EXPRESSO: Cartaz

07-03-2002
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LIVROS

O forçado da palavra O autor do livro citou o mais que pôde, preservou a linguagem do tempo e, salvando-a, salvou tudo GLÓRIA de Vasco Pulido Valente (Gótica, 2001, 478 págs., 3900$00, 19,45 euros) Fátima Maldonado

Primeiro que tudo e tal como o autor esclarece na Introdução: «Este é um livro de história. Não é um livro de história a fingir de romance, nem um romance 'documental'.» Seja como for, trata-se de um assustador retrato de um país adiado cujas mazelas ainda supuram ao fim de mais de um século. José Cardoso Vieira de Castro, herói «à rebours», encarna um tipo de intelectual português de Oitocentos e infelizmente não só. Alguém que sem génio de qualquer espécie supre essa falta cobrindo-a de palavras.

Primeiro que tudo e tal como o autor esclarece na Introdução: «Este é um livro de história. Não é um livro de história a fingir de romance, nem um romance 'documental'.» Seja como for, trata-se de um assustador retrato de um país adiado cujas mazelas ainda supuram ao fim de mais de um século. José Cardoso Vieira de Castro, herói «à rebours», encarna um tipo de intelectual português de Oitocentos e infelizmente não só. Alguém que sem génio de qualquer espécie supre essa falta cobrindo-a de palavras. O Comendador comentado «Cartas Abertas» de Henrique Monteiro agora em livro; o cronista fala ao Expresso desse espólio, visão crítica da nossa História recente (Bertrand, 2001, prefácio e selecção de Irene Fialho, 364 págs., 3990$00, 19,90 euros) Entrevista de Francisco Belard

Boa parte do espólio do Comendador Marques de Correia foi enfim reunida em volume pelo principal (e hoje único) responsável pelas Cartas Abertas, Henrique Monteiro. O livro contém um inédito — o perspicaz, erudito e ameno estudo introdutório de Irene Fialho, que «constrói» a biografia do Comendador. Na parte não inédita, é selectivo — a escolha seguiu o critério da prefaciadora. Mesmo quando já não me lembrava da situação que motivou uma ou outra carta, esta conseguia provocar-me o riso; esquecera muitas dessas crónicas em forma epistolar e gostei de relê-las.

Boa parte do espólio do Comendador Marques de Correia foi enfim reunida em volume pelo principal (e hoje único) responsável pelas Cartas Abertas, Henrique Monteiro. O livro contém um inédito — o perspicaz, erudito e ameno estudo introdutório de Irene Fialho, que «constrói» a biografia do Comendador. Na parte não inédita, é selectivo — a escolha seguiu o critério da prefaciadora. Mesmo quando já não me lembrava da situação que motivou uma ou outra carta, esta conseguia provocar-me o riso; esquecera muitas dessas crónicas em forma epistolar e gostei de relê-las. A vida e a fábula Dois livros vindos de lugares diferentes mas que colocam um problema comum OS DIAS INVENTADOS de Luís Filipe Castro Mendes (Gótica, 2001, 92 págs., 2000$00, 9,98 euros) AUTOBIOGRAFIA CAUTELAR de Paulo Teixeira (Gótica, 2001, 64 págs., 1575$00, 7,86 euros) António Guerreiro

Experimentemos um exercício de comparação que põe a par dois livros de poesia acabados de publicar: Os Dias Inventados, de Luís Filipe Castro Mendes, e Autobiografia Cautelar, de Paulo Teixeira. Aquilo que os aproxima e, além do mais, os faz irradiar de maneira convergente em direcção a uma parte significativa da poesia portuguesa mais recente é o carácter eminentemente elegíaco. Do elegíaco à irrupção lírica, mesmo que repensada como lirismo crítico, muito directas são as vias, como sabemos.

