Governo e PSD em sintonia sobre nova lei eleitoral

08-09-1999
marcar artigo

António Capucho e António Costa: os dois mentores da reforma eleitoral acreditam que as Legislativas de 1999 já poderão ser disputadas com candidaturas uninominais

O GOVERNO e o PSD têm projectos muito idênticos de revisão da Lei Eleitoral para a Assembleia da República e as diferenças que se encontram parecem não pôr em causa, à partida, a possibilidade de um entendimento que viabilize a realização das próximas legislativas já com candidaturas uninominais. Os anteprojectos - aprovados respectivamente em Conselho de Ministros, há meses, e, agora, pela Comissão Política social-democrata - consagram princípios e metodologias passíveis de articulação. Até porque tanto o ministro António Costa como o eurodeputado António Capucho (os respectivos mentores dos projectos governamental e social-democrata) admitem que há margem para a introdução de alterações no sentido de ultrapassar as divergências. Tanto assim que, tendo inicialmente o PSD condicionado a sua participação na discussão da reforma eleitoral à aceitação pelo Governo da redução do número de deputados - admitida pelo PS sob forte contestação interna na última revisão constitucional -, esse primeiro obstáculo parece ultrapassado pelo facto de até já existir um anteprojecto do PSD. E embora o Governo considere que a redução dos actuais 230 mandatos (por exemplo, para os 182 propostos pelo PSD) pode pôr em causa designadamente o «objectivo fundamental» de «aproximação do eleitor ao eleito» (com o argumento de que tal implicaria que cada eleito passasse a representar mais umas dezenas de milhares de eleitores) não há uma afirmação inequívoca de que a questão é inegociável. António Costa prefere, aliás, escudar-se numa cautelosa fórmula: «A redução não nos parece útil». E explica: «Reduzir o número de deputados significaria ter de reduzir as candidaturas uninominais, prejudicando a proximidade eleito/eleitor». A tendência bipolarizadora Problemas negados por socialistas e sociais-democratas, mas que certamente serão levantados pelo PP e PCP, são os da tendência bipolarizadora dos dois anteprojectos e do eventual prejuízo das regras da proporcionalidade. Desde logo, porque a criação dos círculos uninominais deverá induzir o eleitorado ao voto útil num dos dois candidatos com maiores possibilidades de eleição nos casos de indefinição quanto ao vencedor. Com as inerentes consequências quer ao nível do círculo distrital (previsto na proposta governamental) quer na votação nacional. Um «risco» que António Costa remete para os estudos encomendados a instituições universitárias sobre as eventuais mudanças de comportamento do eleitorado. A simples aplicação das regras do novo sistema às votações de actos eleitorais anteriores revelam variações «insignificantes» e «poderiam até, nalguns casos, traduzir um maior respeito pela proporcionalidade». E quer a bipolarização quer a diminuição da proporcionalidade, segundo o ministro, «não estão minimamente nas intenções do Governo». Pelo mesmo raciocínio, António Costa garante que os pequenos partidos (sem qualquer representação na actual composição da AR) também não serão prejudicados pelas novas regras. «Para se ser eleito é preciso ter votos e quem já não era eleito não pode esperar sê-lo por via legislativa», argumentou. O risco dos caciques locais O que fica totalmente fora de causa são as candidaturas de independentes. Mas tal, segundo o ministro, «ficou desde logo arredada na última revisão constitucional». Questão diferente é a do reforço das figuras ou caciques locais. Uma consequência que parece «natural» face à centralização da campanha num candidato em vez de numa lista, mas que, diz António Costa, «observado o peso que já hoje esses caciques pretendem ter na elaboração das listas de candidatos, até pode vir a diminuir». Além disso, junta o governante, os eleitos «vão passar a prestar contas directamente ao eleitorado ao longo do exercício do seu mandato em vez de se limitarem a distribuir sacos de plástico nas campanhas eleitorais de quatro em quatro anos». Um argumento que serve também para o Governo assegurar que, com os círculos uninominais, «haverá uma mudança no exercício da actividade política e partidária, com uma consequente maior aproximação entre o eleitorado e os seus representantes». Questão que se mantêm em aberto é a da existência ou não de círculos distritais (previstos no anteprojecto do Governo e afastados no do PSD). Segundo António Costa, há toda a vantagem em haver círculos intermédios que permitam «dois elementos correctivos» (com o círculo nacional) para melhor garantia da justa distribuição de mandatos. Em aberto também está a possibilidade de haver dois boletins de voto (um para os círculos uninominais e outro para a votação nacional). Costa admite essa possibilidade como «uma variante que, além das dúvidas constitucionais que levanta, tem vantagens e inconvenientes». Neste estado das coisas, e defendendo que a matéria «não poderá ser imposta» por uma maioria de apenas 2/3 dos deputados (a constitucionalmente exigida), o Governo espera conseguir reunir «um amplo consenso» que permita rever a lei eleitoral ainda este ano, por forma a ser aplicável já em 1999. Mário Ramires

As perguntas sobre a nova lei eleitoral Haverá redução do número de deputados?

A criação de círculos uninominais força a bipolarização?

A proporcionalidade será afectada?

Os pequenos partidos sairão prejudicados?

O novo sistema será incompatível com as candidaturas independentes?

As candidaturas uninominais favorecem o reforço dos caciques locais?

Haverá maior proximidade entre eleito e eleitor?

Haverá círculos uninominais, distritais e nacional ou só círculos uninominais e círculo nacional?

Haverá um ou dois boletins de voto?

Quando irá ser aplicada a nova lei: em 1999, em 2003 ou depois?

