A prova do vinho de Costa (e a prova de vida de Boris)

06-11-2019
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Bom dia!

Prepare-se para uma maratona: hoje começa a discutir-se o programa de Governo. É já às 10h00 e vai ser mesmo uma prova longa - todo o dia de hoje e também a manhã de amanhã. Nós vamos seguir tudo em direto e quero deixar-lhe apenas um guião de alguns pontos de interesse:

- António Costa chamou quatro ministros, mas não Centeno. Em si mesmo, isto é um sinal de que algo vai mesmo mudar. Lembra-se do que disse o primeiro-ministro ao Expresso no sábado? Que era preciso tirar a "visão financista das Finanças" à função pública? Parece antes que Costa quer tirar a visão de Centeno do Governo.

- E a esquerda, continua a apoiar o PS? Avaliando pelas primeiras propostas entregues na Assembleia, nada indica uma mudança de estratégia. Isto apesar de Costa ter jogado duro com o Bloco no fim de semana. Francisco Louçã já respondeu à letra. O Bloco seguirá os passos?

- Do lado do PSD, temos uma estreia (ou quase): Rui Rio voltará ao palanque 18 anos depois, agora em registo de campanha interna. Como será o frente a frente com o primeiro-ministro?

- E depois os pequenos: terão dez minutos para mostrar o que valem. Será suficiente para captarem as atenções. Como se vê por este desafio à direita, não faltará competição.

Para aquecer, o que lhe sugiro é que ouça a nossa Comissão Política, desta vez servida com um copo de vinho e uma parábola. Ou dois. Afinal, foi assim que Marcelo serviu a posse do Governo. Pedindo uma colheita exigente. Como escreve o Vítor Matos, é essa a A tragédia dos segundos Governos: transformar a água em vinho só mesmo por milagre.

OUTRAS NOTÍCIAS

Sócrates, quem mais? O ex-primeiro-ministro saiu satisfeito com o segundo dia da sua audição (o que indicia um certo conforto com Ivo Rosa). E, digamos, Sócrates continua igual a si próprio. A sua última versão é que até tentou evitar a nomeação de Armando Vara para a CDG. Este é nova.

A ADSE tem um problema. A avaliar pelas contas do Tribunal... de Contas, o sistema de saúde público será deficitário já em 2020. Esta também é nova.

A vacina para a meningite está de volta. Depois de ter esgotado nas farmácias, tudo indica que estará disponível já na segunda-feira. É, portanto, um regresso.

Lentes de contacto de risco. A Johnson & Johnson está a recolher diversos lotes das lentes de contacto de uso diário alegando risco da existência de “corpos estranhos nas lentes ou no líquido da embalagem”.

No Parlamento Europeu, dois votos fizeram estalar a guerra. Quatro resoluções sobre a busca e salvamento no Mediterrâneo foram chumbadas no Parlamento Europeu. Uma delas, chumbada por dois votos apenas, fez estalar a polémica entre a esquerda e a direita, além de ter dividido os eurodeputados portugueses. A Susana Frexes e a Madalda Ganhão contam porquê.

Na América, o impeachment ganha força. Ontem, um oficial do Exército acusou a Casa Branca de ter apagado partes da transcrição da chamada entre Trump e o Presidente ucraniano. Se é verdade...

Três mortos e nove feridos em tiroteio na Califórnia. Eu sei, parece que se transformou numa banalidade, mas um ato destes tem mesmo de ser registado sempre que acontece. Um dia as coisas mudam.

No Chile, o presidente tenta acalmar a contestação inédita com um pacote de medidas sociais. Mas deixo-lhe o título da Helena Bento, que fala por si: “O descontentamento e a raiva foram crescendo, crescendo, e houve um momento em que… pummm!”.

Mas a América Latina parece um barril de pólvora. Na Bolívia, os confrontos violentos aumentam devido a disputa eleitoral; na Argentina, a justiça livrou Cristina Kirchner de dois processos após ser eleita vice-Presidente.

