Refeições nas escolas. Pedidos de ajuda aumentam todos os dias

31-10-2020
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Se nos primeiros dias as escolas estranhavam a falta de pedidos de refeições, agora estão a braços com os números que não param de crescer. Em média, mais de 18 000 refeições estão a ser servidas em todo o país. Já não apenas para os beneficiários de escalão A e B, Mas também para novos pobres, cujos pais ficaram sem rendimento, ou em lay-off.

© Ivo Pereira / Global Imagens

Nos primeiros dias de portas fechadas, a Secundária Calazans Duarte, na Marinha Grande (escola de referência), não contava pelos dedos de uma mão as refeições servidas aos alunos que beneficiam da Ação Social Escolar. Mas à medida que avançou o Estado de Emergência, foi aumentando o número de pedidos, numa cadência que se vê crescer de dia para dia. Em apenas duas semanas, duplicou o número de refeições servidas.

"Neste momento estamos a servir perto de 150 refeições diárias. Mas devo confessar que estou muito preocupado com os próximos tempos. Isto vai disparar". Cesário Silva, diretor do agrupamento de escolas Marinha Grande Poente, conhece bem o terreno que pisa. Mais do que os beneficiários de escalão A e B (que habitualmente beneficiam do custo da refeição escolar na totalidade, ou pela metade, respetivamente), o professor prevê que no universo dos 2830 alunos, distribuídos pelas 10 escolas do agrupamento, em todos os níveis de ensino, "vai crescer o número dos que vão precisar da escola para comer". Que ninguém tenha dúvidas: "as escolas vão estar na linha da frente a combater os efeitos da pandemia".

No resto do país também se assiste a esta tendência. O número de refeições servidas nas escolas de acolhimento aumentou com o arranque do 3.º período, a 14 de abril. De acordo com dados enviados pelo ministério da Educação, nos primeiros dias, "foi servida uma média de cerca de 13 500 refeições diárias". Passada uma semana, são já 18 mil. A medida, que começou por estar limitada aos alunos do escalão A foi, entretanto, alargada ao escalão B, "quase duplicando a possibilidade de oferta de refeições escolares", escreveu o ministério, em comunicado.

Regressando à Marinha Grande, parece estranho falarmos de um tecido social frágil num concelho que era apontado no todo nacional como um oásis da economia. Uma indústria farta, números de desemprego quase inexistente, sempre com um lugar cimeiro nos registos do Instituto Nacional de Estatística em matéria de poder de compra e nível de vida mais elevado. Mas à volta dessa cintura industrial, sempre houve franjas - sob o olhar atento dos três agrupamentos de escolas do concelho. Além do Poente, também o Nascente e o da Vieira de Leiria. Mas os esforços concentram-se agora todos num deles, na escola-sede. E nos dias que hão de vir, à medida que as fábricas vão entrando em layoff e despedindo trabalhadores temporários. É aí que nasce o drama. "Daí virá uma crise social de uma grande dimensão", conclui Cesário Silva.

Todos os dias a cozinha da Secundária Calazans Duarte funciona quase como se fosse um tempo normal, apenas em menor quantidade. As refeições são preparadas e servidas através de take away, na sua maioria. Uma outra parte é entregue pela Câmara Municipal da Marinha Grande, onde há sempre uma equipa a fazer a distribuição: o almoço (sopa, segundo prato e fruta ou doce) e um suplemento (leite, fruta e pão). Célia Guerra, vereadora com pelouros como a Educação e Ação Social, fez as contas ao que serviram desde o dia 16 de março: mais de 2.500 refeições. Aqui inclui também "alguns avós, que percebemos que estavam sozinhos, e essa distribuição fazemos também ao fim de semana, em colaboração com a Associação Atlas e com a delegação da Cruz Vermelha Portuguesa".

Mas apesar de haver ainda um número considerável de alunos beneficiários da Ação Social que ainda não chegou aos pedidos de refeição, os sinais de que muitos outros vão chegar apareceram na linha Marinha Grande Solidária. Criada inicialmente para dar resposta aos mais velhos, é por aqui que os mais novos estão a fazer-se ouvir. "Não queremos deixar ninguém para trás", diz ao DN Célia Guerra. Estreou-se como vereadora num mantado que a põe à prova em cada anos: primeiros foi o grande incêndio do Pinhal do Rei (que consumiu mais de 80% da mata nacional), mais tarde o furacão Leslie, agora a pandemia. Este será, não tem dúvidas, o maior desafio.

