JORNAL PUBLICO: A difícil gestão das tensões

05-10-1999
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12/07/95

A difícil gestão das tensões

Áurea Sampaio

O actual líder do PSD sempre foi exímio a cerzir as listas. Era ele que executava esse trabalho para Cavaco Silva e talvez advenha do cumprimento desse papel muita da hostilidade que uma parte do partido lhe demonstrou no congresso. Ciente disso, Nogueira fez saber que delegou noutros a ingrata missão. Só que (ainda) ninguém acredita. Tudo o que acontecer nas listas lhe será imputado. Agora começa o tempo de gerir as sensibilidades. Nogueiristas, barrosistas e santanistas estão todos à coca.

Passada a primeira etapa, Fernando Nogueira passou à fase seguinte da escolha das listas, o momento provavelmente mais delicado. São centenas de nomes que deverão ser convenientemente ordenados, numa operação tão delicada quanto a que executa o cirurgião quando anestesia o paciente retalhando aqui, cozendo ali, enxertando mais à frente. Os médicos costumam ter mais sorte que os dirigentes políticos, pois não há memória de estes obterem sucesso total.

Além das secções, concelhias, distritais e figuras nacionais a direcção de Fernando Nogueira vai ter também de gerir de uma forma mais ou menos visível os problemas ligados às duas sensibilidades que com ele disputaram a liderança do partido. E este não são nada fáceis. Vamos ao caso dos ex-barrosistas. O caso mais singular joga-se em Castelo Branco com um braço-de-ferro entre Carlos Pinto, deputado, ex-presidente da câmara da Covilhã membro de uma das comissões políticas de Cavaco e um dos apoiantes de primeira hora de Durão Barroso - se este tivesse sido eleito, Pinto seria um dos vice-presidentes do PSD - e Manuel Frexes, o substituto de Pedro Santana Lopes na Cultura e um dos nomes por este indicados a Nogueira para figurar as listas. Carlos Pinto foi cabeça-de-lista em Castelo Branco há quatro anos, lugar agora preenchido por Álvaro Barreto. Em segundo lugar figura Antunes da Silva, o nome mais votado pela distrital com peso acrescido pela sua condição de membro da Comissão Política de Nogueira. O terceiro posto é o último susceptível de eleição. Pinto e Frexes estão à espreita, sendo que o primeiro teve mais apoios locais. Como vai Nogueira desempatar? Para contentar Durão corre o risco de afrontar Santana... e vice-versa. Há já quem alvitre que " Frexes vai ser paraquedista noutro distrito"... como figura nacional.

Casos difíceis

As dores de cabeça com os ex-barrosistas vão ser mais do que muitas, sobretudo em Lisboa. É bom não esquecer que as secções praticamente não votaram nenhum dos actuais deputados e muitos deles apoiaram o ministro dos Negócios Estrangeiros. Pedro Roseta, Rui Carp, João Matos, Sousa Lara, João Salgado são nomes sem lugar assegurado, embora alguns tenham mais "chance" do que outros. Certas por este círculo estão figuras como Faria de Oliveira (número três), Arlindo de Carvalho, Pedro Pinto, Pedro Passos Coelho (JSD), Arménio Santos (TSD), Francisco Torres, Rui Gomes da Silva, Pedro Campilho e Correia Afonso numa mistura que inclui todas as sensibilidades internas. Curioso é o facto de a inclusão do ministro do Comércio neste círculo não ser entendida como uma promoção, mas justamente como o contrário. Ou seja, a sua saída de cabeça-de-lista de Faro deve-se a uma "actuação desastrada" na guerra Cabrita Neto-Mendes Bota, com apoio declarado a este último contra o homem que no Algarve, não só esteve desde o início ao lado de Nogueira, como tem o currículo reforçado com a sua condição de compadre de Cavaco Silva. Há ainda o episódio da ida a casa de Guterres, relatado pelo "Independente", alegadamente para dar explicações sobre o caso Renault. Apesar dos desmentidos do próprio e do secretário-geral do PS, há quem na direcção do PSD não tenha esquecido o episódio. Daí a leitura de que Faria entra em Lisboa "apenas por ser vice-presidente do partido".

Coimbra vai ser outro centro de polémica ante a perspectiva de Costa Andrade e Luís Paes de Sousa não figurarem nas listas. Muitos olham para Durão interrogando-se sobre se ele tem ou não capacidade para "proteger" os que, em Fevereiro, "arriscaram tudo" por ele.

Quanto aos santanistas, Nogueira também vai ter de usar de toda a cautela. É que quando começou a fazer as listas telefonou a Santa Lopes a convidá-lo para deputado. O presidente do Sporting agradeceu, mas declinou o convite. No entanto, não esqueceu os amigos fazendo sentir ao líder o quanto gostaria de ver em S. Bento figuras como Rui Gomes da Silva, Correia Afonso, Manuel Frexes, Conceição Monteiro e Manuel Geraldes. Sem se comprometer, Nogueira prometeu pensar. Do resultado das cogitações uma coisa parece certa: os três primeiros vão ter lugares elegíveis, a solução quanto aos dois últimos terá de resultar de uma decisão salomónica do próprio Santana.

