Sobreendividados com sete anos para pagar

11-09-1999
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O NOVO regime jurídico sobre insolvência dos particulares prevê uma solução para o sobreendividamento assente na reestruturação do passivo dos devedores através de um processo judicial. O objectivo é o de «conseguir que o devedor fique liberto da maior parte do passivo», segundo se lê no preâmbulo do anteprojecto de lei. O processo é constituído por três fases: a primeira visa o conhecimento da situação patrimonial do devedor, seguindo-se uma fase de mediação sob a tutela de uma entidade administrativa denominada Gabinete de Apoio às Pessoas Singulares Insolventes (GAPSI), em que se procura atingir um acordo de pagamento entre o devedor e os credores. Finalmente, e caso não seja obtido o acordo com os credores, entra-se na terceira e última fase que consiste num plano judicial de pagamento elaborado pelo juiz. Em qualquer dos casos o prazo máximo para a regularização das dívidas é de sete anos. Na filosofia do novo regime estão patentes preocupações não só quanto à utilização abusiva dos meios processuais por parte de «devedores pouco escrupulosos» mas também visando a responsabilização dos credores. Neste aspecto, o anteprojecto de lei impõe aos credores o dever de «actuar com diligência na concessão do crédito, tendo designadamente em conta o fim a que este se destina, a situação patrimonial do devedor, as implicações da dívida para o agregado familiar e as possibilidades de reembolso». Por seu turno, sempre que a insolvência resultar de uma situação de endividamento criada ou agravada por actos intencionais do devedor, este não poderá beneficiar da protecção prevista na lei. As dívidas fiscais e à segurança social serão também objecto de reestruturação, «de modo a conseguir-se a sua satisfação integral durante o período de vigência do acordo ou do plano judicial». Porém, quando «os rendimentos previsíveis do devedor se mostrarem insuficientes para a cobrança integral dos créditos» na vigência do plano ou do acordo de pagamento, «a importância remanescente extingue-se», quer se trate de credores privados quer se trate da fazenda nacional ou da segurança social. As únicas dívidas que se manterão na totalidade são as que gozarem de garantia real, nomeadamente hipoteca ou penhor. O processo de reestruturação das dívidas de pessoas insolventes inicia-se com uma petição dirigida ao tribunal da residência do devedor em que este deve mencionar a composição do seu agregado familiar, o rendimento mensal e as despesas correntes, a relação de todos os credores, montantes do créditos, datas de vencimento e respectivas garantias, relação do activo e respectivo valor, identificação das acções e execuções pendentes contra si, bem como a descrição dos factos que determinaram o aparecimento da situação de sobreendividamento. Posteriormente são citados os credores para justificar os seus créditos num prazo entre dez a vinte dias e opor-se ao pedido com base, nomeadamente, em má-fé do devedor ou na existência de rendimentos suficientes para assegurar o cumprimento da dívida. Se não houver oposição dos credores ou se o juiz concluir pelo prosseguimento do processo é remetida uma cópia deste ao GAPSI para se obter um acordo de pagamento através de negociações entre os interessados. Porém, tal acordo só se considera concluído quando, «em sessão convocada para a sua aprovação não se lhe oponham o devedor ou os credores que representem mais de 50% do valor de todos os créditos ou aqueles que representem mais de 50% dos créditos directamente atingidos com as medidas de reestruturação». Aprovado o acordo o processo é remetido ao juiz para homologação, acompanhado de um relatório do GAPSI. Caso não tenha havido acordo o processo é também remetido ao juiz que fixará então um plano judicial de pagamento, segundo o qual «o cumprimento das obrigações resultantes da aplicação das medidas de reestruturação do passivo seja compatível com os rendimentos do devedor». O plano deverá indicar, nomeadamente, o período de tempo em que vigorará, as obrigações impostas aos devedor e respectivos prazos de cumprimento e os meios afectados ao serviço da dívida. ANTÓNIO MARINHO

Sócrates anuncia novas leis

José Sócrates: as leis existentes são obsoletas

OS CONSUMIDORES que se encontrem numa situação de sobreendividamento vão passar a dispor em breve de um processo judicial de regularização do passivo em tudo semelhante ao processo de recuperação de empresas.

O anúncio desta medida legislativa foi feito no passado fim-de-semana, em Coimbra, pelo ministro José Sócrates, na sessão de encerramento de um Colóquio Internacional sobre o Endividamento dos Consumidores.

Sócrates considerou fundamental uma reforma nas leis sobre a insolvência dos particulares e anunciou que essa legislação estará concluída ainda nesta legislatura.

O EXPRESSO teve acesso ao anteprojecto do novo diploma legal já entregue ao Governo e que foi redigido por uma comissão presidida por António Pinto Monteiro, professor da Faculdade de Direito de Coimbra.

Intitula-se Regime Jurídico de Protecção das Pessoas Singulares Insolventes e prevê que os indivíduos na situação de sobreendividamento (sem bens nem rendimentos suficientes para assegurar o cumprimento das dívidas) poderão recorrer aos tribunais a fim de regularizar a situação através de um plano de liquidação global do passivo reestruturado em função dos rendimentos previsíveis do devedor.

Esse plano poderá resultar de um acordo entre devedor e credores sob a direcção de uma entidade administrativa a criar e denominada Gabinete de Apoio às Pessoas Singulares Insolventes (GAPSI) ou então ser fixado pelo juiz com base num relatório deste gabinete.

Na sua intervenção José Sócrates considerou uma «deficiência gravíssima» haver leis que permitam a recuperação de empresas em situação económica difícil e não haver leis idênticas para as pessoas singulares e esclareceu que a nova legislação não resulta de nenhum preconceito contra o crédito. «Temos um perfil de endividamento que corresponde a uma economia moderna, mas as leis existentes são obsoletas», disse.

