porosidade etérea: Os vossos poemas

24-06-2020
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Caros etéreos,Apesar de estarmos em período de férias, a participação no último passatempo foi excelente. Em menos de 24 horas chegaram mais de quarenta poemas.Como sabem, os primeiros 26 participantes que enviassem poemas com os temas propostos no último desafio receberiam livros.Assim sendo, receberão os seguintes livros:"Área Afectada" de Fernando Esteves Pinto1. Carla Marques (Ermesinde)2. José M. Silva (Santa Maria da Feira)3. Mary de Oliveira (Setúbal)4. Raquel Lacerda (Algés)5. Nuno Xavier (Braga)6. João Rasteiro (Coimbra)7. Fernando Machado Silva (Portimão)"Espelho Íntimo" de Torquato da Luz1. Raquel Lacerda (Algés)2. João Rasteiro (Coimbra)3. Fernando Machado Silva (Portimão)4. Mary de Oliveira (Setúbal)5. Andreia Silva (Vila Nova de Famalicão)6. Jorge Castro (Carcavelos)7. Luísa Henriques (Estarreja)8. Rita Pereira (Famões)Revista "Sulscrito" n.º 31. anothertrickster (Coimbra)2. Mary de Oliveira (Setúbal)3. Eduardo Aleixo (Lisboa)4. João Rasteiro (Coimbra)5. Fernando Machado Silva (Portimão)6. Gabriela Rocha Martins (Silves)"Este pão que nos come!" de Raul Veríssimo1. Carla Marques (Ermesinde)2. Luís Pinto (Nazaré)3. João Rasteiro (Coimbra)4. Fernando Machado Silva (Portimão)5. Fa menorEis os 26 poemas:Mote "Escrita"ESCRITAdespenteia-me as certezasrouba esta pausa que fiz para pensarsurpreende-se não hoje, mas sempre.baralha este jogo de cartas viciadas.vejo a batota que fazes nesse velho truquenenhuma emoção se repete...só os gestosque rasgam essa máscara de indiferençaque esconde a face dorida.vomita na escrita a amargurados dias sempre iguaisreinventa nas palavras a emoçãoe torna especial este minuto.Carla Marqueshttp://www.palavrasemdesalinho.blogspot.com***Pombas BrancasNas mãos…duas pombas brancas.Nos corações…tramas e trancas!…Nos corações.Trancas e teias…e zumbidos de amor!Recordações e apneiasde um pretérito sem cor!…Recordações e apneias.E agora…Nesta, feliz lembrançaque finda… afora.Brilharemos na estrelaque reluz na esperança…Que lá longe moraem suma distância!…Que lá longe mora.Seguiremos em frentede bocas amordaçadas.E diremos que somos gentede mãos amarradas!…E diremos que somos gente.Este poema… é o meu eleitofoi escrito pelo meu coração.Que sangra, pelo amor guardado no peitode uma rosa branca que seguro na mão!…Que sangra, pelo amor guardado no peito.José M. Silvahttp://esquicospoeticos-avlisjota.blogspot.com***AS PALAVRASMastigo-te as palavras como quem faz amor,Sabem-me a orquídias selvagensAcabadas de florir,Como se a Primavera inteira fosse a fonteQue nasce do teu corpo,E as letras que me amanhecem, gorjeiosDe água frescaA correr dentro de mim!Mary de Oliveira***Escrever é tudoimpulso,a escrita como um baloiço,a queda, o erguer,desmanchar nós, cruzando-os.A perfeição das palavras contidas, largadas,que caminham sozinhas pelo texto, nadam no texto, morrem no texto.Escrever é verbo, verbo é mexer, é parar, é remexer, é anestesiar. Verbo é isso é tudo.Escrever é tudo, o pensamento no sentimento, o sentimento que pensa. É agir, ainda que na longa lassidão dos dias quietos, apagados e moribundos.E o que é agir senão o impulso?Raquel Lacerdahttp://www.asinhasdefrango.blogspot.com***(para Ana S.)Se escrevoé porque busco ainda essa palavraúltima irredutível inteiraque possa conter-te:com ela, incendiaria a cidadea partir das entranhas até que, no meiodo fogo, teu nome se erguesselímpido: uma florprenhe de ar e sonho erecta sobrea lenta inutilidade dos dias.Mas não existe, essa palavra - nema minha escassa arte poderáalguma vez criá-la. Ainda assim,escrevo: é necessário dizerque não há palavras que possam transportarem si o teu rostoindizível.Nuno Xavier***O extremo exercício da loucura Escrevo como no princípio atrás do inóspito silêncio da faísca curvado para dentro boca fechada a que se confinam os cicios apocalíptica e múrmur em seus desvarios de garrote e mastiga-se o intrínseco silêncio que corrói esta triste e acirrada madrugada, o silêncio circunflexo apaga os nomes sorvendo a luz das glicínias até que o poeta é desmascarado pelo extremo e assombroso vocabulário – sagrado e profano como se as palavras florissem seiva e sangue e rubras filigranas na beleza física de Auschwitz. Escrevo como no princípio visceral da explosão vulcânica dos cílios e escrevo como se a única contrição superlativa fosse a sílaba muda da água porque o coração do fogo engole-nos vivos por infinitas extensões epifânicas – aí cega a boca na entrega híbrida do dialecto das nuas caligrafias, agora o primórdio fôlego surge elíptico no busto das cimitarras da alquimia e grafará a morte como libérrima cascata no cristalino silêncio silvestre que engoliu Elias.João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***poema sentidoescrever poesia e nãosaber o queé o que isso ée continuarsabendo que ésó escritae procuraro poema aquienquanto a escritase faz. dizer no começoeu sou um homemo que é pouco o que émuito dizê-lo e sersendo sem nadapara dizer ou escrevere saber o nomede