portugal dos pequeninos: EDUARDO PRADO COELHO (1944-2007)

15-12-2019
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Na primeira viagem ao Festival de Cinema da Figueira da Foz lá estava ele, entre o grave e o divertido, sempre rodeado das mulheres que toda a vida o admiraram e que ele amava sinceramente e pelos mais diversos motivos. No ano seguinte, uma manhã mal dormida juntou-nos no pequeno-almoço na pastelaria em frente ao Casino, antes do começo das projecções. Víamos, então, cinco a seis filmes por dia, uma obra. Engraxavam-lhe os sapatos ao som de uma torrada e preparava-se para dar um salto à tipografia para ver o estado da edição da sua tese, Os Universos da Crítica. Comprei-a no verão de 1983, na Feira do Livro, acabada de sair e com ele a dar autógrafos - poucos - na barraquinha da Dom Quixote. Dias depois, na festa do primeiro ano do Frágil, no meio daquela gente bonita que foi desaparecendo, perguntou-me o que é que achava do livro. Eu tinha vinte e dois anos e, parvamente, prodigalizava a mim mesmo uma opinião. Com o Semanário, vieram outras conversas e outros livros. Em quase um quarto de século muda muita coisa. Entretanto a "noite do mundo", de Hegel, e título de um dos seus livros, avançou, improvável e imaterial como a voz da Greco num concerto no CCB. Nós também, para outros e diferentes lados. Os últimos anos foram de grande sofrimento pessoal para Eduardo Prado Coelho. Não merecia. Ninguém merece. Ocorrem-me - em mais um dia de verão interrompido pela mão desse Deus em que ele nunca acreditou ou que, tal como em Nietzsche, já estava morto há muito - as palavras de François Mitterrand sobre Malraux na data do seu desaparecimento. O Eduardo "pertencia às cercanias, à paisagem da nossa vida. Como uma luz na casa fronteiriça e que se apaga, assim um pouco mais de sombra ocupará o espaço e o tempo diante de nós." O Eduardo, lá onde agora se encontra, chega-nos com "a fulgurância que atribuímos aos astros mortos e que continuam a iluminar a nossa noite".


Na primeira viagem ao Festival de Cinema da Figueira da Foz lá estava ele, entre o grave e o divertido, sempre rodeado das mulheres que toda a vida o admiraram e que ele amava sinceramente e pelos mais diversos motivos. No ano seguinte, uma manhã mal dormida juntou-nos no pequeno-almoço na pastelaria em frente ao Casino, antes do começo das projecções. Víamos, então, cinco a seis filmes por dia, uma obra. Engraxavam-lhe os sapatos ao som de uma torrada e preparava-se para dar um salto à tipografia para ver o estado da edição da sua tese, Os Universos da Crítica. Comprei-a no verão de 1983, na Feira do Livro, acabada de sair e com ele a dar autógrafos - poucos - na barraquinha da Dom Quixote. Dias depois, na festa do primeiro ano do Frágil, no meio daquela gente bonita que foi desaparecendo, perguntou-me o que é que achava do livro. Eu tinha vinte e dois anos e, parvamente, prodigalizava a mim mesmo uma opinião. Com o Semanário, vieram outras conversas e outros livros. Em quase um quarto de século muda muita coisa. Entretanto a "noite do mundo", de Hegel, e título de um dos seus livros, avançou, improvável e imaterial como a voz da Greco num concerto no CCB. Nós também, para outros e diferentes lados. Os últimos anos foram de grande sofrimento pessoal para Eduardo Prado Coelho. Não merecia. Ninguém merece. Ocorrem-me - em mais um dia de verão interrompido pela mão desse Deus em que ele nunca acreditou ou que, tal como em Nietzsche, já estava morto há muito - as palavras de François Mitterrand sobre Malraux na data do seu desaparecimento. O Eduardo "pertencia às cercanias, à paisagem da nossa vida. Como uma luz na casa fronteiriça e que se apaga, assim um pouco mais de sombra ocupará o espaço e o tempo diante de nós." O Eduardo, lá onde agora se encontra, chega-nos com "a fulgurância que atribuímos aos astros mortos e que continuam a iluminar a nossa noite".

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