O suspense de Durão

Sexta-feira à tarde Fernando Nogueira já tinha praticamente pronto o "puzzle" dos cabeças-de-lista. Há cerca de um mês, o líder do PSD pediu a algumas pessoas que lhe apresentassem um quadro de hipóteses. Ninguém sabe se a solicitação ultrapassou os vice-presidentes e o secretário-geral, mas estes pelo menos foram. Isto mais as suas próprias apostas permitiu-lhe um exercício de cruzamento de nomes que por certo muito o ajudou para se apresentar perante a Comissão Permanente com o trabalho de casa feito. Havia nomes já consultados e seguros, outros ainda não contactados e um que ficou de dar a sua resposta até segunda-feira. Esse nome era o de Durão Barroso e dele dependia muito a arquitectura da lista. É que se o MNE recusasse este círculo o seu nome avançaria para Viseu, onde não ficaria Falcão e Cunha, etc, etc. Talvez por isso Nogueira tenha mantido silêncio sobre as escolhas para Évora, Beja e a Guarda, embora quanto a este círculo tenha dito expressamente estar a pensar no nome de Álvaro Amaro. Marques Mendes foi citado para Braga ou Viana, sem que o nome de Lucas Pires tenha sido sequer ventilado. Curioso é o facto de Nogueira de, junto com Durão, ter avançado logo com o nome de Ferrreira do Amaral para Lisboa. Há quem garanta ter havido aqui o dedo de Cavaco.

O líder do PSD já teve algumas desilusões ao longo deste processo. Uma delas, grande, foi a de Assumção Esteves. Nogueira queria a juíza do Tribunal Constitucional à frente da lista de Vila Real. Outra decepção foi a de Tavares Moreira, o ex-governador do Banco de Portugal, a quem estava reservado um lugar de primeira grandeza em Lisboa, caso não tivesse declinado o convite. Também Isabel Mota recusou ser incluida na lista de Braga. Marques Mendes bem insistiu, mas a secretária de Estado do Planeamento não mudou de posição. Quando terminar o seu mandato deseja tudo menos ficar ligada à vida política.

Mas para além de tudo isto Fernando Nogueira vai ter de gerir o grosso dos problemas oriundos das suas próprias hostes. Muitos vão querer agora cobrar-lhe também o apoio no congresso. Entre estes estão os tais homens do aparelho onde começam a sair as primeiras "rosnadelas" quanto à entrada de tantos ex-barrosistas no topo das listas. "Afinal com o Nogueira parece que é melhor ter estado na oposição".

12/07/95

A difícil gestão das tensões

Áurea Sampaio

O actual líder do PSD sempre foi exímio a cerzir as listas. Era ele que executava esse trabalho para Cavaco Silva e talvez advenha do cumprimento desse papel muita da hostilidade que uma parte do partido lhe demonstrou no congresso. Ciente disso, Nogueira fez saber que delegou noutros a ingrata missão. Só que (ainda) ninguém acredita. Tudo o que acontecer nas listas lhe será imputado. Agora começa o tempo de gerir as sensibilidades. Nogueiristas, barrosistas e santanistas estão todos à coca.

Passada a primeira etapa, Fernando Nogueira passou à fase seguinte da escolha das listas, o momento provavelmente mais delicado. São centenas de nomes que deverão ser convenientemente ordenados, numa operação tão delicada quanto a que executa o cirurgião quando anestesia o paciente retalhando aqui, cozendo ali, enxertando mais à frente. Os médicos costumam ter mais sorte que os dirigentes políticos, pois não há memória de estes obterem sucesso total.

Além das secções, concelhias, distritais e figuras nacionais a direcção de Fernando Nogueira vai ter também de gerir de uma forma mais ou menos visível os problemas ligados às duas sensibilidades que com ele disputaram a liderança do partido. E este não são nada fáceis. Vamos ao caso dos ex-barrosistas. O caso mais singular joga-se em Castelo Branco com um braço-de-ferro entre Carlos Pinto, deputado, ex-presidente da câmara da Covilhã membro de uma das comissões políticas de Cavaco e um dos apoiantes de primeira hora de Durão Barroso - se este tivesse sido eleito, Pinto seria um dos vice-presidentes do PSD - e Manuel Frexes, o substituto de Pedro Santana Lopes na Cultura e um dos nomes por este indicados a Nogueira para figurar as listas. Carlos Pinto foi cabeça-de-lista em Castelo Branco há quatro anos, lugar agora preenchido por Álvaro Barreto. Em segundo lugar figura Antunes da Silva, o nome mais votado pela distrital com peso acrescido pela sua condição de membro da Comissão Política de Nogueira. O terceiro posto é o último susceptível de eleição. Pinto e Frexes estão à espreita, sendo que o primeiro teve mais apoios locais. Como vai Nogueira desempatar? Para contentar Durão corre o risco de afrontar Santana... e vice-versa. Há já quem alvitre que " Frexes vai ser paraquedista noutro distrito"... como figura nacional.

