EXPRESSO: País

15-12-2001
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Coimbra na hora da despedida

Carlos Encarnação está a um passo de apear Manuel Machado da presidência da Câmara

Rui Duarte Silva Mário Soares na Figueira da Foz: nem a intervenção do «velho leão» erá suficiente para o PS ousar pôr em causa o legado de Santana Lopes a Duarte Silva

UM POUCO por toda a Região Centro, o Partido Socialista apresenta-se ao sufrágio do próximo domingo na defensiva. Seja por desgaste político da acção governativa, seja por dissensões internas, seja ainda pela erosão de alguns protagonistas locais, os socialistas correm o risco de perder algumas das mais emblemáticas autarquias, sem que, em contrapartida, se vislumbrem conquistas compensadoras.

A nível de capitais de distrito a situação ainda se apresenta favorável ao PS, que tem praticamente garantida a vitória em Aveiro, Guarda e Castelo Branco, enquanto o PSD continua hegemónico em Viseu e Leiria, mas ameaçando seriamente a principal cidade da região que é Coimbra. Aqui, o candidato socialista e actual presidente da Câmara, Manuel Machado, foi apoiado por Mário Soares, que se deslocou expressamente à cidade durante a campanha eleitoral, mas sem que a sua presença tenha suscitado o empolgamento de outros tempos. Além de Soares, Machado contou também com o apoio empenhado de Fernando Vale e Manuel Alegre, que é o candidato à presidência da Assembleia Municipal.

Durante a campanha eleitoral propriamente dita, o candidato socialista diminuiu sensivelmente a desvantagem que o separava do seu principal opositor, o social-democrata Carlos Encarnação.

Quanto a Encarnação parece ter obtido agora o entusiasmo e a mobilização das bases que não conseguira em 1982, quando liderou a mesma coligação à Câmara de Coimbra. No entanto, e apesar de algumas sondagens indicarem que obterá uma maioria absoluta, o mais provável é que os votos sejam disputados um a um até ao dia das eleições.

Como curiosidade, registe-se que ambos os candidatos apresentam como mandatários destacados professores da Faculdade de Medicina de Coimbra. O de Manuel Machado é Agostinho Almeida Santos, que se notabilizou na área da reprodução assistida, e o de Encarnação é o conhecido cirurgião cardiotorácico Manuel Antunes.

Campanha tranquila tem feito o candidato da CDU, Jorge Gouveia Monteiro, cujo objectivo eleitoral é impedir que qualquer um dos outros candidatos obtenha maioria absoluta. Gouveia Monteiro será eleito sem dificuldade e é bem possível que os outros dez lugares em disputa sejam divididos em partes iguais pelo PS e pela AD.

A herança de Santana...

Na Figueira da Foz, as eleições vão decorrer sob a figura tutelar de Santana Lopes, cuja fotografia aparece nos cartazes juntamente com a do candidato social-democrata, Duarte Silva, antigo ministro de Cavaco Silva. Dir-se-ia que Santana Lopes concorre em dois concelhos, já que na Figueira é também a sua imagem e a sua obra que irão estar em causa no domingo.

Ao concelho também se deslocaram, em dias diferentes, o antigo ministro da cultura Manuel Maria Carrilho e Mário Soares, este sempre acompanhado de Manuel Alegre, para apoiarem o candidato socialista Vítor Jorge. Apesar disso, não deverá haver surpresa na Figueira de Santana.

... e o afundão de Guterres

O mesmo não se pode dizer do Fundão, terra adoptiva de António Guterres (onde este, aliás, chegou a ser presidente da Assembleia Municipal). O PS apresenta como candidato o governador civil de Castelo Branco, Sampaio Lopes, o mesmo que em 1987 conquistara a Câmara para o PS, mas que em 1995 a trocou pelo lugar de deputado. Sampaio Lopes terá de defrontar Manuel Frexes, antigo secretário de Estado da Cultura de Cavaco Silva, que se mostra totalmente confiante na vitória. Neste concelho não é tanto a força dos opositores que enfraquece a candidatura socialista, mas sim as divisões internas relacionadas com poderosos interesses da construção civil.