Experimentemos um exercício de comparação que põe a par dois livros de poesia acabados de publicar:, de Luís Filipe Castro Mendes, e, de Paulo Teixeira. Aquilo que os aproxima e, além do mais, os faz irradiar de maneira convergente em direcção a uma parte significativa da poesia portuguesa mais recente é o carácter eminentemente elegíaco. Do elegíaco à irrupção lírica, mesmo que repensada como lirismo crítico, muito directas são as vias, como sabemos. Nobre e companhia Publicações no âmbito do centenário do poeta ANTÓNIO NOBRE EM COLÓQUIO organização de Paula Morão (Colibri, 2001, 150 págs., 1575$00, 7,86 euros) Ernesto Rodrigues

Há poetas felizes: António Nobre, centenarizado em 2000, suscitou, a 13 e 14 de Dezembro desse ano, a reunião de especialistas para um colóquio cujas actas acabam de sair. Iniciativa do Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras de Lisboa e da Biblioteca Nacional, onde decorreram as sessões, e que promoveu exposição inaugurada com fresco nobriano por José Carlos Seabra Pereira, saúda-se a presteza na edição de António Nobre em Colóquio, organização de Paula Morão, alma desta série de eventos, que culminaram com recital dirigido por Gastão Cruz. O quadro finissecular, nas convulsões políticas, sociais, pictóricas e poéticas, caminhou paralelo a trabalhos sobre aspectos particulares da lírica, em especial do Só, cuja edição crítica, em seus «fundamentos e pressupostos», por Paula Morão, encerra o volume.

Há poetas felizes: António Nobre, centenarizado em 2000, suscitou, a 13 e 14 de Dezembro desse ano, a reunião de especialistas para um colóquio cujas actas acabam de sair. Iniciativa do Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras de Lisboa e da Biblioteca Nacional, onde decorreram as sessões, e que promoveu exposição inaugurada com fresco nobriano por José Carlos Seabra Pereira, saúda-se a presteza na edição de António Nobre emorganização de Paula Morão, alma desta série de eventos, que culminaram com recital dirigido por Gastão Cruz. O quadro finissecular, nas convulsões políticas, sociais, pictóricas e poéticas, caminhou paralelo a trabalhos sobre aspectos particulares da lírica, em especial do, cuja edição crítica, em seus «fundamentos e pressupostos», por Paula Morão, encerra o volume. Coisas da guerra Um belo romance sobre combates em África e amores coimbrões AS LÁGRIMAS DE AQUILES de José Manuel Saraiva (Oficina do Livro, 2001, 215 págs., 2807$00, 14 euros) José Gabriel Viegas

A guerra é uma barbaridade, seguramente a mais inútil de todas as tragédias, mas é também um acto único — diz o ex-alferes Nuno Sarmento, protagonista-narrador de As Lágrimas de Aquiles, a Aliú, o filho de um guerrilheiro morto pelas forças portuguesas. É «uma espécie de jogo de sorte e de azar», em que tudo «se cumpre no exacto limite dos sentimentos, nas fronteiras precisas do medo e da coragem», um «espectáculo magnífico», mas odioso.

A guerra é uma barbaridade, seguramente a mais inútil de todas as tragédias, mas é também um acto único — diz o ex-alferes Nuno Sarmento, protagonista-narrador de, a Aliú, o filho de um guerrilheiro morto pelas forças portuguesas. É «uma espécie de jogo de sorte e de azar», em que tudo «se cumpre no exacto limite dos sentimentos, nas fronteiras precisas do medo e da coragem», um «espectáculo magnífico», mas odioso. Uma separação imoral Novo romance de um John Le Carré ainda em boa forma O FIEL JARDINEIRO de John Le Carré (Dom Quixote, 2001, trad. de Helena Ramos e Artur Ramos, 406 págs., 3400$00, 16,96 euros) Luís M. Faria

Há pouco mais de dez anos, quando a Guerra Fria acabou, chegou-se a pensar que deixaria de ser necessário haver espiões. Ora, a obra de Le Carré vivia no mundo da espionagem; com a nova situação, ele podia ter entrado em crise criativa permanente. Mas não. Em primeiro lugar, a espionagem continuou a ser necessária, tanto ou mais do que antes (veja-se o que a falta dela, ou as suas graves lacunas devido a cortes orçamentais, permitiram que acontecesse em Nova York há três meses). Em segundo lugar, o mundo acordou para novos problemas. Le Carré acompanhou a evolução, mudando os cenários e os temas. O seu último romance, que é este, trata da indústria farmacêutica.

