Guterres «decreta» caça ao voto

19-12-1999
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António Guterres com os membros do seu Executivo, no Natal: o primeiro-ministro espera que, em ano de eleições, a bancada crie menos problemas ao Governo

OS DEPUTADOS socialistas vão começar a actuar, já a partir de Janeiro, como «agentes do debate político nas regiões de origem», no cumprimento de uma directiva do secretário-geral. A orientação foi comunicada terça-feira à tarde pelo líder da bancada, Francisco Assis, no decorrer de uma reunião na Estalagem do Farol, em Cascais. A mobilização dos deputados, que marca o arranque não-oficial da campanha para as legislativas, será secundada por uma operação de «charme» da direcção da bancada, que fará circular, «uma ou duas vezes por mês», aos fins-de-semana, o presidente e os dez vice-presidentes pelas distritais. A intenção é «criar uma relação mais íntima com o partido» - disse ao EXPRESSO Francisco Assis. O Governo prepara também a derradeira etapa, reunindo pela última vez antes da legislativas, para balanço e afinar estratégias, a 8 e 9 de Janeiro em S. Julião da Barra. A desconhecida Os deputados aceitaram ainda, na intranquila reunião junto à Boca do Inferno, os nomes propostos por Assis para os lugares deixados vagos na vice-presidência da bancada pelo abandono de Elisa Damião e Luís Filipe Madeira. A sindicalista, que em Outubro ocupou o lugar de José Apolinário no Parlamento Europeu, foi substituída por uma desconhecida: Natalina Moura, 37ª na lista por Lisboa. O substituto do deputado algarvio - que em vésperas de Natal bateu com a porta - é o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Medeiros Ferreira, «crítico» da linha oficial do partido. Considerado fundador do PS, apesar de não ter estado em Bad-Munstereifel, Luís Filipe Madeira acha-se desconsiderado por Guterres, de cujo «núcleo duro» sempre fez parte. A indignação - que incluiu a mágoa de não ter sido ouvido na escolha do ex-comunista algarvio Vítor Neto (o criador da «abelhinha» da CDU) para a Secretaria de Estado do Turismo - assenta no pressuposto de que a região do Algarve (derrotada no referendo de Novembro) tem sido sempre preterida nas grandes apostas do Governo, em favor de Lisboa e do Porto. Unidade em perigo Na tentativa de «assegurar consensos» que garantam que o Grupo Parlamentar actuará, até às eleições, como «suporte do Governo», Francisco Assis quer excluir da agenda os temas considerados «incómodos»: a liberalização dos touros de morte em Barrancos, requerida por António Saleiro; e a alteração do direito de propriedade das farmácias, que só é reconhecido a licenciados na área, desencadeada por Strecht Monteiro. A prioridade para Assis é a aprovação da nova Lei de Bases da Segurança Social. Mas a opção não é pacífica. Não só porque a reforma do sistema, tal como é proposta, penaliza fortemente a classe média, estimulando reacções adversas na bancada, mas sobretudo porque nem Saleiro nem Strecht Monteiro estão dispostos a abdicar das suas convicções. A complicar a situação, cresce a ameaça de uma nova investida da JS, que, através de Sérgio Sousa Pinto, se prepara para (re)agendar a despenalização do consumo de drogas em plena campanha eleitoral. Assis - que pondera meter «férias sabáticas» para fazer o mestrado em Filosofia - assegura ao EXPRESSO que «apesar de não achar a hipótese desinteressante», «não é ambição» sua ser candidato ao Parlamento Europeu. O deputado receia que a opinião pública associe as duas questões e considere a possibilidade oportunista. «Assalto» à JS A organização de juventude do PS entrou em grande agitação, na sequência da notícia da candidatura do seu secretário-geral, Sérgio Sousa Pinto, ao Parlamento Europeu. De Norte a Sul do país, multiplicam-se as movimentações de apoio de militantes da organização aos dois principais candidatos à sucessão - Rui Pedro Soares e Marques Perestrelo. Um terceiro candidato está, no entanto, prestes a posicionar-se para disputar o lugar de Sérgio Sousa Pinto - que garante agora não ter ainda tomado uma decisão definitiva sobre a ida para Bruxelas - em representação dos guterristas. Dois nomes estão em cima da mesa - Ricardo Castanheira, deputado por Coimbra, e Ana Catarina, deputada por Setúbal -, sendo certo que (se Sousa Pinto não recuar) um deles assumirá a tentativa de assalto ao poder. Orlando Raimundo Um problema chamado 'Manuel 25' A BANCADA parlamentar do PS e a direcção nacional do partido têm um intrincado problema para resolver, decorrente da renúncia de Raul Rêgo ao lugar de deputado: o sucessor natural do antigo director do «República», no «top» de prioridades fixado pela colocação nas listas, é um truculento homem do povo, conhecido pela alcunha de «Manuel 25», que se tornou famoso no partido como segurança nos tempos de Mário Soares.

