Bloco de Esquerda tem "candidato preso por tráfico de droga" e "condenados por terrorismo"? (COM VÍDEO)

09-10-2020
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"Queremos investigar influências e obscuros interesses privados nos partidos políticos. Além do passado, vamos aproveitar para investigar e conhecer melhor os negócios dos dirigentes do Chega e a origem do financiamento do seu partido. Façamos já essa investigação. E pouparemos a Assembleia da Republica a uma comissão de inquérito futura e pouparemos também o país das aldrabices de um partido comprometido até ao pescoço com os negócios mais obscuros da elite financeira e económica", afirmou Mariana Mortágua, em debate parlamentar no dia 25 de setembro.

Na mesma intervenção, a deputada bloquista também classificou André Ventura como sendo "radioativo" e "um político do pior que o sistema tem".

Em resposta, o deputado único e líder do Chega contrapôs: "Eu não aceito que um partido que diga que os outros são radioativos, que os outros são muito perigosos, que os outros são o pior que o sistema tem, tenha um agente imobiliário dentro do partido, a comprar casas à Segurança Social e a vendê-las por muitos milhões. Eu não aceito que um partido que está sempre a apontar o dedo ao Chega, dê moradas falsas dos seus deputados para receber subsídios que são do Estado e são dinheiro de todos nós. Vêm falar de crimes quando têm um candidato preso por tráfico de droga. Se olhar para as nossas listas pode ver muita coisa, mas nunca vai ver condenados por terrorismo e por assaltos à mão armada. Isso é que nunca vai ver, mas no Bloco de Esquerda é a ver se enchem as listas todas do país inteiro".

Estas alegações têm sustentação factual?

Na medida em que Ventura não mencionou nomes, o Polígrafo questionou o líder do Chega sobre quem eram os alvos específicos da sua intervenção no Parlamento.

Começando pelo "agente imobiliário", trata-se de Ricardo Robles, antigo vereador do Bloco de Esquerda (BE) na Câmara Municipal de Lisboa (CML). É uma evidente referência ao caso revelado em primeira mão pelo "Jornal Económico" em julho de 2018 e que resultou na demissão do então vereador na CML e membro da Comissão Coordenadora da Concelhia de Lisboa do BE.

"Em 2014, com o mercado imobiliário a renascer das cinzas, devido ao crescente interesse de estrangeiros e à lei que descongelou as rendas, dois irmãos decidiram aventurar-se no setor. A oportunidade perfeita surgiu quando a Segurança Social colocou à venda um velho edifício de três pisos, situado na Rua do Terreiro do Trigo, uma zona privilegiada de Alfama, muito perto do Museu do Fado. Os dois irmãos pagaram 347 mil euros pelo prédio, investiram outros 650 mil em obras de requalificação e chegaram a acordo com a maioria dos inquilinos para rescindir os contratos de arrendamento. Já no final de 2017, com o edifício reabilitado e com mais um andar, colocaram-no à venda numa imobiliária especializada em imóveis de luxo, com uma avaliação de 5,7 milhões de euros, o que significa 29 mil euros por cada um dos 192 m² de área de implantação do edifício, descritos na Conservatória. Por outras palavras, terão uma mais-valia potencial de 4,7 milhões de euros", informou o "Jornal Económico".

Quanto às "moradas falsas", remete para uma notícia da RTP de 2018 dando conta de que Pedro Soares, deputado do BE entre 2009 e 2011 e entre 2015 e 2019, na informação prestada aos Serviços da Assembleia da República, indicou como morada a sede do partido em Braga e não a sua verdadeira residência. Tal aconteceu apesar de ter arrendado um apartamento em Almada na primeira vez em que foi deputado e de se ter mudado para Lisboa na segunda vez, tal como entretanto verificou o Polígrafo. Além de ter sido deputado, Pedro Soares também é professor auxiliar na Universidade de Lisboa. Assim, beneficiou financeiramente de ter indicado a morada da sede do partido em Braga em detrimento da morada do apartamento em Lisboa, já que recebeu um subsídio de 69,19 euros por cada dia de atividade parlamentar por residir fora de Lisboa.