tantos outros e outrashomens e mulherespoetas dizendoos seus nomesque tanto já disseramque tanto já escreverame a humanidadeos homensas mulheres aindapor salvar aindapor escrevercomo tantas mãese tantos paisque já foramfilhos e filhase irmãos e irmãsde tantos maisque nada disserame ainda nadadizem e escreverpara eles e elasconstruir o mundo assimem silêncioos carros pelas janelasda segunda circularaté aqui ao quarto sexto andarem silêncioe apenas o raspar da canetano papel e os sons do corpodeste aqui o meupuxando a pele roendoà volta das unhasfazendo planos e promessase o poemadizendo tudocom o seu sentidopróprio que nada dizcom palavras tão pobresporque alguma coisame escapa sempreme escapou comoo teu adormecer no sulagora e os condomíniosà volta e os prédiosde apartamentos vaziostendo as férias já sidojá foram e Monchiquecontinua lápara a esquerda vistado terraço e nósignorando se ficamosse partimos.tudo caminha é certono mistério e o poemalevanta o sentido cansadodele e por fim lidoreconhecemos os nossosrostos o que ligavapelos afectos os que jáse perderam. vêmabraços de longeno esforço de segundosnas teclase esta caneta e mãoterminam o poemapensando no teu corpopelo lado menos virtualcom o cão aos pés da cama.Fernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***Mote "Lisboa"A minha cidadeA minha cidade é feita de janelase entre elashá sempre uma alma doridaao som da música da vidanão vivida.Ela é quente, é friae quando arrefece,a gente toda junta se arrepiacom o fadocantado em agonia.Nelao silêncio vibra,as estátuas erguidas pelos mortos.É feita de poetas amantese amantes cantorese todos gritamroucamenteo elogiodesse amor doente.»Raquel Lacerdahttp://www.asinhasdefrango.blogspot.com***O silencioso rio da minha aldeia A Alberto Caeiro O Tejo é um rio inseguro sobre a profusão das águas vulcânicas insustentáveis mas não é um rio imemoriável revelado opulento na ferocidade dos líquidos sagrados sedentos que correm desvairados o regaço ígneo da minha aldeia. O Tejo tem barcos de metal sustido no ostentação das trovoadas despojado da alma das rosáceas dobrado contra o tempo que multiplica as órbitas das rotas odoríficas a velocidade terrestre dos casulos estranhos de vozes mapas batendo por dentro do sangue das cosmogonias das lâminas que se descobrem rosa no rio que se ignora labareda no rio que se pertence aberto às coisas mínimas primitivas no eco surdo da palavra vulcânica águas iniciais do rio que incendeia pelos dedos aplainados amores da minha aldeia. Pelo Tejo ascende-se a desarmonia de Lisboa das vísceras extremes ausentes da carne incendiada de lascas no silêncio que oculta os girassóis – as silhuetas desnudas que existem além do rio sagrado da minha aldeia. Sementes de milagres crus porque rio morada única que invade as margens contra o tempo e a carne o amor e o sangue a rosa e o substantivo e nas veias que correm o rio da minha aldeia o corpo a eternidade o silêncio de se estar ao pé – a sílaba fecundando o júbilo do Mondego que corre inócuo o verbo da minha aldeia. João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***a memória de um crimenesse ano quase inteirovivendo só na companhiade dois irmãos, enquantotua mãe cuidava dos seuspais moribundos, umvelho perneta diabético euma velha devindo criança,frequentavas as discussões adolescentesde política de esquerda e amoresfalhados. querias-te poeta, liasmuito e escrevias poucoe mal, como agora, anos passados,criança de dextra mão.blusão da tropa, que ainda tens,boina trocada por chapéu, projectode barba – finalmente concretizado –percorrias a avenidade roma e o kingtão cheios de intelectuaisque olhavam o miúdo de lado.talvez por isso também essascâmeras de segurança não viramo movimento nervoso da tua mãoe do livro desalarmadoprocurando o teu bolso:nossa senhora das floresFernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***LISBOA NOSTÁLGICA…Foi no Metro em “hora de ponta”…Eram os acordes arrastados e doces de uma concertina…Num regresso ao passadoMeus olhos marejaram…E o coração derreteu de ternura!Era o Homem da ConcertinaArrastava consigo a saudade de uma vidaAngustias de tempos perdidosA amargura das ausências...… e o mote,O mote mudava conforme as lembranças…Cada acorde era uma lágrimaCada música uma saudadeE ele tocava, tocava sem pararO Homem da Concertina!