Casos difíceis

As dores de cabeça com os ex-barrosistas vão ser mais do que muitas, sobretudo em Lisboa. É bom não esquecer que as secções praticamente não votaram nenhum dos actuais deputados e muitos deles apoiaram o ministro dos Negócios Estrangeiros. Pedro Roseta, Rui Carp, João Matos, Sousa Lara, João Salgado são nomes sem lugar assegurado, embora alguns tenham mais "chance" do que outros. Certas por este círculo estão figuras como Faria de Oliveira (número três), Arlindo de Carvalho, Pedro Pinto, Pedro Passos Coelho (JSD), Arménio Santos (TSD), Francisco Torres, Rui Gomes da Silva, Pedro Campilho e Correia Afonso numa mistura que inclui todas as sensibilidades internas. Curioso é o facto de a inclusão do ministro do Comércio neste círculo não ser entendida como uma promoção, mas justamente como o contrário. Ou seja, a sua saída de cabeça-de-lista de Faro deve-se a uma "actuação desastrada" na guerra Cabrita Neto-Mendes Bota, com apoio declarado a este último contra o homem que no Algarve, não só esteve desde o início ao lado de Nogueira, como tem o currículo reforçado com a sua condição de compadre de Cavaco Silva. Há ainda o episódio da ida a casa de Guterres, relatado pelo "Independente", alegadamente para dar explicações sobre o caso Renault. Apesar dos desmentidos do próprio e do secretário-geral do PS, há quem na direcção do PSD não tenha esquecido o episódio. Daí a leitura de que Faria entra em Lisboa "apenas por ser vice-presidente do partido".

Coimbra vai ser outro centro de polémica ante a perspectiva de Costa Andrade e Luís Paes de Sousa não figurarem nas listas. Muitos olham para Durão interrogando-se sobre se ele tem ou não capacidade para "proteger" os que, em Fevereiro, "arriscaram tudo" por ele.

Quanto aos santanistas, Nogueira também vai ter de usar de toda a cautela. É que quando começou a fazer as listas telefonou a Santa Lopes a convidá-lo para deputado. O presidente do Sporting agradeceu, mas declinou o convite. No entanto, não esqueceu os amigos fazendo sentir ao líder o quanto gostaria de ver em S. Bento figuras como Rui Gomes da Silva, Correia Afonso, Manuel Frexes, Conceição Monteiro e Manuel Geraldes. Sem se comprometer, Nogueira prometeu pensar. Do resultado das cogitações uma coisa parece certa: os três primeiros vão ter lugares elegíveis, a solução quanto aos dois últimos terá de resultar de uma decisão salomónica do próprio Santana.

O suspense de Durão

Sexta-feira à tarde Fernando Nogueira já tinha praticamente pronto o "puzzle" dos cabeças-de-lista. Há cerca de um mês, o líder do PSD pediu a algumas pessoas que lhe apresentassem um quadro de hipóteses. Ninguém sabe se a solicitação ultrapassou os vice-presidentes e o secretário-geral, mas estes pelo menos foram. Isto mais as suas próprias apostas permitiu-lhe um exercício de cruzamento de nomes que por certo muito o ajudou para se apresentar perante a Comissão Permanente com o trabalho de casa feito. Havia nomes já consultados e seguros, outros ainda não contactados e um que ficou de dar a sua resposta até segunda-feira. Esse nome era o de Durão Barroso e dele dependia muito a arquitectura da lista. É que se o MNE recusasse este círculo o seu nome avançaria para Viseu, onde não ficaria Falcão e Cunha, etc, etc. Talvez por isso Nogueira tenha mantido silêncio sobre as escolhas para Évora, Beja e a Guarda, embora quanto a este círculo tenha dito expressamente estar a pensar no nome de Álvaro Amaro. Marques Mendes foi citado para Braga ou Viana, sem que o nome de Lucas Pires tenha sido sequer ventilado. Curioso é o facto de Nogueira de, junto com Durão, ter avançado logo com o nome de Ferrreira do Amaral para Lisboa. Há quem garanta ter havido aqui o dedo de Cavaco.

O líder do PSD já teve algumas desilusões ao longo deste processo. Uma delas, grande, foi a de Assumção Esteves. Nogueira queria a juíza do Tribunal Constitucional à frente da lista de Vila Real. Outra decepção foi a de Tavares Moreira, o ex-governador do Banco de Portugal, a quem estava reservado um lugar de primeira grandeza em Lisboa, caso não tivesse declinado o convite. Também Isabel Mota recusou ser incluida na lista de Braga. Marques Mendes bem insistiu, mas a secretária de Estado do Planeamento não mudou de posição. Quando terminar o seu mandato deseja tudo menos ficar ligada à vida política.

Mas para além de tudo isto Fernando Nogueira vai ter de gerir o grosso dos problemas oriundos das suas próprias hostes. Muitos vão querer agora cobrar-lhe também o apoio no congresso. Entre estes estão os tais homens do aparelho onde começam a sair as primeiras "rosnadelas" quanto à entrada de tantos ex-barrosistas no topo das listas. "Afinal com o Nogueira parece que é melhor ter estado na oposição".

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