Memórias das Pedras Talhas

24-06-2020
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Os "degolados de Mértola"

A propósito das novas e fantásticas descobertas no "ùltimo porto do Mediterrâneo"

A recente descoberta de um conjunto de estatuária monumental
em Mértola, teve o devido e justificadíssimo destaque mediático e, ao contrário
do que tantas vezes se apregoa, constitui de facto uma descoberta da máxima
importância científica e cultural. Para além das ilações histórico-arqueológicas
que se poderão retirar desta descoberta rara, nomeadamente sobre o estatuto e
importância económica e política do “Mértola, o último porto do Mediterrâneo”*,
como o apelidou Santiago Macias na sua tese de doutoramento, esta descoberta
também vem trazer novos dados de cariz historiográfico-arqueológico sobre o “percurso”
de outras três estátuas monumentais há muito referenciadas na Arqueologia
portuguesa. Falamos dos célebres “togados” de Mértola, representações
cerimoniais de importantes figuras públicas (“Vips” na linguagem contemporânea),
exibindo a tradicional “toga” imperial (no caso à moda do Século I) e cujo
achado em Mértola só é compreensível no contexto de um grande edifício público
entretanto desaparecido. Uma dessas estátuas, felizmente encontra-se ainda em
Mértola, e é peça central do chamado núcleo romano do Museu de Mértola,
inaugurado em 1989 e localizado na cripta dos próprios Paços do Concelho, onde
se conservam as ruínas de uma “casa romana” descobertas durante as escavações
que se seguiram à reconstrução do edifício na sequencia de um grande incêndio.
(Estou de algum modo ligado a estas escavações dos anos oitenta mas deixo as
reminiscências para outra ocasião…). 

_____
* De acordo com informação que me chegou já depois de muito divulgado o presente post, a frase "Mértola, o último porto do Mediterrâneo", dever-se-á ao arqueólogo José Luis de Matos, o meu primeiro professor de Arqueologia e Pré-história na Faculdade de Letras de Lisboa, no distante ano de 1970...

O "togado" do Núcleo Romano do Museu de Mértola (foto CMM)

As duas outras estátuas estão quase há um
século, no Museu Nacional de Arqueologia, aos Jerónimos, onde são peças
fundamentais da coleção de estatuária romana. As condições da descoberta destas
três estátuas, época, localização e contexto, permanecem ainda nebulosas,
embora as recentes descobertas possam vir trazer alguma luz sobre o tema. É aceite pela
historiografia, com base nas referencias de Frei Amador Arrais e André de
Resende, mais tarde retomadas por Estácio da Veiga (a quem se deve a primeira
grande monografia sobre as antiguidades de Mértola, ainda editada no Século XIX) que o
par de estátuas do Museu Nacional de Arqueologia terá sido descoberto durante
as obras de alargamento da Igreja da Misericórdia, realizadas nos finais do
Século XVI. Dali, e não se sabe porque artes mágicas, as duas estátuas seriam
levadas para a casa senhorial da Quinta da Amoreira da Torre, nos arredores de
Montemor-o-Novo, onde ainda se encontravam nos anos 20 do século XX (pelo menos
a crer na descrição, a pg. 34 do volume Guia de Portugal, de Raúl Proença, -Estremadura,
Alentejo, Algarve) “Em dois nichos de
casa de entrada, duas notáveis estátuas, que parecem ter vindo de Mértola no
século XVII (…)” A casa pertencia no século XVII a D. Martinho de
Mascarenhas, marquês de Gouveia, que, entre muitas outras prebendas e títulos,
era alcaide-mor de Mértola, o que explicaria na opinião de Túlio Espanca quando
faz o inventário da Quinta da Torre da Amoreira, a presença das estátuas, entre
outras pedras e inscrições. O que se confirma pela referencia do Mestre Espanca
é que à data em que faz o seu registo (anos quarenta ou cinquenta) as estátuas
já tinham sido transferidas para Lisboa, muito provavelmente por ação do
próprio Leite de Vasconcelos, director do então Museu Etnológico (hoje Museu
Nacional de Arqueologia). 

