Coimas para ajuntamentos e festas pecam por tardias? Máximo seria de 3.700 euros mas o Governo pode ir além

22-06-2020
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Esta segunda-feira, o primeiro-ministro, António Costa, anunciou que o Governo decidiu prolongar o estado de calamidade em 15 freguesias de cinco concelhos da Área Metropolitana de Lisboa, locais que concentram a maioria dos novos casos de contágio da covid-19.

Esta decisão abrange a reposição do limite máximo de 10 pessoas por ajuntamento, bem como a aprovação de um diploma que prevê contraordenações, a par do reforço das forças de segurança na rua, visando a “autuação de quem organize ou de quem participe de ajuntamentos que não sejam permitidos”.

Acresce ainda que os serviços comerciais vão passar a fechar às 20h00, à exceção de restaurantes para serviços de refeições, e será proibida a venda de bebidas em áreas de serviço e o consumo de bebidas na via pública.

Depois deste anúncio, António Costa deixou em aberto que valores podem atingir as referidas coimas.

Em declarações à Executive Digest, Sofia Matos, advogada e sócia da Antas da Cunha ECIJA, recorda, desde logo, que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 33-C/2020 de 30 de Abril veio estabelecer uma estratégia de levantamento de medidas de confinamento no âmbito do combate à pandemia da doença Covid-19.

Se de acordo com o plano ficaram expressamente proibidos os eventos ou ajuntamentos com mais de 10 pessoas, a “questão que se coloca é a de saber o que pode acontecer a quem não cumprir com a medida anunciada, como temos vistos acontecer nos últimos dias, especialmente por grupos de jovens que se juntam nas ruas, parques e praias sem que as autoridades assumam o controlo da situação”, questiona a especialista.

Apesar de considerar que a realidade não se compadece com medidas de repressão, a especialista não deixa de afirmar que estas “em abono da verdade, são as únicas de que dispomos para colocar um fim imediato no crescimento do número de infetados pela covid-19, o que nos coloca lamentavelmente na linha da frente na Europa”.

Segundo esclarece a advogada, quando as forças de segurança são chamadas aos locais de ajuntamento e emitem a ordem de desmobilização quem não cumprir de imediato está sujeito a responder criminalmente pela prática do crime de desobediência qualificada previsto e punido pelo n.º 2 do artigo 348º do Código Penal, com uma pena de multa até 120 dias ou pena de prisão até 2 anos.

Mas, esclarece ainda, como em qualquer processo penal e ainda que as pessoas sejam detidas em flagrante delito, por não acatarem com a ordem de desmobilização e sejam presente aos Juiz de Instrução para efeitos de aplicação de medidas de coação, “o tempo que passa até que exista uma decisão judicial transitada em julgado não se compadece com o efeito preventivo que se pretende e que é, desincentivar os que se juntam como se tudo tivesse voltado à normalidade, pois não conhecem ninguém que tenha sido preso ou condenado por facto semelhante”.

Na ótica de Sofia Matos “o que é de estranhar” é que apenas decorridos quase dois meses desde a publicação do plano de desconfinamento o Governo se tenha apercebido agora que deveria ter legislado preventivamente: “isto é, o Governo não considerou de imediato a possibilidade de qualificar como contra-ordenação punível com coima quem violasse a regra de proibição de participação em eventos ou ajuntamentos com mais de dez pessoas”, ressalvou.

E não o tendo feito, as forças de segurança estavam impedidas de autuar quem infringisse tal regra, já que, por obediência ao principio da legalidade, com inscrição constitucional (artigo 29°, n° l) não pode haver crime, contra-ordenação, nem pena que não resultem de uma lei prévia, escrita, estrita e certa (‘nullum crimen, nulla poene sine lege’).

Com este enquadramento, “resta-nos aguardar pela prometida norma que irá qualificar estes atos como contra-ordenação e saber se o governo vai optar por remeter o montante das coimas para as que se encontram fixadas no Regime Jurídico do Ilícito de mera ordenação social”.

Este Regime, recorda, prevê a possibilidade de aplicação de uma coima para as pessoas singulares que pode ir de 3,74 euros a 3.740,98 euros, ou se irá fixar outros valores. “Sem isto ninguém poderá responder por uma contra-ordenação que não existe”, conclui.

Tudo em aberto: sem limites para montantes máximos ou mínimos da coimas

Sobre esta matéria, Pedro Barosa, sócio contratado da Abreu Advogados, começa por apontar que as coimas estão previstas num diploma designado “Regime Geral das Contraordenações”, lembrando que variam em função de estar em causa uma empresa ou pessoa singular. No entanto, à luz da lei atual, “não há nenhum limite àquilo que possam vir a ser os montante máximos ou mínimos da coimas”, disse à Executive Digest. O especialista recusa especular, mas admitiu que os valores deverão “andar dentro do quadro legal que costuma ser praticado e que está previsto no regime”.

Considerando a particularidade do contexto em que estas medidas vão ser aprovadas, Pedro Barosa prevê que o Executivo tente “causar um susto”, no sentido de “inibir” o cidadão de ir contra as mesmas, uma vez que «os comportamentos que vão ser punidos são graves aos olhos do Governo, na medida em que podem constranger o serviço nacional de saúde».

O advogado reconheceu também o efeito de prevenção da medida. “É um bocadinho como o excesso de velocidade. Existem radares na estrada há muitos anos, polícia e a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, mas as pessoas continuam a andar depressa. Ainda para mais hoje em dia, com sede de reunir, conviver, ir para a praia e participar em festas”, fez notar.

Em seu entender, as multas servirão mais “um propósito de prevenção” do que de punição. Pelo que “não terá grande efeito pedagógico”, defendeu.

