A saída mais fácil

09-09-1999
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Capoulas Santos com Gomes da Silva: a ascensão do secretário de Estado a ministro agradou ao aparelho do PS

Ao contrário do lisboeta Gomes da Silva - grande proprietário agrícola que faz parte da minoria de agricultores que recebem uma esmagadora maioria dos apoios comunitários -, Capoulas Santos (alentejano de Montemor-o-Novo) tem apenas pequenos interesses no sector. A sua ligação à terra é mais teórica do que prática, como é próprio de um licenciado em sociologia.

A derrota em Bruxelas

Ao decidir-se pela demissão, Gomes da Silva acabou por resolver um dos problemas que, cada vez mais, parecia colocar-se a Guterres: manter no Executivo um ministro com manifesta inabilidade política (de que são exemplos a refeição de mioleira em plena crise das «vacas loucas» e o «ataque» aos «lobisomens» de Ourique) e alvo de contestação crescente num sector tradicionalmente conflituoso. A flagrante derrota em Bruxelas - com a reconfirmação pelos parceiros comunitários do boicote espanhol à carne de vaca portuguesa - agravou tudo.

«Stressado ao máximo, com os nervos à flor da pele, a dar murros na mesa por tudo e por nada, este homem não estava em condições de continuar», confidencia ao EXPRESSO um membro do Governo, que, por isso, admite como natural que o coração de Gomes da Silva lhe tenha «pregado uma partida».

Neste sentido, a «doença súbita» que o acometeu esta semana acabou por se revelar oportuna. Apesar de não ter sido internado, Gomes da Silva foi aconselhado pelo seu médico a um repouso absoluto de seis meses - facto que, como o próprio primeiro-ministro veio a afirmar publicamente, tornou inadiável a sua substituição.

Vitória do aparelho

Logo que foi conhecida a decisão de Gomes da Silva, o núcleo socialista da Agricultura, reunido de emergência nessa mesma noite, «elegeu» Capoulas Santos como seu sucessor. Apesar de ser já noite, o recado foi mandado de imediato a Jorge Coelho - o «patrão» do aparelho socialista - que tomou a devida nota. Longe de ter chegado ao fim, a guerra independentes-militantes conhecia um novo desenvolvimento.

A nova equipa da Agricultura é agora toda socialista. Capoulas Santos - que mantinha divergências com o ministro desde a posse do Governo - aproveitou a oportunidade para «correr» com os seus homens de confiança: Marcelo Vasconcelos, substituído na Secretaria de Estado das Pescas por José Apolinário, que deixa o Parlamento Europeu; e Cardoso Leal, que cedeu o lugar de secretário de Estado da Produção Agro-Alimentar a Luís Vieira, administrador do IFADAP. Para o lugar de Capoulas Santos, na Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural, foi escolhido o respectivo director-geral, Vítor Barros.

A confirmar a vitória do aparelho, um dos mais antigos deputados do PS disse ao EXPRESSO que, «como é natural, são mais uma vez os militantes do PS a ter que limpar as borradas feitas pelos independentes».

António Campos apoia

O eurodeputado socialista António Campos, o «inimigo número um» de Gomes da Silva - que em Dezembro de 1996 haveria de abrir uma grave crise no interior do partido ao pedir a cabeça do ministro numa entrevista ao EXPRESSO - apressa-se agora a apoiar Capoulas Santos.

São três as razões invocadas por Campos para justificar a solidariedade ao novo ministro: «a garantia de não estar ligado a nenhum 'lobby' sectorial»; a circunstância de ser militante do PS e socialista; e o facto de «conhecer bem o Ministério», onde trabalha há mais de 20 anos.

O eurodeputado espera agora que mude o comportamento de Portugal em Bruxelas, «substituindo a atitude de passividade por uma luta pelas mudanças». E reclama de novo a mais antiga das suas reivindicações: a substituição da Reper (a Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia), em seu entender constituída fundamentalmente por «gente do PSD».

Remodelação adiada

A opção de Guterres pelo famoso «damage control», depressa eliminou os dois candidatos alternativos à sucessão: Francisco Avilez, um dos nomes mais badalados durante os Estados Gerais, considerado um dos grandes especialistas do sector; e Alberto Costa que, durante os cinco anos que antecederam a subida dos socialistas ao poder, foi porta-voz parlamentar do partido para as questões agrícolas. A escolha de qualquer deles comportaria riscos para Guterres: Avilez, por se mover no mesmo grupo de interesses de Gomes da Silva; e Alberto Costa, por ter saído muito «queimado» do Ministério da Administração Interna.

Ao limitar-se a promover Capoulas Santos de secretário de Estado a ministro, Guterres evitou, para já, uma remodelação governamental que decididamente não deseja, mas que poderá não conseguir evitar. Designadamente se o «não» ganhar no referendo de 8 de Novembro, com a consequente derrota das teses regionalistas do PS e do Governo. Neste cenário, e com a previsão de que a contestação de rua em sectores como a saúde ou a educação - além do da agricultura - poderão intensificar-se, o primeiro-ministro poderá ser impulsionado a promover um «refrescamento» do seu gabinete para a «recta final» pré-legislativas de 1999.

Dezembro ou Janeiro é a data apontada como mais provável para uma eventual remodelação, que poderá até ser provocada por outros factores, como, por exemplo, uma prematura saída do ministro das Finanças, Sousa Franco.

