Tancos: encenações e conspiração num caso que entrou na campanha, obrigou partidos a reagir e azedou as relações entre São Bento e Belém

05-05-2020
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À hora marcada, com a comitiva de jornalistas na sala e as televisões a transmitirem em direto, Rui Rio implicava diretamente António Costa no caso de Tancos: “É pouco crível que um ministro não articule aspetos desta gravidade com o primeiro-ministro”. Ou seja, ou Costa sabia e foi conivente, ou não sabia e não tem mão nos seus ministros. Ambas as hipóteses mostram uma “postura política” que não é desejável para a governação. E ambas as hipóteses mostravam, de acordo com o PSD, que Costa devia explicações.

Com o que a campanha social-democrata podia não estar a contar era que António Costa reagisse de imediato. Em Lisboa, depois da surpresa inicial veio a tomada de decisão com o núcleo duro da campanha e Costa alinhou ideias. Ia pelo lado da moralização e pelo ataque de carácter — foi pelo menos assim que leu as palavras do adversário. Ajeitou os colarinhos, puxou pelas bandas do casaco e, antes de se dirigir ao pátio onde falaria aos jornalistas, ainda bebeu um gole de água. A resposta a Rio foi duríssima.

“Até admito que não tenha ouvido bem o que eu disse…”, sugeriu Rui Rio nessa noite, insistindo que o primeiro-ministro só respondeu da forma como respondeu — acusando Rio de estar a inverter a presunção de inocência e a manchar a dignidade da campanha —, porque não quis responder à verdadeira questão “política” que lhe foi colocada.

“A única questão política é Rui Rio ter perdido o debate sobre o resultado destes quatro anos de governação e não ter nada para dizer sobre o futuro do país”, defende fonte próxima de António Costa. No núcleo duro que o acompanha na estrada, o argumento é o de que a questão política foi analisada na Comissão de Inquérito e que Costa respondeu, sendo dispensado de mais explicações. E que na acusação “não há a menor suspeita que o relacione” e “não foi sequer suscitada direta ou indiretamente do ponto de vista judicial”.

Se o assunto perdurar, a linha de argumentação em relação aos ataques que não têm parado de chegar do lado de lá, será esta. A verdade é que, segundo apurou o Observador, o PSD não faz tenção de largar o tema. “Não vamos largar, mas também não vamos escalar, escalar, escalar”, ouve o Observador. Ou seja, deste nível Rui Rio não vai sair: está no plano político, não no plano judicial. Ali acredita-se que a acusação formal do Ministério Público dá força à tese de que o então ministro sabia da encenação do “achamento” das armas, por isso o PSD tem o “direito e o dever”, enquanto “líder da oposição”, de questionar politicamente António Costa sobre se foi ou não informado pelo seu ministro desse facto. “Agora há factos”, diz a mesma fonte.

Contra a polarização, improvisar, desmarcar

A polémica passou a estar centrada em apenas dois homens, Costa e Rio. Na noite da conferência de imprensa de Rio e consequente reação de Costa, Assunção Cristas só tinha na agenda uma sessão sobre o programa em Leiria, mas o CDS percebeu que não podia deixar bipolarizar o debate entre PS e PSD.

De imediato se improvisou uma pergunta da assistência sobre Tancos — que nada tinha a ver com o tema da sessão — para a líder voltar a lembrar que o CDS foi o pioneiro nesta luta e para deixar um soundbite que rivalizasse no plano mediático com luta Costa-Rio. “É uma série da Netflix“, disse.

Mas não chegava. Segundo contou ao Observador um dos membros da equipa, Cristas começou a convocar “por WhatsApp uma reunião da Comissão Executiva” para envolver a cúpula do partido no assunto. Ao mesmo tempo aconselhava-se com o líder parlamentar, Nuno Magalhães, e com os dois deputados presentes na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI): Telmo Correia e António Carlos Monteiro.