…E como tocava bem, o impiedoso…Trouxe-me um sabor amargo-doce!...Mas eu gosteiGostei daquela dor…Dor de saudade bonitaDor dos Amores que ficaram lá atrás!...Lembranças de Vida, vivida!Perdido pelos recantos dessa Lisboa belaArrastando consigo as marcas de uma vidaVai o Homem da ConcertinaNos degraus do Metro…Na Praça do Rossio…Pelas ruas do Bairro Alto…Nas margens do Tejo…Acordando as Tágides adormecidas…O Homem da Consertina…Chorando nostalgiaPelas ruas da bela Lisboa!Mary de Oliveira***LisboaLisboaTens o Tejo a teus pésE eu tenho a vidaFeita em pedaços de marés!Lisboa que és nascidaE criada em colinasNão és nada como euQue sou nascidaE criada em emoções felinas!LisboaTu és capitalÉs importanteE eu sou o quê?Não consigo ser como tuSou a talPessoa deliranteEntre o bem e o malEntre o mesmo e o igual...Andreia Silvahttp://segredos_escondidos.blogs.sapo.pt***LISBOAas colinasas varinasoficinasmuros velhos onde urinasnos apertos da cidadevelhos sótãossaguõeslamentos e oraçõesonde moram ilusõesde que se veste a saudadepátiosátriosbonifratessejam camassejam catresde mil vates cruzam aresos versos sem ter idadecapital do quinto impérioserá beijoSebastiãopersonagem de mistériocolinas onde as varinasvindas das águas do Tejolavraram o seu pregãonalgum painel de azulejocidade quase verdadeLisboa que permanecejunto ao Tejoe adormeceem ânsias de liberdadeJorge Castrohttp://sete-mares.blogspot.com***pousou-me um pássaro sobre os ombros.trazia cartas do exílio dos poetasquando Lisboa era cais de luze uma pena de utopiaa escrever um tempo marinheiro de futuros.numa asa brevena têmpora delirante do ventolevou recados lúcidos do meu olhar nocturno.Luísa Henriques***Gatos de LisboaOs gatos de Lisboasão altos, esguiosbem falantes.Sabem quase tudode história eum pouco de geografia.De noite caçam gatase de dia companhiaentre o lixo da cidade.Não são assim tão pardoscomo dizem as histórias.Pelo contrário, andamengravatadinhos, ar galante ede quem não parte uma unha.Se lhes falarem emsardinhas levantamaltivos os bigodes -não são desses gatosfarruscos aos pésdas varinas. Têm classe!Mas mostrem-lhes umbanco de jardim ao sol.E miau.Rita Pereira***Mote "Sul"apontar as agulhas ao rosto traçado riscado na peledo braço franco ao flanco do nomefarto tamanho que tudo abarca atéaos.......................................nós.......................................dos dedos em ristemarcamos no mapa o nosso pontono sulanothertricksterhttp://anothertrickster.blogspot.com***A TRANÇA DO SOL, NA BAÍA DO SADO!Às vezes o silêncio envolvente faz tão bem... completo, absoluto…… respirar a natureza solitária, verde, profunda!Hoje saí com sede do cheiro do rioe do fascínio desesperante do bailado nervoso das ondassempre me desafiar-me!…Debruço-me… (perigosamente – dizem…)nas cordas de protecção, eu sei, mas…hoje é como quem sente a atracção do abismo!…- Reter na memória o cheiro fresco do rio…- O valsear dos peixes ali, tão pertinho de mim…bastava estender a mão…, um afago, num desejo!...- E os golfinhos!...Há quanto tempo!...Cheguei na hora certa, acordaram agora da sesta!- na minha frente a “ilha”, a (minha) ilha,meu doce sabor de azuis e verdes (d’outrora…),onde o mar abraça o rio… e beija a serra!- E as gaivotas?!...Hoje não há gaivotas…!!!Queria tanto mandar-te um recado…!Abri a mala das saudades esaltaram-me os verdes limbos dos dedos da serra,lembrei daquela promessa…,darmos as mãos e subir,subir até onde o mundo se recolhe…ali, só tu e eu, vestidos do manto negro da noitesob o olhar cúmplice das estrelas!...vaguear por outras galáxias nas asas dos ventos...e dos sonhos!...… Desço das nuvens,o corpo aflito não sossega, que o sol é uma brasa, hoje!Eu sei, logo ali as sombras dos arbustos, no jardim!Vou até lá refrescar-me um pouco na brisa que vem da serra,ler-te de novo,que é como quem te retém aqui,pertinho de mim!...……………………………………….Olha p’ra mim…,estou ainda aqui,debruçada sobre esta corrente que me leva a ti…,que o sol vai alto, aindae estende-me ciumento os fios dos seus cabelos!Vou pegar neles, um a um,entrança-los até onde o seu calor me derreta os dedos de ternura!Olha…, e não te esqueças da pérola,o remate que costumo usarpara prender a trança!...Mary de Oliveira***Nocturno de Chopin - variaçõesEra esta nota, folha diáfana de choupo, arrepiando ao de leve a superfície das águas do rio, que ouvi sibilina na noite cálida de ontem, olhando a lua cheia e a estrela da manhã, já sabendo que o vento não, nem suão, as árvores paradas, como estátuas, noites do sul, do alentejo serrano, nem vivalma, nas portas e poiais,isso era antigamente:- O astro tá parado, compadre!- Parece que mexeram as folhas agora...Vozes nos caminhos perdidos do tempo...A folha. dizia eu. a nota. com voz de céu. de música, entenda-se. Nocturna. De Chopin. Fez falta ontem neste clima de escorpião, de lacrau, para quem não saiba. Doçura de piano. Vestidos de cetim. Lábios de moça com peitos de regaço. Abraços. Na noite cálida. Chopin fez falta. Ontem à noite. No deserto. Sem tâmaras.Eduardo Aleixo***Arquitectura Revisitada À Gabriela Rocha Martins No céu uma intempérie como só a intempérie do amor. Pela arquitectura da carne a sua cicatriz era a taifa acesa o inaudível. Porém para me mostrar a flor ouso pensar que o fogo de I´timad apazigua o Sul: - Não existes Silves lá no remanso do rio sem as vestes escravas do sagrado. Diria que era I´timad a indivisível luz e que é o verbo primordial da aurora. Consigo o desabrochar da sílaba ciclos do alfabeto do tempo cativos do alaúde: - Incandescente, tão incandescente como a melancolia do sémen que outrora era lágrima a chuva de Primavera aberta ao cio de eternidade em eternidade como um denso aroma, suave corpo. João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***casa do Alentejoà entrada não reconheço nadatudo é mourisco um