Câmara de Lisboa alerta para aumento da praga de lagartas tóxicas nas escolas

07-04-2020
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As lagartas do pinheiro (como o nome indica) vivem nos pinheiros e podem representar um perigo para a saúde pública, em caso de contacto direto. As crianças podem ser as mais vulneráveis, pela quantidade de árvores em recintos escolares. Especialistas dizem não haver motivo para alarme.

© Gerardo Santos / Global Imagens

O mês de janeiro começou com preocupações para a escola básica Arquitecto Victor Palla. Pouco a pouco, a instituição foi recebendo relatos de crianças reencaminhadas para o hospital com alergias. A causa estava nas árvores do recinto escolar, no qual estão três pinheiros de grandes dimensões onde vivem as conhecidas lagartas que se alimentam desta espécie de árvore. Quando estes insetos entram em contacto com a pele ou os seus pelos são inalados, há risco de urticária e até dificuldades respiratórias. Este ano (referente à época da lagarta), a espécie registou "uma forte proliferação", de acordo com a Câmara Municipal de Lisboa (CML).

"Temos constatado uma forte proliferação desta praga, e a CML tem atuado, dentro das suas capacidades mecânicas e humanas, nas escolas da sua competência", escreve a autarquia, em resposta ao DN. Um trabalho que "tem de ser assegurado em todas as escolas onde existam pinheiros e se verifique a praga". Contabilizando os últimos três anos, "as solicitações desta natureza por entidades escolares ou demais locais com população mais vulnerável como os anteriormente referidos, nunca foi superior a uma dezena de casos por ano".

Crianças hospitalizadas

Na quarta-feira passada, o pequeno Salvador de seis anos, aluno na escola básica Arquitecto Victor Palla, lançou o alerta. "Reparei que tinha os ombros, costas, barriga, braços e pernas cheios de borbulhas, que começaram a rebentar", relata a mãe Alexandra Canilho, de 38 anos.

Passados alguns dias, esta segunda-feira, preocupada, Alexandra dirige-se com o filho ao hospital, onde lhe dizem ter sintomas de contacto com a lagarta do pinheiro. Nessa altura, Salvador confessou que tinha estado a tocar em alguns dos animais que estavam em redor de um dos pinheiros do recreio da escola, apesar dos alertas dos funcionários para que nenhum criança o fizesse. "É uma criança, tem curiosidade e vai tocar, mesmo que lhe digam para não o fazer", lembra a encarregada de educação.

Ana Abreu, mãe de uma outra aluna na mesma escola, conta ao DN que o caso se repetiu com "mais algumas crianças", sem precisar ao certo quantas. Em 2017, a escola básica do Bairro de São Miguel, em Alvalade, esteve debaixo de fogo, com 18 crianças hospitalizadas com sintomas de urticária, prurido e manchas na pele devido às lagartas do pinheiro.

Na sequência deste episódio, em janeiro do ano passado, na Assembleia Municipal de Lisboa, o CDS-PP apresentou uma recomendação para um maior controlo da praga em espaços públicos frequentados por crianças e animais. Os centristas pediam à autarquia que procedesse "atempadamente a inspeções e tratamentos adequados nas árvores das escolas, dos infantários e dos jardins, parques infantis, parques recreativos e parques caninos".

Em resposta ao DN, a Câmara Municipal de Lisboa garante ter "em curso novos procedimentos de contratação pública para salvaguardar e controlar esta praga, além da manutenção global dos espaços verdes das escolas no decurso deste ano", sem precisar quais.

Na escola básica Arquitecto Victor Palla, a autarquia assegurou o reforço da prevenção, através da colocação de cintas de captura em redor dos troncos.

© Gerardo Santos / Global Imagens

Riscos aumentam com alterações climáticas

De acordo com a Direção-Geral da Saúde (DGS), um pouco por todo o país e não só no concelho de Lisboa, "nos últimos anos têm-se observado ataques de elevada intensidade desta praga, facto que se atribui principalmente às condições climáticas verificadas". A existência de mais ondas de calor durante o ano acelera o processo de desenvolvimento desta espécie, tornando o seu ciclo de vida mais imprevisível, alerta uma especialista do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO).

