Costa não reabriu concurso do SIRESP mesmo com proposta mais barata da Optimus

15-11-2019
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O problema que se colocava aos responsáveis políticos para aceitarem a proposta de Optimus, ou de outras operadoras, passava por equacionar o lançamento de um novo concurso. Mas isso também exigia a elaboração de um novo caderno de encargos que alargasse o tipo de tecnologias admitido no SIRESP e o tipo de rede usada: se fechada ou se pública. O caderno de encargos em vigor limitava a escolhas a uma rede fechada, como é hoje o SIRESP, e à tecnologia TETRA (trunking digital). A obrigatoriedade do uso desta tecnologia foi decidida em 1998 durante o primeiro Governo de António Guterres, classificada numa resolução do Conselho de Ministros como o sistema “mais avançado” nas comunicações de grupos fechados na área da segurança e emergência. Acontece que oito anos depois, em 2006, as operadoras de telemóveis estavam muito mais avançadas, já usavam tecnologia GSM/UMTS e estavam a evoluir para os telemóveis de terceira geração, enquanto os sistemas TETRA se mantinham em grande medida na órbita das forças de segurança.

António Costa reconheceu, de facto, a possibilidade de admitir as operadoras de telecomunicações a concurso num despacho publicado a 26 de julho de 2005, um ano antes de avançar com uma nova adjudicação ao consórcio Motorola/SLN/PT/Esegur: “A adopção de outras soluções técnicas — como o recurso a redes públicas, ou tecnológicas, como as soluções GSM, UMTS/CDMA 450 — não corresponde integralmente aos requisitos constantes do caderno de encargos deste procedimento. Assim sendo, não se pode considerar tais soluções como diretamente oponíveis e alternativas à solução proposta adjudicar”.

O concurso tinha sido lançado pelo Governo anterior do PSD/CDS e a adjudicação foi feita já pelo Governo em gestão de Pedro Santana Lopes. O ministro da Administração Interna era Daniel Sanches, que provinha da administração da Plêiade, uma empresa da Sociedade Lusa de Negócios (SLN) — que detinha o BPN. Quando chegou ao MAI, em 2005, António Costa pediu um parecer ao Conselho Superior do Ministério Público que se pronunciou pela “nulidade” do concurso por a adjudicação ter sido realizada com o anterior executivo em gestão. Com este parecer na mão, o Governo tinha, assim, caminho aberto para voltar a colocar o SIRESP a concurso. António Costa ponderou essa possibilidade, mas não o fez.

O MAI assumia, no mesmo despacho, que “a comparabilidade de soluções implicaria a abertura de novo procedimento, com um novo caderno de encargos que expressamente admitisse diversas soluções técnicas e tecnológicas, de modo a proceder-se a uma análise custo/benefício aberta a todas estas soluções”. Ou seja, havia a possibilidade de se lançar um novo caderno de encargos que não estivesse limitado à tecnologia TETRA usada pela Motorola, mas que considerasse também as novas tecnologias e redes públicas, ou seja, das operadoras de telemóveis.

“Caso venha a anular-se o presente procedimento, deve ser essa a solução a adoptar”, recomendou António Costa no mesmo documento. No entanto, apesar disso, o MAI não anulou a adjudicação do SIRESP à Motorola — preferiu renegociar o contrato — e não abriu um concurso em que as operadoras móveis pudessem participar. O Observador enviou questões sobre este assunto ao gabinete do primeiro-ministro na passada sexta-feira, mas não obteve respostas durante uma semana.

Ao longo de 2005 e de 2006, houve várias reuniões a nível técnico e político no MAI com as equipas da Optimus, que também envolveram Fernando Rocha Andrade, então secretário de Estado da Administração Interna — hoje secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Em resposta ao Observador, Rocha Andrade reconhece que “existiram contactos com representantes da Optimus, por solicitação destes, após a notícia de que o Governo estava a renegociar a proposta com o consórcio concorrente”, mas acrescenta que “esses contactos nunca se traduziram numa proposta formal da Optimus”. Na verdade, a Optimus nunca apresentou uma proposta formal porque não foi aberto um novo concurso, mas entregou uma proposta informal: um documento com a designação de “Análise Prévia do Caderno de Encargos” do SIRESP, a que o Observador teve acesso.

A proposta otimista da Optimus: todos os critérios menos um

O documento da Optimus, datado de Maio de 2005, dizia que a operadora era capaz de cumprir em pleno os requisitos relativos ao “dimensionamento e arquitetura de rede” e todos os outros relativos a “comunicações de voz, serviços suplementares, comunicações de dados e cobertura”.

O única funcionalidade exigida que a Optimus assumia não conseguir cumprir no imediato era relativo “à capacidade de comunicação direta ponto-a-ponto”, que na gíria técnica do caderno de encargos está identificado pelo acrónimo DMO (Direct Mode). Trata-se do funcionamento dos terminais de rádio como se fossem walkie-talkies e da comunicação entre dois aparelhos com um rádio no meio a fazer de antena para retransmitir o sinal entre os outros dois. A empresa da Sonae escreveu no documento a que o Observador teve acesso que, embora não tivesse essa tecnologia disponível, detinha “informações de que a D2 [uma operadora alemã] estava a testar terminais dual-mode” que permitiam o DMO. Um ano depois, em 2006, quando António Costa adjudicou o contrato em definitivo à Motorola, essa tecnologia já seria uma possibilidade nas empresas de telemóveis.