princípioque liga à minha djellabamas tenho de subir toda a escadariapara reconhecer a minha casa.poderia dizer a nossasó que ainda não lá vivemosnão ainda embora os planosjá os tenhamos feitomesmo se surgidos por acasosem qualquer vontade expressaeles estão lá já fechados ao longo do corredorna sua divisão de quartos.estou portanto numalentejo e tu noutroo teu verdadeiro o meu de empréstimoe tu desenhas o que chopin te dizpor mãos amigas enquanto euescrevo para fazer tempocomo um real alentejanocom vinho e azeitonasnuma sala cheia de azulejos epratos na parede com motivosda nossa terra adoptiva.escrevo e tu desenhase tu escreves e eu rabiscopara voltar de novo à escritaporque penso assimnesta distância toco-teporque ao escrever estás sentadaaqui à minha frentecom os nossos pés a tocarem-secomo na tua ou na minha cama se tocame de caneta na mão deslizandoa tinta pelo papel passo a mãopelo teu corpo que pouco gostasmas eu não. do que a minha mãoviu na rara luz dos nossos quartossó me falta o teu gostomais fundo de mulhersalgado como estas azeitonasque levo à boca para enganara fome e húmido como este vinhoque me deu coragem e a desvergonhapor agora para te dizerque a minha língua é curiosatanto ou mais que os meus olhosou as minhas mãosquando se passeiam pelo teu corpode leoa que aos poucos e poucosme tem consumidoas noites os sonos e os sonhoso meu desejo apenas domadoquando o teu encosto encontrao meu à noite se adormeces.estás no alentejo e eu nesta casaem lisboa. tenho um rioe tu a chave da casaonde agora gostaria de estardizendo ou fazendoo que digo aqui escrito.Fernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***o calor sufocatudo se aquieta como se a natureza tivesse feito um pacto de não agressãohá uma suavíssima brisa que tenta transgredirnão lhe é concedido o salvo condutomagnum mysteriumsubscrevem.se os verbos numa continência de acçãonada é permitido além de um degrau de tempo que pretende apresentar.separa que alguém o mastigue masninguém se atreve a contrariar esse calor liquefeito no sangueduma velha senhora//mulhersoterrada nos escombros de uma casa senhorialum dia os vermes hão.de contar a sua históriaestilhaçando as vidraças ressequidas e trespassar as águas quemorrem devagar por entre as pedras de um alfabeto líricohá um silêncio abrupto eos répteis abocanham.no senhores dum espaço a sul porque naquele lugar onde outrora havia um poemahoje restam as ervas presas ao espectro da mulher//senhora de cujo braço cresce uma foicepronta a ceifar o daninho como se de uma asa se tratasse enquanto se tece um ruído vago no rescaldo de lonjuras ouse busca um novo verbo que à sombra do velho há.de medrarousa.se o corpogabriela rocha martinshttp://cantochao.blogspot.com***Mote "Pão"Pãocome-nos os momentosna busca incessante de alimentodor física...múltiplos sofrimentosamagura...na falta um tormento!da fome que nos matado prazer de um aromatextura estaladiça que nos ataao sabor que nos assoma.faz-se de momentos únicospolvilhado do fermento da vidafruto da terra que nos convida.na simplicidade de um nomea complexidade de uma funçãohoje e sempre nada somos sem o pão!Carla Marqueshttp://www.palavrasemdesalinho.blogspot.com***Tabuleiros de TomarDe beleza sem igualOlha-os a gente a pensarQue são pedaços de corArrancados com amorÀ terra de Portugalluís pinto***IniciaçãoA cidade dobrou-se para o rio e o seu útero irrompeu sobre as águas rosa a rosa apoiada por bilhas vivas auríferas sopro a sopro prenhes. Soube-se então que renascia violenta entre mandíbulas alagadiças como a inflexibilidade da borboleta acerba. Em agonia precipitaram-se sobre as casas e coseram-se com a cal pelo coração irreconhecível da pedra. Era uma cidade como um sismo ininterrupto atada às víboras do milagre extremo entre rosas e pão incandescente e granítico. A cidade meteu-se toda para dentro o sexo descoberto transformada em réptil de hálito branco.João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***e tu seguras o pãonas duas mãos postocomo o coração nas nocturnaspreces de ninguém. toma-opor exemplo e parte,metade a tua vida, a outraao corpo que te partilhaa cama, de novo juntosno lajedo esquecidasdiscussões, migalhas.Fernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***Onde está o Pão?Sem pão e sem amorSem sequer uma côdea com bolorQue lhe caia na mãoAos tropeções por essa vidaSem esgar na noite entorpecidaÀ espera de aquecer o coraçãoAnda perdida qual mendigoMuita gente em nosso mundoMatando o ar em campo nu de trigoQue já foi seu e que ardeuQuem lhe roubou o seu pedaço de pãoQuem lhe sacou o coração e o pisouFingindo bem-fazerDizia que era dia e fez a noiteE continua airosamente a sussurrarQue o pão dos outros é ateuQue só quem o tem o mereceuE que o dia de mais pão há-de chegarMas eu grito enquanto a voz não me doerEnquanto a noite escura estiverEnquanto eu vir ainda um pouco mais além:Anda muito ladrão por aí com cara de gente-bem.Fa menorhttp://escritariscada.blogspot.com***Obrigada a todos pela entusiasta participção. Obrigada aos autores e editoras pelos livros oferecidos.


