Astrologias

21-09-1999
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Um trabalho inteligente sobre a melancolia trágica do «carpe diem»

Tendo o «guião» do espectáculo sido criado por um novo autor (n. 1966) oriundo do cinema, não é, pois, de estranhar que a estrutura externa do texto assente no «fragmento» (75 fragmentos no total). Mas, se esta estrutura formal não constitui qualquer novidade, o mesmo já se não pode dizer do notável humor e capacidade de observação revelados por Luís Fonseca. Partindo da imagem do voo e do símbolo da borboleta propostos pelo texto como suportes metafóricos da questionação da possibilidade do amor romântico hoje - uma interrogação que, se bem que séria nos seus pressupostos, não prescinde, felizmente, do recurso à ironia e ao humor escondidos, por exemplo, por detrás da evidenciação dos (repetitivos) padrões de comportamento amoroso ou por detrás das teorizações sexistas da sexualidade! -, Álvaro Correia, com o apoio plástico de Rosa Freitas (cenografia e figurinos), constrói um universo simbólico para essa interrogação (com resposta) pautado por imagens retiradas do campo semântico da astrologia.

É por via desta opção que o universo cénico é, aqui, transposto para o imaginário do espaço sideral - o centro «solar» da cena é, justamente, a representação da trajectória, em elipse inclinada, do astro-brasa - e que o encontro e desencontro entre os cinco homens e as seis mulheres (desequilíbrio muito significativo) se processam como se de tangentes entre órbitas ou de tangentes com cometas se tratasse.

A interpretação das figuras desses astros «estigmatizados» (veja-se o enigmático «gesto» simbólico de Rosa Freitas nos figurinos, reforçando a «tragicidade» deste espectáculo) que, deste modo, entrecruzam os seus desejos, frustrações e perplexidades, está a cargo de um excelente elenco de actores quase todos muito novos (Carlos Oliveira, ainda aluno da Escola Superior de Teatro, numa estreia auspiciosa; Hugo Sequeira, também actor-estudante, a continuar um trajecto iniciado na Cornucópia; e a fulgurante força viva de Margarida Cardeal), liderados por um conjunto de actores, esses com muitas provas dadas, como é o caso dos «futuros veteranos» Alfredo Brissos e Teresa Corte-Real, para além de Cecília Sousa, Carlos Vieira, Cristina Cavalinhos, Dina Lopes ou ainda o divertido Miguel Sermão e a belíssima Mafalda Vilhena.

O Voo das Borboletas é um trabalho inteligente sobre a melancolia trágica do «carpe diem» e é, sobretudo, uma aposta ganha de João Mota na terceira geração daquele que, na história do teatro, figura como «o primeiro teatro na garagem» português.

EUGÉNIA VASQUES

Um trabalho inteligente sobre a melancolia trágica do «carpe diem»

Tendo o «guião» do espectáculo sido criado por um novo autor (n. 1966) oriundo do cinema, não é, pois, de estranhar que a estrutura externa do texto assente no «fragmento» (75 fragmentos no total). Mas, se esta estrutura formal não constitui qualquer novidade, o mesmo já se não pode dizer do notável humor e capacidade de observação revelados por Luís Fonseca. Partindo da imagem do voo e do símbolo da borboleta propostos pelo texto como suportes metafóricos da questionação da possibilidade do amor romântico hoje - uma interrogação que, se bem que séria nos seus pressupostos, não prescinde, felizmente, do recurso à ironia e ao humor escondidos, por exemplo, por detrás da evidenciação dos (repetitivos) padrões de comportamento amoroso ou por detrás das teorizações sexistas da sexualidade! -, Álvaro Correia, com o apoio plástico de Rosa Freitas (cenografia e figurinos), constrói um universo simbólico para essa interrogação (com resposta) pautado por imagens retiradas do campo semântico da astrologia.

É por via desta opção que o universo cénico é, aqui, transposto para o imaginário do espaço sideral - o centro «solar» da cena é, justamente, a representação da trajectória, em elipse inclinada, do astro-brasa - e que o encontro e desencontro entre os cinco homens e as seis mulheres (desequilíbrio muito significativo) se processam como se de tangentes entre órbitas ou de tangentes com cometas se tratasse.

A interpretação das figuras desses astros «estigmatizados» (veja-se o enigmático «gesto» simbólico de Rosa Freitas nos figurinos, reforçando a «tragicidade» deste espectáculo) que, deste modo, entrecruzam os seus desejos, frustrações e perplexidades, está a cargo de um excelente elenco de actores quase todos muito novos (Carlos Oliveira, ainda aluno da Escola Superior de Teatro, numa estreia auspiciosa; Hugo Sequeira, também actor-estudante, a continuar um trajecto iniciado na Cornucópia; e a fulgurante força viva de Margarida Cardeal), liderados por um conjunto de actores, esses com muitas provas dadas, como é o caso dos «futuros veteranos» Alfredo Brissos e Teresa Corte-Real, para além de Cecília Sousa, Carlos Vieira, Cristina Cavalinhos, Dina Lopes ou ainda o divertido Miguel Sermão e a belíssima Mafalda Vilhena.

O Voo das Borboletas é um trabalho inteligente sobre a melancolia trágica do «carpe diem» e é, sobretudo, uma aposta ganha de João Mota na terceira geração daquele que, na história do teatro, figura como «o primeiro teatro na garagem» português.

EUGÉNIA VASQUES

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