Depois da dramatização feita por Rio no dia anterior, com a conferência de imprensa, Cristas seguia-lhe os passos e fazia um anúncio igualmente impactante: para mostrar a importância da decisão, o CDS fez questão de desmarcar a ida à feira de Queluz, em Monte Abraão, e comunicar publicamente que iria haver reunião da direção do partido no Largo do Caldas.

O cancelamento de ações de campanha para dedicar parte do dia a Tancos, como fizeram primeiro o PSD e depois o CDS, nunca esteve em cima da mesa do Bloco de Esquerda. “São ações sobretudo simbólicas, mas nunca considerámos fazê-lo. Mantivemos a nossa agenda e não incluímos isso nos discursos dos comícios porque tínhamos outras oportunidades para falar em público, nomeadamente declarações aos jornalistas”, explicou ao Observador Jorge Costa.

Temos uma campanha estruturada e vamos mantê-la. Nesse sentido, o caso [Tancos] não afetou nada a campanha do Bloco”, diz ainda o dirigente bloquista. Já na CDU, a opção inicial de deixar o assunto de fora tornou-se difícil de manter e Jerónimo-candidato acabou por dizer que era preciso “perceber se o ex-ministro tinha mentido na comissão de inquérito”. A mensagem mantém-se a mesma e a CDU não vai mudar a agenda, mas também não quer que se polarize o tema.

Chegou a hora do taco-a-taco?

É precisamente esse um dos dois ganhos que o PSD acredita ter conseguido com o caso Tancos: bipolarizar a campanha, por um lado, e remeter os supostos parceiros do PS — o BE e PCP — para a “irrelevância”; e pôr o CDS a reboque do PSD, por outro. “A bipolarização é muito positiva, só interessamos nós, os outros ficam irrelevantes”, comenta-se na estrutura de campanha social-democrata. Mais: se o primeiro momento da campanha estava reservado para explicar detalhadamente as propostas do PSD ao eleitorado, depois deste ponto de viragem há quem defenda que é tempo de “elevar a fasquia”. “Rui Rio há mais de um ano que anda a dizer que quando chegarem as eleições vai estar a disputá-las taco a taco com o PS”, comenta uma fonte que acredita que esse momento chegou agora.

À hora marcada, com a comitiva de jornalistas na sala e as televisões a transmitirem em direto, Rui Rio implicava diretamente António Costa no caso de Tancos: “É pouco crível que um ministro não articule aspetos desta gravidade com o primeiro-ministro”. Ou seja, ou Costa sabia e foi conivente, ou não sabia e não tem mão nos seus ministros. Ambas as hipóteses mostram uma “postura política” que não é desejável para a governação. E ambas as hipóteses mostravam, de acordo com o PSD, que Costa devia explicações.

Com o que a campanha social-democrata podia não estar a contar era que António Costa reagisse de imediato. Em Lisboa, depois da surpresa inicial veio a tomada de decisão com o núcleo duro da campanha e Costa alinhou ideias. Ia pelo lado da moralização e pelo ataque de carácter — foi pelo menos assim que leu as palavras do adversário. Ajeitou os colarinhos, puxou pelas bandas do casaco e, antes de se dirigir ao pátio onde falaria aos jornalistas, ainda bebeu um gole de água. A resposta a Rio foi duríssima.

“Até admito que não tenha ouvido bem o que eu disse…”, sugeriu Rui Rio nessa noite, insistindo que o primeiro-ministro só respondeu da forma como respondeu — acusando Rio de estar a inverter a presunção de inocência e a manchar a dignidade da campanha —, porque não quis responder à verdadeira questão “política” que lhe foi colocada.

“A única questão política é Rui Rio ter perdido o debate sobre o resultado destes quatro anos de governação e não ter nada para dizer sobre o futuro do país”, defende fonte próxima de António Costa. No núcleo duro que o acompanha na estrada, o argumento é o de que a questão política foi analisada na Comissão de Inquérito e que Costa respondeu, sendo dispensado de mais explicações. E que na acusação “não há a menor suspeita que o relacione” e “não foi sequer suscitada direta ou indiretamente do ponto de vista judicial”.