A entomóloga (especialista em insetos) Sónia Ferreira explica que "em zonas frias é normal que os animais se desenvolvam de uma forma mais lenta, enquanto em zonas mais quentes têm melhores condições em termos metabólicos e conseguem desenvolver-se mais rapidamente". O que torna "mais difícil prever" quando irão aparecer e em que fase do ciclo se encontram. A fase de maior perigo ocorre quando fazem o seu percurso migratório desde os ramos das árvores, onde constroem os seus ninhos, em direção à terra, descendo pelo tronco.

© Gerardo Santos / Global Imagens

Contudo, ao contrário das declarações da DGS, a especialista do CIBIO frisa não se tratar de uma "intensificação do fenómeno". O que atualmente difere do que ocorreria há uns anos é "uma maior atenção sobre ele". "Esta espécie sempre existiu, mas cada vez mais as pessoas têm uma maior proximidade dela. Não é tanto a invasão do inseto, mas a invasão dos humanos no meio natural dos insetos. Cada vez mais utilizamos áreas onde elas estão presentes", esclarece. Por isso, sublinha, "quando se escolhe determinadas áreas para construir jardins, convinha ter isso em consideração".

Todos os anos, os alertas soam. Partem "principalmente" das escolas, "onde as crianças estão a brincar, vêm aquela filinha de lagartas a passar e devido à curiosidade que lhes é inerente querem tocar no animal". Mas também de donos de animais domésticos, vulneráveis ao contacto com estas lagartas, quando vão passear.

Como prevenir ou tratar

São "vários" os métodos de combate, mas este processo deve ser sempre feito por "especialistas", alerta a especialista Sónia Ferreira. Na escola básica Arquitecto Victor Palla, onde estas espécies têm lugar todos os anos, o último tratamento aconteceu em novembro, através da colocações de armadilhas em torno dos troncos por onde costumam descer, em procissão, entre janeiro e abril. Contudo, com o mau tempo, algumas das proteções voaram e, entretanto, as lagartas conseguiram descer até ao solo, no recreio, arriscando a saúde das crianças.

Há três semanas, quando a direção da instituição se apercebeu do problema, informou tanto a Câmara Municipal de Lisboa como a Junta de Freguesia da Penha de França, que prometeram intervir assim que possível. Mas a intervenção demoraria mais do que esperado - apenas esta quinta-feira foi feita -, dando azo a que algumas crianças fossem transportadas para o hospital com sintomas.

© Gerardo Santos / Global Imagens

Questionada pelo DN, a Junta de Freguesia explicou que o tratamento é feito em três principais fases. Numa primeira, no mês de abril, através da "remoção de todos os ninhos desta lagarta processionária". Depois, entre junho a setembro, pela "aplicação de armadilhas com feromonas para captura de machos fecundantes, antes que realizem a fecundação das fêmeas". Por último, preferencialmente durante o decorrer do mês de setembro, é aplicada uma "microinjeção de fitofármaco em todas as árvores, para prevenir a formação das lagartas".

"Em todo o caso", escreve a DGS, "a solução não residirá, nunca, no abate das árvores infestadas, tanto mais que se dispõe de uma série de medidas alternativas de controlo deste inseto".

Sónia Ferreira alerta ainda que em nenhuma situação se deve proceder ao combate desta espécie pelas próprias mãos, sem o auxílio de um perito. Além disso, sublinha, "elas não vêm para atacar o ser humano, estão simplesmente a completar o seu ciclo de vida". "É deixá-las. O perigo das lagartas do pinheiro só existe quando as tocamos com a nossa pele", diz.

Enquanto as lagartas estão a viver no topo das árvores sentem-se protegidas do predador, assim que fazem a migração tornam-se vulneráveis para todo o tipo de predadores (como aves), "portanto, a natureza dotou-a das sedas urticantes de forma a defenderem-se das aves", explica a entomóloga. "E há maneiras de usufruir da presença da espécie, que pode ser bastante educativa. Nem a borboleta nem a lagarta são, por definição, um perigo para o ser humano."

