abro Paginas Encontro Espelhos: Por isso, vou para casa e aguardo os sonhos

19-06-2020
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Vieste como um barco carregado de vento, abrindoferidas de espuma pelas ondas. Chegaste tão depressaque nem pude aguardar-te ou prevenir-me; e só ficasteo tempo de iludires a arquitectura fria do estaleiro
onde hoje me sentei a perguntar como foi que partiste,se partiste,que dentro de mim se acanham as certezas etu vais sempre ardendo, embora como um lumede cera, lento e brando, que já não derrama calor.
Tenho os olhos azuis de tanto os ter lançado ao maro dia inteiro, como os pescadores fazem com as redes;e não existe no mundo cegueira pior do que a minha:o frio do horizonte começou ainda agora a oscilar,exausto de me ver entre as mulheres que se passeiamno cais como se transportassem no corpo o vaivémdos barcos. Dizem-me os seus passos
que vale a pena esperar, porque as ondas acabamsempre por quebrar-se junto das margens. Mas eu seique o meu mar está cercado de litorais, que é tardepara quase tudo. Por isso, vou para casa
e aguardo os sonhos, pontuais como a noite.

Maria do Rosário Pedreira

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Vieste como um barco carregado de vento, abrindoferidas de espuma pelas ondas. Chegaste tão depressaque nem pude aguardar-te ou prevenir-me; e só ficasteo tempo de iludires a arquitectura fria do estaleiro
onde hoje me sentei a perguntar como foi que partiste,se partiste,que dentro de mim se acanham as certezas etu vais sempre ardendo, embora como um lumede cera, lento e brando, que já não derrama calor.
Tenho os olhos azuis de tanto os ter lançado ao maro dia inteiro, como os pescadores fazem com as redes;e não existe no mundo cegueira pior do que a minha:o frio do horizonte começou ainda agora a oscilar,exausto de me ver entre as mulheres que se passeiamno cais como se transportassem no corpo o vaivémdos barcos. Dizem-me os seus passos
que vale a pena esperar, porque as ondas acabamsempre por quebrar-se junto das margens. Mas eu seique o meu mar está cercado de litorais, que é tardepara quase tudo. Por isso, vou para casa
e aguardo os sonhos, pontuais como a noite.

Maria do Rosário Pedreira

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