No 114º aniversário, a magia (e os resultados das vendas) dos livros invadiu a Lello

20-01-2020
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Na festa do 114º aniversário da Livraria Lello, as personagens saltaram das páginas dos livros e uma Rainha de Copas insolente e mandona, retirada d’ Alice no País das Maravilhas e interpretada pela atriz Marta Freitas, assumiu o papel de mestre da cerimónia, com convidados ilustres como o músico Rui Reininho e o bispo D. Januário Torgal Ferreira. O mergulho no universo fantasioso de Lewis Carroll estendeu-se às novas montras, concebidas pelo Atelier Caviar, a recordar que, mais do que as datas festivas, é preciso celebrar os dias de “desaniversário”, e sublinhar, como também foi dito durante a cerimónia, “um percurso com 109 anos+5”. Uma referência às transformações feitas a partir de 2015, aquando da entrada na administração de Avelino e Aurora Pedro Pinto (com 51% da sociedade; os restantes 49% pertencem a José Manuel Lello, bisneto de um dos fundadores). O resgate da editora, as avultadas obras de conservação e de restauro do edifício, ou a introdução do voucher (o “ovo de Colombo” da Lello, nas palavras de Aurora Pinto), traduzida na desejada transformação de turistas em leitores (o valor da entrada é dedutível em livros e, em 2019, 55 % dos visitantes fizeram-no), estão entre as principais medidas da nova administração, “colocando o livro no centro de toda a atuação”, como repetidamente assumiram. Comparativamente com janeiro a outubro de 2018, no período homólogo de 2019 venderam mais 208 mil livros, um ganho de 67%. A faturação total, no ano passado, alcançou os 11 milhões.

Pedro Cabrita Reis com a mão no bolo-instalação criado para o aniversário FOTO: Lucília Monteiro

Na Rua das Carmelitas cantaram-se os parabéns à livraria com um bolo-instalação da autoria de Pedro Cabrita Reis (com as fatias servidas dentro de capas duras de livros). “Quando fui convidado, achei uma ideia deliciosa, até pensei que se tinham enganado no número de telefone, porque era absolutamente disparatada… mas adorei o desafio”, confessou o artista. Ao mesmo tempo, ouviam-se palavras de ordem como “a leitura sai à rua” ou “um voucher na mão, um livro no coração”, empunhadas em cartazes por um grupo de jovens, em jeito de manifestação.

Afonso Reis Cabral colaborará no projeto Novo Canto para Os Lusíadas FOTO: Lucília Monteiro

Como é habitual, aproveitou-se o aniversário da Lello para anunciar os grandes projetos anuais. Desde que, no ano passado, lançaram uma oferta pública de aquisição sobre a primeira edição d’Os Lusíadas (a oferta de 250 mil euros não foi aceite), a obra a quem o pensador Eduardo Lourenço chamou de “bilhete de identidade dos portugueses” ficou na mira da livraria. “Não desistimos, ainda, porque desistir não faz parte do ADN da livraria Lello”, sublinha a administração. Enquanto a aquisição não se concretiza, lançam um Novo Canto para Os Lusíadas. O projeto conta com a colaboração de Afonso Reis Cabral (e com o apoio da VISÃO), que fará a reconstituição dos passos de Camões, com paragens em pontos como Goa, Macau e Moçambique, pedindo a 1102 pessoas (das figuras mais destacadas às mais insuspeitas) para transcrever, à mão, o mesmo número de estrofes do poema maior da língua portuguesa. “As possibilidades de contributos são gigantes, este ano vai ser de preparação, para poder começar a viagem em 2021”, contou o jovem escritor, que se vê como “mandatário de Camões”. No espaço Vozes Vivas, na cave da livraria, a instalação X Cantos, assinada pelo gabinete R2 Design, reinterpreta o poema épico destacando palavras-chave, como despedidas, glória e fortuna, dispostas cronologicamente nas paredes.