"Somos um barril de pólvora"

Numa terra onde a História se fez de grande tumultos, revolta social e agitação política, os últimos anos mostravam uma aparente calma. Mas "a indústria de moldes já não andava bem. E sempre tivemos muita pobreza envergonhada. Infelizmente vai disparar, não só aqui. Vai ser transversal a todo o país", diz ao DN Margarida Balseiro Lopes, deputada do PSD na Assembleia da República, natural da Marinha Grande. Também ela se orgulhava do desemprego baixo, do espírito empreendedor dos industriais, mas antevê que as assimetrias sociais se tornem, por ali, muito mais evidentes, com a agravante de uma população "que terá dificuldade em pedir ajuda". "Preocupa-me que essa pobreza envergonhada não permita que as autarquias possam chegar a todos os que precisam de ajuda. Mas preocupa-me sobretudo que as Juntas de Freguesia e as Câmaras Municipais, que estão mais próximas, não estejam a receber do Governo apoio que se impõe nesta altura, para prestarem esse serviço", acrescenta Margarida Balseiro, apesar de admitir que "o Governo tem estado bem em muitas coisas, neste processo. Mas não é o caso do apoio às autarquias".

Quem entrou em layoff ou simplesmente perder o trabalho, está ainda a gerir esse novo normal, por perda parcial ou total do rendimento. "A Marinha Grande é um barril de pólvora. Vamos ter uma crise social sem precedentes", diz ao DN Maria Loureiro, dirigente comunista, também ela com redução do horário e do vencimento na fábrica onde trabalha. "Não tenho dúvida de que nas escolas isso se vai notar, no imediato".

Entrega de refeições em casa na Marinha Grande © DR

Ricardo Vicente, deputado do Bloco de Esquerda eleito pelo distrito de Leiria, vaticina o mesmo. "O crescimento do número de pessoas com dificuldades económicas no concelho da Marinha Grande, como no país, em boa parte deve-se a decisões erradas por parte do Governo. O Bloco de Esquerda propôs que o Estado de Emergência fosse acompanhada de uma proibição dos despedimentos, independentemente do vínculo laboral de cada trabalhador, de forma a proteger os trabalhadores mais vulneráveis, em especial os precários. Esta medida seria acompanhada de uma garantia de pagamento de salários na sua integra durante os meses de março e abril, para os quais o Governo deveria mobilizar apoios financeiros à pequenas empresas". Mas a proposta foi chumbada.

O Governo optou por "atribuir apoios empresariais através do recurso ao lay-off simplificado, o que reduz 1/3 dos salários declarados a toda a gente, apoiando simultaneamente empresas com e sem dificuldades económicas para manter os empregos. Por outro lado permitiu o acesso a apoios públicos sem acautelar os despedimentos dos trabalhadores precários, por isso as empresas estão a despedir os mais vulneráveis, os trabalhadores temporários, recibos verdes e contratados a prazo". Um dos exemplos apontado pelo BE tornou-se público recentemente, quando a Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria (CIMRL), a Associação Empresarial da Região de Leiria (NERLEI) e o Instituto Politécnico de Leiria (IPL) anunciaram a criação de um Gabinete Económico e Social Pós-Pandemia. "Ora esse gabinete vai ser presidido pelo senhor Jorge Santos, administrador de uma empresa que despediu dezenas de precários na Marinha Grande", adianta Ricardo Vicente.

Há cerca de 150 mil alunos de escalão social que não recorrem às escolas

Por outro lado, um pouco por todo o país, continua a existir um elevado número de crianças e jovens beneficiários dos dois principais escalões de Ação Social Escolar (A e B) que não tem recorrido à alimentação nas escolas designadas para o efeito.

A discussão sobre a necessidade de encerrar ou não as escolas ainda ia no adro, já se fazia da alimentação tema prioritário. Questionada numa audição parlamentar sobre o que deveria pesar nesta decisão, a ministra da Saúde, lembrava que a mesma dependia de uma séria ponderação, principalmente por haver crianças que poderiam ficar sem refeições porque é nas escolas que as têm. Por isso, na primeira semana que se previa de portas fechadas, o governo anunciou que mais de 700 escolas passariam a abrir com o propósito de garantir refeições aos estudantes com escalões sociais.

