Professor Surdo Francisco Goulão * SURDO *: EDUCAÇÃO ESPECIAL: "90% DAS DIFICULDADES ESTÃO À MARGEM"

24-06-2020
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fonte educareEducação especial: "90% das dificuldades estão à margem"Teresa Sousa| 2008-02-15Pais, professores e investigadores temem que as mudanças previstas na ensinoespecial deixem de fora todo um conjunto de crianças cujas dificuldades deaprendizagem não foram tipificadas segundo a actual legislação.O Parlamento discute hoje o novo enquadramento legislativo para a educaçãoespecial, no meio de uma encruzilhada de opiniões contestatárias e medidasno terreno. Ninguém se atreve a pôr em causa o ideal da escola inclusiva,mas pais, professores e especialistas manifestam expressivas reservas aoDecreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro, enquanto o Ministério da Educaçãose desdobra em acções para pôr em prática o seu modelo de integração.A ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, assinou ontem umprotocolo de colaboração entre a tutela e sete federações associadas aoensino especial. A formalização do acordo é uma de outras acções que seespera venham a ser tomadas para concretizar os objectivos do Governo para oensino especial. A saber: integrar, até 2013, no ensino regular 1300 alunosque frequentam actualmente escolas especializadas. Além deste protocolo, aministra assinou um outro, relativo à formação de professores. De acordo como previsto no documento, durante este ano lectivo, 1500 docentes receberão50 horas de formação na área do ensino especial.O entusiasmo do Governo com estas mudanças - a ministra chegou mesmo aafirmar sentir-se envergonhada, enquanto cidadã, com o estado do ensinoespecial nopaís - contrasta com as incertezas dos diversos parceiros sociais. A começarpor dois especialistas, ouvidos pelo EDUCARE.PT. Tanto David Rodrigues,professor na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica deLisboa, como Luís Miranda Correia, professor no Instituto de Estudos daCriança da Universidade do Minho, opõem-se ao método utilizado peloMinistério para classificar e identificar crianças com necessidadeseducativas especiais.Na opinião de Miranda Correia, no método CIF (Classificação Internacional deFuncionalidade), "a escala de avaliação é altamente subjectiva, não temqualquer rigor". De resto, como argumenta, "trata-se de uma classificaçãopara adultos e não para crianças". As mesmas críticas são esgrimidas porDavid Rodrigues, que acrescenta: "A elegibilidade, tal como é apanágio daCIF, deixa de fora muitos alunos com dificuldades".A mancha mais ou menos desconhecida de crianças com necessidades educativasque, não obstante, permanecem sem apoios específicos, é aliás umapreocupação que se repete de voz para voz, de opinião para opinião.Raquel Ferreira, da direcção do Agrupamento de Escolas de Vouzela, é um dosecos desta incerteza. "O que vai acontecer aos alunos que estavam ao abrigodo 319 [anteriordecreto-lei]? Estas são dúvidas ainda por esclarecer", declarou aoEDUCARE.PT. No mesmo sentido vai Fernando Magalhães, pai de uma criança comnecessidades educativas especiais e membro da Plataforma de Pais Pelo EnsinoEspecial, formada na sequência da publicação do n.º 3/08. "Há um conjuntoenorme de alunos que vão ficar excluídos da tipificação da CIF", afirmou. Ouseja, "vão ser identificadas como crianças normais, sem necessidade deapoios".De acordo com os dados do Ministério da Educação, há no ensino regular 49mil alunos com necessidades educativas especiais, sendo que o objectivo é acrescentar, a este número, 1300 alunos matriculados em escolas de ensino especial. Também aqui as opiniões são diversas. "Há estudos de prevalência a nível internacional que apontam para uma percentagem de 8% a 12% de crianças com necessidades educativas especiais permanentes", diz o investigador daUniversidade do Minho. O que significa que, em Portugal, haverá "75 mil alunos com dificuldades de aprendizagem severas".O actual enquadramento legal prevê a criação, por despacho ministerial, deescolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos, cegos e combaixa visão. O ponto 3 do artigo 4.