Caros etéreos,Apesar de estarmos em período de férias, a participação no último passatempo foi excelente. Em menos de 24 horas chegaram mais de quarenta poemas.Como sabem, os primeiros 26 participantes que enviassem poemas com os temas propostos no último desafio receberiam livros.Assim sendo, receberão os seguintes livros:"Área Afectada" de Fernando Esteves Pinto1. Carla Marques (Ermesinde)2. José M. Silva (Santa Maria da Feira)3. Mary de Oliveira (Setúbal)4. Raquel Lacerda (Algés)5. Nuno Xavier (Braga)6. João Rasteiro (Coimbra)7. Fernando Machado Silva (Portimão)"Espelho Íntimo" de Torquato da Luz1. Raquel Lacerda (Algés)2. João Rasteiro (Coimbra)3. Fernando Machado Silva (Portimão)4. Mary de Oliveira (Setúbal)5. Andreia Silva (Vila Nova de Famalicão)6. Jorge Castro (Carcavelos)7. Luísa Henriques (Estarreja)8. Rita Pereira (Famões)Revista "Sulscrito" n.º 31. anothertrickster (Coimbra)2. Mary de Oliveira (Setúbal)3. Eduardo Aleixo (Lisboa)4. João Rasteiro (Coimbra)5. Fernando Machado Silva (Portimão)6. Gabriela Rocha Martins (Silves)"Este pão que nos come!" de Raul Veríssimo1. Carla Marques (Ermesinde)2. Luís Pinto (Nazaré)3. João Rasteiro (Coimbra)4. Fernando Machado Silva (Portimão)5. Fa menorEis os 26 poemas:Mote "Escrita"ESCRITAdespenteia-me as certezasrouba esta pausa que fiz para pensarsurpreende-se não hoje, mas sempre.baralha este jogo de cartas viciadas.vejo a batota que fazes nesse velho truquenenhuma emoção se repete...só os gestosque rasgam essa máscara de indiferençaque esconde a face dorida.vomita na escrita a amargurados dias sempre iguaisreinventa nas palavras a emoçãoe torna especial este minuto.Carla Marqueshttp://www.palavrasemdesalinho.blogspot.com***Pombas BrancasNas mãos…duas pombas brancas.Nos corações…tramas e trancas!…Nos corações.Trancas e teias…e zumbidos de amor!Recordações e apneiasde um pretérito sem cor!…Recordações e apneias.E agora…Nesta, feliz lembrançaque finda… afora.Brilharemos na estrelaque reluz na esperança…Que lá longe moraem suma distância!…Que lá longe mora.Seguiremos em frentede bocas amordaçadas.E diremos que somos gentede mãos amarradas!…E diremos que somos gente.Este poema… é o meu eleitofoi escrito pelo meu coração.Que sangra, pelo amor guardado no peitode uma rosa branca que seguro na mão!…Que sangra, pelo amor guardado no peito.José M. Silvahttp://esquicospoeticos-avlisjota.blogspot.com***AS PALAVRASMastigo-te as palavras como quem faz amor,Sabem-me a orquídias selvagensAcabadas de florir,Como se a Primavera inteira fosse a fonteQue nasce do teu corpo,E as letras que me amanhecem, gorjeiosDe água frescaA correr dentro de mim!Mary de Oliveira***Escrever é tudoimpulso,a escrita como um baloiço,a queda, o erguer,desmanchar nós, cruzando-os.A perfeição das palavras contidas, largadas,que caminham sozinhas pelo texto, nadam no texto, morrem no texto.Escrever é verbo, verbo é mexer, é parar, é remexer, é anestesiar. Verbo é isso é tudo.Escrever é tudo, o pensamento no sentimento, o sentimento que pensa. É agir, ainda que na longa lassidão dos dias quietos, apagados e moribundos.E o que é agir senão o impulso?Raquel Lacerdahttp://www.asinhasdefrango.blogspot.com***(para Ana S.)Se escrevoé porque busco ainda essa palavraúltima irredutível inteiraque possa conter-te:com ela, incendiaria a cidadea partir das entranhas até que, no meiodo fogo, teu nome se erguesselímpido: uma florprenhe de ar e sonho erecta sobrea lenta inutilidade dos dias.Mas não existe, essa palavra - nema minha escassa arte poderáalguma vez criá-la. Ainda assim,escrevo: é necessário dizerque não há palavras que possam transportarem si o teu rostoindizível.Nuno Xavier***O extremo exercício da loucura Escrevo como no princípio atrás do inóspito silêncio da faísca curvado para dentro boca fechada a que se confinam os cicios apocalíptica e múrmur em seus desvarios de garrote e mastiga-se o intrínseco silêncio que corrói esta triste e acirrada madrugada, o silêncio circunflexo apaga os nomes sorvendo a luz das glicínias até que o poeta é desmascarado pelo extremo e assombroso vocabulário – sagrado e profano como se as palavras florissem seiva e sangue e rubras filigranas na beleza física de Auschwitz. Escrevo como no princípio visceral da explosão vulcânica dos cílios e escrevo como se a única contrição superlativa fosse a sílaba muda da água porque o coração do fogo engole-nos vivos por infinitas extensões epifânicas – aí cega a boca na entrega híbrida do dialecto das nuas caligrafias, agora o primórdio fôlego surge elíptico no busto das cimitarras da alquimia e grafará a morte como libérrima cascata no cristalino silêncio silvestre que engoliu Elias.João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***poema sentidoescrever poesia e nãosaber o queé o que isso ée continuarsabendo que ésó escritae procuraro poema aquienquanto a escritase faz. dizer no começoeu sou um homemo que é pouco o que émuito dizê-lo e sersendo sem nadapara dizer ou escrevere saber o nomede tantos outros e outrashomens e mulherespoetas dizendoos seus nomesque tanto já disseramque