Desde o início dessa mesma semana, 16 de março, e até 23 de abril, cerca de 275 mil crianças e jovens beneficiaram deste serviço, segundo dados enviados ao DN pelo Ministério da Educação. No entanto, de acordo com o mais recente relatório Estado da Educação, em 2018 havia 424 mil alunos do ensino regular público dependentes do escalão A e B de ação social - retirando o pré-escolar à equação. O que significa que há milhares de alunos onde a alimentação prestada pelas escolas não tem chegado, desde o arranque da pandemia em Portugal. São cerca de 150 mil.

Não se poderá afirmar necessariamente que todas estas crianças e jovens estejam a passar fome, alerta Filinto Lima, dirigente da Associação Nacional de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Na sua perspetiva, estes milhares não são mais do que o somatório de uma realidade permeável pelas ações de solidariedade de bancos alimentares e outras "ajudas próximas, como vizinhos e amigos". Mas também lembra que há "encarregados de educação que preferem ter os filhos resguardados em casa", em vez de "percorrer diariamente alguns quilómetros para levantar o almoço".

É na região Norte onde se concentra a maioria dos estabelecimentos de ensino abertos para gerir estas refeições - quase 300. Mas é a zona de Lisboa, com 194 escolas com este serviço, que reúne maior procura dos estudantes por refeições. Segue-se imediatamente o Norte, Centro, Algarve e, por fim, Alentejo, de acordo com os dados do Ministério da Educação.

Cada escola tem ao seu encargo definir, em conjunto com as autarquias e os prestadores de serviço, o meio mais eficaz de assegurar estas refeições. No caso de Lisboa, por exemplo, a autarquia anunciou que os pais com crianças no jardim de infância e 1.º ciclo teriam de ir buscar as refeições à escola. As refeições incluem o pequeno-almoço, almoço (com sopa, prato principal e fruta) e ainda lanche (sandes, acompanhada de leite ou fruta). Já na Golegã, a autarquia comprometeu-se a fazer a entrega porta-a-porta a todos os alunos.

Se nos primeiros dias as escolas estranhavam a falta de pedidos de refeições, agora estão a braços com os números que não param de crescer. Em média, mais de 18 000 refeições estão a ser servidas em todo o país. Já não apenas para os beneficiários de escalão A e B, Mas também para novos pobres, cujos pais ficaram sem rendimento, ou em lay-off.

© Ivo Pereira / Global Imagens

Nos primeiros dias de portas fechadas, a Secundária Calazans Duarte, na Marinha Grande (escola de referência), não contava pelos dedos de uma mão as refeições servidas aos alunos que beneficiam da Ação Social Escolar. Mas à medida que avançou o Estado de Emergência, foi aumentando o número de pedidos, numa cadência que se vê crescer de dia para dia. Em apenas duas semanas, duplicou o número de refeições servidas.

"Neste momento estamos a servir perto de 150 refeições diárias. Mas devo confessar que estou muito preocupado com os próximos tempos. Isto vai disparar". Cesário Silva, diretor do agrupamento de escolas Marinha Grande Poente, conhece bem o terreno que pisa. Mais do que os beneficiários de escalão A e B (que habitualmente beneficiam do custo da refeição escolar na totalidade, ou pela metade, respetivamente), o professor prevê que no universo dos 2830 alunos, distribuídos pelas 10 escolas do agrupamento, em todos os níveis de ensino, "vai crescer o número dos que vão precisar da escola para comer". Que ninguém tenha dúvidas: "as escolas vão estar na linha da frente a combater os efeitos da pandemia".

No resto do país também se assiste a esta tendência. O número de refeições servidas nas escolas de acolhimento aumentou com o arranque do 3.º período, a 14 de abril. De acordo com dados enviados pelo ministério da Educação, nos primeiros dias, "foi servida uma média de cerca de 13 500 refeições diárias". Passada uma semana, são já 18 mil. A medida, que começou por estar limitada aos alunos do escalão A foi, entretanto, alargada ao escalão B, "quase duplicando a possibilidade de oferta de refeições escolares", escreveu o ministério, em comunicado.