"Togado" do Museu Nacional de Arqueologia (foto arquivo MNA)

O “Guia de Portugal” que citámos, regista ainda uma
história saborosa sobre estas estátuas às quais, “O povo, sob a sugestão da tragédia dos Távoras, deu o nome de marquês
e marquesa degolados”. Estamos de facto perante estátuas acéfalas, preparadas
à boa maneira do sentido prático romano, para “mudarem de cabeça”, se
necessário… E, explicando a tradição popular, um dos descendentes de
D.Martinho, o 8º Duque de Aveiro, D.José de Mascarenhas,  titular da casa da
Amoreira, na sequencia do atentado contra D.José I, sofreria a pena capital no
patíbulo de Belém (próximo da hoje célebre Casa dos Pastéis e a poucas centenas
de metros do actual paradeiro dos dois “degolados” de Mértola…). Apesar de
certamente haver alguma relação entre estas estátuas e a que hoje se conserva
na cripta da Câmara Municipal de Mértola, o contexto do achado é aparentemente
divergente. A primeira referencia que conheço à mesma, é uma pequena nota de
Abel Viana, publicada em 1950 na “sua” revista “Arquivo de Beja”. Segundo este
arqueólogo minhoto, alentejano por opção (ver aqui sobre A Viana), a estátua então guardada na
residência do médico Manuel Francisco Gomes, teria aparecido na encosta
oriental do Castelo… De referir que só o facto desta peça ser propriedade de alguém com poder e prestígio, como era certamente o caso deste médico hoje representado na toponímia mertolense, terá evitado que a estátua tenha levado descaminho para outras paragens... Pelo menos Leite de Vasconcelos deve ter tentado levá-la para Lisboa, felizmente neste caso sem sucesso.

Nota de Abel Viana publicada no "Arquivo de Beja, nº7, 1950, sobre o togado de Mértola, que se conservou na vila alentejana.

Temos assim, actualmente, três hipóteses de localizações
alternativas para este achado ocorrido em data incerta. Na encosta Oriental do
Castelo de Mértola, na Misericórdia em conjunto com o par do MNA, e por fim, nas obras de construção da casa onde já se encontrava pelo menos nos anos 40 do século passado. Este edifício é hoje conhecido como “Casa
Côr de Rosa” e localiza-se na Rua 5 de de Outubro, tendo sido entretanto adquirido pela
Câmara Municipal de Mértola. Dois dados parecem fazer pender a balança para que
esta última hipótese seja a mais correcta. Desde logo os recentíssimos achados de
estatuária aqui verificados nas profundas escavações levadas a cabo pelo Campo
Arqueológico de Mértola, no âmbito de um projecto de requalificação do
edifício. Por outro, a relativa proximidade da zona do Largo da Misericórdia, o
que cruzando os dados das presentes escavações com a informação já disponível,
permite pensar na existência de um grande edifício público nesta zona da vila
velha de Mértola.

Acto de assinatura do contrato de doação pela família Allen Gomes do "togado" de Mértola à Câmara Municipal de Mértola, representada pelo seu Vice-presidente João Serrão (à direita), no dia 23 de Junho de 2017 (Foto SITE_
 CMMértola)

Para finalizar, uma outra curiosidade sobre o “togado” de
Mértola…Acabo de tomar conhecimento através do Site da Câmara Municipal de
Mértola, que representantes da família Allen Gomes, os actuais herdeiros do Dr.
Manuel Francisco Gomes, acabam de formalizar por contrato de doação assinado em
23 de Junho último, a oferta da estátua à Câmara. É o último e esclarecedor acto de um "qui pro quo" que tive oportunidade de acompanhar como Director do Departamento de
Arqueologia do IPPC, no início do ano de 1986 e que passo a documentar. Tendo
em contas as compreensivelmente difíceis relações entre Cláudio Torres e o
então Director do Serviço Regional de Arqueologia do Sul, Caetano Mello Beirão
(a que já aludi neste “blog”, uma vez que o primeiro vinha praticamente da “oposição
clandestina” ao regime salazarista e o segundo se inscrevia na via do mais puro
“integrismo lusitano”), era a miúde contactado directamente pelo Cláudio Torres
para resolver em Lisboa questões pendentes que normalmente deveriam ser
canalizadas através de Évora. É nesse contexto que se explicará um ofício que
em Janeiro de 1986 o IPPC endereçou à Câmara Municipal solicitando que aquela
autarquia tomasse as necessárias providências no sentido de encontrar um local
de armazenamento mais condigno e adequado à conservação, para uma estátua que
se encontrava em péssimas condições num armazém municipal instalado num
edifício particular alugado pela autarquia. Sobre o que se passou de seguida
apenas o podemos depreender de um segundo ofício, já datado de Maio do mesmo
ano e em que se solicitam uma série de esclarecimentos à autarquia, uma vez que
decorria um processo de averiguações na Polícia Judiciária envolvendo a
referida estátua. 