tanto já escreverame a humanidadeos homensas mulheres aindapor salvar aindapor escrevercomo tantas mãese tantos paisque já foramfilhos e filhase irmãos e irmãsde tantos maisque nada disserame ainda nadadizem e escreverpara eles e elasconstruir o mundo assimem silêncioos carros pelas janelasda segunda circularaté aqui ao quarto sexto andarem silêncioe apenas o raspar da canetano papel e os sons do corpodeste aqui o meupuxando a pele roendoà volta das unhasfazendo planos e promessase o poemadizendo tudocom o seu sentidopróprio que nada dizcom palavras tão pobresporque alguma coisame escapa sempreme escapou comoo teu adormecer no sulagora e os condomíniosà volta e os prédiosde apartamentos vaziostendo as férias já sidojá foram e Monchiquecontinua lápara a esquerda vistado terraço e nósignorando se ficamosse partimos.tudo caminha é certono mistério e o poemalevanta o sentido cansadodele e por fim lidoreconhecemos os nossosrostos o que ligavapelos afectos os que jáse perderam. vêmabraços de longeno esforço de segundosnas teclase esta caneta e mãoterminam o poemapensando no teu corpopelo lado menos virtualcom o cão aos pés da cama.Fernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***Mote "Lisboa"A minha cidadeA minha cidade é feita de janelase entre elashá sempre uma alma doridaao som da música da vidanão vivida.Ela é quente, é friae quando arrefece,a gente toda junta se arrepiacom o fadocantado em agonia.Nelao silêncio vibra,as estátuas erguidas pelos mortos.É feita de poetas amantese amantes cantorese todos gritamroucamenteo elogiodesse amor doente.»Raquel Lacerdahttp://www.asinhasdefrango.blogspot.com***O silencioso rio da minha aldeia A Alberto Caeiro O Tejo é um rio inseguro sobre a profusão das águas vulcânicas insustentáveis mas não é um rio imemoriável revelado opulento na ferocidade dos líquidos sagrados sedentos que correm desvairados o regaço ígneo da minha aldeia. O Tejo tem barcos de metal sustido no ostentação das trovoadas despojado da alma das rosáceas dobrado contra o tempo que multiplica as órbitas das rotas odoríficas a velocidade terrestre dos casulos estranhos de vozes mapas batendo por dentro do sangue das cosmogonias das lâminas que se descobrem rosa no rio que se ignora labareda no rio que se pertence aberto às coisas mínimas primitivas no eco surdo da palavra vulcânica águas iniciais do rio que incendeia pelos dedos aplainados amores da minha aldeia. Pelo Tejo ascende-se a desarmonia de Lisboa das vísceras extremes ausentes da carne incendiada de lascas no silêncio que oculta os girassóis – as silhuetas desnudas que existem além do rio sagrado da minha aldeia. Sementes de milagres crus porque rio morada única que invade as margens contra o tempo e a carne o amor e o sangue a rosa e o substantivo e nas veias que correm o rio da minha aldeia o corpo a eternidade o silêncio de se estar ao pé – a sílaba fecundando o júbilo do Mondego que corre inócuo o verbo da minha aldeia. João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***a memória de um crimenesse ano quase inteirovivendo só na companhiade dois irmãos, enquantotua mãe cuidava dos seuspais moribundos, umvelho perneta diabético euma velha devindo criança,frequentavas as discussões adolescentesde política de esquerda e amoresfalhados. querias-te poeta, liasmuito e escrevias poucoe mal, como agora, anos passados,criança de dextra mão.blusão da tropa, que ainda tens,boina trocada por chapéu, projectode barba – finalmente concretizado –percorrias a avenidade roma e o kingtão cheios de intelectuaisque olhavam o miúdo de lado.talvez por isso também essascâmeras de segurança não viramo movimento nervoso da tua mãoe do livro desalarmadoprocurando o teu bolso:nossa senhora das floresFernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***LISBOA NOSTÁLGICA…Foi no Metro em “hora de ponta”…Eram os acordes arrastados e doces de uma concertina…Num regresso ao passadoMeus olhos marejaram…E o coração derreteu de ternura!Era o Homem da ConcertinaArrastava consigo a saudade de uma vidaAngustias de tempos perdidosA amargura das ausências...… e o mote,O mote mudava conforme as lembranças…Cada acorde era uma lágrimaCada música uma saudadeE ele tocava, tocava sem pararO Homem da Concertina!…E como tocava bem, o impiedoso…Trouxe-me um sabor amargo-doce!...Mas eu gosteiGostei daquela dor…Dor de saudade bonitaDor dos Amores que ficaram lá atrás!...Lembranças de Vida, vivida!Perdido pelos recantos dessa Lisboa belaArrastando consigo as marcas de uma vidaVai o Homem da ConcertinaNos degraus do Metro…Na Praça do Rossio…Pelas ruas do Bairro Alto…Nas margens do Tejo…Acordando as Tágides adormecidas…O Homem da Consertina…Chorando nostalgiaPelas ruas da bela Lisboa!Mary de Oliveira***LisboaLisboaTens o Tejo a teus pésE eu tenho a vidaFeita em pedaços de marés!Lisboa que és nascidaE criada em colinasNão és nada como euQue sou nascidaE criada em emoções felinas!LisboaTu és capitalÉs importanteE eu sou o quê?Não consigo ser como tuSou a talPessoa deliranteEntre o bem e o malEntre o mesmo e o igual...Andreia