As lagartas do pinheiro (como o nome indica) vivem nos pinheiros e podem representar um perigo para a saúde pública, em caso de contacto direto. As crianças podem ser as mais vulneráveis, pela quantidade de árvores em recintos escolares. Especialistas dizem não haver motivo para alarme.

© Gerardo Santos / Global Imagens

O mês de janeiro começou com preocupações para a escola básica Arquitecto Victor Palla. Pouco a pouco, a instituição foi recebendo relatos de crianças reencaminhadas para o hospital com alergias. A causa estava nas árvores do recinto escolar, no qual estão três pinheiros de grandes dimensões onde vivem as conhecidas lagartas que se alimentam desta espécie de árvore. Quando estes insetos entram em contacto com a pele ou os seus pelos são inalados, há risco de urticária e até dificuldades respiratórias. Este ano (referente à época da lagarta), a espécie registou "uma forte proliferação", de acordo com a Câmara Municipal de Lisboa (CML).

"Temos constatado uma forte proliferação desta praga, e a CML tem atuado, dentro das suas capacidades mecânicas e humanas, nas escolas da sua competência", escreve a autarquia, em resposta ao DN. Um trabalho que "tem de ser assegurado em todas as escolas onde existam pinheiros e se verifique a praga". Contabilizando os últimos três anos, "as solicitações desta natureza por entidades escolares ou demais locais com população mais vulnerável como os anteriormente referidos, nunca foi superior a uma dezena de casos por ano".

Crianças hospitalizadas

Na quarta-feira passada, o pequeno Salvador de seis anos, aluno na escola básica Arquitecto Victor Palla, lançou o alerta. "Reparei que tinha os ombros, costas, barriga, braços e pernas cheios de borbulhas, que começaram a rebentar", relata a mãe Alexandra Canilho, de 38 anos.

Passados alguns dias, esta segunda-feira, preocupada, Alexandra dirige-se com o filho ao hospital, onde lhe dizem ter sintomas de contacto com a lagarta do pinheiro. Nessa altura, Salvador confessou que tinha estado a tocar em alguns dos animais que estavam em redor de um dos pinheiros do recreio da escola, apesar dos alertas dos funcionários para que nenhum criança o fizesse. "É uma criança, tem curiosidade e vai tocar, mesmo que lhe digam para não o fazer", lembra a encarregada de educação.

Ana Abreu, mãe de uma outra aluna na mesma escola, conta ao DN que o caso se repetiu com "mais algumas crianças", sem precisar ao certo quantas. Em 2017, a escola básica do Bairro de São Miguel, em Alvalade, esteve debaixo de fogo, com 18 crianças hospitalizadas com sintomas de urticária, prurido e manchas na pele devido às lagartas do pinheiro.

Na sequência deste episódio, em janeiro do ano passado, na Assembleia Municipal de Lisboa, o CDS-PP apresentou uma recomendação para um maior controlo da praga em espaços públicos frequentados por crianças e animais. Os centristas pediam à autarquia que procedesse "atempadamente a inspeções e tratamentos adequados nas árvores das escolas, dos infantários e dos jardins, parques infantis, parques recreativos e parques caninos".

Em resposta ao DN, a Câmara Municipal de Lisboa garante ter "em curso novos procedimentos de contratação pública para salvaguardar e controlar esta praga, além da manutenção global dos espaços verdes das escolas no decurso deste ano", sem precisar quais.

Na escola básica Arquitecto Victor Palla, a autarquia assegurou o reforço da prevenção, através da colocação de cintas de captura em redor dos troncos.

© Gerardo Santos / Global Imagens

Riscos aumentam com alterações climáticas

De acordo com a Direção-Geral da Saúde (DGS), um pouco por todo o país e não só no concelho de Lisboa, "nos últimos anos têm-se observado ataques de elevada intensidade desta praga, facto que se atribui principalmente às condições climáticas verificadas". A existência de mais ondas de calor durante o ano acelera o processo de desenvolvimento desta espécie, tornando o seu ciclo de vida mais imprevisível, alerta uma especialista do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO).