º do decreto-lei refere ainda que, "paraapoiar a adequação do processo de ensino e de aprendizagem, podem as escolasou agrupamentos de escolas desenvolver respostas específicas diferenciadaspara alunos com perturbações do espectro do autismo e com multideficiência". Assim, serão criadas unidades de ensino estruturado para as perturbações do espectro autista e unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita.A especificação das dificuldades de aprendizagem a apoiar fica-se por aqui,o que leva Luís Miranda Correia a declarar que "mais de 90% das dificuldadesestão à margem desta legislação". Isto é, não há referências aos alunos comdificuldades intelectuais (deficiência mental), com dificuldades deaprendizagem específicas (como acontece com a dislexia), com perturbaçõesemocionais e do comportamento grave, ou com problemas de comunicação.Fernando Magalhães como que decalca esta mesma ideia. "São excluídas dasescolas de referência ou das unidades de ensino e de apoio nelas previstasas respostas específicas para as perturbações do desenvolvimento, adeficiência mental e as perturbações da personalidade e do comportamento",enumera.A falta de resposta precoce a estes casos não tipificados na lei leva, no entender de Miranda Correia, a aumentar o número das crianças "frustradas, tensas e ansiosas".O investigador antecipa desfechos: "São crianças com o futuro hipotecado ecaracterizadas por um percurso de abandono escolar." No que é corroboradopor David Rodrigues. "Tememos que muitos alunos com dificuldades, aoser-lhes barrado o acesso a um apoio especializado, engrossem as nossastristes estatísticas de insucesso e abandono escolar", adianta o presidentedo Fórum de Estudos de Educação Inclusiva.Com todas as energias direccionadas para a recente legislação, o Ministérioda Educação vai atingindo as metas definidas até ao objectivo final, o deconcretizar a escola inclusiva até 2013. A formação de professores é uma dasmetas da lista de tarefas. Durante os meses de Março a Maio a aposta é naformação. O que suscita as críticas de David Rodrigues. "Precisamos demelhorar a política de formação em serviço e não de fazer 'lambuzadelas' de30 horas de formação", comenta.Escolas preparam alterações, pais receiam mudançasEntretanto, e antes mesmo da publicação do decreto-lei, desde o início doano lectivo que as escolas se têm vindo a preparar para as mudançasorganizacionais. Para lá das escolas de referência, a lei estipula uma novaforma de apoios, que assenta na criação de unidades de apoio especializado,que "concentram alunos de um ou mais concelhos, em função da sua localizaçãoe rede de transportes existentes". O agrupamento de escolas de Vouzela é umdos que, no terreno, têm desenvolvido acções concretas para se adaptar aonovo esquema de funcionamento. O agrupamento tem ao seu serviço um professordo ensino especial e uma equipa de apoios educativos e prepara-se paraelaborar uma candidatura a escola de referência. Como avançou RaquelFerreira ao EDUCARE.PT, o agrupamento aproveitou, também, as directivas daactual legislação para celebrar protocolos de colaboração e parcerias cominstituições privadas e públicas da região para prestação de serviços naárea da educação especial.Os exemplos de boas práticas que se vão fazendo ouvir não chegam, noentanto, para acalmar a plataforma de pais. A "falta de condições noterreno" é um dos motivos cimeiros para a contestação à actual lei. Esta e a"regressão" que a transferência para o ensino regular pode provocar nascrianças são as causas que levaram os pais a pedir audiências ao Ministérioe a trazer o caso para a discussão pública. Fernando Magalhães não condenaos ideias de inclusão invocados na lei. "Todos os dias, quando vamos aosupermercado com os nossos filhos ou quando os metemos nos autocarrossozinhos estamos a lutar pela inclusão", argumenta. Mas os pais temem asconsequências que a alteração possa provocar no equilíbrio emocional e nodesenvolvimento dos filhos.

