Deputados do PS recuam na declaração de patrimónios elevados

30-12-2001
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Deputados do PS Recuam na Declaração de Patrimónios Elevados

Por CRISTINA FERREIRA

Terça-feira, 18 de Dezembro de 2001 Medida de averiguação de fortunas posta em causa Sete dezenas de deputados do PS que votaram com João Cravinho a proposta de declaração obrigatória de património fizeram uma declaração de voto a lembrar que já existem meios "de controlo de ganhos não justificados". A maioria dos deputados do Partido Socialista que aprovaram o projecto do deputado João Cravinho, também do PS, no sentido de obrigar os contribuintes com bens líquidos "relevantes" a entregar prova escrita de património, assinaram a seguir uma declaração de voto que a esvazia de sentido. João Cravinho mostrou-se surpreendido com o documento, e afirmou desconhecer o seu teor. Setenta e três deputados socialistas assinaram uma declaração de voto onde lembram a António Guterres que existem já instrumentos jurídicos "de controlo de ganhos não justificados", e aconselham o Executivo a não tomar medidas que possam ferir a "confiança dos agentes económicos" e conduzir à "fuga de capitais". Todos os deputados que assinaram o documento tinham aprovado a iniciativa de João Cravinho, que visa tornar obrigatório, a partir de 2003, que os contribuintes anexem ao modelo dois de IRS uma declaração de património liquido [financeiro, imobiliário e outros] desde que o valor dos bens ultrapasse um montante considerado relevante pelo Governo. A medida tem como finalidade controlar fortunas e combater a fraude e a evasão fiscal. Este projecto foi aprovado por 111 deputados do PS, quase todo o grupo da bancada socialista, que conta com 115 deputados. Votaram desde logo contra a proposta quatro deputados socialistas: três independentes (Maria do Rosário Carneiro, Teresa Venda e Cláudio Monteiro) e Vítor Ramalho, dirigente do partido. A iniciativa dos 73 deputados socialistas não é alheia à oposição manifestada pelo Governo, por via do ministro das Finanças, Guilherme de Oliveira Martins, que sempre se mostrou relutante em aderir ao projecto de Cravinho, que fixava, numa primeira fase, o em cem mil contos o valor a partir do qual a declaração era obrigatória. Desde logo, Oliveira Martins manifestou-se preocupado com a possibilidade de a iniciativa poder contribuir para a fuga de capitais e alertou ainda para as repercussões que a proposta pudesse vir a ter junto da classe média e dos pequenos investidores, dos detentores de unidades de participações de fundos de investimento. Na sequência, antes da votação em plenário Governo, os deputados desdobraram-se em reuniões, tendo negociado mesmo com João Cravinho alguns pontos da proposta, em especial o valor que estava em cima da mesa (cem mil contos). O braço-de-ferro entre socialistas evoluiu para a substituição deste montante, para "um valor razoável". Cravinho contou com o apoio dos deputados Manuel Alegre, Marques Júnior, Ana Benavente, Medeiros Ferreira, Maria Santos, Vera Jardim, Jorge Lacão, Alberto Costa. E também de Fernando Serrasqueiro e Afonso Candal. Da negociação entre Governo e a bancada socialista resultou uma orientação de voto favorável à iniciativa de João Cravinho, nas novas condições, que delegavam no executivo a fixação de um montante mínimo a partir do qual o contribuinte terá que fazer declaração do seu património. Com a declaração de voto, os deputados dão, no fundo, margem de manobra ao Governo para actuar como entender, pois aconselham-no a não tomar decisões [na definição do valor a declarar] que possam conduzir à fuga de capitais. Ou seja, como cabe ao Governo fixar um montante a declarar, este pode definir um montante que atinja um número mínimo de pessoas, criando condições para que a proposta de Cravinho não saia do papel. Contactado para interpretar o teor da declaração de voto assinada pelos mesmos deputados que a haviam aprovado, João Cravinho afirmou que ignorava "em absoluto o que se passava." E acrescentou: "Não vejo como será possível escapar" a matéria decidida em sede parlamentar. Admitiu ter já "ouvido" falar na intenção de alguns deputados em fundamentar, por escrito, a razão do seu voto, mas declarou desconhecer que já o tinham feito, nem saber quais os nomes na sua origem. Finalmente, em tom de ironia, disse: "Uma declaração de voto é sempre um elemento interessante da vida política e um contributo para o debate em Portugal." "Mas não tenho mais nada a dizer, embora compreenda a sua razão de ser." E concluiu: "O que está decidido está decidido." Por sua vez, a porta-voz do ministro das Finanças afirmou que a definição do valor considerado relevante para a declaração de património, votada no âmbito da discussão do Orçamento do Estado de 2002, continua por pensar, e recorda que o Governo ficou autorizado a legislar no prazo de seis meses. Contactado para interpretar o volte-face da maioria da bancada rosa, o deputado Vítor Ramalho mostrou surpresa pela existência da declaração de voto. E explicou por que razão se opôs: "Tenho a maior estima por João Cravinho como homem sério e pensador, mas discordo totalmente do seu projecto, que impede que a esquerda reflicta sobre o desenvolvimento de Portugal e a forma de o prosseguir." O deputado socialista adiantou vários motivos para não votar ao lado de João Cravinho. Primeiro, "não estando clarificado o sigilo bancário, a proposta viola-o, pois contribuintes com determinados rendimentos terão de declarar o que têm no banco". Em segundo lugar, a proposta é "irrealista", porque, atendendo aos valores imobiliários de hoje, ter "um património de cem mil contos é corrente". Vítor Ramalho sublinha ainda que, com "a entrada no euro e a tendência para o aumento da livre circulação de capitais, é mais fácil a deslocalização de capitais para qualquer outro local". Por último, diz que, "no estado actual da nossa economia, deve-se reforçar tudo o que estimule a esperança, como factor de acréscimo de criação de riqueza, e não o contrário." OUTROS TÍTULOS EM ECONOMIA Corrida aos "kits" de 10 euros

