Câmara Corporativa: Por que razão Passos Coelho está a querer ganhar tempo?

03-01-2020
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Quando afirmou numa entrevista que «o Pedro é que abria as portas todas», houve um só momento em que o patrão da Tecnoforma ficou embaraçado e até pediu para o gravador ser desligado. Aconteceu quando questionado acerca das remunerações pagas a Pedro Passos Coelho: «Eh pá, isso já não me recordo. É um bocado arriscado estar-lhe a dizer e era grave.» A verdade é que, já em 2011, dois administradores da Tecnoforma haviam contado ao Expresso que Passos Coelho trabalhou para este grupo enquanto era deputado. É inverosímil que Passos Coelho «não tenha presente» se o trabalho que prestou à Tecnoforma foi pago. Então, que pretende Passos Coelho com esta estratégia de remeter o cabal esclarecimento da situação para a Assembleia da República (no início da semana) e para a Procuradoria-Geral da República (ontem)?Vamos por partes. O pedido de esclarecimento feito ao parlamento teve o propósito de evitar que, no caso de ser descoberto (como viria a acontecer) que Passos Coelho tinha requerido o subsídio de reintegração, fosse ele apanhado a mentir. Coube ao secretário-geral da Assembleia da República — ex-secretário de Estado de Balsemão e Cavaco — fazer esse vergonhoso papel a dois tempos: primeiro, ao negar que Passos Coelho tivesse optado pelo regime de exclusividade e, depois, embrulhando-se na explicação da atribuição do subsídio de reintegração (a que só teria direito se estivesse em exclusividade de funções). Ontem, na conferência de imprensa conjunta com Martin Schulz, Passos Coelho voltou a fazer uma declaração inverosímil: não tinha ainda tido oportunidade de ler o (segundo) comunicado do secretário-geral do parlamento. Eram cinco horas da tarde. Mas, logo aí, após ter sido bombardeado com perguntas dos jornalistas a que não respondeu, afirmou que iria requerer de imediato que a Procuradoria-Geral da República investigasse a situação. Entretanto, ainda não foi apresentado nenhum pedido por parte de Passos Coelho. Acontece que, do ponto de vista criminal, os factos estão prescritos. Ele sabe que nós sabemos que ele sabe que a Procuradoria-Geral da República não pode investigar factos prescritos. Assim, o pedido terá o único propósito de ganhar tempo. De acordo com o que veio a público, as declarações de IRS de Passos Coelho não contêm os rendimentos que ele poderá ter auferido na Tecnoforma. Tendo já caducado o direito à liquidação do imposto em falta, também a Autoridade Tributária não poderá investigar seja o que for. Por outro lado, as sociedades comerciais são obrigadas a guardar a sua contabilidade durante dez anos. Os factos em causa ocorreram há mais de dez anos. Face ao exposto, as declarações falsas prestadas por Passos Coelho e a fuga aos impostos, a terem ocorrido, só podem ser esclarecidas por uma destas vias: • Ou o alegado primeiro-ministro exige que a Tecnoforma e o banco onde tinha conta permitam o acesso às respectivas contabilidades para que a sua reputação não seja manchada;• Ou provas documentais da denúncia anónima que se diz ter sido enviada para a Procuradoria-Geral da República chegam aos jornais.Aqui chegados, poderemos conjecturar que as manobras dilatórias de Passos Coelho visam ganhar tempo para fechar os eventuais alçapões que o possam comprometer. Ora, não podendo ter nunca a certeza de que não andem por aí provas documentais à solta, o último ano do mandato do alegado primeiro-ministro será percorrido sob a ameaça ou a chantagem da bomba atómica. PS — Questionado há dias pelo Público acerca dos pagamentos a Passos Coelho pelos serviços prestados à Tecnoforma, o presidente da empresa respondeu o seguinte: «Estou convencido de que ele [Passos Coelho] recebia qualquer coisa, mas não posso falar em valores porque não posso provar nada». Esta declaração não deixa grande margem para dúvidas de que a «abertura de todas portas» foi um serviço pago, mas faz admitir a possibilidade de poder ter acontecido em «cash» e em espécie.