Há pouco mais de dez anos, quando a Guerra Fria acabou, chegou-se a pensar que deixaria de ser necessário haver espiões. Ora, a obra de Le Carré vivia no mundo da espionagem; com a nova situação, ele podia ter entrado em crise criativa permanente. Mas não. Em primeiro lugar, a espionagem continuou a ser necessária, tanto ou mais do que antes (veja-se o que a falta dela, ou as suas graves lacunas devido a cortes orçamentais, permitiram que acontecesse em Nova York há três meses). Em segundo lugar, o mundo acordou para novos problemas. Le Carré acompanhou a evolução, mudando os cenários e os temas. O seu último romance, que é este, trata da indústria farmacêutica. Atracção pela repulsa Uma obra sobre a exploração de fenómenos físicos em circos norte-americanos FREAKS — ABERRAÇÕES HUMANAS organização de Earl H.E. Jenkins e fotografias de Charles Eisenmann (Livros e Livros, 2000, trad. de Marta Jacinto, 192 págs., 2205$00, 11 euros) João Paulo Cotrim

A primeira das sensações é de repulsa, mas há duas ou três razões para dar o passo seguinte. Nenhuma tem a ver com a curiosidade mórbida. Todas têm a ver com a curiosidade. O contexto começa por ser apresentado na capa, na sucessão de subtítulos: «A Colecção Akimitsu Naruyama» e «A exploração de fenómenos físicos humanos em circos e espectáculos itinerantes», desenvolvidos depois na introdução informativa q.b. Trata-se, portanto, de uma colecção de fotografias de pessoas com as mais variadas «deficiências» físicas (gordos e magros, peludos, com escamas e cauda, gémeos siameses, etc.) ou capazes de «absurdos» físicos (puxar pesos com os olhos, etc), que foram atracção em circos norte-americanos de finais do século XIX e inícios do século XX.

A primeira das sensações é de repulsa, mas há duas ou três razões para dar o passo seguinte. Nenhuma tem a ver com a curiosidade mórbida. Todas têm a ver com a curiosidade. O contexto começa por ser apresentado na capa, na sucessão de subtítulos: «A Colecção Akimitsu Naruyama» e «A exploração de fenómenos físicos humanos em circos e espectáculos itinerantes», desenvolvidos depois na introdução informativa q.b. Trata-se, portanto, de uma colecção de fotografias de pessoas com as mais variadas «deficiências» físicas (gordos e magros, peludos, com escamas e cauda, gémeos siameses, etc.) ou capazes de «absurdos» físicos (puxar pesos com os olhos, etc), que foram atracção em circos norte-americanos de finais do século XIX e inícios do século XX. Um labirinto pessoal O livro que mostra os percursos de Jorge Luis Borges pela sua Buenos Aires A BUENOS AIRES DE BORGES de Carlos Alberto Zito (Teorema, 2001, trad. de Serafim Ferreira, 258 págs., 4000$00, 19,95 euros) Luciana Leiderfarb

No fim da vida, Jorge Luís Borges fez uma confissão: depois das inúmeras viagens que o ocupavam várias vezes num mesmo ano, depois de conhecer cidades novas com a cor amarela e clara da cegueira, havia algo de essencial nele que não viajava, que ficava sempre na mesma cidade. A sua, Buenos Aires. Aos 56 anos tinha deixado de ver. E a urbe que via, nos sonhos, nas alucinações pertinazes dos seus contos, era um labirinto enorme feito de ruas de subúrbios que os anos 40 modelavam com o fluxo crescente da imigração em massa. Nessa década, Borges fez, obstinadamente, da literatura um repositório de memórias. O jornalista argentino Carlos Alberto Zito percorreu essas memórias com idêntica obstinação, e fez um livro, A Buenos Aires de Borges. «Grosso modo», um itinerário que persegue o escritor pelos rastos por ele deixados, tanto nos seus textos e poemas como nas cartas pessoais e entrevistas que deu.

No fim da vida, Jorge Luís Borges fez uma confissão: depois das inúmeras viagens que o ocupavam várias vezes num mesmo ano, depois de conhecer cidades novas com a cor amarela e clara da cegueira, havia algo de essencial nele que não viajava, que ficava sempre na mesma cidade. A sua, Buenos Aires. Aos 56 anos tinha deixado de ver. E a urbe que via, nos sonhos, nas alucinações pertinazes dos seus contos, era um labirinto enorme feito de ruas de subúrbios que os anos 40 modelavam com o fluxo crescente da imigração em massa. Nessa década, Borges fez, obstinadamente, da literatura um repositório de memórias. O jornalista argentino Carlos Alberto Zito percorreu essas memórias com idêntica obstinação, e fez um livro,. «Grosso modo», um itinerário que persegue o escritor pelos rastos por ele deixados, tanto nos seus textos e poemas como nas cartas pessoais e entrevistas que deu. Como falar do silêncio? Ensaio sobre a arqueologia/genealogia de Michel Foucault O PODER E O SABER de Maria Manuela Carvalho (Campo das Letras, 2001, 144 págs., 1155$00, 5,76 euros) Maria João Cabrita