A instalação X Cantos, do R2. FOTO: Lucília Monteiro

A política de investimento nos livros esteve bem visível na exposição Lucky 13, inaugurada no aniversário, uma montra de 13 raras primeiras edições de obras-primas da literatura mundial adquiridas pela Lello – desde Orgulho e Preconceito, de Jane Austen (comprada em leilão por 50 mil libras), à Mensagem, de Fernando Pessoa – um investimento de quase meio milhão de euros, só em 2019. Obras que fazem também parte da The Collection, a coleção de 29 títulos de bolso lançados pela editora, onde se inclui, por exemplo, O Principezinho, de Saint-Exupery, o n.º 1 do top de vendas, mas também Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco, um dos autores publicados nos tempos de Ernesto Chardron, que fundou a primeira Lello, em 1869. “Um dos problemas que identificamos foi a portabilidade, nomeadamente para os turistas, e decidimos apostar neste formato”, contou Hugo Cardoso, diretor criativo da Lello. O design apelativo e a tradução em várias línguas de clássicos da literatura mundial e portuguesa contribuíram igualmente para o sucesso das vendas: de 60 mil livros vendidos em 2015, passaram para 700 mil livros em 2019, uma média de mais de 1900 por dia. Para 2020, haverá novas coleções: uma de livros infantis, prevista junho; e outra pensada a partir da coleção privada de Fernando Pessoa, cujo primeiro lançamento será em novembro.

Algumas das primeiras edições adquiridas pela Lello FOTO: Lucília Monteiro

Para 2020 está ainda previsto o regresso ao Porto do manuscrito original de Amor de Perdição, escrito a dois passos da livraria, quando Camilo Castelo Branco esteve preso na cadeia da Relação, e atualmente guardado pelo Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro. A exposição inaugurará a 16 de março, data do aniversário do autor, e terminará a 16 de outubro, dia em que foi absolvido no processo de adultério.

As novas montras, concebidas pelo Atelier Caviar FOTO: Lucília Monteiro

Para 27 de março próximo, dia mundial do teatro e data da escritura da compra do Teatro Sá da Bandeira (em maio de 2019 foi adquirido em hasta pública por 3,5 milhões de euros), fica reservado o anúncio dos projetos para a sala de espetáculos histórica do Porto. Certo é que “será um teatro ligado aos livros”, diz Andreia Ferreira, do departamento de marketing e comunicação. Com qualquer coisa de cabaret.

Na festa do 114º aniversário da Livraria Lello, as personagens saltaram das páginas dos livros e uma Rainha de Copas insolente e mandona, retirada d’ Alice no País das Maravilhas e interpretada pela atriz Marta Freitas, assumiu o papel de mestre da cerimónia, com convidados ilustres como o músico Rui Reininho e o bispo D. Januário Torgal Ferreira. O mergulho no universo fantasioso de Lewis Carroll estendeu-se às novas montras, concebidas pelo Atelier Caviar, a recordar que, mais do que as datas festivas, é preciso celebrar os dias de “desaniversário”, e sublinhar, como também foi dito durante a cerimónia, “um percurso com 109 anos+5”. Uma referência às transformações feitas a partir de 2015, aquando da entrada na administração de Avelino e Aurora Pedro Pinto (com 51% da sociedade; os restantes 49% pertencem a José Manuel Lello, bisneto de um dos fundadores). O resgate da editora, as avultadas obras de conservação e de restauro do edifício, ou a introdução do voucher (o “ovo de Colombo” da Lello, nas palavras de Aurora Pinto), traduzida na desejada transformação de turistas em leitores (o valor da entrada é dedutível em livros e, em 2019, 55 % dos visitantes fizeram-no), estão entre as principais medidas da nova administração, “colocando o livro no centro de toda a atuação”, como repetidamente assumiram. Comparativamente com janeiro a outubro de 2018, no período homólogo de 2019 venderam mais 208 mil livros, um ganho de 67%. A faturação total, no ano passado, alcançou os 11 milhões.

Pedro Cabrita Reis com a mão no bolo-instalação criado para o aniversário FOTO: Lucília Monteiro

Na Rua das Carmelitas cantaram-se os parabéns à livraria com um bolo-instalação da autoria de Pedro Cabrita Reis (com as fatias servidas dentro de capas duras de livros). “Quando fui convidado, achei uma ideia deliciosa, até pensei que se tinham enganado no número de telefone, porque era absolutamente disparatada… mas adorei o desafio”, confessou o artista. Ao mesmo tempo, ouviam-se palavras de ordem como “a leitura sai à rua” ou “um voucher na mão, um livro no coração”, empunhadas em cartazes por um grupo de jovens, em jeito de manifestação.