O primeiro sinal dessas divisões aparece quando, por intervenção da direcção nacional, o partido preteriu o actual presidente da Câmara, José Maria Fortunato, em favor de Sampaio Lopes. Depois surgiu uma forte contestação ao nome proposto para presidente da Assembleia Municipal, ou seja, o independente Manuel Correia, provedor da Santa Casa da Misericórdia do Fundão. Círculos políticos locais garantiram ao EXPRESSO que essa escolha foi também uma imposição da direcção nacional do partido. Na comissão concelhia, o nome de Manuel Correia só foi aprovado à segunda tentativa e por dois votos.

Finalmente, os socialistas também se dividiram por causa da Fundabeiras, uma empresa de construção civil de que são sócios, entre outros, Manuel Correia e João Lindeza, membro da Assembleia Municipal pelo PS. Tudo porque a Câmara decidiu comprar a esta empresa um edifício ainda não construído para instalar uma escola de hotelaria, num projecto que envolvia também a Região de Turismo da Serra da Estrela (RTSE) e o Instituto Nacional de Formação Turística. Inicialmente, o preço era de 108 mil contos, mas depois de um aumento de área passou para 490 mil. O negócio chegou a ser «abençoado» pelo secretário de Estado do Turismo, Vítor Neto, que em Junho se deslocou ao Fundão para presidir à cerimónia de assinatura desse protocolo, que significativamente se realizou no edifício da Fundabeiras ainda em construção.

Só que a PJ começou a investigar o negócio, a AM recusou aprová-lo e a Câmara acabou por desistir. Então, Jorge Patrão, presidente da RTSE dá uma conferência de imprensa no edifício em construção da Fundabeiras, acompanhado de João Lindeza, anunciando que a escola de hotelaria não seria instalada no Fundão se o protocolo não fosse concretizado.

MOI na Mealhada

Na Mealhada, vive-se também uma situação algo insólita, com o eleitorado socialista partido entre duas candidaturas socialistas: de um lado o actual presidente da Câmara, Carlos Cabral, apoiado pelo presidente da concelhia, Rui Maqueiro, e do outro a candidatura independente da militante do PS Odete Isabel, apoiada pelo Movimento Odete Isabel pelo Concelho da Mealhada (MOI/CM).

Esta candidata já foi presidente da Câmara, entre 1976 e 1979, tendo sido a primeira mulher eleita para esse lugar. A sua escolha como candidata do PS foi inicialmente apoiada pela maioria dos membros eleitos da comissão política concelhia, onde o seu nome chegou mesmo a ser votado. Só que o presidente da concelhia, Rui Marqueiro, preferia o actual presidente da Câmara e arranjou maneira de, à última hora, nomear dois membros da JS para a CPC, o que inverteu a maioria favorável a Odete Isabel.

Depois de duas tumultuosas reuniões desse órgão, em que os candidatos reivindicavam ter sido escolhidos em cada uma delas, acabou por se realizar uma espécie de referendo entre os militantes do PS que escolhem Carlos Cabral. Perante isso, Odete Isabel, que já tinha anunciado a irreversibilidade da sua candidatura, lança o movimento com o seu nome, o qual, desde então e surpreendentemente, tem animado a campanha eleitoral no concelho. Logo abriu sede de candidatura, montou as infra-estruturas para a campanha eleitoral, criou uma página na Internet e praticamente todos os dias leva a cabo iniciativas de campanha, mostrando uma capacidade de organização e mobilização de fazer inveja aos grandes partidos tradicionais.

Odete Isabel não fala em vitória, mas todos os seus apoiantes aspiram a vê-la presidente da Câmara da Mealhada. No mínimo, é mais uma preocupação para o PS, apesar de ser difícil que, na Mealhada, perca mais uma autarquia. É caso para dizer que mói, mas não mata.

