"Serralves não é um palco de protagonismos"

15-02-2001
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Entrevista com Teresa Patrício Gouveia

"Serralves Não É Um Palco de Protagonismos"

Por SÉRGIO C. ANDRADE

Domingo, 4 de Fevereiro de 2001 Teresa Patrício Gouveia é a nova presidente do Conselho de Administração de Serralves. A sua principal aposta é dar continuidade ao projecto pluridisciplinar da fundação. E acredita que tal pode continuar a ser feito sob o modelo de gestão e de voluntariado seguido até agora Há mais de uma década, entre 1986 e 1989, a então secretária de Estado da Cultura do Governo de Cavaco Silva pôs a sua assinatura na compra da propriedade de Serralves e no projecto de constituição de uma fundação inédita no país. Este gesto, tão ousado como oportuno, incluía o projecto de fixar no Porto o futuro Museu de Arte Contemporânea, entretanto concretizado com o sucesso amplamente reconhecido. Agora, Teresa Patrício Gouveia, deputada do PSD na AR eleita pelo círculo do Porto, assume a direcção da fundação. À sua frente tem a difícil tarefa de dar continuidade à gestão de João Marques Pinto. PÚBLICO - Admite que a sua eleição para presidir a Serralves possa ter uma componente de homenagem ao papel que desempenhou no lançamento do projecto? TERESA PATRÍCIO GOUVEIA - Não vejo isso assim. Com certeza que tive responsabilidade política na sua criação, mas o projecto cresceu graças à contribuição de muitas pessoas, sobretudo do sector privado. Não vejo que estes lugares devam ser indicados por essas razões. Seria uma péssima motivação. Serralves não é um palco de protagonismos, é um terreno de serviço. E o espírito com que as pessoas estão aqui é de voluntariado, de serviço. P. - O que é que a levou, há mais de uma década, a apostar no Porto para sede do Museu de Arte Contemporânea? R. - Foi uma razão de política de descentralização. A ideia de que há muitas instituições de carácter nacional que não têm de estar em Lisboa. Pelo contrário. Falamos muito em descentralização e em regionalização e isso é, de facto, concretizável. E havia fortes razões para que fosse no Porto. Sobretudo, a intensa actividade artística e cultural da cidade. E porque também era necessário que houvesse uma massa crítica de actividade artística e de público que sustentasse o museu. P. - A escolha do arquitecto Siza Vieira para o projecto do museu tem também a sua assinatura. Foi uma escolha pessoal? R. - Sim. Também me pareceu evidente que fosse o arquitecto Siza Vieira, que até aí não tinha nenhuma obra de grande importância no Porto. P. - O museu, tal qual existe agora, corresponde àquilo que imaginou nessa altura? R. - O facto de ter convidado o arquitecto Siza antecipava um projecto com estas características. Mas confesso que a escala do museu - não estou só a referir-me ao aspecto físico - e a importância do projecto ultrapassaram as expectativas. Isso deve-se muito à visão do arquitecto, mas também à capacidade que a fundação entretanto adquiriu, graças ao anterior presidente, João Marques Pinto. Ele e toda a equipa da administração pensaram em grande, com ambição. E tiveram a sabedoria e a enorme capacidade para viabilizar - naturalmente em parceria com o Estado - uma empreitada desta grandeza. Nesse sentido ultrapassou o que eu tinha imaginado. P. - Acredita que há condições para essa parceria continuar a funcionar? R. - O essencial da lógica do projecto, sim. Mas teremos que o ir ajustando à medida das circunstâncias. Por outro lado, a adesão do público traz também uma responsabilidade acrescida. P. - A certa altura, o ex-ministro Manuel Maria Carrilho fez o desafio à fundação para ela contribuir também para as despesas de funcionamento, agora acrescidas com o museu. Isso parece-lhe possível? R. - O conselho de administração decidiu que seria bom que uma fatia das receitas do sector privado pudesse ser encaminhada nesse sentido. Estamos a trabalhar nisso, e tem havido uma resposta bastante positiva. P. - O modelo de gestão baseado no voluntariado não terá já esgotado as suas virtualidades? O ano passado chegou a falar-se na criação de um lugar de administrador executivo remunerado. R. - A fundação assenta numa estrutura directiva muito profissionalizada e eficiente. Por outro lado, o grau de disponibilidade na equipa da administração continua a ser grande. O modelo de voluntariado não é, por isso, deficitário, apesar da nova dimensão que a fundação atingiu. O modelo continua operacional, e é importante realçar a existência de várias autonomias. Primeiro, a da fundação como entidade privada; depois, a independência cultural da direcção do museu. O conselho de administração dá orientações de carácter geral, mas a programação é da responsabilidade do director. P. - Uma questão com que a nova administração se vai confrontar, mais cedo ou mais tarde, é com a substituição de Vicente Todolí... R. - Renovámos o contrato com Vicente Todolí até final de 2002. Mas gostaria que ele pudesse ficar por mais tempo. Todolí, juntamente com João Fernandes, teve um papel determinante na projecção do museu tanto a nível nacional como internacional. E esta vocação internacional é também importante. O Porto sempre foi uma cidade cosmopolita, e nem sempre esse seu carácter tem sido devidamente reconhecido e explorado. Às vezes aqueles que defendem a personalidade e identidade do Porto fazem-no de uma maneira redutora. P. - Referiu a importância da independência de Serralves. Mas, mais do que uma vez já, foram feitas alusões a tentativas de governamentalização da fundação. Não teme esse risco? R. - A minha experiência é que - tirando um momento que já foi referido pelo meu antecessor e mencionado como de menor compreensão - houve sempre por parte dos Governos um grande entendimento e respeito pela autonomia desta instituição, que foi desejada como sendo de direito privado. P. - Como analisa esse momento mais conturbado que referiu, em que o seu sucessor na pasta da Cultura, Pedro Santana Lopes, trouxe alguma turbulência ao processo de construção do museu? R. - Já não me lembro bem disso. Mas isso é passado. Não tem interesse nenhum. OUTROS TÍTULOS EM CULTURA "Serralves não é um palco de protagonismos"