fonte educareEducação especial: "90% das dificuldades estão à margem"Teresa Sousa| 2008-02-15Pais, professores e investigadores temem que as mudanças previstas na ensinoespecial deixem de fora todo um conjunto de crianças cujas dificuldades deaprendizagem não foram tipificadas segundo a actual legislação.O Parlamento discute hoje o novo enquadramento legislativo para a educaçãoespecial, no meio de uma encruzilhada de opiniões contestatárias e medidasno terreno. Ninguém se atreve a pôr em causa o ideal da escola inclusiva,mas pais, professores e especialistas manifestam expressivas reservas aoDecreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro, enquanto o Ministério da Educaçãose desdobra em acções para pôr em prática o seu modelo de integração.A ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, assinou ontem umprotocolo de colaboração entre a tutela e sete federações associadas aoensino especial. A formalização do acordo é uma de outras acções que seespera venham a ser tomadas para concretizar os objectivos do Governo para oensino especial. A saber: integrar, até 2013, no ensino regular 1300 alunosque frequentam actualmente escolas especializadas. Além deste protocolo, aministra assinou um outro, relativo à formação de professores. De acordo como previsto no documento, durante este ano lectivo, 1500 docentes receberão50 horas de formação na área do ensino especial.O entusiasmo do Governo com estas mudanças - a ministra chegou mesmo aafirmar sentir-se envergonhada, enquanto cidadã, com o estado do ensinoespecial nopaís - contrasta com as incertezas dos diversos parceiros sociais. A começarpor dois especialistas, ouvidos pelo EDUCARE.PT. Tanto David Rodrigues,professor na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica deLisboa, como Luís Miranda Correia, professor no Instituto de Estudos daCriança da Universidade do Minho, opõem-se ao método utilizado peloMinistério para classificar e identificar crianças com necessidadeseducativas especiais.Na opinião de Miranda Correia, no método CIF (Classificação Internacional deFuncionalidade), "a escala de avaliação é altamente subjectiva, não temqualquer rigor". De resto, como argumenta, "trata-se de uma classificaçãopara adultos e não para crianças". As mesmas críticas são esgrimidas porDavid Rodrigues, que acrescenta: "A elegibilidade, tal como é apanágio daCIF, deixa de fora muitos alunos com dificuldades".A mancha mais ou menos desconhecida de crianças com necessidades educativasque, não obstante, permanecem sem apoios específicos, é aliás umapreocupação que se repete de voz para voz, de opinião para opinião.Raquel Ferreira, da direcção do Agrupamento de Escolas de Vouzela, é um dosecos desta incerteza. "O que vai acontecer aos alunos que estavam ao abrigodo 319 [anteriordecreto-lei]? Estas são dúvidas ainda por esclarecer", declarou aoEDUCARE.PT. No mesmo sentido vai Fernando Magalhães, pai de uma criança comnecessidades educativas especiais e membro da Plataforma de Pais Pelo EnsinoEspecial, formada na sequência da publicação do n.º 3/08. "Há um conjuntoenorme de alunos que vão ficar excluídos da tipificação da CIF", afirmou. Ouseja, "vão ser identificadas como crianças normais, sem necessidade deapoios".De acordo com os dados do Ministério da Educação, há no ensino regular 49mil alunos com necessidades educativas especiais, sendo que o objectivo é acrescentar, a este número, 1300 alunos matriculados em escolas de ensino especial. Também aqui as opiniões são diversas. "Há estudos de prevalência a nível internacional que apontam para uma percentagem de 8% a 12% de crianças com necessidades educativas especiais permanentes", diz o investigador daUniversidade do Minho. O que significa que, em Portugal, haverá "75 mil alunos com dificuldades de aprendizagem severas".O actual enquadramento legal prevê a criação, por despacho ministerial, deescolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos, cegos e combaixa visão. O ponto 3 do artigo 4.