Coimbra na hora da despedida

Carlos Encarnação está a um passo de apear Manuel Machado da presidência da Câmara

Rui Duarte Silva Mário Soares na Figueira da Foz: nem a intervenção do «velho leão» erá suficiente para o PS ousar pôr em causa o legado de Santana Lopes a Duarte Silva

UM POUCO por toda a Região Centro, o Partido Socialista apresenta-se ao sufrágio do próximo domingo na defensiva. Seja por desgaste político da acção governativa, seja por dissensões internas, seja ainda pela erosão de alguns protagonistas locais, os socialistas correm o risco de perder algumas das mais emblemáticas autarquias, sem que, em contrapartida, se vislumbrem conquistas compensadoras.

A nível de capitais de distrito a situação ainda se apresenta favorável ao PS, que tem praticamente garantida a vitória em Aveiro, Guarda e Castelo Branco, enquanto o PSD continua hegemónico em Viseu e Leiria, mas ameaçando seriamente a principal cidade da região que é Coimbra. Aqui, o candidato socialista e actual presidente da Câmara, Manuel Machado, foi apoiado por Mário Soares, que se deslocou expressamente à cidade durante a campanha eleitoral, mas sem que a sua presença tenha suscitado o empolgamento de outros tempos. Além de Soares, Machado contou também com o apoio empenhado de Fernando Vale e Manuel Alegre, que é o candidato à presidência da Assembleia Municipal.

Durante a campanha eleitoral propriamente dita, o candidato socialista diminuiu sensivelmente a desvantagem que o separava do seu principal opositor, o social-democrata Carlos Encarnação.

Quanto a Encarnação parece ter obtido agora o entusiasmo e a mobilização das bases que não conseguira em 1982, quando liderou a mesma coligação à Câmara de Coimbra. No entanto, e apesar de algumas sondagens indicarem que obterá uma maioria absoluta, o mais provável é que os votos sejam disputados um a um até ao dia das eleições.

Como curiosidade, registe-se que ambos os candidatos apresentam como mandatários destacados professores da Faculdade de Medicina de Coimbra. O de Manuel Machado é Agostinho Almeida Santos, que se notabilizou na área da reprodução assistida, e o de Encarnação é o conhecido cirurgião cardiotorácico Manuel Antunes.

Campanha tranquila tem feito o candidato da CDU, Jorge Gouveia Monteiro, cujo objectivo eleitoral é impedir que qualquer um dos outros candidatos obtenha maioria absoluta. Gouveia Monteiro será eleito sem dificuldade e é bem possível que os outros dez lugares em disputa sejam divididos em partes iguais pelo PS e pela AD.

A herança de Santana...

Na Figueira da Foz, as eleições vão decorrer sob a figura tutelar de Santana Lopes, cuja fotografia aparece nos cartazes juntamente com a do candidato social-democrata, Duarte Silva, antigo ministro de Cavaco Silva. Dir-se-ia que Santana Lopes concorre em dois concelhos, já que na Figueira é também a sua imagem e a sua obra que irão estar em causa no domingo.

Ao concelho também se deslocaram, em dias diferentes, o antigo ministro da cultura Manuel Maria Carrilho e Mário Soares, este sempre acompanhado de Manuel Alegre, para apoiarem o candidato socialista Vítor Jorge. Apesar disso, não deverá haver surpresa na Figueira de Santana.

... e o afundão de Guterres

O mesmo não se pode dizer do Fundão, terra adoptiva de António Guterres (onde este, aliás, chegou a ser presidente da Assembleia Municipal). O PS apresenta como candidato o governador civil de Castelo Branco, Sampaio Lopes, o mesmo que em 1987 conquistara a Câmara para o PS, mas que em 1995 a trocou pelo lugar de deputado. Sampaio Lopes terá de defrontar Manuel Frexes, antigo secretário de Estado da Cultura de Cavaco Silva, que se mostra totalmente confiante na vitória. Neste concelho não é tanto a força dos opositores que enfraquece a candidatura socialista, mas sim as divisões internas relacionadas com poderosos interesses da construção civil.