Silvahttp://segredos_escondidos.blogs.sapo.pt***LISBOAas colinasas varinasoficinasmuros velhos onde urinasnos apertos da cidadevelhos sótãossaguõeslamentos e oraçõesonde moram ilusõesde que se veste a saudadepátiosátriosbonifratessejam camassejam catresde mil vates cruzam aresos versos sem ter idadecapital do quinto impérioserá beijoSebastiãopersonagem de mistériocolinas onde as varinasvindas das águas do Tejolavraram o seu pregãonalgum painel de azulejocidade quase verdadeLisboa que permanecejunto ao Tejoe adormeceem ânsias de liberdadeJorge Castrohttp://sete-mares.blogspot.com***pousou-me um pássaro sobre os ombros.trazia cartas do exílio dos poetasquando Lisboa era cais de luze uma pena de utopiaa escrever um tempo marinheiro de futuros.numa asa brevena têmpora delirante do ventolevou recados lúcidos do meu olhar nocturno.Luísa Henriques***Gatos de LisboaOs gatos de Lisboasão altos, esguiosbem falantes.Sabem quase tudode história eum pouco de geografia.De noite caçam gatase de dia companhiaentre o lixo da cidade.Não são assim tão pardoscomo dizem as histórias.Pelo contrário, andamengravatadinhos, ar galante ede quem não parte uma unha.Se lhes falarem emsardinhas levantamaltivos os bigodes -não são desses gatosfarruscos aos pésdas varinas. Têm classe!Mas mostrem-lhes umbanco de jardim ao sol.E miau.Rita Pereira***Mote "Sul"apontar as agulhas ao rosto traçado riscado na peledo braço franco ao flanco do nomefarto tamanho que tudo abarca atéaos.......................................nós.......................................dos dedos em ristemarcamos no mapa o nosso pontono sulanothertricksterhttp://anothertrickster.blogspot.com***A TRANÇA DO SOL, NA BAÍA DO SADO!Às vezes o silêncio envolvente faz tão bem... completo, absoluto…… respirar a natureza solitária, verde, profunda!Hoje saí com sede do cheiro do rioe do fascínio desesperante do bailado nervoso das ondassempre me desafiar-me!…Debruço-me… (perigosamente – dizem…)nas cordas de protecção, eu sei, mas…hoje é como quem sente a atracção do abismo!…- Reter na memória o cheiro fresco do rio…- O valsear dos peixes ali, tão pertinho de mim…bastava estender a mão…, um afago, num desejo!...- E os golfinhos!...Há quanto tempo!...Cheguei na hora certa, acordaram agora da sesta!- na minha frente a “ilha”, a (minha) ilha,meu doce sabor de azuis e verdes (d’outrora…),onde o mar abraça o rio… e beija a serra!- E as gaivotas?!...Hoje não há gaivotas…!!!Queria tanto mandar-te um recado…!Abri a mala das saudades esaltaram-me os verdes limbos dos dedos da serra,lembrei daquela promessa…,darmos as mãos e subir,subir até onde o mundo se recolhe…ali, só tu e eu, vestidos do manto negro da noitesob o olhar cúmplice das estrelas!...vaguear por outras galáxias nas asas dos ventos...e dos sonhos!...… Desço das nuvens,o corpo aflito não sossega, que o sol é uma brasa, hoje!Eu sei, logo ali as sombras dos arbustos, no jardim!Vou até lá refrescar-me um pouco na brisa que vem da serra,ler-te de novo,que é como quem te retém aqui,pertinho de mim!...……………………………………….Olha p’ra mim…,estou ainda aqui,debruçada sobre esta corrente que me leva a ti…,que o sol vai alto, aindae estende-me ciumento os fios dos seus cabelos!Vou pegar neles, um a um,entrança-los até onde o seu calor me derreta os dedos de ternura!Olha…, e não te esqueças da pérola,o remate que costumo usarpara prender a trança!...Mary de Oliveira***Nocturno de Chopin - variaçõesEra esta nota, folha diáfana de choupo, arrepiando ao de leve a superfície das águas do rio, que ouvi sibilina na noite cálida de ontem, olhando a lua cheia e a estrela da manhã, já sabendo que o vento não, nem suão, as árvores paradas, como estátuas, noites do sul, do alentejo serrano, nem vivalma, nas portas e poiais,isso era antigamente:- O astro tá parado, compadre!- Parece que mexeram as folhas agora...Vozes nos caminhos perdidos do tempo...A folha. dizia eu. a nota. com voz de céu. de música, entenda-se. Nocturna. De Chopin. Fez falta ontem neste clima de escorpião, de lacrau, para quem não saiba. Doçura de piano. Vestidos de cetim. Lábios de moça com peitos de regaço. Abraços. Na noite cálida. Chopin fez falta. Ontem à noite. No deserto. Sem tâmaras.Eduardo Aleixo***Arquitectura Revisitada À Gabriela Rocha Martins No céu uma intempérie como só a intempérie do amor. Pela arquitectura da carne a sua cicatriz era a taifa acesa o inaudível. Porém para me mostrar a flor ouso pensar que o fogo de I´timad apazigua o Sul: - Não existes Silves lá no remanso do rio sem as vestes escravas do sagrado. Diria que era I´timad a indivisível luz e que é o verbo primordial da aurora. Consigo o desabrochar da sílaba ciclos do alfabeto do tempo cativos do alaúde: - Incandescente, tão incandescente como a melancolia do sémen que outrora era lágrima a chuva de Primavera aberta ao cio de eternidade em eternidade como um denso aroma, suave corpo. João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***casa do Alentejoà entrada não reconheço nadatudo é mourisco um princípioque liga à minha djellabamas tenho de subir toda a