º do decreto-lei refere ainda que, "paraapoiar a adequação do processo de ensino e de aprendizagem, podem as escolasou agrupamentos de escolas desenvolver respostas específicas diferenciadaspara alunos com perturbações do espectro do autismo e com multideficiência". Assim, serão criadas unidades de ensino estruturado para as perturbações do espectro autista e unidades de apoio especializado para a educação de alunos com multideficiência e surdocegueira congénita.A especificação das dificuldades de aprendizagem a apoiar fica-se por aqui,o que leva Luís Miranda Correia a declarar que "mais de 90% das dificuldadesestão à margem desta legislação". Isto é, não há referências aos alunos comdificuldades intelectuais (deficiência mental), com dificuldades deaprendizagem específicas (como acontece com a dislexia), com perturbaçõesemocionais e do comportamento grave, ou com problemas de comunicação.Fernando Magalhães como que decalca esta mesma ideia. "São excluídas dasescolas de referência ou das unidades de ensino e de apoio nelas previstasas respostas específicas para as perturbações do desenvolvimento, adeficiência mental e as perturbações da personalidade e do comportamento",enumera.A falta de resposta precoce a estes casos não tipificados na lei leva, no entender de Miranda Correia, a aumentar o número das crianças "frustradas, tensas e ansiosas".O investigador antecipa desfechos: "São crianças com o futuro hipotecado ecaracterizadas por um percurso de abandono escolar." No que é corroboradopor David Rodrigues. "Tememos que muitos alunos com dificuldades, aoser-lhes barrado o acesso a um apoio especializado, engrossem as nossastristes estatísticas de insucesso e abandono escolar", adianta o presidentedo Fórum de Estudos de Educação Inclusiva.Com todas as energias direccionadas para a recente legislação, o Ministérioda Educação vai atingindo as metas definidas até ao objectivo final, o deconcretizar a escola inclusiva até 2013. A formação de professores é uma dasmetas da lista de tarefas. Durante os meses de Março a Maio a aposta é naformação. O que suscita as críticas de David Rodrigues. "Precisamos demelhorar a política de formação em serviço e não de fazer 'lambuzadelas' de30 horas de formação", comenta.Escolas preparam alterações, pais receiam mudançasEntretanto, e antes mesmo da publicação do decreto-lei, desde o início doano lectivo que as escolas se têm vindo a preparar para as mudançasorganizacionais. Para lá das escolas de referência, a lei estipula uma novaforma de apoios, que assenta na criação de unidades de apoio especializado,que "concentram alunos de um ou mais concelhos, em função da sua localizaçãoe rede de transportes existentes". O agrupamento de escolas de Vouzela é umdos que, no terreno, têm desenvolvido acções concretas para se adaptar aonovo esquema de funcionamento. O agrupamento tem ao seu serviço um professordo ensino especial e uma equipa de apoios educativos e prepara-se paraelaborar uma candidatura a escola de referência. Como avançou RaquelFerreira ao EDUCARE.PT, o agrupamento aproveitou, também, as directivas daactual legislação para celebrar protocolos de colaboração e parcerias cominstituições privadas e públicas da região para prestação de serviços naárea da educação especial.Os exemplos de boas práticas que se vão fazendo ouvir não chegam, noentanto, para acalmar a plataforma de pais. A "falta de condições noterreno" é um dos motivos cimeiros para a contestação à actual lei. Esta e a"regressão" que a transferência para o ensino regular pode provocar nascrianças são as causas que levaram os pais a pedir audiências ao Ministérioe a trazer o caso para a discussão pública. Fernando Magalhães não condenaos ideias de inclusão invocados na lei. "Todos os dias, quando vamos aosupermercado com os nossos filhos ou quando os metemos nos autocarrossozinhos estamos a lutar pela inclusão", argumenta. Mas os pais temem asconsequências que a alteração possa provocar no equilíbrio emocional e nodesenvolvimento dos filhos.

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