Estudar as particularidades do pensamento de Michel Foucault (1926-1984) não é uma tarefa propriamente fácil; sobretudo porque, ao longo do itinerário invulgar que se estende de Maladie Mentale et Personnalité (1954) a Histoire de la Sexualité (1984), o filósofo foi corrigindo e alterando o que já havia dito. Paradigmática do movimento estruturalista, da demanda não tanto dos dramas humanos quanto das estruturas inconscientes - na esteira de Levi-Strauss e Lacan -, a sua obra, singular pela metodologia e objectos de reflexão, apontou para a contingência e historicidade das fronteiras entre os vários domínios do conhecimento. Reflexo da própria dificuldade do pensar - e por isso a cada momento dilucidando e tecendo uma rede conceptual -, foi perpassada pela cogitação sobre a constituição do sujeito e desenvolveu-se em redor da dualidade saber/poder.

Estudar as particularidades do pensamento de Michel Foucault (1926-1984) não é uma tarefa propriamente fácil; sobretudo porque, ao longo do itinerário invulgar que se estende de(1954) a(1984), o filósofo foi corrigindo e alterando o que já havia dito. Paradigmática do movimento estruturalista, da demanda não tanto dos dramas humanos quanto das estruturas inconscientes - na esteira de Levi-Strauss e Lacan -, a sua obra, singular pela metodologia e objectos de reflexão, apontou para a contingência e historicidade das fronteiras entre os vários domínios do conhecimento. Reflexo da própria dificuldade do pensar - e por isso a cada momento dilucidando e tecendo uma rede conceptual -, foi perpassada pela cogitação sobre a constituição do sujeito e desenvolveu-se em redor da dualidade saber/poder.

RECENSÕES O Enviado de Stradivarius

Rodrigo Brunori Lagoa Morta

Michael Dibdin Conversas entre Nós

Manuel Sá Correia Maçã pra Dois

Cláudio Lima As Representações Sociais dos Moçambicanos

Gabriel Sérgio Mithá Ribeiro

LIVROS

O forçado da palavra O autor do livro citou o mais que pôde, preservou a linguagem do tempo e, salvando-a, salvou tudo GLÓRIA de Vasco Pulido Valente (Gótica, 2001, 478 págs., 3900$00, 19,45 euros) Fátima Maldonado

Primeiro que tudo e tal como o autor esclarece na Introdução: «Este é um livro de história. Não é um livro de história a fingir de romance, nem um romance 'documental'.» Seja como for, trata-se de um assustador retrato de um país adiado cujas mazelas ainda supuram ao fim de mais de um século. José Cardoso Vieira de Castro, herói «à rebours», encarna um tipo de intelectual português de Oitocentos e infelizmente não só. Alguém que sem génio de qualquer espécie supre essa falta cobrindo-a de palavras.

Primeiro que tudo e tal como o autor esclarece na Introdução: «Este é um livro de história. Não é um livro de história a fingir de romance, nem um romance 'documental'.» Seja como for, trata-se de um assustador retrato de um país adiado cujas mazelas ainda supuram ao fim de mais de um século. José Cardoso Vieira de Castro, herói «à rebours», encarna um tipo de intelectual português de Oitocentos e infelizmente não só. Alguém que sem génio de qualquer espécie supre essa falta cobrindo-a de palavras. O Comendador comentado «Cartas Abertas» de Henrique Monteiro agora em livro; o cronista fala ao Expresso desse espólio, visão crítica da nossa História recente (Bertrand, 2001, prefácio e selecção de Irene Fialho, 364 págs., 3990$00, 19,90 euros) Entrevista de Francisco Belard

Boa parte do espólio do Comendador Marques de Correia foi enfim reunida em volume pelo principal (e hoje único) responsável pelas Cartas Abertas, Henrique Monteiro. O livro contém um inédito — o perspicaz, erudito e ameno estudo introdutório de Irene Fialho, que «constrói» a biografia do Comendador. Na parte não inédita, é selectivo — a escolha seguiu o critério da prefaciadora. Mesmo quando já não me lembrava da situação que motivou uma ou outra carta, esta conseguia provocar-me o riso; esquecera muitas dessas crónicas em forma epistolar e gostei de relê-las.