Ofício de Maio de 1986 que dá conta à Câmara Municipal de Mértola da existência do processo de averiguações na Polícia Judiciária

Finalmente, em Julho chegariam ao IPPC os necessários
esclarecimentos. Com efeito, a autarquia por precipitação ou excesso de zelo,
antecipara-se ao indispensável processo negocial com os proprietários do
edifício (herdeiros do Dr.Manuel Francisco Gomes, já então falecido) e um destes,
por coincidência inspector da Polícia Judiciária, penso que à época, director
da própria brigada de “Obras de Arte”, não esteve com meias medidas…e avançou
com um processo de averiguações por “furto”. Naturalmente, tudo se viria a
esclarecer, tendo então a estátua sido “emprestada” para figurar na exposição
inaugurada dois anos depois e onde ainda hoje permanece. Aliás, entre os
herdeiros que assinaram há poucos meses o contrato de doação ao município,
figura o nome de Maria Judite Ramos Allen Gomes, viúva do inspector Alfredo
Barreto Allen Gomes.

Resposta da C.M. de Mértola de Julho de 1986 em que se dá conta do acordo de empréstimo alcançado com a família Gomes

Descrição da estátua romana "togado-Mértiola", pela arqueóloga Susana Correia. Na hipótese de se gorarem as negociações entre a autarquia e os legítimos proprietários da estátua, os serviços estavam a preparar a sua "inventariação" administrativa, acto indispensável para precaver uma eventual transação legal da mesma para o estrangeiro.

Os "degolados de Mértola"

A propósito das novas e fantásticas descobertas no "ùltimo porto do Mediterrâneo"

A recente descoberta de um conjunto de estatuária monumental
em Mértola, teve o devido e justificadíssimo destaque mediático e, ao contrário
do que tantas vezes se apregoa, constitui de facto uma descoberta da máxima
importância científica e cultural. Para além das ilações histórico-arqueológicas
que se poderão retirar desta descoberta rara, nomeadamente sobre o estatuto e
importância económica e política do “Mértola, o último porto do Mediterrâneo”*,
como o apelidou Santiago Macias na sua tese de doutoramento, esta descoberta
também vem trazer novos dados de cariz historiográfico-arqueológico sobre o “percurso”
de outras três estátuas monumentais há muito referenciadas na Arqueologia
portuguesa. Falamos dos célebres “togados” de Mértola, representações
cerimoniais de importantes figuras públicas (“Vips” na linguagem contemporânea),
exibindo a tradicional “toga” imperial (no caso à moda do Século I) e cujo
achado em Mértola só é compreensível no contexto de um grande edifício público
entretanto desaparecido. Uma dessas estátuas, felizmente encontra-se ainda em
Mértola, e é peça central do chamado núcleo romano do Museu de Mértola,
inaugurado em 1989 e localizado na cripta dos próprios Paços do Concelho, onde
se conservam as ruínas de uma “casa romana” descobertas durante as escavações
que se seguiram à reconstrução do edifício na sequencia de um grande incêndio.
(Estou de algum modo ligado a estas escavações dos anos oitenta mas deixo as
reminiscências para outra ocasião…). 

_____
* De acordo com informação que me chegou já depois de muito divulgado o presente post, a frase "Mértola, o último porto do Mediterrâneo", dever-se-á ao arqueólogo José Luis de Matos, o meu primeiro professor de Arqueologia e Pré-história na Faculdade de Letras de Lisboa, no distante ano de 1970...