Sandro Santos era o bloquista na mira de Ventura quando este falou sobre um elemento do BE preso por tráfico de droga. Em 2013 foi candidato à junta de freguesia de Azurém, no concelho de Guimarães, e cerca de dois anos depois acabou por ser detido pelas autoridades. Foi acusado de encabeçar uma rede de produção de cannabis em quatro apartamentos de Guimarães, como noticiou o jornal "Diário de Notícias".

Sobre as acusações de terrorismo e assaltos à mão armada, André Ventura explicou ao Polígrafo que falava de Helena Carmo, Teodósio Alcobia e Luís Gobern Lopes. Os dois primeiros foram presos por integrarem as Forças Populares 25 de Abril (FP-25). Neste documento podemos verificar o contributo que ambos deram para as Jornadas Autárquicas do BE em 2007.

Por sua vez, Gobern Lopes foi mesmo um dos fundadores das FP-25 e o primeiro a assumir em julgamento que pertencia à organização. Em 2017 foi candidato do BE à junta de freguesia de Santo António da Charneca, no concelho do Barreiro.

Os três foram condenados no processo das FP-25, pelo crime de organização terrorista. Contudo, no dia 1 de março de 1996, a Assembleia da República aprovou uma amnistia para os elementos presos das FP-25, a qual foi promulgada cinco dias depois pelo então Presidente da República, Mário Soares.

O Polígrafo contactou o BE, de forma a poder exercer o direito ao contraditório sobre todas estas alegações, tendo obtido a seguinte resposta: "André Ventura apresenta uma amálgama de acusações sobre diversas pessoas que em momento algum envolvem a organização do Bloco de Esquerda ou as contas certas que sempre apresentou. Registamos que o faz para fugir ao tema que estava em debate: a origem do financiamento do Chega e os negócios obscuros dos seus dirigentes".

Em suma, as alegações de Ventura contêm algumas extrapolações. No caso de Pedro Soares, por exemplo, não foi o partido que indicou a morada errada, mas sim o próprio deputado. A utilização do tempo verbal presente para se referir a antigos candidatos a juntas de freguesia também não é inteiramente rigorosa. De qualquer modo, no geral, encontramos sustentação factual nas quatro invectivas dirigidas aos bloquistas, sob o calor do debate parlamentar.

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Avaliação do Polígrafo:

"Queremos investigar influências e obscuros interesses privados nos partidos políticos. Além do passado, vamos aproveitar para investigar e conhecer melhor os negócios dos dirigentes do Chega e a origem do financiamento do seu partido. Façamos já essa investigação. E pouparemos a Assembleia da Republica a uma comissão de inquérito futura e pouparemos também o país das aldrabices de um partido comprometido até ao pescoço com os negócios mais obscuros da elite financeira e económica", afirmou Mariana Mortágua, em debate parlamentar no dia 25 de setembro.

Na mesma intervenção, a deputada bloquista também classificou André Ventura como sendo "radioativo" e "um político do pior que o sistema tem".

Em resposta, o deputado único e líder do Chega contrapôs: "Eu não aceito que um partido que diga que os outros são radioativos, que os outros são muito perigosos, que os outros são o pior que o sistema tem, tenha um agente imobiliário dentro do partido, a comprar casas à Segurança Social e a vendê-las por muitos milhões. Eu não aceito que um partido que está sempre a apontar o dedo ao Chega, dê moradas falsas dos seus deputados para receber subsídios que são do Estado e são dinheiro de todos nós. Vêm falar de crimes quando têm um candidato preso por tráfico de droga. Se olhar para as nossas listas pode ver muita coisa, mas nunca vai ver condenados por terrorismo e por assaltos à mão armada. Isso é que nunca vai ver, mas no Bloco de Esquerda é a ver se enchem as listas todas do país inteiro".

Estas alegações têm sustentação factual?

Na medida em que Ventura não mencionou nomes, o Polígrafo questionou o líder do Chega sobre quem eram os alvos específicos da sua intervenção no Parlamento.

Começando pelo "agente imobiliário", trata-se de Ricardo Robles, antigo vereador do Bloco de Esquerda (BE) na Câmara Municipal de Lisboa (CML). É uma evidente referência ao caso revelado em primeira mão pelo "Jornal Económico" em julho de 2018 e que resultou na demissão do então vereador na CML e membro da Comissão Coordenadora da Concelhia de Lisboa do BE.

