Ronaldo das finanças é quem António Costa quiser

23-06-2020
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Em 1958, houve eleições presidenciais em Portugal. Era no tempo de Salazar. Por causa do general Delgado, houve alguma curiosidade internacional. O New York Times deu-se até ao trabalho de explicar o que se passava. Não, não era como na América. O presidente seria quem o chefe de governo quisesse. Ia ser um almirante, mas, segundo o New York Times, podia ter sido um polícia sinaleiro, se fosse essa a escolha do ditador. Era assim em 1958. Em 2020, o chefe do governo ainda tenta fingir que escolhe o presidente da república, como se viu na Autoeuropa. Mas no que António Costa é mesmo soberano é noutra coisa: a eleger “génios das Finanças”. Não um ministro, porque isso está ao alcance de qualquer mortal que seja primeiro-ministro, mas um “génio”, ou, na linguagem futebolística que o regime usa para fazer de conta que é popular, um “Ronaldo das Finanças”.

A posição de “Ronaldo” foi ocupada até agora por Mário Centeno. Há uns tempos, percebeu-se – pelos “sinais” típicos das autocracias — que não estava para durar. E esta semana, eis subitamente alguém em quem o país nunca reparara levantado à glória de novo “Ronaldo”. Foi um secretário de Estado. Podia bem ter sido, como na história de Salazar, um polícia sinaleiro. Não teria feito qualquer diferença. O jornalismo estaria agora igualmente embasbacado com a sua genialidade, a contar histórias de como, no cruzamento onde o “Ronaldo” costumava estar de serviço, o trânsito fluía muito certinho. Ronaldo das Finanças é quem António Costa quiser.

A pergunta é esta: porque é que os ministros das Finanças de António Costa têm de ser Ronaldos? Porque é que não podem ser apenas ministros das Finanças? Porque é preciso fingir. Sim, isso: fingir. Em 2016, foi preciso fingir que a possibilidade de fazer “reposições de direitos” não se devia ao ajustamento conseguido por Passos Coelho, com Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque no Ministério das Finanças. Desde então, foi ainda preciso continuar a fingir que a política financeira não se reduziu a manter a carga fiscal do ajustamento e a fazer cativações para justificar, em Bruxelas, o apoio financeiro europeu que, desde os anos 90, disfarça a estagnação económica portuguesa. Esse apoio requer um certo valor do défice. Os “Ronaldos” trataram de o conseguir sacrificando tudo, menos as classes que o PS e os seus aliados resolveram tratar como clientes eleitorais. É essa “genialidade” que o governo manda a imprensa admirar. E a imprensa, atenta e veneradora, admira.

Há duas décadas, que o regime português é um longo crepúsculo adoçado pelos juros baratos do Euro. Esta estagnação, porém, não é politicamente neutral. Facilitou o projecto socialista de domínio do país, assente no controle do Estado, e portanto dos recursos externos a que o Estado tem acesso através da integração europeia, e na segmentação cínica de uma sociedade cada dia mais pobre e vulnerável. Hoje, os portugueses estão divididos entre os que, sob a protecção do Estado, recebem aumentos durante a quarentena e os que, no “sector privado”, estão condenados ao lay-off e ao desemprego; ou entre os que, à esquerda, podem manifestar-se, fazer comícios e bater palmas aos humoristas de serviço, e os que, como os católicos, têm a polícia a cercar os locais onde possam eventualmente reunir-se. Nunca tanta gente foi empurrada para fora do regime. Há agora em Portugal dois países: o das esquerdas anichadas no Estado, e o dos outros. É essa a verdadeira obra desta governação. A abstenção tem sido, por enquanto, o mar onde desaguam as exclusões sociais e as discriminações políticas do poder socialista. Alguém se preocupa com o risco de um dia vir desse mar uma onda que varra tudo?

Em 1958, houve eleições presidenciais em Portugal. Era no tempo de Salazar. Por causa do general Delgado, houve alguma curiosidade internacional. O New York Times deu-se até ao trabalho de explicar o que se passava. Não, não era como na América. O presidente seria quem o chefe de governo quisesse. Ia ser um almirante, mas, segundo o New York Times, podia ter sido um polícia sinaleiro, se fosse essa a escolha do ditador. Era assim em 1958. Em 2020, o chefe do governo ainda tenta fingir que escolhe o presidente da república, como se viu na Autoeuropa. Mas no que António Costa é mesmo soberano é noutra coisa: a eleger “génios das Finanças”. Não um ministro, porque isso está ao alcance de qualquer mortal que seja primeiro-ministro, mas um “génio”, ou, na linguagem futebolística que o regime usa para fazer de conta que é popular, um “Ronaldo das Finanças”.

A posição de “Ronaldo” foi ocupada até agora por Mário Centeno. Há uns tempos, percebeu-se – pelos “sinais” típicos das autocracias — que não estava para durar. E esta semana, eis subitamente alguém em quem o país nunca reparara levantado à glória de novo “Ronaldo”. Foi um secretário de Estado. Podia bem ter sido, como na história de Salazar, um polícia sinaleiro. Não teria feito qualquer diferença. O jornalismo estaria agora igualmente embasbacado com a sua genialidade, a contar histórias de como, no cruzamento onde o “Ronaldo” costumava estar de serviço, o trânsito fluía muito certinho. Ronaldo das Finanças é quem António Costa quiser.

A pergunta é esta: porque é que os ministros das Finanças de António Costa têm de ser Ronaldos? Porque é que não podem ser apenas ministros das Finanças? Porque é preciso fingir. Sim, isso: fingir. Em 2016, foi preciso fingir que a possibilidade de fazer “reposições de direitos” não se devia ao ajustamento conseguido por Passos Coelho, com Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque no Ministério das Finanças. Desde então, foi ainda preciso continuar a fingir que a política financeira não se reduziu a manter a carga fiscal do ajustamento e a fazer cativações para justificar, em Bruxelas, o apoio financeiro europeu que, desde os anos 90, disfarça a estagnação económica portuguesa. Esse apoio requer um certo valor do défice. Os “Ronaldos” trataram de o conseguir sacrificando tudo, menos as classes que o PS e os seus aliados resolveram tratar como clientes eleitorais. É essa “genialidade” que o governo manda a imprensa admirar. E a imprensa, atenta e veneradora, admira.

Há duas décadas, que o regime português é um longo crepúsculo adoçado pelos juros baratos do Euro. Esta estagnação, porém, não é politicamente neutral. Facilitou o projecto socialista de domínio do país, assente no controle do Estado, e portanto dos recursos externos a que o Estado tem acesso através da integração europeia, e na segmentação cínica de uma sociedade cada dia mais pobre e vulnerável. Hoje, os portugueses estão divididos entre os que, sob a protecção do Estado, recebem aumentos durante a quarentena e os que, no “sector privado”, estão condenados ao lay-off e ao desemprego; ou entre os que, à esquerda, podem manifestar-se, fazer comícios e bater palmas aos humoristas de serviço, e os que, como os católicos, têm a polícia a cercar os locais onde possam eventualmente reunir-se. Nunca tanta gente foi empurrada para fora do regime. Há agora em Portugal dois países: o das esquerdas anichadas no Estado, e o dos outros. É essa a verdadeira obra desta governação. A abstenção tem sido, por enquanto, o mar onde desaguam as exclusões sociais e as discriminações políticas do poder socialista. Alguém se preocupa com o risco de um dia vir desse mar uma onda que varra tudo?

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