escadariapara reconhecer a minha casa.poderia dizer a nossasó que ainda não lá vivemosnão ainda embora os planosjá os tenhamos feitomesmo se surgidos por acasosem qualquer vontade expressaeles estão lá já fechados ao longo do corredorna sua divisão de quartos.estou portanto numalentejo e tu noutroo teu verdadeiro o meu de empréstimoe tu desenhas o que chopin te dizpor mãos amigas enquanto euescrevo para fazer tempocomo um real alentejanocom vinho e azeitonasnuma sala cheia de azulejos epratos na parede com motivosda nossa terra adoptiva.escrevo e tu desenhase tu escreves e eu rabiscopara voltar de novo à escritaporque penso assimnesta distância toco-teporque ao escrever estás sentadaaqui à minha frentecom os nossos pés a tocarem-secomo na tua ou na minha cama se tocame de caneta na mão deslizandoa tinta pelo papel passo a mãopelo teu corpo que pouco gostasmas eu não. do que a minha mãoviu na rara luz dos nossos quartossó me falta o teu gostomais fundo de mulhersalgado como estas azeitonasque levo à boca para enganara fome e húmido como este vinhoque me deu coragem e a desvergonhapor agora para te dizerque a minha língua é curiosatanto ou mais que os meus olhosou as minhas mãosquando se passeiam pelo teu corpode leoa que aos poucos e poucosme tem consumidoas noites os sonos e os sonhoso meu desejo apenas domadoquando o teu encosto encontrao meu à noite se adormeces.estás no alentejo e eu nesta casaem lisboa. tenho um rioe tu a chave da casaonde agora gostaria de estardizendo ou fazendoo que digo aqui escrito.Fernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***o calor sufocatudo se aquieta como se a natureza tivesse feito um pacto de não agressãohá uma suavíssima brisa que tenta transgredirnão lhe é concedido o salvo condutomagnum mysteriumsubscrevem.se os verbos numa continência de acçãonada é permitido além de um degrau de tempo que pretende apresentar.separa que alguém o mastigue masninguém se atreve a contrariar esse calor liquefeito no sangueduma velha senhora//mulhersoterrada nos escombros de uma casa senhorialum dia os vermes hão.de contar a sua históriaestilhaçando as vidraças ressequidas e trespassar as águas quemorrem devagar por entre as pedras de um alfabeto líricohá um silêncio abrupto eos répteis abocanham.no senhores dum espaço a sul porque naquele lugar onde outrora havia um poemahoje restam as ervas presas ao espectro da mulher//senhora de cujo braço cresce uma foicepronta a ceifar o daninho como se de uma asa se tratasse enquanto se tece um ruído vago no rescaldo de lonjuras ouse busca um novo verbo que à sombra do velho há.de medrarousa.se o corpogabriela rocha martinshttp://cantochao.blogspot.com***Mote "Pão"Pãocome-nos os momentosna busca incessante de alimentodor física...múltiplos sofrimentosamagura...na falta um tormento!da fome que nos matado prazer de um aromatextura estaladiça que nos ataao sabor que nos assoma.faz-se de momentos únicospolvilhado do fermento da vidafruto da terra que nos convida.na simplicidade de um nomea complexidade de uma funçãohoje e sempre nada somos sem o pão!Carla Marqueshttp://www.palavrasemdesalinho.blogspot.com***Tabuleiros de TomarDe beleza sem igualOlha-os a gente a pensarQue são pedaços de corArrancados com amorÀ terra de Portugalluís pinto***IniciaçãoA cidade dobrou-se para o rio e o seu útero irrompeu sobre as águas rosa a rosa apoiada por bilhas vivas auríferas sopro a sopro prenhes. Soube-se então que renascia violenta entre mandíbulas alagadiças como a inflexibilidade da borboleta acerba. Em agonia precipitaram-se sobre as casas e coseram-se com a cal pelo coração irreconhecível da pedra. Era uma cidade como um sismo ininterrupto atada às víboras do milagre extremo entre rosas e pão incandescente e granítico. A cidade meteu-se toda para dentro o sexo descoberto transformada em réptil de hálito branco.João Rasteirohttp://www.nocentrodoarco.blogspot.com***e tu seguras o pãonas duas mãos postocomo o coração nas nocturnaspreces de ninguém. toma-opor exemplo e parte,metade a tua vida, a outraao corpo que te partilhaa cama, de novo juntosno lajedo esquecidasdiscussões, migalhas.Fernando Machado Silvahttp://donnemoimachance.blogspot.com***Onde está o Pão?Sem pão e sem amorSem sequer uma côdea com bolorQue lhe caia na mãoAos tropeções por essa vidaSem esgar na noite entorpecidaÀ espera de aquecer o coraçãoAnda perdida qual mendigoMuita gente em nosso mundoMatando o ar em campo nu de trigoQue já foi seu e que ardeuQuem lhe roubou o seu pedaço de pãoQuem lhe sacou o coração e o pisouFingindo bem-fazerDizia que era dia e fez a noiteE continua airosamente a sussurrarQue o pão dos outros é ateuQue só quem o tem o mereceuE que o dia de mais pão há-de chegarMas eu grito enquanto a voz não me doerEnquanto a noite escura estiverEnquanto eu vir ainda um pouco mais além:Anda muito ladrão por aí com cara de gente-bem.Fa menorhttp://escritariscada.blogspot.com***Obrigada a todos pela entusiasta participção. Obrigada aos autores e editoras pelos livros oferecidos.

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