Regressando à Marinha Grande, parece estranho falarmos de um tecido social frágil num concelho que era apontado no todo nacional como um oásis da economia. Uma indústria farta, números de desemprego quase inexistente, sempre com um lugar cimeiro nos registos do Instituto Nacional de Estatística em matéria de poder de compra e nível de vida mais elevado. Mas à volta dessa cintura industrial, sempre houve franjas - sob o olhar atento dos três agrupamentos de escolas do concelho. Além do Poente, também o Nascente e o da Vieira de Leiria. Mas os esforços concentram-se agora todos num deles, na escola-sede. E nos dias que hão de vir, à medida que as fábricas vão entrando em layoff e despedindo trabalhadores temporários. É aí que nasce o drama. "Daí virá uma crise social de uma grande dimensão", conclui Cesário Silva.

Todos os dias a cozinha da Secundária Calazans Duarte funciona quase como se fosse um tempo normal, apenas em menor quantidade. As refeições são preparadas e servidas através de take away, na sua maioria. Uma outra parte é entregue pela Câmara Municipal da Marinha Grande, onde há sempre uma equipa a fazer a distribuição: o almoço (sopa, segundo prato e fruta ou doce) e um suplemento (leite, fruta e pão). Célia Guerra, vereadora com pelouros como a Educação e Ação Social, fez as contas ao que serviram desde o dia 16 de março: mais de 2.500 refeições. Aqui inclui também "alguns avós, que percebemos que estavam sozinhos, e essa distribuição fazemos também ao fim de semana, em colaboração com a Associação Atlas e com a delegação da Cruz Vermelha Portuguesa".

Mas apesar de haver ainda um número considerável de alunos beneficiários da Ação Social que ainda não chegou aos pedidos de refeição, os sinais de que muitos outros vão chegar apareceram na linha Marinha Grande Solidária. Criada inicialmente para dar resposta aos mais velhos, é por aqui que os mais novos estão a fazer-se ouvir. "Não queremos deixar ninguém para trás", diz ao DN Célia Guerra. Estreou-se como vereadora num mantado que a põe à prova em cada anos: primeiros foi o grande incêndio do Pinhal do Rei (que consumiu mais de 80% da mata nacional), mais tarde o furacão Leslie, agora a pandemia. Este será, não tem dúvidas, o maior desafio.

"Somos um barril de pólvora"

Numa terra onde a História se fez de grande tumultos, revolta social e agitação política, os últimos anos mostravam uma aparente calma. Mas "a indústria de moldes já não andava bem. E sempre tivemos muita pobreza envergonhada. Infelizmente vai disparar, não só aqui. Vai ser transversal a todo o país", diz ao DN Margarida Balseiro Lopes, deputada do PSD na Assembleia da República, natural da Marinha Grande. Também ela se orgulhava do desemprego baixo, do espírito empreendedor dos industriais, mas antevê que as assimetrias sociais se tornem, por ali, muito mais evidentes, com a agravante de uma população "que terá dificuldade em pedir ajuda". "Preocupa-me que essa pobreza envergonhada não permita que as autarquias possam chegar a todos os que precisam de ajuda. Mas preocupa-me sobretudo que as Juntas de Freguesia e as Câmaras Municipais, que estão mais próximas, não estejam a receber do Governo apoio que se impõe nesta altura, para prestarem esse serviço", acrescenta Margarida Balseiro, apesar de admitir que "o Governo tem estado bem em muitas coisas, neste processo. Mas não é o caso do apoio às autarquias".

Quem entrou em layoff ou simplesmente perder o trabalho, está ainda a gerir esse novo normal, por perda parcial ou total do rendimento. "A Marinha Grande é um barril de pólvora. Vamos ter uma crise social sem precedentes", diz ao DN Maria Loureiro, dirigente comunista, também ela com redução do horário e do vencimento na fábrica onde trabalha. "Não tenho dúvida de que nas escolas isso se vai notar, no imediato".