* com Ana Rita Rebelo

Esta segunda-feira, o primeiro-ministro, António Costa, anunciou que o Governo decidiu prolongar o estado de calamidade em 15 freguesias de cinco concelhos da Área Metropolitana de Lisboa, locais que concentram a maioria dos novos casos de contágio da covid-19.

Esta decisão abrange a reposição do limite máximo de 10 pessoas por ajuntamento, bem como a aprovação de um diploma que prevê contraordenações, a par do reforço das forças de segurança na rua, visando a “autuação de quem organize ou de quem participe de ajuntamentos que não sejam permitidos”.

Acresce ainda que os serviços comerciais vão passar a fechar às 20h00, à exceção de restaurantes para serviços de refeições, e será proibida a venda de bebidas em áreas de serviço e o consumo de bebidas na via pública.

Depois deste anúncio, António Costa deixou em aberto que valores podem atingir as referidas coimas.

Em declarações à Executive Digest, Sofia Matos, advogada e sócia da Antas da Cunha ECIJA, recorda, desde logo, que a Resolução do Conselho de Ministros n.º 33-C/2020 de 30 de Abril veio estabelecer uma estratégia de levantamento de medidas de confinamento no âmbito do combate à pandemia da doença Covid-19.

Se de acordo com o plano ficaram expressamente proibidos os eventos ou ajuntamentos com mais de 10 pessoas, a “questão que se coloca é a de saber o que pode acontecer a quem não cumprir com a medida anunciada, como temos vistos acontecer nos últimos dias, especialmente por grupos de jovens que se juntam nas ruas, parques e praias sem que as autoridades assumam o controlo da situação”, questiona a especialista.

Apesar de considerar que a realidade não se compadece com medidas de repressão, a especialista não deixa de afirmar que estas “em abono da verdade, são as únicas de que dispomos para colocar um fim imediato no crescimento do número de infetados pela covid-19, o que nos coloca lamentavelmente na linha da frente na Europa”.

Segundo esclarece a advogada, quando as forças de segurança são chamadas aos locais de ajuntamento e emitem a ordem de desmobilização quem não cumprir de imediato está sujeito a responder criminalmente pela prática do crime de desobediência qualificada previsto e punido pelo n.º 2 do artigo 348º do Código Penal, com uma pena de multa até 120 dias ou pena de prisão até 2 anos.

Mas, esclarece ainda, como em qualquer processo penal e ainda que as pessoas sejam detidas em flagrante delito, por não acatarem com a ordem de desmobilização e sejam presente aos Juiz de Instrução para efeitos de aplicação de medidas de coação, “o tempo que passa até que exista uma decisão judicial transitada em julgado não se compadece com o efeito preventivo que se pretende e que é, desincentivar os que se juntam como se tudo tivesse voltado à normalidade, pois não conhecem ninguém que tenha sido preso ou condenado por facto semelhante”.

Na ótica de Sofia Matos “o que é de estranhar” é que apenas decorridos quase dois meses desde a publicação do plano de desconfinamento o Governo se tenha apercebido agora que deveria ter legislado preventivamente: “isto é, o Governo não considerou de imediato a possibilidade de qualificar como contra-ordenação punível com coima quem violasse a regra de proibição de participação em eventos ou ajuntamentos com mais de dez pessoas”, ressalvou.

E não o tendo feito, as forças de segurança estavam impedidas de autuar quem infringisse tal regra, já que, por obediência ao principio da legalidade, com inscrição constitucional (artigo 29°, n° l) não pode haver crime, contra-ordenação, nem pena que não resultem de uma lei prévia, escrita, estrita e certa (‘nullum crimen, nulla poene sine lege’).

Com este enquadramento, “resta-nos aguardar pela prometida norma que irá qualificar estes atos como contra-ordenação e saber se o governo vai optar por remeter o montante das coimas para as que se encontram fixadas no Regime Jurídico do Ilícito de mera ordenação social”.

Este Regime, recorda, prevê a possibilidade de aplicação de uma coima para as pessoas singulares que pode ir de 3,74 euros a 3.740,98 euros, ou se irá fixar outros valores. “Sem isto ninguém poderá responder por uma contra-ordenação que não existe”, conclui.

Tudo em aberto: sem limites para montantes máximos ou mínimos da coimas

Sobre esta matéria, Pedro Barosa, sócio contratado da Abreu Advogados, começa por apontar que as coimas estão previstas num diploma designado “Regime Geral das Contraordenações”, lembrando que variam em função de estar em causa uma empresa ou pessoa singular. No entanto, à luz da lei atual, “não há nenhum limite àquilo que possam vir a ser os montante máximos ou mínimos da coimas”, disse à Executive Digest. O especialista recusa especular, mas admitiu que os valores deverão “andar dentro do quadro legal que costuma ser praticado e que está previsto no regime”.

Considerando a particularidade do contexto em que estas medidas vão ser aprovadas, Pedro Barosa prevê que o Executivo tente “causar um susto”, no sentido de “inibir” o cidadão de ir contra as mesmas, uma vez que «os comportamentos que vão ser punidos são graves aos olhos do Governo, na medida em que podem constranger o serviço nacional de saúde».

O advogado reconheceu também o efeito de prevenção da medida. “É um bocadinho como o excesso de velocidade. Existem radares na estrada há muitos anos, polícia e a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, mas as pessoas continuam a andar depressa. Ainda para mais hoje em dia, com sede de reunir, conviver, ir para a praia e participar em festas”, fez notar.

Em seu entender, as multas servirão mais “um propósito de prevenção” do que de punição. Pelo que “não terá grande efeito pedagógico”, defendeu.

* com Ana Rita Rebelo

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