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PÚBLICO - Admite que a sua eleição para presidir a Serralves possa ter uma componente de homenagem ao papel que desempenhou no lançamento do projecto? TERESA PATRÍCIO GOUVEIA - Não vejo isso assim. Com certeza que tive responsabilidade política na sua criação, mas o projecto cresceu graças à contribuição de muitas pessoas, sobretudo do sector privado. Não vejo que estes lugares devam ser indicados por essas razões. Seria uma péssima motivação. Serralves não é um palco de protagonismos, é um terreno de serviço. E o espírito com que as pessoas estão aqui é de voluntariado, de serviço. P. - O que é que a levou, há mais de uma década, a apostar no Porto para sede do Museu de Arte Contemporânea? R. - Foi uma razão de política de descentralização. A ideia de que há muitas instituições de carácter nacional que não têm de estar em Lisboa. Pelo contrário. Falamos muito em descentralização e em regionalização e isso é, de facto, concretizável. E havia fortes razões para que fosse no Porto. Sobretudo, a intensa actividade artística e cultural da cidade. E porque também era necessário que houvesse uma massa crítica de actividade artística e de público que sustentasse o museu. P. - A escolha do arquitecto Siza Vieira para o projecto do museu tem também a sua assinatura. Foi uma escolha pessoal? R. - Sim. Também me pareceu evidente que fosse o arquitecto Siza Vieira, que até aí não tinha nenhuma obra de grande importância no Porto. P. - O museu, tal qual existe agora, corresponde àquilo que imaginou nessa altura? R. - O facto de ter convidado o arquitecto Siza antecipava um projecto com estas características. Mas confesso que a escala do museu - não estou só a referir-me ao aspecto físico - e a importância do projecto ultrapassaram as expectativas. Isso deve-se muito à visão do arquitecto, mas também à capacidade que a fundação entretanto adquiriu, graças ao anterior presidente, João Marques Pinto. Ele e toda a equipa da administração pensaram em grande, com ambição. E tiveram a sabedoria e a enorme capacidade para viabilizar - naturalmente em parceria com o Estado - uma empreitada desta grandeza. Nesse sentido ultrapassou o que eu tinha imaginado. P. - Acredita que há condições para essa parceria continuar a funcionar? R. - O essencial da lógica do projecto, sim. Mas teremos que o ir ajustando à medida das circunstâncias. Por outro lado, a adesão do público traz também uma responsabilidade acrescida. P. - A certa altura, o ex-ministro Manuel Maria Carrilho fez o desafio à fundação para ela contribuir também para as despesas de funcionamento, agora acrescidas com o museu. Isso parece-lhe possível? R. - O conselho de administração decidiu que seria bom que uma fatia das receitas do sector privado pudesse ser encaminhada nesse sentido. Estamos a trabalhar nisso, e tem havido uma resposta bastante positiva. P. - O modelo de gestão baseado no voluntariado não terá já esgotado as suas virtualidades? 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P. - Como analisa esse momento mais conturbado que referiu, em que o seu sucessor na pasta da Cultura, Pedro Santana Lopes, trouxe alguma turbulência ao processo de construção do museu? R. - Já não me lembro bem disso. Mas isso é passado. Não tem interesse nenhum. OUTROS TÍTULOS EM CULTURA "Serralves não é um palco de protagonismos"

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