O "togado" do Núcleo Romano do Museu de Mértola (foto CMM)

As duas outras estátuas estão quase há um
século, no Museu Nacional de Arqueologia, aos Jerónimos, onde são peças
fundamentais da coleção de estatuária romana. As condições da descoberta destas
três estátuas, época, localização e contexto, permanecem ainda nebulosas,
embora as recentes descobertas possam vir trazer alguma luz sobre o tema. É aceite pela
historiografia, com base nas referencias de Frei Amador Arrais e André de
Resende, mais tarde retomadas por Estácio da Veiga (a quem se deve a primeira
grande monografia sobre as antiguidades de Mértola, ainda editada no Século XIX) que o
par de estátuas do Museu Nacional de Arqueologia terá sido descoberto durante
as obras de alargamento da Igreja da Misericórdia, realizadas nos finais do
Século XVI. Dali, e não se sabe porque artes mágicas, as duas estátuas seriam
levadas para a casa senhorial da Quinta da Amoreira da Torre, nos arredores de
Montemor-o-Novo, onde ainda se encontravam nos anos 20 do século XX (pelo menos
a crer na descrição, a pg. 34 do volume Guia de Portugal, de Raúl Proença, -Estremadura,
Alentejo, Algarve) “Em dois nichos de
casa de entrada, duas notáveis estátuas, que parecem ter vindo de Mértola no
século XVII (…)” A casa pertencia no século XVII a D. Martinho de
Mascarenhas, marquês de Gouveia, que, entre muitas outras prebendas e títulos,
era alcaide-mor de Mértola, o que explicaria na opinião de Túlio Espanca quando
faz o inventário da Quinta da Torre da Amoreira, a presença das estátuas, entre
outras pedras e inscrições. O que se confirma pela referencia do Mestre Espanca
é que à data em que faz o seu registo (anos quarenta ou cinquenta) as estátuas
já tinham sido transferidas para Lisboa, muito provavelmente por ação do
próprio Leite de Vasconcelos, director do então Museu Etnológico (hoje Museu
Nacional de Arqueologia). 

"Togado" do Museu Nacional de Arqueologia (foto arquivo MNA)

O “Guia de Portugal” que citámos, regista ainda uma
história saborosa sobre estas estátuas às quais, “O povo, sob a sugestão da tragédia dos Távoras, deu o nome de marquês
e marquesa degolados”. Estamos de facto perante estátuas acéfalas, preparadas
à boa maneira do sentido prático romano, para “mudarem de cabeça”, se
necessário… E, explicando a tradição popular, um dos descendentes de
D.Martinho, o 8º Duque de Aveiro, D.José de Mascarenhas,  titular da casa da
Amoreira, na sequencia do atentado contra D.José I, sofreria a pena capital no
patíbulo de Belém (próximo da hoje célebre Casa dos Pastéis e a poucas centenas
de metros do actual paradeiro dos dois “degolados” de Mértola…). Apesar de
certamente haver alguma relação entre estas estátuas e a que hoje se conserva
na cripta da Câmara Municipal de Mértola, o contexto do achado é aparentemente
divergente. A primeira referencia que conheço à mesma, é uma pequena nota de
Abel Viana, publicada em 1950 na “sua” revista “Arquivo de Beja”. Segundo este
arqueólogo minhoto, alentejano por opção (ver aqui sobre A Viana), a estátua então guardada na
residência do médico Manuel Francisco Gomes, teria aparecido na encosta
oriental do Castelo… De referir que só o facto desta peça ser propriedade de alguém com poder e prestígio, como era certamente o caso deste médico hoje representado na toponímia mertolense, terá evitado que a estátua tenha levado descaminho para outras paragens... Pelo menos Leite de Vasconcelos deve ter tentado levá-la para Lisboa, felizmente neste caso sem sucesso.

Nota de Abel Viana publicada no "Arquivo de Beja, nº7, 1950, sobre o togado de Mértola, que se conservou na vila alentejana.

