Muxicongo: O “Sentimento do Poema” em Amândio Sousa Dantas

28-09-2020
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“O
romance apresenta imagens perceptíveis com sensações definidas, e a poesia com
sensações indefinidas, para cujo fim a música é uma parte essencial, dado que a
nossa concepção mais indefinida é a compreensão de um som doce”.

Edgar Allan Poe

Aí está o novo livro de
Amândio Sousa Dantas. Algumas pessoas questionar-se-ão do nosso persistente atrevimento
em falar de novo deste inspirado vate limiano, quando já o fizemos por duas
vezes este ano, nomeadamente numa das nossas crónicas – a propósito da sua
magnífica “Antologia Poética” – e no “Anunciador das Feiras Novas, onde o
baptizaríamos de “um poeta mesológico do Lethes e do Mundo”. Na altura, fizemos
questão de salientar que sempre soubemos perscrutar-lhe a alma, porque o
sentimos possuidor das três distinções mais imediatas e óbvias do mundo da
mente: o “Puro Intelecto”, o “Gosto” e o “Sentido Moral”, parafraseando Edgar
Allan Poe quando afirma que “da mesma maneira que o Intelecto se preocupa com a
Verdade, assim o Gosto nos informa sobre o Belo, enquanto o Sentido Moral se
responsabiliza pelo Dever”. Achamos que, pelo ajuste das distinções, não serão
necessários mais condimentos ou adjectivações para considerarmos Amândio Sousa
Dantas, sem o acantonarmos ao nosso espaço geográfico e sem menosprezarmos
outros poetas que tanto admiramos, um dos grandes poetas contemporâneos
nacionais. Tal facto, tendo em conta a nossa convincente afirmação (tão só,
sedimentada pelo nosso gosto pessoal), permite-nos, ao mesmo tempo, formular alguma
concepção especulativa no que concerne à “mimese poética” de muitos outros
poetas – e poetisas – de quem gostamos. E não são poucos, tendo em conta que todos
eles têm o seu lugar próprio na nossa percepção cognitiva – escolha de uma impressão, ou efeito, a ser
transmitido (E. A. Poe) – de cada um. À sua vez, iremos falar de todos
aqueles que, “poetando”, nos criam um estado emocional, uma saudável nostalgia
ou uma sonorização melódica – sim, com certa musicalidade –, transmitindo
partilha de pensamento (mesmo quando na dor), porque a poesia se repercute na
linguagem humana, utilizada com fins estéticos, compreendendo mesmo aspectos
“metafísicos”, no sentido de sua imaterialidade e da possibilidade de se
transcender ao mundo fático.

Mas, voltemos ao
Amândio Sousa Dantas e ao seu mais recente brado poético – “Sentimento do
Poema”, qual espelho de revelação, voo, existência, desafio, presságio, despedida,
tristeza, silêncio, ternura, abraço, olhar, sombra, caminhos, medo, dúvida,
natureza, rio, vento, reconciliação, desolação, entardecer, paisagem, rumo,
luz, assombro, adeus, tempo, palavra, vida como um fio, comunhão, esperança,
amor e eternidade – complexo lexical em que devíamos ter usado aspas, visto que
extraído dos textos –, melhor expressaria o sentimento profundo do poeta, em
cuja “metafísica não segue a [sua] minh’alma” (sou mais de olhos na paisagem / pela viagem de Ulisses), e que tudo
conjugado dissimula, de uma forma perfeita, uma canção para seu irmão: “As
lágrimas transformaram-se / em vidro estilhaçado: / e eu, meu irmão / teu rosto
não alcanço, / e só na minha alma um rio corre / sem cessar – eu não o posso
atravessar”. Se não fosse a riqueza de conteúdo que percorre todo o “Sentimento
do Poema”, onde “o poeta é responsável pelo ar que o rodeia” e “um fio se tece
por sua dor”, bem que poderíamos ficar por aqui. Contudo, mais nos apraz dizer
que o “Sentimento do Poema”, apesar de nos revelar um sentimento amargurado (de
dor) de quem perdeu algo que o complementava – pensa crescer árvore / sol ou o amor exacto / no esplendor do dia
(Luís Dantas) –, produzindo um efeito profundo e duradouro de que “só a força
invisível do poema” o contempla: “Hoje conheço o silêncio mais fundo, / como o
estremecer da terra e / de nós a desprender-se. / Ali, uma fenda se abre dentro
de mim. / Eis-me sozinho a estancar a dor”, é, simultaneamente, um hino à
imortalidade e ao amor: “Imortal / sou e / o que de mim / ficou? / o amor”. De
facto, a poesia em Amândio Sousa Dantas flui com a maior naturalidade porque,
felizmente, e extraindo das suas próprias palavras, “o poeta não se refugia na
cara da dor. / Só a vida se abre ao conhecimento”. Só os grandes poetas
conseguem ver, numa verdadeira e sensitiva reconciliação, “que a compaixão se
funde no poema”. Mais não diremos, ficando o apelo à sua leitura e
interiorização, como um abraço que nasce da emoção: “Assim – sem mais nem menos
– / Um abraço do poema ao sol: / e toda a sombra / do poeta / por ele se
ilumina”. Simplesmente, sublime…

“Sentimento do Poema”,
mais um livro com nota máxima!