"Em 2014, com o mercado imobiliário a renascer das cinzas, devido ao crescente interesse de estrangeiros e à lei que descongelou as rendas, dois irmãos decidiram aventurar-se no setor. A oportunidade perfeita surgiu quando a Segurança Social colocou à venda um velho edifício de três pisos, situado na Rua do Terreiro do Trigo, uma zona privilegiada de Alfama, muito perto do Museu do Fado. Os dois irmãos pagaram 347 mil euros pelo prédio, investiram outros 650 mil em obras de requalificação e chegaram a acordo com a maioria dos inquilinos para rescindir os contratos de arrendamento. Já no final de 2017, com o edifício reabilitado e com mais um andar, colocaram-no à venda numa imobiliária especializada em imóveis de luxo, com uma avaliação de 5,7 milhões de euros, o que significa 29 mil euros por cada um dos 192 m² de área de implantação do edifício, descritos na Conservatória. Por outras palavras, terão uma mais-valia potencial de 4,7 milhões de euros", informou o "Jornal Económico".

Quanto às "moradas falsas", remete para uma notícia da RTP de 2018 dando conta de que Pedro Soares, deputado do BE entre 2009 e 2011 e entre 2015 e 2019, na informação prestada aos Serviços da Assembleia da República, indicou como morada a sede do partido em Braga e não a sua verdadeira residência. Tal aconteceu apesar de ter arrendado um apartamento em Almada na primeira vez em que foi deputado e de se ter mudado para Lisboa na segunda vez, tal como entretanto verificou o Polígrafo. Além de ter sido deputado, Pedro Soares também é professor auxiliar na Universidade de Lisboa. Assim, beneficiou financeiramente de ter indicado a morada da sede do partido em Braga em detrimento da morada do apartamento em Lisboa, já que recebeu um subsídio de 69,19 euros por cada dia de atividade parlamentar por residir fora de Lisboa.

Sandro Santos era o bloquista na mira de Ventura quando este falou sobre um elemento do BE preso por tráfico de droga. Em 2013 foi candidato à junta de freguesia de Azurém, no concelho de Guimarães, e cerca de dois anos depois acabou por ser detido pelas autoridades. Foi acusado de encabeçar uma rede de produção de cannabis em quatro apartamentos de Guimarães, como noticiou o jornal "Diário de Notícias".

Sobre as acusações de terrorismo e assaltos à mão armada, André Ventura explicou ao Polígrafo que falava de Helena Carmo, Teodósio Alcobia e Luís Gobern Lopes. Os dois primeiros foram presos por integrarem as Forças Populares 25 de Abril (FP-25). Neste documento podemos verificar o contributo que ambos deram para as Jornadas Autárquicas do BE em 2007.

Por sua vez, Gobern Lopes foi mesmo um dos fundadores das FP-25 e o primeiro a assumir em julgamento que pertencia à organização. Em 2017 foi candidato do BE à junta de freguesia de Santo António da Charneca, no concelho do Barreiro.

Os três foram condenados no processo das FP-25, pelo crime de organização terrorista. Contudo, no dia 1 de março de 1996, a Assembleia da República aprovou uma amnistia para os elementos presos das FP-25, a qual foi promulgada cinco dias depois pelo então Presidente da República, Mário Soares.

O Polígrafo contactou o BE, de forma a poder exercer o direito ao contraditório sobre todas estas alegações, tendo obtido a seguinte resposta: "André Ventura apresenta uma amálgama de acusações sobre diversas pessoas que em momento algum envolvem a organização do Bloco de Esquerda ou as contas certas que sempre apresentou. Registamos que o faz para fugir ao tema que estava em debate: a origem do financiamento do Chega e os negócios obscuros dos seus dirigentes".

Em suma, as alegações de Ventura contêm algumas extrapolações. No caso de Pedro Soares, por exemplo, não foi o partido que indicou a morada errada, mas sim o próprio deputado. A utilização do tempo verbal presente para se referir a antigos candidatos a juntas de freguesia também não é inteiramente rigorosa. De qualquer modo, no geral, encontramos sustentação factual nas quatro invectivas dirigidas aos bloquistas, sob o calor do debate parlamentar.

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Avaliação do Polígrafo:

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