O NOVO regime jurídico sobre insolvência dos particulares prevê uma solução para o sobreendividamento assente na reestruturação do passivo dos devedores através de um processo judicial. O objectivo é o de «conseguir que o devedor fique liberto da maior parte do passivo», segundo se lê no preâmbulo do anteprojecto de lei. O processo é constituído por três fases: a primeira visa o conhecimento da situação patrimonial do devedor, seguindo-se uma fase de mediação sob a tutela de uma entidade administrativa denominada Gabinete de Apoio às Pessoas Singulares Insolventes (GAPSI), em que se procura atingir um acordo de pagamento entre o devedor e os credores. Finalmente, e caso não seja obtido o acordo com os credores, entra-se na terceira e última fase que consiste num plano judicial de pagamento elaborado pelo juiz. Em qualquer dos casos o prazo máximo para a regularização das dívidas é de sete anos. Na filosofia do novo regime estão patentes preocupações não só quanto à utilização abusiva dos meios processuais por parte de «devedores pouco escrupulosos» mas também visando a responsabilização dos credores. Neste aspecto, o anteprojecto de lei impõe aos credores o dever de «actuar com diligência na concessão do crédito, tendo designadamente em conta o fim a que este se destina, a situação patrimonial do devedor, as implicações da dívida para o agregado familiar e as possibilidades de reembolso». Por seu turno, sempre que a insolvência resultar de uma situação de endividamento criada ou agravada por actos intencionais do devedor, este não poderá beneficiar da protecção prevista na lei. As dívidas fiscais e à segurança social serão também objecto de reestruturação, «de modo a conseguir-se a sua satisfação integral durante o período de vigência do acordo ou do plano judicial». Porém, quando «os rendimentos previsíveis do devedor se mostrarem insuficientes para a cobrança integral dos créditos» na vigência do plano ou do acordo de pagamento, «a importância remanescente extingue-se», quer se trate de credores privados quer se trate da fazenda nacional ou da segurança social. As únicas dívidas que se manterão na totalidade são as que gozarem de garantia real, nomeadamente hipoteca ou penhor. O processo de reestruturação das dívidas de pessoas insolventes inicia-se com uma petição dirigida ao tribunal da residência do devedor em que este deve mencionar a composição do seu agregado familiar, o rendimento mensal e as despesas correntes, a relação de todos os credores, montantes do créditos, datas de vencimento e respectivas garantias, relação do activo e respectivo valor, identificação das acções e execuções pendentes contra si, bem como a descrição dos factos que determinaram o aparecimento da situação de sobreendividamento. Posteriormente são citados os credores para justificar os seus créditos num prazo entre dez a vinte dias e opor-se ao pedido com base, nomeadamente, em má-fé do devedor ou na existência de rendimentos suficientes para assegurar o cumprimento da dívida. Se não houver oposição dos credores ou se o juiz concluir pelo prosseguimento do processo é remetida uma cópia deste ao GAPSI para se obter um acordo de pagamento através de negociações entre os interessados. Porém, tal acordo só se considera concluído quando, «em sessão convocada para a sua aprovação não se lhe oponham o devedor ou os credores que representem mais de 50% do valor de todos os créditos ou aqueles que representem mais de 50% dos créditos directamente atingidos com as medidas de reestruturação». Aprovado o acordo o processo é remetido ao juiz para homologação, acompanhado de um relatório do GAPSI. Caso não tenha havido acordo o processo é também remetido ao juiz que fixará então um plano judicial de pagamento, segundo o qual «o cumprimento das obrigações resultantes da aplicação das medidas de reestruturação do passivo seja compatível com os rendimentos do devedor». O plano deverá indicar, nomeadamente, o período de tempo em que vigorará, as obrigações impostas aos devedor e respectivos prazos de cumprimento e os meios afectados ao serviço da dívida. ANTÓNIO MARINHO

Sócrates anuncia novas leis

José Sócrates: as leis existentes são obsoletas

OS CONSUMIDORES que se encontrem numa situação de sobreendividamento vão passar a dispor em breve de um processo judicial de regularização do passivo em tudo semelhante ao processo de recuperação de empresas.

O anúncio desta medida legislativa foi feito no passado fim-de-semana, em Coimbra, pelo ministro José Sócrates, na sessão de encerramento de um Colóquio Internacional sobre o Endividamento dos Consumidores.

Sócrates considerou fundamental uma reforma nas leis sobre a insolvência dos particulares e anunciou que essa legislação estará concluída ainda nesta legislatura.

O EXPRESSO teve acesso ao anteprojecto do novo diploma legal já entregue ao Governo e que foi redigido por uma comissão presidida por António Pinto Monteiro, professor da Faculdade de Direito de Coimbra.

Intitula-se Regime Jurídico de Protecção das Pessoas Singulares Insolventes e prevê que os indivíduos na situação de sobreendividamento (sem bens nem rendimentos suficientes para assegurar o cumprimento das dívidas) poderão recorrer aos tribunais a fim de regularizar a situação através de um plano de liquidação global do passivo reestruturado em função dos rendimentos previsíveis do devedor.

Esse plano poderá resultar de um acordo entre devedor e credores sob a direcção de uma entidade administrativa a criar e denominada Gabinete de Apoio às Pessoas Singulares Insolventes (GAPSI) ou então ser fixado pelo juiz com base num relatório deste gabinete.

Na sua intervenção José Sócrates considerou uma «deficiência gravíssima» haver leis que permitam a recuperação de empresas em situação económica difícil e não haver leis idênticas para as pessoas singulares e esclareceu que a nova legislação não resulta de nenhum preconceito contra o crédito. «Temos um perfil de endividamento que corresponde a uma economia moderna, mas as leis existentes são obsoletas», disse.

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