Afonso Reis Cabral colaborará no projeto Novo Canto para Os Lusíadas FOTO: Lucília Monteiro

Como é habitual, aproveitou-se o aniversário da Lello para anunciar os grandes projetos anuais. Desde que, no ano passado, lançaram uma oferta pública de aquisição sobre a primeira edição d’Os Lusíadas (a oferta de 250 mil euros não foi aceite), a obra a quem o pensador Eduardo Lourenço chamou de “bilhete de identidade dos portugueses” ficou na mira da livraria. “Não desistimos, ainda, porque desistir não faz parte do ADN da livraria Lello”, sublinha a administração. Enquanto a aquisição não se concretiza, lançam um Novo Canto para Os Lusíadas. O projeto conta com a colaboração de Afonso Reis Cabral (e com o apoio da VISÃO), que fará a reconstituição dos passos de Camões, com paragens em pontos como Goa, Macau e Moçambique, pedindo a 1102 pessoas (das figuras mais destacadas às mais insuspeitas) para transcrever, à mão, o mesmo número de estrofes do poema maior da língua portuguesa. “As possibilidades de contributos são gigantes, este ano vai ser de preparação, para poder começar a viagem em 2021”, contou o jovem escritor, que se vê como “mandatário de Camões”. No espaço Vozes Vivas, na cave da livraria, a instalação X Cantos, assinada pelo gabinete R2 Design, reinterpreta o poema épico destacando palavras-chave, como despedidas, glória e fortuna, dispostas cronologicamente nas paredes.

A instalação X Cantos, do R2. FOTO: Lucília Monteiro

A política de investimento nos livros esteve bem visível na exposição Lucky 13, inaugurada no aniversário, uma montra de 13 raras primeiras edições de obras-primas da literatura mundial adquiridas pela Lello – desde Orgulho e Preconceito, de Jane Austen (comprada em leilão por 50 mil libras), à Mensagem, de Fernando Pessoa – um investimento de quase meio milhão de euros, só em 2019. Obras que fazem também parte da The Collection, a coleção de 29 títulos de bolso lançados pela editora, onde se inclui, por exemplo, O Principezinho, de Saint-Exupery, o n.º 1 do top de vendas, mas também Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco, um dos autores publicados nos tempos de Ernesto Chardron, que fundou a primeira Lello, em 1869. “Um dos problemas que identificamos foi a portabilidade, nomeadamente para os turistas, e decidimos apostar neste formato”, contou Hugo Cardoso, diretor criativo da Lello. O design apelativo e a tradução em várias línguas de clássicos da literatura mundial e portuguesa contribuíram igualmente para o sucesso das vendas: de 60 mil livros vendidos em 2015, passaram para 700 mil livros em 2019, uma média de mais de 1900 por dia. Para 2020, haverá novas coleções: uma de livros infantis, prevista junho; e outra pensada a partir da coleção privada de Fernando Pessoa, cujo primeiro lançamento será em novembro.

Algumas das primeiras edições adquiridas pela Lello FOTO: Lucília Monteiro

Para 2020 está ainda previsto o regresso ao Porto do manuscrito original de Amor de Perdição, escrito a dois passos da livraria, quando Camilo Castelo Branco esteve preso na cadeia da Relação, e atualmente guardado pelo Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro. A exposição inaugurará a 16 de março, data do aniversário do autor, e terminará a 16 de outubro, dia em que foi absolvido no processo de adultério.

As novas montras, concebidas pelo Atelier Caviar FOTO: Lucília Monteiro

Para 27 de março próximo, dia mundial do teatro e data da escritura da compra do Teatro Sá da Bandeira (em maio de 2019 foi adquirido em hasta pública por 3,5 milhões de euros), fica reservado o anúncio dos projetos para a sala de espetáculos histórica do Porto. Certo é que “será um teatro ligado aos livros”, diz Andreia Ferreira, do departamento de marketing e comunicação. Com qualquer coisa de cabaret.

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