«Jotas» rivalizam com o PCP e PP

03-10-1999
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Um exemplo desta realidade foi a recente discussão parlamentar sobre a despenalização do aborto, um tema de sempre do PCP. Depois da derrota que o seu projecto sofreu no ano passado a JS voltou, este ano, a apresentar a sua proposta e a despenalização foi aprovada. Em todo o processo, o PCP acabou relegado para segundo plano.

Mas por que é que são os «juniores» e não os «seniores» os arautos das convicções, especialmente nestes últimos anos? Os líderes da Juventude Socialista e o da Juventude Social Democrata, Sérgio Sousa Pinto e Jorge Moreira da Silva, respectivamente, têm uma resposta quase coincidente. A JS «está mais bem colocada» para fazer um discurso que Sousa Pinto apelida de «consciência crítica de esquerda no PS e na sociedade». Porque «não tem vocação de poder» e «está liberta» de uma série de «constrangimentos» que o PS tem de ter em conta, nomeadamente numa altura em que «existem factores que amarram a governação ao centro». Quanto às iniciativas que a sua organização tem tomado, considera que «credibilizam o PS à esquerda», sendo a JS uma «indiscutível mais-valia para o partido».

E Jorge Moreira da Silva pensa que as juventudes partidárias estão mais «ideologizadas» porque «não estão constrangidas pela governação ou pela sua preparação». Assim, estando mais «libertas» (no estado «original da política», afirma) podem dizer o «que pensam», sem «necessidade de temperar» o seu discurso. Mas o líder da JSD defende que a sua organização «complementa» o PSD e que não pode ser «redundante» em relação ao partido. E onde os «seniores» têm mais dificuldade em captar eleitorado - ao centro - é o campo da JSD que, desde a sua fundação, diz Moreira da Silva, «sempre esteve à esquerda do PSD», com uma «preocupação social muito marcada». Tal como a JS, a diferenciação ideológica da «Jota» não deixa também de ser uma mais-valia.

A JS como «consciência crítica» do PS

O «histórico» deputado socialista Manuel Alegre defende que «estamos na hora da globalização», quadro em que as alternativas ideológicas têm «maior dificuldade em se afirmar» e cujas consequências em Portugal «também se sentem».

E quanto à JS, Alegre afirma que pela «primeira vez» está a desempenhar o papel que é o seu: «De consciência crítica de esquerda e uma incomodidade para o partido». Incomodidade que o deputado vê como «estimulante» mas que, deixa o recado, para outros poderá constituir uma «perturbação».

O facto de serem os jovens, e não o partido, os portadores de uma série de «bandeiras» como as do aborto, da droga ou das uniões de facto é explicado pelo deputado pela sua «juventude» - «mais sensível a estes temas» -, que tem «mais iniciativa, criatividade» e, por outro lado, «uma maior desinibição» em relação a alguns tabus «ainda imperantes na sociedade».

Marcos Perestrelo, do Secretariado Nacional da JS, corrobora as afirmações de Sérgio Sousa Pinto e de Manuel Alegre de que a organização a que pertence é a «consciência crítica no PS» e, nota, «na esquerda do PS». Um rumo que foi decidido quando, há cerca de quatro anos, Sousa Pinto apresentou a sua moção «Uma esquerda para a nossa época». Por outro lado, entende que só se «estranha» a «ideologização» da JS porque «normalmente» as juventudes «não têm preocupação em traçar um rumo ideológico».

«A JSD é uma cópia «softcore» da JS»

Já para o deputado social-democrata e ex-vice-presidente da JSD, Rui Rio, a evolução do PS «a partir do momento» em que Mário Soares foi eleito Presidente da República «foi caminhar para a direita, afastando-se da sua linha mais tradicional». E, adianta, a seguir à eleição de António Guterres como secretário-geral o PS «começou a caminhar para o poder». Desde esse momento e «até aqui» há uma «desvalorização de princípios e valorização da gestão conjuntural do poder».

No que respeita à JS, para Rio, o que se passa é que, como os socialistas estão «há pouco» no poder, «ainda não houve tempo para que a JS tivesse sido desvirtuada por esse mesmo poder» e, assim, tem espaço para «explorar a linha tradicional socialista» - sem «retirar o mérito» a Sérgio Sousa Pinto, esclarece, porque se «fosse outro o líder as coisas poderiam ser diferentes».