E entretanto no Reino Unido, finalmente há uma luz verde para eleições. Será em Dezembro, pela primeira vez desde 1923. Mas é sobre isso que vos quero falar aqui à frente.

O QUE ANDO A LER

Na falta de tempo para terminar os muitos livros que tenho em mãos, tenho ouvido alguns podcasts que lhe quero recomendar hoje, porque vêm mesmo a calhar para a atualidade. Um é da Spectator, chama-se Coffee House Shots (procure no Spotify ou iTunes). O último episódio, com apenas 15 minutos, explica direitinho por que estas eleições não estão ganhas para Boris Johson. Sim, vou sintetizar: é que os conservadores só vão conseguir governar, desta vez, se conseguirem garantir uma maioria dos deputados; ao passo que o Labour, mesmo fragilizado e com uma liderança divisiva, podem conseguir fazer alianças com os nacionalistas escoceses e até com os liberais (os "remainers" que restam no país). Mais um dado relevante: Boris Johnson terá de decidir se quer candidatar os conservadores que mais o desafiaram na sua proposta de saída à força. Dilema? Sim, porque alguns deles serão os únicos com capacidade de ganhar em certos círculos eleitorais no Reino. Chama-se a isto uma decisão difícil: arriscar perder os lugares ou manter uma bancada dividida? Bem-vindo ao Reino (des)Unido. Será uma batalha interessante, a de Dezembro. E ainda falta votar o acordo de saída.

O outro podcast que lhe quero deixar é o Ezra Klein, nome do podcast e do ex-jornalista do Washington Post que fundou o Vox, um site de notícias mais explicadas que faz sucesso nos EUA. Ezra dedicou-se a fazer conversas sobre a democracia nos nossos tempos e as circunstâncias políticas novas em que vivemos. A que lhe quero recomendar chama-se "How politics became a war agains reality". Dá um belo guião para a política britânica, também para a americana. Espero que não seja um guião para o debate parlamentar que hoje começa no Parlamento português.

Até já, dia bom para si.

Bom dia!

Prepare-se para uma maratona: hoje começa a discutir-se o programa de Governo. É já às 10h00 e vai ser mesmo uma prova longa - todo o dia de hoje e também a manhã de amanhã. Nós vamos seguir tudo em direto e quero deixar-lhe apenas um guião de alguns pontos de interesse:

- António Costa chamou quatro ministros, mas não Centeno. Em si mesmo, isto é um sinal de que algo vai mesmo mudar. Lembra-se do que disse o primeiro-ministro ao Expresso no sábado? Que era preciso tirar a "visão financista das Finanças" à função pública? Parece antes que Costa quer tirar a visão de Centeno do Governo.

- E a esquerda, continua a apoiar o PS? Avaliando pelas primeiras propostas entregues na Assembleia, nada indica uma mudança de estratégia. Isto apesar de Costa ter jogado duro com o Bloco no fim de semana. Francisco Louçã já respondeu à letra. O Bloco seguirá os passos?

- Do lado do PSD, temos uma estreia (ou quase): Rui Rio voltará ao palanque 18 anos depois, agora em registo de campanha interna. Como será o frente a frente com o primeiro-ministro?

- E depois os pequenos: terão dez minutos para mostrar o que valem. Será suficiente para captarem as atenções. Como se vê por este desafio à direita, não faltará competição.

Para aquecer, o que lhe sugiro é que ouça a nossa Comissão Política, desta vez servida com um copo de vinho e uma parábola. Ou dois. Afinal, foi assim que Marcelo serviu a posse do Governo. Pedindo uma colheita exigente. Como escreve o Vítor Matos, é essa a A tragédia dos segundos Governos: transformar a água em vinho só mesmo por milagre.

OUTRAS NOTÍCIAS

Sócrates, quem mais? O ex-primeiro-ministro saiu satisfeito com o segundo dia da sua audição (o que indicia um certo conforto com Ivo Rosa). E, digamos, Sócrates continua igual a si próprio. A sua última versão é que até tentou evitar a nomeação de Armando Vara para a CDG. Este é nova.