INQUÉRITO

Suecos favoráveis ao euro

Estado contraria as suas próprias orientações ao arredondar para o euro

Contas públicas deverão escapar a terceiro "rectificativo"

Venda da rede fixa pode ter de esperar por novo Governo

Luís Nazaré ainda não foi nomeado

Função pública em "jornada de indignação"

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Um "Ecofin ibérico" à espera

COMENTÁRIO DA BOLSA

Bolsa baixa em contra-ciclo com a Europa

MERCADO DE CÂMBIOS

Notas

BREVES

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Todos os deputados que assinaram o documento tinham aprovado a iniciativa de João Cravinho, que visa tornar obrigatório, a partir de 2003, que os contribuintes anexem ao modelo dois de IRS uma declaração de património liquido [financeiro, imobiliário e outros] desde que o valor dos bens ultrapasse um montante considerado relevante pelo Governo. A medida tem como finalidade controlar fortunas e combater a fraude e a evasão fiscal. Este projecto foi aprovado por 111 deputados do PS, quase todo o grupo da bancada socialista, que conta com 115 deputados. Votaram desde logo contra a proposta quatro deputados socialistas: três independentes (Maria do Rosário Carneiro, Teresa Venda e Cláudio Monteiro) e Vítor Ramalho, dirigente do partido. A iniciativa dos 73 deputados socialistas não é alheia à oposição manifestada pelo Governo, por via do ministro das Finanças, Guilherme de Oliveira Martins, que sempre se mostrou relutante em aderir ao projecto de Cravinho, que fixava, numa primeira fase, o em cem mil contos o valor a partir do qual a declaração era obrigatória. Desde logo, Oliveira Martins manifestou-se preocupado com a possibilidade de a iniciativa poder contribuir para a fuga de capitais e alertou ainda para as repercussões que a proposta pudesse vir a ter junto da classe média e dos pequenos investidores, dos detentores de unidades de participações de fundos de investimento. Na sequência, antes da votação em plenário Governo, os deputados desdobraram-se em reuniões, tendo negociado mesmo com João Cravinho alguns pontos da proposta, em especial o valor que estava em cima da mesa (cem mil contos). O braço-de-ferro entre socialistas evoluiu para a substituição deste montante, para "um valor razoável". Cravinho contou com o apoio dos deputados Manuel Alegre, Marques Júnior, Ana Benavente, Medeiros Ferreira, Maria Santos, Vera Jardim, Jorge Lacão, Alberto Costa. E também de Fernando Serrasqueiro e Afonso Candal. Da negociação entre Governo e a bancada socialista resultou uma orientação de voto favorável à iniciativa de João Cravinho, nas novas condições, que delegavam no executivo a fixação de um montante mínimo a partir do qual o contribuinte terá que fazer declaração do seu património. Com a declaração de voto, os deputados dão, no fundo, margem de manobra ao Governo para actuar como entender, pois aconselham-no a não tomar decisões [na definição do valor a declarar] que possam conduzir à fuga de capitais. Ou seja, como cabe ao Governo fixar um montante a declarar, este pode definir um montante que atinja um número mínimo de pessoas, criando condições para que a proposta de Cravinho não saia do papel. Contactado para interpretar o teor da declaração de voto assinada pelos mesmos deputados que a haviam aprovado, João Cravinho afirmou que ignorava "em absoluto o que se passava." E acrescentou: "Não vejo como será possível escapar" a matéria decidida em sede parlamentar. Admitiu ter já "ouvido" falar na intenção de alguns deputados em fundamentar, por escrito, a razão do seu voto, mas declarou desconhecer que já o tinham feito, nem saber quais os nomes na sua origem. Finalmente, em tom de ironia, disse: "Uma declaração de voto é sempre um elemento interessante da vida política e um contributo para o debate em Portugal." "Mas não tenho mais nada a dizer, embora compreenda a sua razão de ser." E concluiu: "O que está decidido está decidido." 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Em segundo lugar, a proposta é "irrealista", porque, atendendo aos valores imobiliários de hoje, ter "um património de cem mil contos é corrente". Vítor Ramalho sublinha ainda que, com "a entrada no euro e a tendência para o aumento da livre circulação de capitais, é mais fácil a deslocalização de capitais para qualquer outro local". Por último, diz que, "no estado actual da nossa economia, deve-se reforçar tudo o que estimule a esperança, como factor de acréscimo de criação de riqueza, e não o contrário." OUTROS TÍTULOS EM ECONOMIA Corrida aos "kits" de 10 euros

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