Entrega de refeições em casa na Marinha Grande © DR

Ricardo Vicente, deputado do Bloco de Esquerda eleito pelo distrito de Leiria, vaticina o mesmo. "O crescimento do número de pessoas com dificuldades económicas no concelho da Marinha Grande, como no país, em boa parte deve-se a decisões erradas por parte do Governo. O Bloco de Esquerda propôs que o Estado de Emergência fosse acompanhada de uma proibição dos despedimentos, independentemente do vínculo laboral de cada trabalhador, de forma a proteger os trabalhadores mais vulneráveis, em especial os precários. Esta medida seria acompanhada de uma garantia de pagamento de salários na sua integra durante os meses de março e abril, para os quais o Governo deveria mobilizar apoios financeiros à pequenas empresas". Mas a proposta foi chumbada.

O Governo optou por "atribuir apoios empresariais através do recurso ao lay-off simplificado, o que reduz 1/3 dos salários declarados a toda a gente, apoiando simultaneamente empresas com e sem dificuldades económicas para manter os empregos. Por outro lado permitiu o acesso a apoios públicos sem acautelar os despedimentos dos trabalhadores precários, por isso as empresas estão a despedir os mais vulneráveis, os trabalhadores temporários, recibos verdes e contratados a prazo". Um dos exemplos apontado pelo BE tornou-se público recentemente, quando a Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria (CIMRL), a Associação Empresarial da Região de Leiria (NERLEI) e o Instituto Politécnico de Leiria (IPL) anunciaram a criação de um Gabinete Económico e Social Pós-Pandemia. "Ora esse gabinete vai ser presidido pelo senhor Jorge Santos, administrador de uma empresa que despediu dezenas de precários na Marinha Grande", adianta Ricardo Vicente.

Há cerca de 150 mil alunos de escalão social que não recorrem às escolas

Por outro lado, um pouco por todo o país, continua a existir um elevado número de crianças e jovens beneficiários dos dois principais escalões de Ação Social Escolar (A e B) que não tem recorrido à alimentação nas escolas designadas para o efeito.

A discussão sobre a necessidade de encerrar ou não as escolas ainda ia no adro, já se fazia da alimentação tema prioritário. Questionada numa audição parlamentar sobre o que deveria pesar nesta decisão, a ministra da Saúde, lembrava que a mesma dependia de uma séria ponderação, principalmente por haver crianças que poderiam ficar sem refeições porque é nas escolas que as têm. Por isso, na primeira semana que se previa de portas fechadas, o governo anunciou que mais de 700 escolas passariam a abrir com o propósito de garantir refeições aos estudantes com escalões sociais.

Desde o início dessa mesma semana, 16 de março, e até 23 de abril, cerca de 275 mil crianças e jovens beneficiaram deste serviço, segundo dados enviados ao DN pelo Ministério da Educação. No entanto, de acordo com o mais recente relatório Estado da Educação, em 2018 havia 424 mil alunos do ensino regular público dependentes do escalão A e B de ação social - retirando o pré-escolar à equação. O que significa que há milhares de alunos onde a alimentação prestada pelas escolas não tem chegado, desde o arranque da pandemia em Portugal. São cerca de 150 mil.

Não se poderá afirmar necessariamente que todas estas crianças e jovens estejam a passar fome, alerta Filinto Lima, dirigente da Associação Nacional de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Na sua perspetiva, estes milhares não são mais do que o somatório de uma realidade permeável pelas ações de solidariedade de bancos alimentares e outras "ajudas próximas, como vizinhos e amigos". Mas também lembra que há "encarregados de educação que preferem ter os filhos resguardados em casa", em vez de "percorrer diariamente alguns quilómetros para levantar o almoço".

É na região Norte onde se concentra a maioria dos estabelecimentos de ensino abertos para gerir estas refeições - quase 300. Mas é a zona de Lisboa, com 194 escolas com este serviço, que reúne maior procura dos estudantes por refeições. Segue-se imediatamente o Norte, Centro, Algarve e, por fim, Alentejo, de acordo com os dados do Ministério da Educação.

Cada escola tem ao seu encargo definir, em conjunto com as autarquias e os prestadores de serviço, o meio mais eficaz de assegurar estas refeições. No caso de Lisboa, por exemplo, a autarquia anunciou que os pais com crianças no jardim de infância e 1.º ciclo teriam de ir buscar as refeições à escola. As refeições incluem o pequeno-almoço, almoço (com sopa, prato principal e fruta) e ainda lanche (sandes, acompanhada de leite ou fruta). Já na Golegã, a autarquia comprometeu-se a fazer a entrega porta-a-porta a todos os alunos.

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