“O
romance apresenta imagens perceptíveis com sensações definidas, e a poesia com
sensações indefinidas, para cujo fim a música é uma parte essencial, dado que a
nossa concepção mais indefinida é a compreensão de um som doce”.

Edgar Allan Poe

Aí está o novo livro de
Amândio Sousa Dantas. Algumas pessoas questionar-se-ão do nosso persistente atrevimento
em falar de novo deste inspirado vate limiano, quando já o fizemos por duas
vezes este ano, nomeadamente numa das nossas crónicas – a propósito da sua
magnífica “Antologia Poética” – e no “Anunciador das Feiras Novas, onde o
baptizaríamos de “um poeta mesológico do Lethes e do Mundo”. Na altura, fizemos
questão de salientar que sempre soubemos perscrutar-lhe a alma, porque o
sentimos possuidor das três distinções mais imediatas e óbvias do mundo da
mente: o “Puro Intelecto”, o “Gosto” e o “Sentido Moral”, parafraseando Edgar
Allan Poe quando afirma que “da mesma maneira que o Intelecto se preocupa com a
Verdade, assim o Gosto nos informa sobre o Belo, enquanto o Sentido Moral se
responsabiliza pelo Dever”. Achamos que, pelo ajuste das distinções, não serão
necessários mais condimentos ou adjectivações para considerarmos Amândio Sousa
Dantas, sem o acantonarmos ao nosso espaço geográfico e sem menosprezarmos
outros poetas que tanto admiramos, um dos grandes poetas contemporâneos
nacionais. Tal facto, tendo em conta a nossa convincente afirmação (tão só,
sedimentada pelo nosso gosto pessoal), permite-nos, ao mesmo tempo, formular alguma
concepção especulativa no que concerne à “mimese poética” de muitos outros
poetas – e poetisas – de quem gostamos. E não são poucos, tendo em conta que todos
eles têm o seu lugar próprio na nossa percepção cognitiva – escolha de uma impressão, ou efeito, a ser
transmitido (E. A. Poe) – de cada um. À sua vez, iremos falar de todos
aqueles que, “poetando”, nos criam um estado emocional, uma saudável nostalgia
ou uma sonorização melódica – sim, com certa musicalidade –, transmitindo
partilha de pensamento (mesmo quando na dor), porque a poesia se repercute na
linguagem humana, utilizada com fins estéticos, compreendendo mesmo aspectos
“metafísicos”, no sentido de sua imaterialidade e da possibilidade de se
transcender ao mundo fático.

Mas, voltemos ao
Amândio Sousa Dantas e ao seu mais recente brado poético – “Sentimento do
Poema”, qual espelho de revelação, voo, existência, desafio, presságio, despedida,
tristeza, silêncio, ternura, abraço, olhar, sombra, caminhos, medo, dúvida,
natureza, rio, vento, reconciliação, desolação, entardecer, paisagem, rumo,
luz, assombro, adeus, tempo, palavra, vida como um fio, comunhão, esperança,
amor e eternidade – complexo lexical em que devíamos ter usado aspas, visto que
extraído dos textos –, melhor expressaria o sentimento profundo do poeta, em
cuja “metafísica não segue a [sua] minh’alma” (sou mais de olhos na paisagem / pela viagem de Ulisses), e que tudo
conjugado dissimula, de uma forma perfeita, uma canção para seu irmão: “As
lágrimas transformaram-se / em vidro estilhaçado: / e eu, meu irmão / teu rosto
não alcanço, / e só na minha alma um rio corre / sem cessar – eu não o posso
atravessar”. Se não fosse a riqueza de conteúdo que percorre todo o “Sentimento
do Poema”, onde “o poeta é responsável pelo ar que o rodeia” e “um fio se tece
por sua dor”, bem que poderíamos ficar por aqui. Contudo, mais nos apraz dizer
que o “Sentimento do Poema”, apesar de nos revelar um sentimento amargurado (de
dor) de quem perdeu algo que o complementava – pensa crescer árvore / sol ou o amor exacto / no esplendor do dia
(Luís Dantas) –, produzindo um efeito profundo e duradouro de que “só a força
invisível do poema” o contempla: “Hoje conheço o silêncio mais fundo, / como o
estremecer da terra e / de nós a desprender-se. / Ali, uma fenda se abre dentro
de mim. / Eis-me sozinho a estancar a dor”, é, simultaneamente, um hino à
imortalidade e ao amor: “Imortal / sou e / o que de mim / ficou? / o amor”. De
facto, a poesia em Amândio Sousa Dantas flui com a maior naturalidade porque,
felizmente, e extraindo das suas próprias palavras, “o poeta não se refugia na
cara da dor. / Só a vida se abre ao conhecimento”. Só os grandes poetas
conseguem ver, numa verdadeira e sensitiva reconciliação, “que a compaixão se
funde no poema”. Mais não diremos, ficando o apelo à sua leitura e
interiorização, como um abraço que nasce da emoção: “Assim – sem mais nem menos
– / Um abraço do poema ao sol: / e toda a sombra / do poeta / por ele se
ilumina”. Simplesmente, sublime…

“Sentimento do Poema”,
mais um livro com nota máxima!

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