Câmara Corporativa: Programa do Governo na área da solidariedade social: tomem lá um ‘kit de sobrevivência’

13-03-2020
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• Pedro Adão e Silva, UM GIGANTESCO BANCO ALIMENTAR [hoje no Expresso]:
‘(…) Ao longo do programa [do Governo] é sugerido que as políticas públicas de solidariedade social se transformem num gigantesco banco alimentar. Há nisto um enorme equívoco. Uma coisa são iniciativas muito meritórias da sociedade civil, mas naturalmente parcelares, outra é as políticas públicas assentarem numa lógica discricionária que emula princípios desadequados às respostas do Estado. No fundo, trata-se da diferença entre assistencialismo privado e direitos sociais públicos. (…) Apesar de a ideia de pagar prestações sociais em vales ter desaparecido, a substituição de pagamentos em espécie por géneros mantém-se presente. Numa frase que faz recuar as políticas públicas portuguesas quatro décadas, é estabelecida uma hierarquia dos bens a distribuir aos pobres, uma espécie de ‘kit de sobrevivência’: “são prioritários, em termos de entrega às famílias, os seguintes itens: alimentação, vestuário e medicamento”. (…) Nas sociedades democráticas, o dinheiro é também um mecanismo de integração social e não ter um mínimo de recursos materiais uma forma brutal de privação de liberdade. Negar o acesso ao dinheiro a um conjunto de cidadãos apenas aprofunda os mecanismos de segregação associados à pobreza. Igualmente chocante é o exercício de novilíngua que dá pelo nome de ‘tributo solidário’. A ideia parece sugestiva, mas é perversa: os beneficiários de prestações sociais devem ser chamados a cumprir trabalho a favor da comunidade. Este princípio, para além de nos reenviar para uma visão punitiva do trabalho, (...) encontra eco, pelo menos, nas ‘workhouses’ dickensianas (…). Depois, num contexto de depressão profunda do mercado de trabalho, a transformação dos beneficiários de prestações sociais num novo ‘exército industrial de reserva’ só servirá para colocar pressão adicional sobre os trabalhadores pouco qualificados e de baixos salários – os que estão na iminência de cair na armadilha de pobreza. (…)’

• Pedro Adão e Silva, UM GIGANTESCO BANCO ALIMENTAR [hoje no Expresso]:
‘(…) Ao longo do programa [do Governo] é sugerido que as políticas públicas de solidariedade social se transformem num gigantesco banco alimentar. Há nisto um enorme equívoco. Uma coisa são iniciativas muito meritórias da sociedade civil, mas naturalmente parcelares, outra é as políticas públicas assentarem numa lógica discricionária que emula princípios desadequados às respostas do Estado. No fundo, trata-se da diferença entre assistencialismo privado e direitos sociais públicos. (…) Apesar de a ideia de pagar prestações sociais em vales ter desaparecido, a substituição de pagamentos em espécie por géneros mantém-se presente. Numa frase que faz recuar as políticas públicas portuguesas quatro décadas, é estabelecida uma hierarquia dos bens a distribuir aos pobres, uma espécie de ‘kit de sobrevivência’: “são prioritários, em termos de entrega às famílias, os seguintes itens: alimentação, vestuário e medicamento”. (…) Nas sociedades democráticas, o dinheiro é também um mecanismo de integração social e não ter um mínimo de recursos materiais uma forma brutal de privação de liberdade. Negar o acesso ao dinheiro a um conjunto de cidadãos apenas aprofunda os mecanismos de segregação associados à pobreza. Igualmente chocante é o exercício de novilíngua que dá pelo nome de ‘tributo solidário’. A ideia parece sugestiva, mas é perversa: os beneficiários de prestações sociais devem ser chamados a cumprir trabalho a favor da comunidade. Este princípio, para além de nos reenviar para uma visão punitiva do trabalho, (...) encontra eco, pelo menos, nas ‘workhouses’ dickensianas (…). Depois, num contexto de depressão profunda do mercado de trabalho, a transformação dos beneficiários de prestações sociais num novo ‘exército industrial de reserva’ só servirá para colocar pressão adicional sobre os trabalhadores pouco qualificados e de baixos salários – os que estão na iminência de cair na armadilha de pobreza. (…)’

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