O primeiro sinal dessas divisões aparece quando, por intervenção da direcção nacional, o partido preteriu o actual presidente da Câmara, José Maria Fortunato, em favor de Sampaio Lopes. Depois surgiu uma forte contestação ao nome proposto para presidente da Assembleia Municipal, ou seja, o independente Manuel Correia, provedor da Santa Casa da Misericórdia do Fundão. Círculos políticos locais garantiram ao EXPRESSO que essa escolha foi também uma imposição da direcção nacional do partido. Na comissão concelhia, o nome de Manuel Correia só foi aprovado à segunda tentativa e por dois votos.

Finalmente, os socialistas também se dividiram por causa da Fundabeiras, uma empresa de construção civil de que são sócios, entre outros, Manuel Correia e João Lindeza, membro da Assembleia Municipal pelo PS. Tudo porque a Câmara decidiu comprar a esta empresa um edifício ainda não construído para instalar uma escola de hotelaria, num projecto que envolvia também a Região de Turismo da Serra da Estrela (RTSE) e o Instituto Nacional de Formação Turística. Inicialmente, o preço era de 108 mil contos, mas depois de um aumento de área passou para 490 mil. O negócio chegou a ser «abençoado» pelo secretário de Estado do Turismo, Vítor Neto, que em Junho se deslocou ao Fundão para presidir à cerimónia de assinatura desse protocolo, que significativamente se realizou no edifício da Fundabeiras ainda em construção.

Só que a PJ começou a investigar o negócio, a AM recusou aprová-lo e a Câmara acabou por desistir. Então, Jorge Patrão, presidente da RTSE dá uma conferência de imprensa no edifício em construção da Fundabeiras, acompanhado de João Lindeza, anunciando que a escola de hotelaria não seria instalada no Fundão se o protocolo não fosse concretizado.

MOI na Mealhada

Na Mealhada, vive-se também uma situação algo insólita, com o eleitorado socialista partido entre duas candidaturas socialistas: de um lado o actual presidente da Câmara, Carlos Cabral, apoiado pelo presidente da concelhia, Rui Maqueiro, e do outro a candidatura independente da militante do PS Odete Isabel, apoiada pelo Movimento Odete Isabel pelo Concelho da Mealhada (MOI/CM).

Esta candidata já foi presidente da Câmara, entre 1976 e 1979, tendo sido a primeira mulher eleita para esse lugar. A sua escolha como candidata do PS foi inicialmente apoiada pela maioria dos membros eleitos da comissão política concelhia, onde o seu nome chegou mesmo a ser votado. Só que o presidente da concelhia, Rui Marqueiro, preferia o actual presidente da Câmara e arranjou maneira de, à última hora, nomear dois membros da JS para a CPC, o que inverteu a maioria favorável a Odete Isabel.

Depois de duas tumultuosas reuniões desse órgão, em que os candidatos reivindicavam ter sido escolhidos em cada uma delas, acabou por se realizar uma espécie de referendo entre os militantes do PS que escolhem Carlos Cabral. Perante isso, Odete Isabel, que já tinha anunciado a irreversibilidade da sua candidatura, lança o movimento com o seu nome, o qual, desde então e surpreendentemente, tem animado a campanha eleitoral no concelho. Logo abriu sede de candidatura, montou as infra-estruturas para a campanha eleitoral, criou uma página na Internet e praticamente todos os dias leva a cabo iniciativas de campanha, mostrando uma capacidade de organização e mobilização de fazer inveja aos grandes partidos tradicionais.

Odete Isabel não fala em vitória, mas todos os seus apoiantes aspiram a vê-la presidente da Câmara da Mealhada. No mínimo, é mais uma preocupação para o PS, apesar de ser difícil que, na Mealhada, perca mais uma autarquia. É caso para dizer que mói, mas não mata.

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