Orlando Raimundo

Capoulas Santos com Gomes da Silva: a ascensão do secretário de Estado a ministro agradou ao aparelho do PS

Ao contrário do lisboeta Gomes da Silva - grande proprietário agrícola que faz parte da minoria de agricultores que recebem uma esmagadora maioria dos apoios comunitários -, Capoulas Santos (alentejano de Montemor-o-Novo) tem apenas pequenos interesses no sector. A sua ligação à terra é mais teórica do que prática, como é próprio de um licenciado em sociologia.

A derrota em Bruxelas

Ao decidir-se pela demissão, Gomes da Silva acabou por resolver um dos problemas que, cada vez mais, parecia colocar-se a Guterres: manter no Executivo um ministro com manifesta inabilidade política (de que são exemplos a refeição de mioleira em plena crise das «vacas loucas» e o «ataque» aos «lobisomens» de Ourique) e alvo de contestação crescente num sector tradicionalmente conflituoso. A flagrante derrota em Bruxelas - com a reconfirmação pelos parceiros comunitários do boicote espanhol à carne de vaca portuguesa - agravou tudo.

«Stressado ao máximo, com os nervos à flor da pele, a dar murros na mesa por tudo e por nada, este homem não estava em condições de continuar», confidencia ao EXPRESSO um membro do Governo, que, por isso, admite como natural que o coração de Gomes da Silva lhe tenha «pregado uma partida».

Neste sentido, a «doença súbita» que o acometeu esta semana acabou por se revelar oportuna. Apesar de não ter sido internado, Gomes da Silva foi aconselhado pelo seu médico a um repouso absoluto de seis meses - facto que, como o próprio primeiro-ministro veio a afirmar publicamente, tornou inadiável a sua substituição.

Vitória do aparelho

Logo que foi conhecida a decisão de Gomes da Silva, o núcleo socialista da Agricultura, reunido de emergência nessa mesma noite, «elegeu» Capoulas Santos como seu sucessor. Apesar de ser já noite, o recado foi mandado de imediato a Jorge Coelho - o «patrão» do aparelho socialista - que tomou a devida nota. Longe de ter chegado ao fim, a guerra independentes-militantes conhecia um novo desenvolvimento.

A nova equipa da Agricultura é agora toda socialista. Capoulas Santos - que mantinha divergências com o ministro desde a posse do Governo - aproveitou a oportunidade para «correr» com os seus homens de confiança: Marcelo Vasconcelos, substituído na Secretaria de Estado das Pescas por José Apolinário, que deixa o Parlamento Europeu; e Cardoso Leal, que cedeu o lugar de secretário de Estado da Produção Agro-Alimentar a Luís Vieira, administrador do IFADAP. Para o lugar de Capoulas Santos, na Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural, foi escolhido o respectivo director-geral, Vítor Barros.

A confirmar a vitória do aparelho, um dos mais antigos deputados do PS disse ao EXPRESSO que, «como é natural, são mais uma vez os militantes do PS a ter que limpar as borradas feitas pelos independentes».

António Campos apoia

O eurodeputado socialista António Campos, o «inimigo número um» de Gomes da Silva - que em Dezembro de 1996 haveria de abrir uma grave crise no interior do partido ao pedir a cabeça do ministro numa entrevista ao EXPRESSO - apressa-se agora a apoiar Capoulas Santos.

São três as razões invocadas por Campos para justificar a solidariedade ao novo ministro: «a garantia de não estar ligado a nenhum 'lobby' sectorial»; a circunstância de ser militante do PS e socialista; e o facto de «conhecer bem o Ministério», onde trabalha há mais de 20 anos.

O eurodeputado espera agora que mude o comportamento de Portugal em Bruxelas, «substituindo a atitude de passividade por uma luta pelas mudanças». E reclama de novo a mais antiga das suas reivindicações: a substituição da Reper (a Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia), em seu entender constituída fundamentalmente por «gente do PSD».

Remodelação adiada

A opção de Guterres pelo famoso «damage control», depressa eliminou os dois candidatos alternativos à sucessão: Francisco Avilez, um dos nomes mais badalados durante os Estados Gerais, considerado um dos grandes especialistas do sector; e Alberto Costa que, durante os cinco anos que antecederam a subida dos socialistas ao poder, foi porta-voz parlamentar do partido para as questões agrícolas. A escolha de qualquer deles comportaria riscos para Guterres: Avilez, por se mover no mesmo grupo de interesses de Gomes da Silva; e Alberto Costa, por ter saído muito «queimado» do Ministério da Administração Interna.

Ao limitar-se a promover Capoulas Santos de secretário de Estado a ministro, Guterres evitou, para já, uma remodelação governamental que decididamente não deseja, mas que poderá não conseguir evitar. Designadamente se o «não» ganhar no referendo de 8 de Novembro, com a consequente derrota das teses regionalistas do PS e do Governo. Neste cenário, e com a previsão de que a contestação de rua em sectores como a saúde ou a educação - além do da agricultura - poderão intensificar-se, o primeiro-ministro poderá ser impulsionado a promover um «refrescamento» do seu gabinete para a «recta final» pré-legislativas de 1999.

Dezembro ou Janeiro é a data apontada como mais provável para uma eventual remodelação, que poderá até ser provocada por outros factores, como, por exemplo, uma prematura saída do ministro das Finanças, Sousa Franco.

Orlando Raimundo

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