Temos assim, actualmente, três hipóteses de localizações
alternativas para este achado ocorrido em data incerta. Na encosta Oriental do
Castelo de Mértola, na Misericórdia em conjunto com o par do MNA, e por fim, nas obras de construção da casa onde já se encontrava pelo menos nos anos 40 do século passado. Este edifício é hoje conhecido como “Casa
Côr de Rosa” e localiza-se na Rua 5 de de Outubro, tendo sido entretanto adquirido pela
Câmara Municipal de Mértola. Dois dados parecem fazer pender a balança para que
esta última hipótese seja a mais correcta. Desde logo os recentíssimos achados de
estatuária aqui verificados nas profundas escavações levadas a cabo pelo Campo
Arqueológico de Mértola, no âmbito de um projecto de requalificação do
edifício. Por outro, a relativa proximidade da zona do Largo da Misericórdia, o
que cruzando os dados das presentes escavações com a informação já disponível,
permite pensar na existência de um grande edifício público nesta zona da vila
velha de Mértola.

Acto de assinatura do contrato de doação pela família Allen Gomes do "togado" de Mértola à Câmara Municipal de Mértola, representada pelo seu Vice-presidente João Serrão (à direita), no dia 23 de Junho de 2017 (Foto SITE_
 CMMértola)

Para finalizar, uma outra curiosidade sobre o “togado” de
Mértola…Acabo de tomar conhecimento através do Site da Câmara Municipal de
Mértola, que representantes da família Allen Gomes, os actuais herdeiros do Dr.
Manuel Francisco Gomes, acabam de formalizar por contrato de doação assinado em
23 de Junho último, a oferta da estátua à Câmara. É o último e esclarecedor acto de um "qui pro quo" que tive oportunidade de acompanhar como Director do Departamento de
Arqueologia do IPPC, no início do ano de 1986 e que passo a documentar. Tendo
em contas as compreensivelmente difíceis relações entre Cláudio Torres e o
então Director do Serviço Regional de Arqueologia do Sul, Caetano Mello Beirão
(a que já aludi neste “blog”, uma vez que o primeiro vinha praticamente da “oposição
clandestina” ao regime salazarista e o segundo se inscrevia na via do mais puro
“integrismo lusitano”), era a miúde contactado directamente pelo Cláudio Torres
para resolver em Lisboa questões pendentes que normalmente deveriam ser
canalizadas através de Évora. É nesse contexto que se explicará um ofício que
em Janeiro de 1986 o IPPC endereçou à Câmara Municipal solicitando que aquela
autarquia tomasse as necessárias providências no sentido de encontrar um local
de armazenamento mais condigno e adequado à conservação, para uma estátua que
se encontrava em péssimas condições num armazém municipal instalado num
edifício particular alugado pela autarquia. Sobre o que se passou de seguida
apenas o podemos depreender de um segundo ofício, já datado de Maio do mesmo
ano e em que se solicitam uma série de esclarecimentos à autarquia, uma vez que
decorria um processo de averiguações na Polícia Judiciária envolvendo a
referida estátua. 

Ofício de Maio de 1986 que dá conta à Câmara Municipal de Mértola da existência do processo de averiguações na Polícia Judiciária

Finalmente, em Julho chegariam ao IPPC os necessários
esclarecimentos. Com efeito, a autarquia por precipitação ou excesso de zelo,
antecipara-se ao indispensável processo negocial com os proprietários do
edifício (herdeiros do Dr.Manuel Francisco Gomes, já então falecido) e um destes,
por coincidência inspector da Polícia Judiciária, penso que à época, director
da própria brigada de “Obras de Arte”, não esteve com meias medidas…e avançou
com um processo de averiguações por “furto”. Naturalmente, tudo se viria a
esclarecer, tendo então a estátua sido “emprestada” para figurar na exposição
inaugurada dois anos depois e onde ainda hoje permanece. Aliás, entre os
herdeiros que assinaram há poucos meses o contrato de doação ao município,
figura o nome de Maria Judite Ramos Allen Gomes, viúva do inspector Alfredo
Barreto Allen Gomes.

Resposta da C.M. de Mértola de Julho de 1986 em que se dá conta do acordo de empréstimo alcançado com a família Gomes

Descrição da estátua romana "togado-Mértiola", pela arqueóloga Susana Correia. Na hipótese de se gorarem as negociações entre a autarquia e os legítimos proprietários da estátua, os serviços estavam a preparar a sua "inventariação" administrativa, acto indispensável para precaver uma eventual transação legal da mesma para o estrangeiro.

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