O problema que se colocava aos responsáveis políticos para aceitarem a proposta de Optimus, ou de outras operadoras, passava por equacionar o lançamento de um novo concurso. Mas isso também exigia a elaboração de um novo caderno de encargos que alargasse o tipo de tecnologias admitido no SIRESP e o tipo de rede usada: se fechada ou se pública. O caderno de encargos em vigor limitava a escolhas a uma rede fechada, como é hoje o SIRESP, e à tecnologia TETRA (trunking digital). A obrigatoriedade do uso desta tecnologia foi decidida em 1998 durante o primeiro Governo de António Guterres, classificada numa resolução do Conselho de Ministros como o sistema “mais avançado” nas comunicações de grupos fechados na área da segurança e emergência. Acontece que oito anos depois, em 2006, as operadoras de telemóveis estavam muito mais avançadas, já usavam tecnologia GSM/UMTS e estavam a evoluir para os telemóveis de terceira geração, enquanto os sistemas TETRA se mantinham em grande medida na órbita das forças de segurança.

António Costa reconheceu, de facto, a possibilidade de admitir as operadoras de telecomunicações a concurso num despacho publicado a 26 de julho de 2005, um ano antes de avançar com uma nova adjudicação ao consórcio Motorola/SLN/PT/Esegur: “A adopção de outras soluções técnicas — como o recurso a redes públicas, ou tecnológicas, como as soluções GSM, UMTS/CDMA 450 — não corresponde integralmente aos requisitos constantes do caderno de encargos deste procedimento. Assim sendo, não se pode considerar tais soluções como diretamente oponíveis e alternativas à solução proposta adjudicar”.

O concurso tinha sido lançado pelo Governo anterior do PSD/CDS e a adjudicação foi feita já pelo Governo em gestão de Pedro Santana Lopes. O ministro da Administração Interna era Daniel Sanches, que provinha da administração da Plêiade, uma empresa da Sociedade Lusa de Negócios (SLN) — que detinha o BPN. Quando chegou ao MAI, em 2005, António Costa pediu um parecer ao Conselho Superior do Ministério Público que se pronunciou pela “nulidade” do concurso por a adjudicação ter sido realizada com o anterior executivo em gestão. Com este parecer na mão, o Governo tinha, assim, caminho aberto para voltar a colocar o SIRESP a concurso. António Costa ponderou essa possibilidade, mas não o fez.

O MAI assumia, no mesmo despacho, que “a comparabilidade de soluções implicaria a abertura de novo procedimento, com um novo caderno de encargos que expressamente admitisse diversas soluções técnicas e tecnológicas, de modo a proceder-se a uma análise custo/benefício aberta a todas estas soluções”. Ou seja, havia a possibilidade de se lançar um novo caderno de encargos que não estivesse limitado à tecnologia TETRA usada pela Motorola, mas que considerasse também as novas tecnologias e redes públicas, ou seja, das operadoras de telemóveis.

“Caso venha a anular-se o presente procedimento, deve ser essa a solução a adoptar”, recomendou António Costa no mesmo documento. No entanto, apesar disso, o MAI não anulou a adjudicação do SIRESP à Motorola — preferiu renegociar o contrato — e não abriu um concurso em que as operadoras móveis pudessem participar. O Observador enviou questões sobre este assunto ao gabinete do primeiro-ministro na passada sexta-feira, mas não obteve respostas durante uma semana.

Ao longo de 2005 e de 2006, houve várias reuniões a nível técnico e político no MAI com as equipas da Optimus, que também envolveram Fernando Rocha Andrade, então secretário de Estado da Administração Interna — hoje secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Em resposta ao Observador, Rocha Andrade reconhece que “existiram contactos com representantes da Optimus, por solicitação destes, após a notícia de que o Governo estava a renegociar a proposta com o consórcio concorrente”, mas acrescenta que “esses contactos nunca se traduziram numa proposta formal da Optimus”. Na verdade, a Optimus nunca apresentou uma proposta formal porque não foi aberto um novo concurso, mas entregou uma proposta informal: um documento com a designação de “Análise Prévia do Caderno de Encargos” do SIRESP, a que o Observador teve acesso.

A proposta otimista da Optimus: todos os critérios menos um

O documento da Optimus, datado de Maio de 2005, dizia que a operadora era capaz de cumprir em pleno os requisitos relativos ao “dimensionamento e arquitetura de rede” e todos os outros relativos a “comunicações de voz, serviços suplementares, comunicações de dados e cobertura”.

O única funcionalidade exigida que a Optimus assumia não conseguir cumprir no imediato era relativo “à capacidade de comunicação direta ponto-a-ponto”, que na gíria técnica do caderno de encargos está identificado pelo acrónimo DMO (Direct Mode). Trata-se do funcionamento dos terminais de rádio como se fossem walkie-talkies e da comunicação entre dois aparelhos com um rádio no meio a fazer de antena para retransmitir o sinal entre os outros dois. A empresa da Sonae escreveu no documento a que o Observador teve acesso que, embora não tivesse essa tecnologia disponível, detinha “informações de que a D2 [uma operadora alemã] estava a testar terminais dual-mode” que permitiam o DMO. Um ano depois, em 2006, quando António Costa adjudicou o contrato em definitivo à Motorola, essa tecnologia já seria uma possibilidade nas empresas de telemóveis.

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