Governo e PSD em sintonia sobre nova lei eleitoral

Só duas diferenças nos projectos

António Capucho e António Costa: os dois mentores da reforma eleitoral acreditam que as Legislativas de 1999 já poderão ser disputadas com candidaturas uninominais

O GOVERNO e o PSD têm projectos muito idênticos de revisão da Lei Eleitoral para a Assembleia da República e as diferenças que se encontram parecem não pôr em causa, à partida, a possibilidade de um entendimento que viabilize a realização das próximas legislativas já com candidaturas uninominais. Os anteprojectos - aprovados respectivamente em Conselho de Ministros, há meses, e, agora, pela Comissão Política social-democrata - consagram princípios e metodologias passíveis de articulação. Até porque tanto o ministro António Costa como o eurodeputado António Capucho (os respectivos mentores dos projectos governamental e social-democrata) admitem que há margem para a introdução de alterações no sentido de ultrapassar as divergências. Tanto assim que, tendo inicialmente o PSD condicionado a sua participação na discussão da reforma eleitoral à aceitação pelo Governo da redução do número de deputados - admitida pelo PS sob forte contestação interna na última revisão constitucional -, esse primeiro obstáculo parece ultrapassado pelo facto de até já existir um anteprojecto do PSD. E embora o Governo considere que a redução dos actuais 230 mandatos (por exemplo, para os 182 propostos pelo PSD) pode pôr em causa designadamente o «objectivo fundamental» de «aproximação do eleitor ao eleito» (com o argumento de que tal implicaria que cada eleito passasse a representar mais umas dezenas de milhares de eleitores) não há uma afirmação inequívoca de que a questão é inegociável. António Costa prefere, aliás, escudar-se numa cautelosa fórmula: «A redução não nos parece útil». E explica: «Reduzir o número de deputados significaria ter de reduzir as candidaturas uninominais, prejudicando a proximidade eleito/eleitor». A tendência bipolarizadora Problemas negados por socialistas e sociais-democratas, mas que certamente serão levantados pelo PP e PCP, são os da tendência bipolarizadora dos dois anteprojectos e do eventual prejuízo das regras da proporcionalidade. Desde logo, porque a criação dos círculos uninominais deverá induzir o eleitorado ao voto útil num dos dois candidatos com maiores possibilidades de eleição nos casos de indefinição quanto ao vencedor. Com as inerentes consequências quer ao nível do círculo distrital (previsto na proposta governamental) quer na votação nacional. Um «risco» que António Costa remete para os estudos encomendados a instituições universitárias sobre as eventuais mudanças de comportamento do eleitorado. A simples aplicação das regras do novo sistema às votações de actos eleitorais anteriores revelam variações «insignificantes» e «poderiam até, nalguns casos, traduzir um maior respeito pela proporcionalidade». E quer a bipolarização quer a diminuição da proporcionalidade, segundo o ministro, «não estão minimamente nas intenções do Governo». Pelo mesmo raciocínio, António Costa garante que os pequenos partidos (sem qualquer representação na actual composição da AR) também não serão prejudicados pelas novas regras. «Para se ser eleito é preciso ter votos e quem já não era eleito não pode esperar sê-lo por via legislativa», argumentou. O risco dos caciques locais O que fica totalmente fora de causa são as candidaturas de independentes. Mas tal, segundo o ministro, «ficou desde logo arredada na última revisão constitucional». Questão diferente é a do reforço das figuras ou caciques locais. Uma consequência que parece «natural» face à centralização da campanha num candidato em vez de numa lista, mas que, diz António Costa, «observado o peso que já hoje esses caciques pretendem ter na elaboração das listas de candidatos, até pode vir a diminuir». Além disso, junta o governante, os eleitos «vão passar a prestar contas directamente ao eleitorado ao longo do exercício do seu mandato em vez de se limitarem a distribuir sacos de plástico nas campanhas eleitorais de quatro em quatro anos». Um argumento que serve também para o Governo assegurar que, com os círculos uninominais, «haverá uma mudança no exercício da actividade política e partidária, com uma consequente maior aproximação entre o eleitorado e os seus representantes». Questão que se mantêm em aberto é a da existência ou não de círculos distritais (previstos no anteprojecto do Governo e afastados no do PSD). Segundo António Costa, há toda a vantagem em haver círculos intermédios que permitam «dois elementos correctivos» (com o círculo nacional) para melhor garantia da justa distribuição de mandatos. Em aberto também está a possibilidade de haver dois boletins de voto (um para os círculos uninominais e outro para a votação nacional). Costa admite essa possibilidade como «uma variante que, além das dúvidas constitucionais que levanta, tem vantagens e inconvenientes». Neste estado das coisas, e defendendo que a matéria «não poderá ser imposta» por uma maioria de apenas 2/3 dos deputados (a constitucionalmente exigida), o Governo espera conseguir reunir «um amplo consenso» que permita rever a lei eleitoral ainda este ano, por forma a ser aplicável já em 1999. Mário Ramires

As perguntas sobre a nova lei eleitoral Haverá redução do número de deputados?

A criação de círculos uninominais força a bipolarização?

A proporcionalidade será afectada?

Os pequenos partidos sairão prejudicados?

O novo sistema será incompatível com as candidaturas independentes?

As candidaturas uninominais favorecem o reforço dos caciques locais?

Haverá maior proximidade entre eleito e eleitor?

Haverá círculos uninominais, distritais e nacional ou só círculos uninominais e círculo nacional?

Haverá um ou dois boletins de voto?

Quando irá ser aplicada a nova lei: em 1999, em 2003 ou depois?

Governo e PSD em sintonia sobre nova lei eleitoral

Só duas diferenças nos projectos

marcar artigo