual comício de domingo, o conteúdo político do discurso do PCP ficará sobretudo por estes encontros entre dirigentes e militantes. Ainda assim, o debate que teve mais afluência - e o que criou o primeiro ajuntamento de várias centenas de pessoas na Quinta da Atalaia - foi claramente o que contou, ali ao lado, com a participação de Ricardo Araújo Pereira, que brincou: “Normalmente as pessoas dizem que eu sou demasiado comuna. O único sítio onde não sou é no Avante!”. As mensagens políticas do dia foram muitas... mas o humor ganhou em participação.

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