A entomóloga (especialista em insetos) Sónia Ferreira explica que "em zonas frias é normal que os animais se desenvolvam de uma forma mais lenta, enquanto em zonas mais quentes têm melhores condições em termos metabólicos e conseguem desenvolver-se mais rapidamente". O que torna "mais difícil prever" quando irão aparecer e em que fase do ciclo se encontram. A fase de maior perigo ocorre quando fazem o seu percurso migratório desde os ramos das árvores, onde constroem os seus ninhos, em direção à terra, descendo pelo tronco.

© Gerardo Santos / Global Imagens

Contudo, ao contrário das declarações da DGS, a especialista do CIBIO frisa não se tratar de uma "intensificação do fenómeno". O que atualmente difere do que ocorreria há uns anos é "uma maior atenção sobre ele". "Esta espécie sempre existiu, mas cada vez mais as pessoas têm uma maior proximidade dela. Não é tanto a invasão do inseto, mas a invasão dos humanos no meio natural dos insetos. Cada vez mais utilizamos áreas onde elas estão presentes", esclarece. Por isso, sublinha, "quando se escolhe determinadas áreas para construir jardins, convinha ter isso em consideração".

Todos os anos, os alertas soam. Partem "principalmente" das escolas, "onde as crianças estão a brincar, vêm aquela filinha de lagartas a passar e devido à curiosidade que lhes é inerente querem tocar no animal". Mas também de donos de animais domésticos, vulneráveis ao contacto com estas lagartas, quando vão passear.

Como prevenir ou tratar

São "vários" os métodos de combate, mas este processo deve ser sempre feito por "especialistas", alerta a especialista Sónia Ferreira. Na escola básica Arquitecto Victor Palla, onde estas espécies têm lugar todos os anos, o último tratamento aconteceu em novembro, através da colocações de armadilhas em torno dos troncos por onde costumam descer, em procissão, entre janeiro e abril. Contudo, com o mau tempo, algumas das proteções voaram e, entretanto, as lagartas conseguiram descer até ao solo, no recreio, arriscando a saúde das crianças.

Há três semanas, quando a direção da instituição se apercebeu do problema, informou tanto a Câmara Municipal de Lisboa como a Junta de Freguesia da Penha de França, que prometeram intervir assim que possível. Mas a intervenção demoraria mais do que esperado - apenas esta quinta-feira foi feita -, dando azo a que algumas crianças fossem transportadas para o hospital com sintomas.

© Gerardo Santos / Global Imagens

Questionada pelo DN, a Junta de Freguesia explicou que o tratamento é feito em três principais fases. Numa primeira, no mês de abril, através da "remoção de todos os ninhos desta lagarta processionária". Depois, entre junho a setembro, pela "aplicação de armadilhas com feromonas para captura de machos fecundantes, antes que realizem a fecundação das fêmeas". Por último, preferencialmente durante o decorrer do mês de setembro, é aplicada uma "microinjeção de fitofármaco em todas as árvores, para prevenir a formação das lagartas".

"Em todo o caso", escreve a DGS, "a solução não residirá, nunca, no abate das árvores infestadas, tanto mais que se dispõe de uma série de medidas alternativas de controlo deste inseto".

Sónia Ferreira alerta ainda que em nenhuma situação se deve proceder ao combate desta espécie pelas próprias mãos, sem o auxílio de um perito. Além disso, sublinha, "elas não vêm para atacar o ser humano, estão simplesmente a completar o seu ciclo de vida". "É deixá-las. O perigo das lagartas do pinheiro só existe quando as tocamos com a nossa pele", diz.

Enquanto as lagartas estão a viver no topo das árvores sentem-se protegidas do predador, assim que fazem a migração tornam-se vulneráveis para todo o tipo de predadores (como aves), "portanto, a natureza dotou-a das sedas urticantes de forma a defenderem-se das aves", explica a entomóloga. "E há maneiras de usufruir da presença da espécie, que pode ser bastante educativa. Nem a borboleta nem a lagarta são, por definição, um perigo para o ser humano."

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