Uma análise «completamente diferente» faz quanto à juventude do seu próprio partido. A «Jota» «foi conquistada pelo poder», afirma, e está, neste momento, a atravessar uma «fase difícil»: a da «libertação e renascimento» do «verdadeiro espírito da JSD que havia no fim dos anos 70, início de 80». Mas, sublinha Rio, «no meu tempo» a JSD «era mais à esquerda do que o PSD»; agora, porém, não pensa que nas acções da juventude social-democrata fique «sistematicamente vincada a diferença ideológica» face ao partido, o que, por outro lado, «acontece na JS».

Jorge Ferreira, deputado do PP, entende que as demonstrações das convicções ideológicas da JS se explicam pelo conflito de gerações que «o PS tem para resolver»: entre a «geração de Argel e a geração tecnocrática». Nesse quadro, considera, a JuventudeSocialista aparece como «representante tardia da geração de Argel».

Jovens socialistas podem substituir PCP?

Para Jorge Ferreira, outros factores que explicam ainda a actuação da JS são a «sofreguidão mediática» de alguns dos seus «protagonistas» e a «incompatibilidade inconsciente de resistir às diferenças ideológicas entre António Guterres e o PS».

Sobre os jovens sociais-democratas Jorge Ferreira apenas afirma: «A JSD é uma cópia 'softcore' da JS».

Mas a JS está a ocupar o espaço do PCP? Jorge Ferreira acredita que «a radicalização à esquerda» que a JS «provoca no PS» faz passar para «segundo plano as posições teóricas do PCP na mesma matéria». Fenómeno que se não dá em relação ao PP, JSD e PSD porque o «código genético» dos jovens sociais-democratas «é de esquerda».

Para Rui Rio, o PCP está «mais à esquerda» que a JS, e a «tremenda injustiça» de os jovens socialistas terem ficado com a «bandeira» do aborto foi, para o deputado sicial-democrata, «mais uma consequência da mediatização desta questão». Para mais, pensa que «dificilmente um líder de juventude pode transformar-se num referencial para a sociedade».

Manuel Alegre e Marcos Perestrelo não têm dúvidas. Para o deputado, a JS não está a ocupar o espaço do PCP, tem é «convicções fortes, o que é bom». Para Perestrelo, não é «legítimo» reduzir a questão da interrupção voluntária da gravidez a «uma questão entre a JS e o PCP». A JS, adianta, «não quer disputar o espaço ao PCP», partido que tem, «nomeadamente», um conteúdo programático «diferente» do PS.

Teresa Oliveira

Um exemplo desta realidade foi a recente discussão parlamentar sobre a despenalização do aborto, um tema de sempre do PCP. Depois da derrota que o seu projecto sofreu no ano passado a JS voltou, este ano, a apresentar a sua proposta e a despenalização foi aprovada. Em todo o processo, o PCP acabou relegado para segundo plano.

Mas por que é que são os «juniores» e não os «seniores» os arautos das convicções, especialmente nestes últimos anos? Os líderes da Juventude Socialista e o da Juventude Social Democrata, Sérgio Sousa Pinto e Jorge Moreira da Silva, respectivamente, têm uma resposta quase coincidente. A JS «está mais bem colocada» para fazer um discurso que Sousa Pinto apelida de «consciência crítica de esquerda no PS e na sociedade». Porque «não tem vocação de poder» e «está liberta» de uma série de «constrangimentos» que o PS tem de ter em conta, nomeadamente numa altura em que «existem factores que amarram a governação ao centro». Quanto às iniciativas que a sua organização tem tomado, considera que «credibilizam o PS à esquerda», sendo a JS uma «indiscutível mais-valia para o partido».

E Jorge Moreira da Silva pensa que as juventudes partidárias estão mais «ideologizadas» porque «não estão constrangidas pela governação ou pela sua preparação». Assim, estando mais «libertas» (no estado «original da política», afirma) podem dizer o «que pensam», sem «necessidade de temperar» o seu discurso. Mas o líder da JSD defende que a sua organização «complementa» o PSD e que não pode ser «redundante» em relação ao partido. E onde os «seniores» têm mais dificuldade em captar eleitorado - ao centro - é o campo da JSD que, desde a sua fundação, diz Moreira da Silva, «sempre esteve à esquerda do PSD», com uma «preocupação social muito marcada». Tal como a JS, a diferenciação ideológica da «Jota» não deixa também de ser uma mais-valia.

A JS como «consciência crítica» do PS

O «histórico» deputado socialista Manuel Alegre defende que «estamos na hora da globalização», quadro em que as alternativas ideológicas têm «maior dificuldade em se afirmar» e cujas consequências em Portugal «também se sentem».

