PS rasteirado no 25 de Abril

11-09-1999
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A Associação 25 de Abril chegou a ameaçar não participar nas comemorações da «Revolução dos Cravos» se fosse aprovada uma moção marcadamente política e contra Guterres

«É uma rasteira baixa do Partido Comunista», acusa António José Seguro, assegurando que o PS não se desvincula das comemorações, por ser «um partido do 25 de Abril», mas rejeita em bloco a «manobra».

Contra o guterrismo

Intitulado «Apelo à Participação», o documento, de duas páginas, contém inúmeras críticas, veladas mas perceptíveis, à actuação do PS e do Governo.

«É condenável qualquer tentativa de alterar as regras da representação colectiva que, em nome da operacionalidades dos executivos, conduza a Assembleias cuja imagem se não aproxima da sociedade» - ajuíza, numa argumentação em tudo idêntica à que o PCP utilizou esta semana na AR para chumbar as alterações à lei eleitoral.

A questão das propinas também é abordada, em termos de encorajamento ao não pagamento. A linguagem é clara quanto baste: «Importa que os custos do Ensino Superior sejam encarados no âmbito do conceito de serviço público e daí retiradas as devidas consequências. Há que decidir, de uma vez por todas, se uma formatura universitária é apenas uma mais-valia individual ou um benefício extensível à comunidade».

São ainda perceptíveis «boutades» à reforma da Segurança Social («a estratégia neo-liberal visa destruir o Estado-providência»); à presença de Veiga Simão no Governo («ficou por esclarecer a quem deverá ser atribuída, no anterior regime, a responsabilidade de ordenar certos actos»); à criação do Rendimento Mínimo Garantido («faltam postos de trabalho duráveis, que constituam alternativa válida à pseudo-solução de conceder subsídios para aliviar situações extremas»); ou à globalidade da estratégia de Guterres («aos poucos perdeu-se a confiança no futuro, dada a pouco segurança do emprego e a precariedade da assistência», gerando «sindromas de angústia colectiva e descrença na solução política dos problemas»).

Além dos governantes, aparecem a assinar o documento figuras do PS, como João Soares, Francisco Assis, Manuel Alegre, Alberto Martins, António Campos, António Reis, Sérgio Sousa Pinto, João Proença ou Torres Couto. Nenhum deles participou na sua elaboração.

Socialistas «distraídos»...

O texto foi acordado pela comissão promotora das comemorações do 25 de Abril, de que fazem parte representantes do MFA, CGTP, UGT, e quase todos os partidos de esquerda - PS, PCP, PRD, MDP, UDP, «Os Verdes», Plataforma de Esquerda e Política XXI. A comissão, à semelhança do que faz há 18 anos, reuniu na sede da Federação das Colectividades de Cultura e Recreio, sob a coordenação de Cunha Serra, da Intervenção Democrática. A representação do PS foi confiada a João Pedro Correia, adjunto do «patrão» da organização, António Galamba.

Tal como em anos anteriores, foi relator o socialista Aquilino Ribeiro Machado, que transpôs para o papel as ideias expendidas na discussão, sem aparentemente se preocupar com os ataques aos socialistas.

Um tanto estranhamente, porém, o encontro ficou marcado pela discussão não deste mas de um outro documento, que acabou «chumbado»: uma moção mais crítica ainda para o PS e o Governo, que punha em causa «o papel hegemónico dos centros supranacionais de decisão», numa alusão à União Europeia, prognosticando «insegurança quanto ao futuro».

Terá sido precisamente essa discussão que desviou a atenção do jovem que representava o PS, que acabou por dar o aval ao que não devia. Fixado o texto - cujo alcance político João Pedro Correia não terá entendido - os presentes ditaram para a lista de assinaturas os nomes dos correligionários sempre dispostos a apoiar o 25 de Abril, como se tudo não passasse de um ritual evocativo da data.

... e Vasco Lourenço irritado

Luís Fernandes, o representante do PCP, declara-se surpreendido com a reacção dos socialistas, lembrando o que parece evidente: «O texto só avançou porque houve consenso». O dirigente da DORL lamenta que os socialistas não se saibam organizar e garante que a questão teria passado despercebida se, como aconteceu em anos anteriores, o documento não tivesse sido divulgado.

A proposta da moção suscitou forte reacção não apenas do do PS mas da Associação 25 de Abril, com Vasco Lourenço a ameaçar retirar-se das comemorações se o texto fosse aprovado. Reagindo à ameaça, Aquilino rebate os argumentos, expressando o entendimento de que as comemorações não deveriam limitar-se ao habitual, mas assumir-se como «afirmação da tendência» para «uma espécie de máximo denominador comum» da esquerda. Receios do bloco de direita?

«Neste clima, o PS deverá repensar a sua participação na comissão do 25 de Abril» - sugere Galamba, ao mesmo tempo que Seguro garante que os socialistas farão frente a «qualquer tentativa de arrastar o PS para frentismos de esquerda».