Quando afirmou numa entrevista que «o Pedro é que abria as portas todas», houve um só momento em que o patrão da Tecnoforma ficou embaraçado e até pediu para o gravador ser desligado. Aconteceu quando questionado acerca das remunerações pagas a Pedro Passos Coelho: «Eh pá, isso já não me recordo. É um bocado arriscado estar-lhe a dizer e era grave.» A verdade é que, já em 2011, dois administradores da Tecnoforma haviam contado ao Expresso que Passos Coelho trabalhou para este grupo enquanto era deputado. É inverosímil que Passos Coelho «não tenha presente» se o trabalho que prestou à Tecnoforma foi pago. Então, que pretende Passos Coelho com esta estratégia de remeter o cabal esclarecimento da situação para a Assembleia da República (no início da semana) e para a Procuradoria-Geral da República (ontem)?Vamos por partes. O pedido de esclarecimento feito ao parlamento teve o propósito de evitar que, no caso de ser descoberto (como viria a acontecer) que Passos Coelho tinha requerido o subsídio de reintegração, fosse ele apanhado a mentir. Coube ao secretário-geral da Assembleia da República — ex-secretário de Estado de Balsemão e Cavaco — fazer esse vergonhoso papel a dois tempos: primeiro, ao negar que Passos Coelho tivesse optado pelo regime de exclusividade e, depois, embrulhando-se na explicação da atribuição do subsídio de reintegração (a que só teria direito se estivesse em exclusividade de funções). Ontem, na conferência de imprensa conjunta com Martin Schulz, Passos Coelho voltou a fazer uma declaração inverosímil: não tinha ainda tido oportunidade de ler o (segundo) comunicado do secretário-geral do parlamento. Eram cinco horas da tarde. Mas, logo aí, após ter sido bombardeado com perguntas dos jornalistas a que não respondeu, afirmou que iria requerer de imediato que a Procuradoria-Geral da República investigasse a situação. Entretanto, ainda não foi apresentado nenhum pedido por parte de Passos Coelho. Acontece que, do ponto de vista criminal, os factos estão prescritos. Ele sabe que nós sabemos que ele sabe que a Procuradoria-Geral da República não pode investigar factos prescritos. Assim, o pedido terá o único propósito de ganhar tempo. De acordo com o que veio a público, as declarações de IRS de Passos Coelho não contêm os rendimentos que ele poderá ter auferido na Tecnoforma. Tendo já caducado o direito à liquidação do imposto em falta, também a Autoridade Tributária não poderá investigar seja o que for. Por outro lado, as sociedades comerciais são obrigadas a guardar a sua contabilidade durante dez anos. Os factos em causa ocorreram há mais de dez anos. Face ao exposto, as declarações falsas prestadas por Passos Coelho e a fuga aos impostos, a terem ocorrido, só podem ser esclarecidas por uma destas vias: • Ou o alegado primeiro-ministro exige que a Tecnoforma e o banco onde tinha conta permitam o acesso às respectivas contabilidades para que a sua reputação não seja manchada;• Ou provas documentais da denúncia anónima que se diz ter sido enviada para a Procuradoria-Geral da República chegam aos jornais.Aqui chegados, poderemos conjecturar que as manobras dilatórias de Passos Coelho visam ganhar tempo para fechar os eventuais alçapões que o possam comprometer. Ora, não podendo ter nunca a certeza de que não andem por aí provas documentais à solta, o último ano do mandato do alegado primeiro-ministro será percorrido sob a ameaça ou a chantagem da bomba atómica. PS — Questionado há dias pelo Público acerca dos pagamentos a Passos Coelho pelos serviços prestados à Tecnoforma, o presidente da empresa respondeu o seguinte: «Estou convencido de que ele [Passos Coelho] recebia qualquer coisa, mas não posso falar em valores porque não posso provar nada». Esta declaração não deixa grande margem para dúvidas de que a «abertura de todas portas» foi um serviço pago, mas faz admitir a possibilidade de poder ter acontecido em «cash» e em espécie.

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