E quanto à JS, Alegre afirma que pela «primeira vez» está a desempenhar o papel que é o seu: «De consciência crítica de esquerda e uma incomodidade para o partido». Incomodidade que o deputado vê como «estimulante» mas que, deixa o recado, para outros poderá constituir uma «perturbação».

O facto de serem os jovens, e não o partido, os portadores de uma série de «bandeiras» como as do aborto, da droga ou das uniões de facto é explicado pelo deputado pela sua «juventude» - «mais sensível a estes temas» -, que tem «mais iniciativa, criatividade» e, por outro lado, «uma maior desinibição» em relação a alguns tabus «ainda imperantes na sociedade».

Marcos Perestrelo, do Secretariado Nacional da JS, corrobora as afirmações de Sérgio Sousa Pinto e de Manuel Alegre de que a organização a que pertence é a «consciência crítica no PS» e, nota, «na esquerda do PS». Um rumo que foi decidido quando, há cerca de quatro anos, Sousa Pinto apresentou a sua moção «Uma esquerda para a nossa época». Por outro lado, entende que só se «estranha» a «ideologização» da JS porque «normalmente» as juventudes «não têm preocupação em traçar um rumo ideológico».

«A JSD é uma cópia «softcore» da JS»

Já para o deputado social-democrata e ex-vice-presidente da JSD, Rui Rio, a evolução do PS «a partir do momento» em que Mário Soares foi eleito Presidente da República «foi caminhar para a direita, afastando-se da sua linha mais tradicional». E, adianta, a seguir à eleição de António Guterres como secretário-geral o PS «começou a caminhar para o poder». Desde esse momento e «até aqui» há uma «desvalorização de princípios e valorização da gestão conjuntural do poder».

No que respeita à JS, para Rio, o que se passa é que, como os socialistas estão «há pouco» no poder, «ainda não houve tempo para que a JS tivesse sido desvirtuada por esse mesmo poder» e, assim, tem espaço para «explorar a linha tradicional socialista» - sem «retirar o mérito» a Sérgio Sousa Pinto, esclarece, porque se «fosse outro o líder as coisas poderiam ser diferentes».

Uma análise «completamente diferente» faz quanto à juventude do seu próprio partido. A «Jota» «foi conquistada pelo poder», afirma, e está, neste momento, a atravessar uma «fase difícil»: a da «libertação e renascimento» do «verdadeiro espírito da JSD que havia no fim dos anos 70, início de 80». Mas, sublinha Rio, «no meu tempo» a JSD «era mais à esquerda do que o PSD»; agora, porém, não pensa que nas acções da juventude social-democrata fique «sistematicamente vincada a diferença ideológica» face ao partido, o que, por outro lado, «acontece na JS».

Jorge Ferreira, deputado do PP, entende que as demonstrações das convicções ideológicas da JS se explicam pelo conflito de gerações que «o PS tem para resolver»: entre a «geração de Argel e a geração tecnocrática». Nesse quadro, considera, a JuventudeSocialista aparece como «representante tardia da geração de Argel».

Jovens socialistas podem substituir PCP?

Para Jorge Ferreira, outros factores que explicam ainda a actuação da JS são a «sofreguidão mediática» de alguns dos seus «protagonistas» e a «incompatibilidade inconsciente de resistir às diferenças ideológicas entre António Guterres e o PS».

Sobre os jovens sociais-democratas Jorge Ferreira apenas afirma: «A JSD é uma cópia 'softcore' da JS».

Mas a JS está a ocupar o espaço do PCP? Jorge Ferreira acredita que «a radicalização à esquerda» que a JS «provoca no PS» faz passar para «segundo plano as posições teóricas do PCP na mesma matéria». Fenómeno que se não dá em relação ao PP, JSD e PSD porque o «código genético» dos jovens sociais-democratas «é de esquerda».

Para Rui Rio, o PCP está «mais à esquerda» que a JS, e a «tremenda injustiça» de os jovens socialistas terem ficado com a «bandeira» do aborto foi, para o deputado sicial-democrata, «mais uma consequência da mediatização desta questão». Para mais, pensa que «dificilmente um líder de juventude pode transformar-se num referencial para a sociedade».

Manuel Alegre e Marcos Perestrelo não têm dúvidas. Para o deputado, a JS não está a ocupar o espaço do PCP, tem é «convicções fortes, o que é bom». Para Perestrelo, não é «legítimo» reduzir a questão da interrupção voluntária da gravidez a «uma questão entre a JS e o PCP». A JS, adianta, «não quer disputar o espaço ao PCP», partido que tem, «nomeadamente», um conteúdo programático «diferente» do PS.

Teresa Oliveira

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