ULTRAPERIFERIAS: Governo não deu verbas para fiscalizar políticos e partidos

04-09-2020
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Este ano prescreveram milhões de euros em coimas pelas irregularidades
nas contas dos partidos de 2009 e 2010 e também passaram de prazo os processos
de milhares de euros contra os mandatários financeiros de campanhas regionais e
autárquicas. Apesar dos sucessivos avisos da Entidade das Contas e
Financiamentos Políticos (ECFP) de que lhe faltam meios para fiscalizar as
contas dos partidos, o Orçamento do Estado para 2020 volta a não reforçar as
verbas para este organismo, que funciona dentro do Tribunal Constitucional —
mesmo com o alerta do seu presidente, Costa Andrade, de que isto implicará a
prescrição de processos pelo menos até 2014.

Mas agora o problema surge em duplicado: o Parlamento aprovou há seis
meses a criação de um novo organismo, a Entidade da Transparência, para
fiscalizar todas as declarações de rendimento de políticos e outros agentes do
Estado. Mas o dinheiro que o OE 2020 lhe destina não chega sequer para o criar:
“A proposta do Governo de Orçamento do Estado para 2020 prevê uma verba para a
instalação da Entidade para a Transparência manifestamente aquém das
necessidades apontadas pelo Tribunal”, garante fonte oficial do Tribunal
Constitucional ao Expresso, lembrando “as especificidades desta nova entidade,
nomeadamente no plano do funcionamento da plataforma informática”.

A Entidade da Transparência, que surgiu de uma proposta do Bloco de
Esquerda, acabou por ser criada com os votos do BE, PS e PSD depois de meses de
ajustes para dar resposta a reservas dos vários partidos, do presidente do TC e
até do Presidente da República. O organismo foi pensado como um órgão
independente que funcionará junto do TC e fará a “apreciação e fiscalização”
das declarações dos rendimentos, património e interesses dos titulares de
cargos políticos e altos cargos públicos (que passa agora a uma única
declaração).

Acontece que esse documento passa a ser entregue ao novo organismo,
sendo para isso necessário criar uma plataforma eletrónica: “A entidade procede
à elaboração de uma base de dados informatizada das declarações”, prevê a lei —
que necessita dos meios humanos necessários, que têm custos. Ora esses
montantes, ainda segundo a lei, devem estar previstos no OE, na rubrica destinada
ao TC: “Os encargos com o funcionamento da entidade são suportados pela dotação
orçamental atribuída ao Tribunal Constitucional.”

Presidente do TC chamado ao Parlamento

Esse valor, diz o Governo, já está incluído na verba destinada ao
Tribunal — mas a rubrica não está discriminada no OE. No mapa dedicado às
despesas dos serviços e fundos autónomos, no que toca ao TC está prevista uma
despesa de €9.730.691 sem que esteja, no entanto, especificado qual o valor
destinado a criar a nova entidade. O problema foi detetado na Comissão da
Transparência, que se apressou a pedir uma reunião pública a Costa Andrade,
presidente do Constitucional, já agendada para 8 de janeiro. “Como não
descortinámos no OE qual seria o investimento previsto, tomámos a iniciativa de
convidar o presidente do TC para ter uma reunião connosco, para avaliar o
investimento e dotação necessários”, confirma ao Expresso o socialista Jorge
Lacão, presidente da Comissão da Transparência.

O facto de a reunião ser pública não é um acaso: mesmo entre os
socialistas e dentro do Governo, apurou o Expresso, a questão do financiamento
destas duas entidades abriu divisões. Alertado pelo TC dias antes da entrega do
Orçamento, o deputado Jorge Lacão avisou o Executivo de que o tema era sensível
e que o reforço de verbas era mesmo necessário. A ministra da Justiça chegou a
sensibilizar Mário Centeno para o problema. Mas, apesar das notí­cias sobre as
novas prescrições, nos quadros finais o que ficou foi um aumento que, na
prática, não o é. Ao Expresso, o Ministério das Finanças explica o montante:
“Está inscrita uma dotação de €1.169.000 para a Entidade da Transparência numa
subdivisão do TC. O orçamento do TC sobe 17,5% em 2020.” Parece muito, mas
entre esta verba para o novo organismo e os aumentos salariais que juízes e
magistrados vão ter pela mudança do seu estatuto (aprovada pelo Governo antes
das eleições) pouco mais sobra para a ECFP melhorar a fiscalização da
contabilidade partidária.

Dentro do Governo, a ala mais sensível para o problema garante estar
atenta. “Se não está, vamos resolver no debate na especialidade”, afirma um
membro do Executivo ao Expresso. O Bloco, que originalmente propôs a criação da
Entidade da Transparência, recorda que no ano passado “não estavam contempladas
todas as verbas para a ECFP” e que, se o mesmo acontecer com o montante
dedicado ao novo organismo, avançará com nova proposta para as aumentar. Mas
pode não o fazer sozinho. “Achamos que pode haver uma proposta da própria
Comissão da Transparência [no Orçamento do Estado]”, confirma o líder
parlamentar bloquista, Pedro Filipe Soares. A ideia já foi avançada pelo BE,
que espera, depois da reunião de “ponto de situação” com Costa Andrade, contar
com uma tomada de posição dos outros partidos sobre a possível proposta
conjunta para corrigir o OE (Expresso, texto de David Dinis e Mariana Lima Cunha)

Este ano prescreveram milhões de euros em coimas pelas irregularidades
nas contas dos partidos de 2009 e 2010 e também passaram de prazo os processos
de milhares de euros contra os mandatários financeiros de campanhas regionais e
autárquicas. Apesar dos sucessivos avisos da Entidade das Contas e
Financiamentos Políticos (ECFP) de que lhe faltam meios para fiscalizar as
contas dos partidos, o Orçamento do Estado para 2020 volta a não reforçar as
verbas para este organismo, que funciona dentro do Tribunal Constitucional —
mesmo com o alerta do seu presidente, Costa Andrade, de que isto implicará a
prescrição de processos pelo menos até 2014.

