«Um drogado que rouba não é criminoso»

13-09-1999
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Paulo Mendo, Eurico Figueiredo, João Menezes Ferreira e Jorge Torgal, na mesa do congresso da SOMA

«Criminoso? De modo nenhum! Agente material apenas. Foram as suas mãos que roubaram ou mataram. Ele não 'quis' fazer o que fez. Não teve culpa de o ter feito. Não era, no momento, senhor da sua liberdade, da sua consciência e da sua vontade. E nós sabemos que não existe crime sem adesão consciente, livre e voluntária ao resultado do acto cometido».

Mais à frente, Almeida Santos escreve ainda: «Dito isto, faz algum sentido continuarmos a perene discussão do costume sobre se o toxicodependente deve ser encarado como criminoso ou como doente? Em estado de necessidade, criminoso é que ele não é!»

O discurso de Almeida Santos, que, por não poder estar presente, foi lido por João Menezes Ferreira (ex-deputado do PS e fundador da SOMA, a organização antiproibicionista que organiza o congresso), já provocou reacções. Entre os técnicos, as teses de Almeida Santos caíram mal por significarem a «infantilização dos toxicodependentes» e, no limite, por conduzirem à «banalização do consumo das drogas», como comentou Carlos Fugas, técnico do Centro de Apoio à Toxicodependência do Restelo, em Lisboa.

Mas Almeida Santos não é a única estrela do congresso da SOMA, que hoje prossegue na Gulbenkian, em Lisboa. Ambros Uchtenhagen, um investigador suíço, vai hoje apresentar os resultados de um polémico projecto realizado no seu país, com o apoio das autoridades locais, que decorreu entre 1994 e 1996 com mais de mil toxicodependentes.

A experiência baseou-se na prescrição controlada de estupefacientes - heroína, cocaína e metadona -, tendo decorrido em 18 centros de tratamento de toxicodependentes (um deles, prisional) espalhados por toda a Suíça. O proclamado êxito do projecto, que os investigadores têm feito divulgar pela Europa e pelos EUA, tem servido de bandeira aos movimentos políticos que defendem a liberalização das drogas.

No entanto, as críticas a alguns dos aspectos metodológicos seguidos levantam, entre os técnicos, dúvidas sobre a confiança dos resultados. Uchtenhagen defende que a prescrição de droga a toxicodependentes duradouros, em quem falharam outros métodos, permitiu a redução dos índices de criminalidade, a integração social e a melhoria das condições de saúde.

«Disponível para o debate sem tabus», mesmo de teses tão liberalizadores como as dos congressistas da SOMA, parece estar o Governo, que aceitou participar no encontro mas preferiu não lhe dar o seu «alto patrocínio» e, com isso, «evitar equívocos sobre a nossa posição». «Discordamos totalmente das posições ali defendidas», disse ao EXPRESSO o ministro José Sócrates, que tem no Governo o pelouro da toxicodependência. Sócrates vai hoje ao Congresso defender a posição do Governo, que considera ser «irresponsável e leviano» qualquer alteração «unilateral» ao actual quadro legal - ou seja, sem discussão nas estruturas que reúnem todas as nações e sem um consenso mundial.

A SOMA, que congrega individualidades de todo o leque partidário - como Eurico Figueiredo, do PS, Paulo Mendo, do PSD, e Rosado Fernandes, do PP -, acusa a falência do proibicionismo, denuncia as suas «graves consequências» na saúde pública e nos índices de criminalidade e defende uma mudança radical nas políticas de droga, no caminho da sua liberalização.

G.R.

Paulo Mendo, Eurico Figueiredo, João Menezes Ferreira e Jorge Torgal, na mesa do congresso da SOMA

«Criminoso? De modo nenhum! Agente material apenas. Foram as suas mãos que roubaram ou mataram. Ele não 'quis' fazer o que fez. Não teve culpa de o ter feito. Não era, no momento, senhor da sua liberdade, da sua consciência e da sua vontade. E nós sabemos que não existe crime sem adesão consciente, livre e voluntária ao resultado do acto cometido».

Mais à frente, Almeida Santos escreve ainda: «Dito isto, faz algum sentido continuarmos a perene discussão do costume sobre se o toxicodependente deve ser encarado como criminoso ou como doente? Em estado de necessidade, criminoso é que ele não é!»

O discurso de Almeida Santos, que, por não poder estar presente, foi lido por João Menezes Ferreira (ex-deputado do PS e fundador da SOMA, a organização antiproibicionista que organiza o congresso), já provocou reacções. Entre os técnicos, as teses de Almeida Santos caíram mal por significarem a «infantilização dos toxicodependentes» e, no limite, por conduzirem à «banalização do consumo das drogas», como comentou Carlos Fugas, técnico do Centro de Apoio à Toxicodependência do Restelo, em Lisboa.

Mas Almeida Santos não é a única estrela do congresso da SOMA, que hoje prossegue na Gulbenkian, em Lisboa. Ambros Uchtenhagen, um investigador suíço, vai hoje apresentar os resultados de um polémico projecto realizado no seu país, com o apoio das autoridades locais, que decorreu entre 1994 e 1996 com mais de mil toxicodependentes.

A experiência baseou-se na prescrição controlada de estupefacientes - heroína, cocaína e metadona -, tendo decorrido em 18 centros de tratamento de toxicodependentes (um deles, prisional) espalhados por toda a Suíça. O proclamado êxito do projecto, que os investigadores têm feito divulgar pela Europa e pelos EUA, tem servido de bandeira aos movimentos políticos que defendem a liberalização das drogas.

No entanto, as críticas a alguns dos aspectos metodológicos seguidos levantam, entre os técnicos, dúvidas sobre a confiança dos resultados. Uchtenhagen defende que a prescrição de droga a toxicodependentes duradouros, em quem falharam outros métodos, permitiu a redução dos índices de criminalidade, a integração social e a melhoria das condições de saúde.

«Disponível para o debate sem tabus», mesmo de teses tão liberalizadores como as dos congressistas da SOMA, parece estar o Governo, que aceitou participar no encontro mas preferiu não lhe dar o seu «alto patrocínio» e, com isso, «evitar equívocos sobre a nossa posição». «Discordamos totalmente das posições ali defendidas», disse ao EXPRESSO o ministro José Sócrates, que tem no Governo o pelouro da toxicodependência. Sócrates vai hoje ao Congresso defender a posição do Governo, que considera ser «irresponsável e leviano» qualquer alteração «unilateral» ao actual quadro legal - ou seja, sem discussão nas estruturas que reúnem todas as nações e sem um consenso mundial.

A SOMA, que congrega individualidades de todo o leque partidário - como Eurico Figueiredo, do PS, Paulo Mendo, do PSD, e Rosado Fernandes, do PP -, acusa a falência do proibicionismo, denuncia as suas «graves consequências» na saúde pública e nos índices de criminalidade e defende uma mudança radical nas políticas de droga, no caminho da sua liberalização.

G.R.

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