Filho do 25 de Abril: (354) Quadratura do Círculo

01-09-2020
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A Quadratura do Círculo apaixonou durante séculos os matemáticos. Construir um quadrado com a mesma área de um círculo dado não era tarefa fácil. No século XIX Von Lindemann provou que π (pi - razão entre o perímetro e o diâmetro do círculo) é transcendente, pelo que é impossível efectuar a quadratura do círculo apenas com régua e compasso como os Gregos tentavam. A Quadratura do Círculo passou a designar algo impossível de obter...Mas não é de matemática que quero falar hoje mas sim do programa de debate com o mesmo nome que passa na SIC Notícias. Só por ser um dos programas mais antigos de debate político na realidade portuguesa já merece umas palavras de apreço. Mas também não estou aqui para lançar elogios fáceis ao programa. É que o painel de comentadores no programa é uma imagem nua e crua do que representam os partidos hoje em dia, no seu melhor e pior. Já não é a primeira vez que defendo que o verdadeiro problema da nossa democracia não é o sistema eleitoral nem a Constituição mas sim o funcionamento interno dos partidos. Cabe-me agora tentar provar que Pacheco Pereira, Lobo Xavier e José Magalhães também são parte do problema apesar da imagem de desprendimento que (uns) gostam de publicitar.José Magalhães, sem discutir as suas qualidades profissionais, representa o homem leal do partido que é cego na sua defesa. Não há nenhuma matéria em que tenha a coragem de atacar o seu partido. Não diria que é o verdadeiro homem do aparelho pois o verdadeiro homem do aparelho tem a inteligência de estar sempre de acordo com o partido numa solidariedade amoral mas também sabe quando deve criticar algumas trivialidades internas que nunca atingem ninguém em particular. Nesta óptica José Magalhães é aquele que não esconde o que os partidos, enquanto entidades com inteligência artificial, querem verdadeiramente dos seus militantes, ou seja, obediência cega. José Magalhães é, assim, o último dos românticos ingénuos porque não sabe disfarçar o que, na realidade, todos fazem.Lobo Xavier gosta de estar dentro e fora ao mesmo tempo. Voa sobre a estrutura do partido, nunca pousa mas também nunca se afasta. Adora virar-se para José Magalhães e colocar aquela expressão digna dum sangue azul e dizer: “Eu sou independente!”. Mas estes anti-heróis dos partidos têm uma particularidade curiosa já que conhecem e respeitam as regras dos partidos. Não é o país que os move mas uma noção de serviço (mascarado de classe e rigor) aos partidos que pertencem. Ainda há pouco tempo Lobo Xavier virava-se para Pacheco Pereira e enunciava a longa lista de regras que um militante deve ter com o seu partido. Uma delas é não criticar o partido em vésperas de eleições e que esse desrespeito se paga caro. Por isso o seu constante distanciamento virtual não existiu em vésperas de eleições. Mais um serviço prestado ao partido ao invés de defender quem o partido verdadeiramente representa.Pacheco Pereira é o caso mais paradigmático. Eu admiro a sua coragem e quanto a isso faço a minha devida vénia. Mas ninguém pense que o seu distanciamento é levado às últimas consequências porque Pacheco Pereira também é um homem pragmático. Durante meses criticou abertamente Santana Lopes em termos que vão muito além da crítica interna (que verdade seja dita é muito inconsequente nos partidos) à liderança ideológica do partido que é militante. Falou em termos de desgraça nacional, do que Portugal sofria às mãos deste populista. Mas, no fim, votou Santana Lopes explicando que elegia deputados e que acreditava na regeneração do seu partido. Nem é preciso desmontar este raciocínio porque o próprio raciocínio faz esse trabalho sozinho e sem ajuda. Afinal não era Portugal que estava em jogo. Depois das eleições falou dos seus sacrifícios pessoais, os do passado e os do futuro, porque, segundo o próprio, a única coisa que fez foi defender Portugal mas agora é natural que o partido castigue quem não foi solidário com a desgraça. Depois do mea culpa esquece-se de toda a sua independência e volta ao seu desporto favorito que é criticar de forma agressiva e paternalista José Magalhães. Mas desta vez nota-se o desespero de quem precisa criticar agressivamente tudo o que o PS vai fazer porque, no fundo, com a sua oposição a Santana também ele perdeu a sua independência. Veja-se que elogiar o PS nos próximos meses destrói definitivamente a esperança que o PSD o perdoe e, sobre esta perspectiva, o seu ensaio de independência retirou-lhe a própria independência para avaliar racionalmente as decisões dos vários partidos.Desengane-se quem pensa que eu critiquei algum destes comentadores. Só os mais distraídos não notam que eu fiz um largo elogio à capacidade pragmática de cada um deles se posicionar na realidade em que vivemos, com as regras que nós próprios resolvemos construír ao longo da nossa curta permanência na Terra (também temos culpa ao permitir que os partidos funcionem de forma anti democrática). Nenhum de nós tem independência porque queremos sobreviver e precisamos da liberdade que nos oferecem, da comida que conquistamos e do respeito que impomos. No fundo é a Quadratura do Círculo.P.S. Parece que José Magalhães vai ser substituído por Jorge Coelho. Respira o PS de alívio e, na minha opinião, também o PSD (acredito que a presença de José Magalhães proporcionava o ambiente certo para Pacheco Pereira criticar o seu próprio partido, por não existirem verdadeiros antagonistas no programa e por Pacheco Pereira fazer questão de sublinhar que é muito diferente no tipo de militância que pratica). Espero que José Magalhães consiga colocar a sua competência técnica ao serviço do país.