Se o assunto perdurar, a linha de argumentação em relação aos ataques que não têm parado de chegar do lado de lá, será esta. A verdade é que, segundo apurou o Observador, o PSD não faz tenção de largar o tema. “Não vamos largar, mas também não vamos escalar, escalar, escalar”, ouve o Observador. Ou seja, deste nível Rui Rio não vai sair: está no plano político, não no plano judicial. Ali acredita-se que a acusação formal do Ministério Público dá força à tese de que o então ministro sabia da encenação do “achamento” das armas, por isso o PSD tem o “direito e o dever”, enquanto “líder da oposição”, de questionar politicamente António Costa sobre se foi ou não informado pelo seu ministro desse facto. “Agora há factos”, diz a mesma fonte.

Contra a polarização, improvisar, desmarcar

A polémica passou a estar centrada em apenas dois homens, Costa e Rio. Na noite da conferência de imprensa de Rio e consequente reação de Costa, Assunção Cristas só tinha na agenda uma sessão sobre o programa em Leiria, mas o CDS percebeu que não podia deixar bipolarizar o debate entre PS e PSD.

De imediato se improvisou uma pergunta da assistência sobre Tancos — que nada tinha a ver com o tema da sessão — para a líder voltar a lembrar que o CDS foi o pioneiro nesta luta e para deixar um soundbite que rivalizasse no plano mediático com luta Costa-Rio. “É uma série da Netflix“, disse.

Mas não chegava. Segundo contou ao Observador um dos membros da equipa, Cristas começou a convocar “por WhatsApp uma reunião da Comissão Executiva” para envolver a cúpula do partido no assunto. Ao mesmo tempo aconselhava-se com o líder parlamentar, Nuno Magalhães, e com os dois deputados presentes na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI): Telmo Correia e António Carlos Monteiro.

Depois da dramatização feita por Rio no dia anterior, com a conferência de imprensa, Cristas seguia-lhe os passos e fazia um anúncio igualmente impactante: para mostrar a importância da decisão, o CDS fez questão de desmarcar a ida à feira de Queluz, em Monte Abraão, e comunicar publicamente que iria haver reunião da direção do partido no Largo do Caldas.

O cancelamento de ações de campanha para dedicar parte do dia a Tancos, como fizeram primeiro o PSD e depois o CDS, nunca esteve em cima da mesa do Bloco de Esquerda. “São ações sobretudo simbólicas, mas nunca considerámos fazê-lo. Mantivemos a nossa agenda e não incluímos isso nos discursos dos comícios porque tínhamos outras oportunidades para falar em público, nomeadamente declarações aos jornalistas”, explicou ao Observador Jorge Costa.

Temos uma campanha estruturada e vamos mantê-la. Nesse sentido, o caso [Tancos] não afetou nada a campanha do Bloco”, diz ainda o dirigente bloquista. Já na CDU, a opção inicial de deixar o assunto de fora tornou-se difícil de manter e Jerónimo-candidato acabou por dizer que era preciso “perceber se o ex-ministro tinha mentido na comissão de inquérito”. A mensagem mantém-se a mesma e a CDU não vai mudar a agenda, mas também não quer que se polarize o tema.

Chegou a hora do taco-a-taco?

É precisamente esse um dos dois ganhos que o PSD acredita ter conseguido com o caso Tancos: bipolarizar a campanha, por um lado, e remeter os supostos parceiros do PS — o BE e PCP — para a “irrelevância”; e pôr o CDS a reboque do PSD, por outro. “A bipolarização é muito positiva, só interessamos nós, os outros ficam irrelevantes”, comenta-se na estrutura de campanha social-democrata. Mais: se o primeiro momento da campanha estava reservado para explicar detalhadamente as propostas do PSD ao eleitorado, depois deste ponto de viragem há quem defenda que é tempo de “elevar a fasquia”. “Rui Rio há mais de um ano que anda a dizer que quando chegarem as eleições vai estar a disputá-las taco a taco com o PS”, comenta uma fonte que acredita que esse momento chegou agora.

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