Orlando Raimundo

A Associação 25 de Abril chegou a ameaçar não participar nas comemorações da «Revolução dos Cravos» se fosse aprovada uma moção marcadamente política e contra Guterres

«É uma rasteira baixa do Partido Comunista», acusa António José Seguro, assegurando que o PS não se desvincula das comemorações, por ser «um partido do 25 de Abril», mas rejeita em bloco a «manobra».

Contra o guterrismo

Intitulado «Apelo à Participação», o documento, de duas páginas, contém inúmeras críticas, veladas mas perceptíveis, à actuação do PS e do Governo.

«É condenável qualquer tentativa de alterar as regras da representação colectiva que, em nome da operacionalidades dos executivos, conduza a Assembleias cuja imagem se não aproxima da sociedade» - ajuíza, numa argumentação em tudo idêntica à que o PCP utilizou esta semana na AR para chumbar as alterações à lei eleitoral.

A questão das propinas também é abordada, em termos de encorajamento ao não pagamento. A linguagem é clara quanto baste: «Importa que os custos do Ensino Superior sejam encarados no âmbito do conceito de serviço público e daí retiradas as devidas consequências. Há que decidir, de uma vez por todas, se uma formatura universitária é apenas uma mais-valia individual ou um benefício extensível à comunidade».

São ainda perceptíveis «boutades» à reforma da Segurança Social («a estratégia neo-liberal visa destruir o Estado-providência»); à presença de Veiga Simão no Governo («ficou por esclarecer a quem deverá ser atribuída, no anterior regime, a responsabilidade de ordenar certos actos»); à criação do Rendimento Mínimo Garantido («faltam postos de trabalho duráveis, que constituam alternativa válida à pseudo-solução de conceder subsídios para aliviar situações extremas»); ou à globalidade da estratégia de Guterres («aos poucos perdeu-se a confiança no futuro, dada a pouco segurança do emprego e a precariedade da assistência», gerando «sindromas de angústia colectiva e descrença na solução política dos problemas»).

Além dos governantes, aparecem a assinar o documento figuras do PS, como João Soares, Francisco Assis, Manuel Alegre, Alberto Martins, António Campos, António Reis, Sérgio Sousa Pinto, João Proença ou Torres Couto. Nenhum deles participou na sua elaboração.

Socialistas «distraídos»...

O texto foi acordado pela comissão promotora das comemorações do 25 de Abril, de que fazem parte representantes do MFA, CGTP, UGT, e quase todos os partidos de esquerda - PS, PCP, PRD, MDP, UDP, «Os Verdes», Plataforma de Esquerda e Política XXI. A comissão, à semelhança do que faz há 18 anos, reuniu na sede da Federação das Colectividades de Cultura e Recreio, sob a coordenação de Cunha Serra, da Intervenção Democrática. A representação do PS foi confiada a João Pedro Correia, adjunto do «patrão» da organização, António Galamba.

Tal como em anos anteriores, foi relator o socialista Aquilino Ribeiro Machado, que transpôs para o papel as ideias expendidas na discussão, sem aparentemente se preocupar com os ataques aos socialistas.

Um tanto estranhamente, porém, o encontro ficou marcado pela discussão não deste mas de um outro documento, que acabou «chumbado»: uma moção mais crítica ainda para o PS e o Governo, que punha em causa «o papel hegemónico dos centros supranacionais de decisão», numa alusão à União Europeia, prognosticando «insegurança quanto ao futuro».

Terá sido precisamente essa discussão que desviou a atenção do jovem que representava o PS, que acabou por dar o aval ao que não devia. Fixado o texto - cujo alcance político João Pedro Correia não terá entendido - os presentes ditaram para a lista de assinaturas os nomes dos correligionários sempre dispostos a apoiar o 25 de Abril, como se tudo não passasse de um ritual evocativo da data.

... e Vasco Lourenço irritado

Luís Fernandes, o representante do PCP, declara-se surpreendido com a reacção dos socialistas, lembrando o que parece evidente: «O texto só avançou porque houve consenso». O dirigente da DORL lamenta que os socialistas não se saibam organizar e garante que a questão teria passado despercebida se, como aconteceu em anos anteriores, o documento não tivesse sido divulgado.

A proposta da moção suscitou forte reacção não apenas do do PS mas da Associação 25 de Abril, com Vasco Lourenço a ameaçar retirar-se das comemorações se o texto fosse aprovado. Reagindo à ameaça, Aquilino rebate os argumentos, expressando o entendimento de que as comemorações não deveriam limitar-se ao habitual, mas assumir-se como «afirmação da tendência» para «uma espécie de máximo denominador comum» da esquerda. Receios do bloco de direita?

«Neste clima, o PS deverá repensar a sua participação na comissão do 25 de Abril» - sugere Galamba, ao mesmo tempo que Seguro garante que os socialistas farão frente a «qualquer tentativa de arrastar o PS para frentismos de esquerda».

Orlando Raimundo

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