A Quadratura do Círculo apaixonou durante séculos os matemáticos. Construir um quadrado com a mesma área de um círculo dado não era tarefa fácil. No século XIX Von Lindemann provou que π (pi - razão entre o perímetro e o diâmetro do círculo) é transcendente, pelo que é impossível efectuar a quadratura do círculo apenas com régua e compasso como os Gregos tentavam. A Quadratura do Círculo passou a designar algo impossível de obter...Mas não é de matemática que quero falar hoje mas sim do programa de debate com o mesmo nome que passa na SIC Notícias. Só por ser um dos programas mais antigos de debate político na realidade portuguesa já merece umas palavras de apreço. Mas também não estou aqui para lançar elogios fáceis ao programa. É que o painel de comentadores no programa é uma imagem nua e crua do que representam os partidos hoje em dia, no seu melhor e pior. Já não é a primeira vez que defendo que o verdadeiro problema da nossa democracia não é o sistema eleitoral nem a Constituição mas sim o funcionamento interno dos partidos. Cabe-me agora tentar provar que Pacheco Pereira, Lobo Xavier e José Magalhães também são parte do problema apesar da imagem de desprendimento que (uns) gostam de publicitar.José Magalhães, sem discutir as suas qualidades profissionais, representa o homem leal do partido que é cego na sua defesa. Não há nenhuma matéria em que tenha a coragem de atacar o seu partido. Não diria que é o verdadeiro homem do aparelho pois o verdadeiro homem do aparelho tem a inteligência de estar sempre de acordo com o partido numa solidariedade amoral mas também sabe quando deve criticar algumas trivialidades internas que nunca atingem ninguém em particular. Nesta óptica José Magalhães é aquele que não esconde o que os partidos, enquanto entidades com inteligência artificial, querem verdadeiramente dos seus militantes, ou seja, obediência cega. José Magalhães é, assim, o último dos românticos ingénuos porque não sabe disfarçar o que, na realidade, todos fazem.Lobo Xavier gosta de estar dentro e fora ao mesmo tempo. Voa sobre a estrutura do partido, nunca pousa mas também nunca se afasta. Adora virar-se para José Magalhães e colocar aquela expressão digna dum sangue azul e dizer: “Eu sou independente!”. Mas estes anti-heróis dos partidos têm uma particularidade curiosa já que conhecem e respeitam as regras dos partidos. Não é o país que os move mas uma noção de serviço (mascarado de classe e rigor) aos partidos que pertencem. Ainda há pouco tempo Lobo Xavier virava-se para Pacheco Pereira e enunciava a longa lista de regras que um militante deve ter com o seu partido. Uma delas é não criticar o partido em vésperas de eleições e que esse desrespeito se paga caro. Por isso o seu constante distanciamento virtual não existiu em vésperas de eleições. Mais um serviço prestado ao partido ao invés de defender quem o partido verdadeiramente representa.Pacheco Pereira é o caso mais paradigmático. Eu admiro a sua coragem e quanto a isso faço a minha devida vénia. Mas ninguém pense que o seu distanciamento é levado às últimas consequências porque Pacheco Pereira também é um homem pragmático. Durante meses criticou abertamente Santana Lopes em termos que vão muito além da crítica interna (que verdade seja dita é muito inconsequente nos partidos) à liderança ideológica do partido que é militante. Falou em termos de desgraça nacional, do que Portugal sofria às mãos deste populista. Mas, no fim, votou Santana Lopes explicando que elegia deputados e que acreditava na regeneração do seu partido. Nem é preciso desmontar este raciocínio porque o próprio raciocínio faz esse trabalho sozinho e sem ajuda. Afinal não era Portugal que estava em jogo. Depois das eleições falou dos seus sacrifícios pessoais, os do passado e os do futuro, porque, segundo o próprio, a única coisa que fez foi defender Portugal mas agora é natural que o partido castigue quem não foi solidário com a desgraça. Depois do mea culpa esquece-se de toda a sua independência e volta ao seu desporto favorito que é criticar de forma agressiva e paternalista José Magalhães. Mas desta vez nota-se o desespero de quem precisa criticar agressivamente tudo o que o PS vai fazer porque, no fundo, com a sua oposição a Santana também ele perdeu a sua independência. Veja-se que elogiar o PS nos próximos meses destrói definitivamente a esperança que o PSD o perdoe e, sobre esta perspectiva, o seu ensaio de independência retirou-lhe a própria independência para avaliar racionalmente as decisões dos vários partidos.Desengane-se quem pensa que eu critiquei algum destes comentadores. Só os mais distraídos não notam que eu fiz um largo elogio à capacidade pragmática de cada um deles se posicionar na realidade em que vivemos, com as regras que nós próprios resolvemos construír ao longo da nossa curta permanência na Terra (também temos culpa ao permitir que os partidos funcionem de forma anti democrática). Nenhum de nós tem independência porque queremos sobreviver e precisamos da liberdade que nos oferecem, da comida que conquistamos e do respeito que impomos. No fundo é a Quadratura do Círculo.P.S. Parece que José Magalhães vai ser substituído por Jorge Coelho. Respira o PS de alívio e, na minha opinião, também o PSD (acredito que a presença de José Magalhães proporcionava o ambiente certo para Pacheco Pereira criticar o seu próprio partido, por não existirem verdadeiros antagonistas no programa e por Pacheco Pereira fazer questão de sublinhar que é muito diferente no tipo de militância que pratica). Espero que José Magalhães consiga colocar a sua competência técnica ao serviço do país.

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