Mas agora o problema surge em duplicado: o Parlamento aprovou há seis
meses a criação de um novo organismo, a Entidade da Transparência, para
fiscalizar todas as declarações de rendimento de políticos e outros agentes do
Estado. Mas o dinheiro que o OE 2020 lhe destina não chega sequer para o criar:
“A proposta do Governo de Orçamento do Estado para 2020 prevê uma verba para a
instalação da Entidade para a Transparência manifestamente aquém das
necessidades apontadas pelo Tribunal”, garante fonte oficial do Tribunal
Constitucional ao Expresso, lembrando “as especificidades desta nova entidade,
nomeadamente no plano do funcionamento da plataforma informática”.

A Entidade da Transparência, que surgiu de uma proposta do Bloco de
Esquerda, acabou por ser criada com os votos do BE, PS e PSD depois de meses de
ajustes para dar resposta a reservas dos vários partidos, do presidente do TC e
até do Presidente da República. O organismo foi pensado como um órgão
independente que funcionará junto do TC e fará a “apreciação e fiscalização”
das declarações dos rendimentos, património e interesses dos titulares de
cargos políticos e altos cargos públicos (que passa agora a uma única
declaração).

Acontece que esse documento passa a ser entregue ao novo organismo,
sendo para isso necessário criar uma plataforma eletrónica: “A entidade procede
à elaboração de uma base de dados informatizada das declarações”, prevê a lei —
que necessita dos meios humanos necessários, que têm custos. Ora esses
montantes, ainda segundo a lei, devem estar previstos no OE, na rubrica destinada
ao TC: “Os encargos com o funcionamento da entidade são suportados pela dotação
orçamental atribuída ao Tribunal Constitucional.”

Presidente do TC chamado ao Parlamento

Esse valor, diz o Governo, já está incluído na verba destinada ao
Tribunal — mas a rubrica não está discriminada no OE. No mapa dedicado às
despesas dos serviços e fundos autónomos, no que toca ao TC está prevista uma
despesa de €9.730.691 sem que esteja, no entanto, especificado qual o valor
destinado a criar a nova entidade. O problema foi detetado na Comissão da
Transparência, que se apressou a pedir uma reunião pública a Costa Andrade,
presidente do Constitucional, já agendada para 8 de janeiro. “Como não
descortinámos no OE qual seria o investimento previsto, tomámos a iniciativa de
convidar o presidente do TC para ter uma reunião connosco, para avaliar o
investimento e dotação necessários”, confirma ao Expresso o socialista Jorge
Lacão, presidente da Comissão da Transparência.

O facto de a reunião ser pública não é um acaso: mesmo entre os
socialistas e dentro do Governo, apurou o Expresso, a questão do financiamento
destas duas entidades abriu divisões. Alertado pelo TC dias antes da entrega do
Orçamento, o deputado Jorge Lacão avisou o Executivo de que o tema era sensível
e que o reforço de verbas era mesmo necessário. A ministra da Justiça chegou a
sensibilizar Mário Centeno para o problema. Mas, apesar das notí­cias sobre as
novas prescrições, nos quadros finais o que ficou foi um aumento que, na
prática, não o é. Ao Expresso, o Ministério das Finanças explica o montante:
“Está inscrita uma dotação de €1.169.000 para a Entidade da Transparência numa
subdivisão do TC. O orçamento do TC sobe 17,5% em 2020.” Parece muito, mas
entre esta verba para o novo organismo e os aumentos salariais que juízes e
magistrados vão ter pela mudança do seu estatuto (aprovada pelo Governo antes
das eleições) pouco mais sobra para a ECFP melhorar a fiscalização da
contabilidade partidária.

Dentro do Governo, a ala mais sensível para o problema garante estar
atenta. “Se não está, vamos resolver no debate na especialidade”, afirma um
membro do Executivo ao Expresso. O Bloco, que originalmente propôs a criação da
Entidade da Transparência, recorda que no ano passado “não estavam contempladas
todas as verbas para a ECFP” e que, se o mesmo acontecer com o montante
dedicado ao novo organismo, avançará com nova proposta para as aumentar. Mas
pode não o fazer sozinho. “Achamos que pode haver uma proposta da própria
Comissão da Transparência [no Orçamento do Estado]”, confirma o líder
parlamentar bloquista, Pedro Filipe Soares. A ideia já foi avançada pelo BE,
que espera, depois da reunião de “ponto de situação” com Costa Andrade, contar
com uma tomada de posição dos outros partidos sobre a possível proposta
conjunta para corrigir o OE (Expresso, texto de David Dinis e Mariana Lima Cunha)

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