Boa parte do espólio do Comendador Marques de Correia foi enfim reunida em volume pelo principal (e hoje único) responsável pelas Cartas Abertas, Henrique Monteiro. O livro contém um inédito — o perspicaz, erudito e ameno estudo introdutório de Irene Fialho, que «constrói» a biografia do Comendador. Na parte não inédita, é selectivo — a escolha seguiu o critério da prefaciadora. Mesmo quando já não me lembrava da situação que motivou uma ou outra carta, esta conseguia provocar-me o riso; esquecera muitas dessas crónicas em forma epistolar e gostei de relê-las. A vida e a fábula Dois livros vindos de lugares diferentes mas que colocam um problema comum OS DIAS INVENTADOS de Luís Filipe Castro Mendes (Gótica, 2001, 92 págs., 2000$00, 9,98 euros) AUTOBIOGRAFIA CAUTELAR de Paulo Teixeira (Gótica, 2001, 64 págs., 1575$00, 7,86 euros) António Guerreiro

Experimentemos um exercício de comparação que põe a par dois livros de poesia acabados de publicar: Os Dias Inventados, de Luís Filipe Castro Mendes, e Autobiografia Cautelar, de Paulo Teixeira. Aquilo que os aproxima e, além do mais, os faz irradiar de maneira convergente em direcção a uma parte significativa da poesia portuguesa mais recente é o carácter eminentemente elegíaco. Do elegíaco à irrupção lírica, mesmo que repensada como lirismo crítico, muito directas são as vias, como sabemos.

Experimentemos um exercício de comparação que põe a par dois livros de poesia acabados de publicar:, de Luís Filipe Castro Mendes, e, de Paulo Teixeira. Aquilo que os aproxima e, além do mais, os faz irradiar de maneira convergente em direcção a uma parte significativa da poesia portuguesa mais recente é o carácter eminentemente elegíaco. Do elegíaco à irrupção lírica, mesmo que repensada como lirismo crítico, muito directas são as vias, como sabemos. Nobre e companhia Publicações no âmbito do centenário do poeta ANTÓNIO NOBRE EM COLÓQUIO organização de Paula Morão (Colibri, 2001, 150 págs., 1575$00, 7,86 euros) Ernesto Rodrigues

Há poetas felizes: António Nobre, centenarizado em 2000, suscitou, a 13 e 14 de Dezembro desse ano, a reunião de especialistas para um colóquio cujas actas acabam de sair. Iniciativa do Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras de Lisboa e da Biblioteca Nacional, onde decorreram as sessões, e que promoveu exposição inaugurada com fresco nobriano por José Carlos Seabra Pereira, saúda-se a presteza na edição de António Nobre em Colóquio, organização de Paula Morão, alma desta série de eventos, que culminaram com recital dirigido por Gastão Cruz. O quadro finissecular, nas convulsões políticas, sociais, pictóricas e poéticas, caminhou paralelo a trabalhos sobre aspectos particulares da lírica, em especial do Só, cuja edição crítica, em seus «fundamentos e pressupostos», por Paula Morão, encerra o volume.

Há poetas felizes: António Nobre, centenarizado em 2000, suscitou, a 13 e 14 de Dezembro desse ano, a reunião de especialistas para um colóquio cujas actas acabam de sair. Iniciativa do Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras de Lisboa e da Biblioteca Nacional, onde decorreram as sessões, e que promoveu exposição inaugurada com fresco nobriano por José Carlos Seabra Pereira, saúda-se a presteza na edição de António Nobre emorganização de Paula Morão, alma desta série de eventos, que culminaram com recital dirigido por Gastão Cruz. O quadro finissecular, nas convulsões políticas, sociais, pictóricas e poéticas, caminhou paralelo a trabalhos sobre aspectos particulares da lírica, em especial do, cuja edição crítica, em seus «fundamentos e pressupostos», por Paula Morão, encerra o volume. Coisas da guerra Um belo romance sobre combates em África e amores coimbrões AS LÁGRIMAS DE AQUILES de José Manuel Saraiva (Oficina do Livro, 2001, 215 págs., 2807$00, 14 euros) José Gabriel Viegas

A guerra é uma barbaridade, seguramente a mais inútil de todas as tragédias, mas é também um acto único — diz o ex-alferes Nuno Sarmento, protagonista-narrador de As Lágrimas de Aquiles, a Aliú, o filho de um guerrilheiro morto pelas forças portuguesas. É «uma espécie de jogo de sorte e de azar», em que tudo «se cumpre no exacto limite dos sentimentos, nas fronteiras precisas do medo e da coragem», um «espectáculo magnífico», mas odioso.