A ADSE tem um problema. A avaliar pelas contas do Tribunal... de Contas, o sistema de saúde público será deficitário já em 2020. Esta também é nova.

A vacina para a meningite está de volta. Depois de ter esgotado nas farmácias, tudo indica que estará disponível já na segunda-feira. É, portanto, um regresso.

Lentes de contacto de risco. A Johnson & Johnson está a recolher diversos lotes das lentes de contacto de uso diário alegando risco da existência de “corpos estranhos nas lentes ou no líquido da embalagem”.

No Parlamento Europeu, dois votos fizeram estalar a guerra. Quatro resoluções sobre a busca e salvamento no Mediterrâneo foram chumbadas no Parlamento Europeu. Uma delas, chumbada por dois votos apenas, fez estalar a polémica entre a esquerda e a direita, além de ter dividido os eurodeputados portugueses. A Susana Frexes e a Madalda Ganhão contam porquê.

Na América, o impeachment ganha força. Ontem, um oficial do Exército acusou a Casa Branca de ter apagado partes da transcrição da chamada entre Trump e o Presidente ucraniano. Se é verdade...

Três mortos e nove feridos em tiroteio na Califórnia. Eu sei, parece que se transformou numa banalidade, mas um ato destes tem mesmo de ser registado sempre que acontece. Um dia as coisas mudam.

No Chile, o presidente tenta acalmar a contestação inédita com um pacote de medidas sociais. Mas deixo-lhe o título da Helena Bento, que fala por si: “O descontentamento e a raiva foram crescendo, crescendo, e houve um momento em que… pummm!”.

Mas a América Latina parece um barril de pólvora. Na Bolívia, os confrontos violentos aumentam devido a disputa eleitoral; na Argentina, a justiça livrou Cristina Kirchner de dois processos após ser eleita vice-Presidente.

E entretanto no Reino Unido, finalmente há uma luz verde para eleições. Será em Dezembro, pela primeira vez desde 1923. Mas é sobre isso que vos quero falar aqui à frente.

O QUE ANDO A LER

Na falta de tempo para terminar os muitos livros que tenho em mãos, tenho ouvido alguns podcasts que lhe quero recomendar hoje, porque vêm mesmo a calhar para a atualidade. Um é da Spectator, chama-se Coffee House Shots (procure no Spotify ou iTunes). O último episódio, com apenas 15 minutos, explica direitinho por que estas eleições não estão ganhas para Boris Johson. Sim, vou sintetizar: é que os conservadores só vão conseguir governar, desta vez, se conseguirem garantir uma maioria dos deputados; ao passo que o Labour, mesmo fragilizado e com uma liderança divisiva, podem conseguir fazer alianças com os nacionalistas escoceses e até com os liberais (os "remainers" que restam no país). Mais um dado relevante: Boris Johnson terá de decidir se quer candidatar os conservadores que mais o desafiaram na sua proposta de saída à força. Dilema? Sim, porque alguns deles serão os únicos com capacidade de ganhar em certos círculos eleitorais no Reino. Chama-se a isto uma decisão difícil: arriscar perder os lugares ou manter uma bancada dividida? Bem-vindo ao Reino (des)Unido. Será uma batalha interessante, a de Dezembro. E ainda falta votar o acordo de saída.

O outro podcast que lhe quero deixar é o Ezra Klein, nome do podcast e do ex-jornalista do Washington Post que fundou o Vox, um site de notícias mais explicadas que faz sucesso nos EUA. Ezra dedicou-se a fazer conversas sobre a democracia nos nossos tempos e as circunstâncias políticas novas em que vivemos. A que lhe quero recomendar chama-se "How politics became a war agains reality". Dá um belo guião para a política britânica, também para a americana. Espero que não seja um guião para o debate parlamentar que hoje começa no Parlamento português.

Até já, dia bom para si.

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