A guerra é uma barbaridade, seguramente a mais inútil de todas as tragédias, mas é também um acto único — diz o ex-alferes Nuno Sarmento, protagonista-narrador de, a Aliú, o filho de um guerrilheiro morto pelas forças portuguesas. É «uma espécie de jogo de sorte e de azar», em que tudo «se cumpre no exacto limite dos sentimentos, nas fronteiras precisas do medo e da coragem», um «espectáculo magnífico», mas odioso. Uma separação imoral Novo romance de um John Le Carré ainda em boa forma O FIEL JARDINEIRO de John Le Carré (Dom Quixote, 2001, trad. de Helena Ramos e Artur Ramos, 406 págs., 3400$00, 16,96 euros) Luís M. Faria

Há pouco mais de dez anos, quando a Guerra Fria acabou, chegou-se a pensar que deixaria de ser necessário haver espiões. Ora, a obra de Le Carré vivia no mundo da espionagem; com a nova situação, ele podia ter entrado em crise criativa permanente. Mas não. Em primeiro lugar, a espionagem continuou a ser necessária, tanto ou mais do que antes (veja-se o que a falta dela, ou as suas graves lacunas devido a cortes orçamentais, permitiram que acontecesse em Nova York há três meses). Em segundo lugar, o mundo acordou para novos problemas. Le Carré acompanhou a evolução, mudando os cenários e os temas. O seu último romance, que é este, trata da indústria farmacêutica.

Há pouco mais de dez anos, quando a Guerra Fria acabou, chegou-se a pensar que deixaria de ser necessário haver espiões. Ora, a obra de Le Carré vivia no mundo da espionagem; com a nova situação, ele podia ter entrado em crise criativa permanente. Mas não. Em primeiro lugar, a espionagem continuou a ser necessária, tanto ou mais do que antes (veja-se o que a falta dela, ou as suas graves lacunas devido a cortes orçamentais, permitiram que acontecesse em Nova York há três meses). Em segundo lugar, o mundo acordou para novos problemas. Le Carré acompanhou a evolução, mudando os cenários e os temas. O seu último romance, que é este, trata da indústria farmacêutica. Atracção pela repulsa Uma obra sobre a exploração de fenómenos físicos em circos norte-americanos FREAKS — ABERRAÇÕES HUMANAS organização de Earl H.E. Jenkins e fotografias de Charles Eisenmann (Livros e Livros, 2000, trad. de Marta Jacinto, 192 págs., 2205$00, 11 euros) João Paulo Cotrim

A primeira das sensações é de repulsa, mas há duas ou três razões para dar o passo seguinte. Nenhuma tem a ver com a curiosidade mórbida. Todas têm a ver com a curiosidade. O contexto começa por ser apresentado na capa, na sucessão de subtítulos: «A Colecção Akimitsu Naruyama» e «A exploração de fenómenos físicos humanos em circos e espectáculos itinerantes», desenvolvidos depois na introdução informativa q.b. Trata-se, portanto, de uma colecção de fotografias de pessoas com as mais variadas «deficiências» físicas (gordos e magros, peludos, com escamas e cauda, gémeos siameses, etc.) ou capazes de «absurdos» físicos (puxar pesos com os olhos, etc), que foram atracção em circos norte-americanos de finais do século XIX e inícios do século XX.

A primeira das sensações é de repulsa, mas há duas ou três razões para dar o passo seguinte. Nenhuma tem a ver com a curiosidade mórbida. Todas têm a ver com a curiosidade. O contexto começa por ser apresentado na capa, na sucessão de subtítulos: «A Colecção Akimitsu Naruyama» e «A exploração de fenómenos físicos humanos em circos e espectáculos itinerantes», desenvolvidos depois na introdução informativa q.b. Trata-se, portanto, de uma colecção de fotografias de pessoas com as mais variadas «deficiências» físicas (gordos e magros, peludos, com escamas e cauda, gémeos siameses, etc.) ou capazes de «absurdos» físicos (puxar pesos com os olhos, etc), que foram atracção em circos norte-americanos de finais do século XIX e inícios do século XX. Um labirinto pessoal O livro que mostra os percursos de Jorge Luis Borges pela sua Buenos Aires A BUENOS AIRES DE BORGES de Carlos Alberto Zito (Teorema, 2001, trad. de Serafim Ferreira, 258 págs., 4000$00, 19,95 euros) Luciana Leiderfarb

No fim da vida, Jorge Luís Borges fez uma confissão: depois das inúmeras viagens que o ocupavam várias vezes num mesmo ano, depois de conhecer cidades novas com a cor amarela e clara da cegueira, havia algo de essencial nele que não viajava, que ficava sempre na mesma cidade. A sua, Buenos Aires. Aos 56 anos tinha deixado de ver. E a urbe que via, nos sonhos, nas alucinações pertinazes dos seus contos, era um labirinto enorme feito de ruas de subúrbios que os anos 40 modelavam com o fluxo crescente da imigração em massa. Nessa década, Borges fez, obstinadamente, da literatura um repositório de memórias. O jornalista argentino Carlos Alberto Zito percorreu essas memórias com idêntica obstinação, e fez um livro, A Buenos Aires de Borges. «Grosso modo», um itinerário que persegue o escritor pelos rastos por ele deixados, tanto nos seus textos e poemas como nas cartas pessoais e entrevistas que deu.

No fim da vida, Jorge Luís Borges fez uma confissão: depois das inúmeras viagens que o ocupavam várias vezes num mesmo ano, depois de conhecer cidades novas com a cor amarela e clara da cegueira, havia algo de essencial nele que não viajava, que ficava sempre na mesma cidade. A sua, Buenos Aires. Aos 56 anos tinha deixado de ver. E a urbe que via, nos sonhos, nas alucinações pertinazes dos seus contos, era um labirinto enorme feito de ruas de subúrbios que os anos 40 modelavam com o fluxo crescente da imigração em massa. Nessa década, Borges fez, obstinadamente, da literatura um repositório de memórias. O jornalista argentino Carlos Alberto Zito percorreu essas memórias com idêntica obstinação, e fez um livro,. «Grosso modo», um itinerário que persegue o escritor pelos rastos por ele deixados, tanto nos seus textos e poemas como nas cartas pessoais e entrevistas que deu. Como falar do silêncio? Ensaio sobre a arqueologia/genealogia de Michel Foucault O PODER E O SABER de Maria Manuela Carvalho (Campo das Letras, 2001, 144 págs., 1155$00, 5,76 euros) Maria João Cabrita

Estudar as particularidades do pensamento de Michel Foucault (1926-1984) não é uma tarefa propriamente fácil; sobretudo porque, ao longo do itinerário invulgar que se estende de Maladie Mentale et Personnalité (1954) a Histoire de la Sexualité (1984), o filósofo foi corrigindo e alterando o que já havia dito. Paradigmática do movimento estruturalista, da demanda não tanto dos dramas humanos quanto das estruturas inconscientes - na esteira de Levi-Strauss e Lacan -, a sua obra, singular pela metodologia e objectos de reflexão, apontou para a contingência e historicidade das fronteiras entre os vários domínios do conhecimento. Reflexo da própria dificuldade do pensar - e por isso a cada momento dilucidando e tecendo uma rede conceptual -, foi perpassada pela cogitação sobre a constituição do sujeito e desenvolveu-se em redor da dualidade saber/poder.

Estudar as particularidades do pensamento de Michel Foucault (1926-1984) não é uma tarefa propriamente fácil; sobretudo porque, ao longo do itinerário invulgar que se estende de(1954) a(1984), o filósofo foi corrigindo e alterando o que já havia dito. Paradigmática do movimento estruturalista, da demanda não tanto dos dramas humanos quanto das estruturas inconscientes - na esteira de Levi-Strauss e Lacan -, a sua obra, singular pela metodologia e objectos de reflexão, apontou para a contingência e historicidade das fronteiras entre os vários domínios do conhecimento. Reflexo da própria dificuldade do pensar - e por isso a cada momento dilucidando e tecendo uma rede conceptual -, foi perpassada pela cogitação sobre a constituição do sujeito e desenvolveu-se em redor da dualidade saber/poder.

RECENSÕES O Enviado de Stradivarius

Rodrigo Brunori Lagoa Morta

Michael Dibdin Conversas entre Nós

Manuel Sá Correia Maçã pra Dois

Cláudio Lima As Representações Sociais dos Moçambicanos

Gabriel Sérgio Mithá Ribeiro

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