O problema pôs-se pela primeira vez em Outubro, quando Elisa Damião partiu para Bruxelas. «Manuel 25» era o terceiro suplente, mas Bento Feliz (o primeiro) não podia ocupar a vaga, por ter assumido a presidência da EMEL, e o jovem Alexandre Sargento (o segundo) era já vereador em Cascais. A solução foi encontrada por Jorge Coelho, que obrigou o jovem (substituído provisoriamente no cargo, durante o debate do Orçamento, por um especialista) a acumular funções. A renúncia de Raul Rêgo, já formalmente comunicada, coloca de novo o PS em apuros. Desta vez sem escapadela à vista.

Nascido no Bairro da Boavista e residente na Brandoa, «Manuel 25» (cujo verdadeiro apelido é Jerónimo) exerce as curiosas funções de presidente do Sindicato dos Reformados e não está minimamente disposto - garante quem o conhece de perto - a prescindir do direito de fazer ouvir a sua voz em S. Bento.

António Guterres com os membros do seu Executivo, no Natal: o primeiro-ministro espera que, em ano de eleições, a bancada crie menos problemas ao Governo

OS DEPUTADOS socialistas vão começar a actuar, já a partir de Janeiro, como «agentes do debate político nas regiões de origem», no cumprimento de uma directiva do secretário-geral. A orientação foi comunicada terça-feira à tarde pelo líder da bancada, Francisco Assis, no decorrer de uma reunião na Estalagem do Farol, em Cascais. A mobilização dos deputados, que marca o arranque não-oficial da campanha para as legislativas, será secundada por uma operação de «charme» da direcção da bancada, que fará circular, «uma ou duas vezes por mês», aos fins-de-semana, o presidente e os dez vice-presidentes pelas distritais. A intenção é «criar uma relação mais íntima com o partido» - disse ao EXPRESSO Francisco Assis. O Governo prepara também a derradeira etapa, reunindo pela última vez antes da legislativas, para balanço e afinar estratégias, a 8 e 9 de Janeiro em S. Julião da Barra. A desconhecida Os deputados aceitaram ainda, na intranquila reunião junto à Boca do Inferno, os nomes propostos por Assis para os lugares deixados vagos na vice-presidência da bancada pelo abandono de Elisa Damião e Luís Filipe Madeira. A sindicalista, que em Outubro ocupou o lugar de José Apolinário no Parlamento Europeu, foi substituída por uma desconhecida: Natalina Moura, 37ª na lista por Lisboa. O substituto do deputado algarvio - que em vésperas de Natal bateu com a porta - é o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros Medeiros Ferreira, «crítico» da linha oficial do partido. Considerado fundador do PS, apesar de não ter estado em Bad-Munstereifel, Luís Filipe Madeira acha-se desconsiderado por Guterres, de cujo «núcleo duro» sempre fez parte. A indignação - que incluiu a mágoa de não ter sido ouvido na escolha do ex-comunista algarvio Vítor Neto (o criador da «abelhinha» da CDU) para a Secretaria de Estado do Turismo - assenta no pressuposto de que a região do Algarve (derrotada no referendo de Novembro) tem sido sempre preterida nas grandes apostas do Governo, em favor de Lisboa e do Porto. Unidade em perigo Na tentativa de «assegurar consensos» que garantam que o Grupo Parlamentar actuará, até às eleições, como «suporte do Governo», Francisco Assis quer excluir da agenda os temas considerados «incómodos»: a liberalização dos touros de morte em Barrancos, requerida por António Saleiro; e a alteração do direito de propriedade das farmácias, que só é reconhecido a licenciados na área, desencadeada por Strecht Monteiro. A prioridade para Assis é a aprovação da nova Lei de Bases da Segurança Social. Mas a opção não é pacífica. Não só porque a reforma do sistema, tal como é proposta, penaliza fortemente a classe média, estimulando reacções adversas na bancada, mas sobretudo porque nem Saleiro nem Strecht Monteiro estão dispostos a abdicar das suas convicções. A complicar a situação, cresce a ameaça de uma nova investida da JS, que, através de Sérgio Sousa Pinto, se prepara para (re)agendar a despenalização do consumo de drogas em plena campanha eleitoral. Assis - que pondera meter «férias sabáticas» para fazer o mestrado em Filosofia - assegura ao EXPRESSO que «apesar de não achar a hipótese desinteressante», «não é ambição» sua ser candidato ao Parlamento Europeu. O deputado receia que a opinião pública associe as duas questões e considere a possibilidade oportunista. «Assalto» à JS A organização de juventude do PS entrou em grande agitação, na sequência da notícia da candidatura do seu secretário-geral, Sérgio Sousa Pinto, ao Parlamento Europeu. De Norte a Sul do país, multiplicam-se as movimentações de apoio de militantes da organização aos dois principais candidatos à sucessão - Rui Pedro Soares e Marques Perestrelo. Um terceiro candidato está, no entanto, prestes a posicionar-se para disputar o lugar de Sérgio Sousa Pinto - que garante agora não ter ainda tomado uma decisão definitiva sobre a ida para Bruxelas - em representação dos guterristas. Dois nomes estão em cima da mesa - Ricardo Castanheira, deputado por Coimbra, e Ana Catarina, deputada por Setúbal -, sendo certo que (se Sousa Pinto não recuar) um deles assumirá a tentativa de assalto ao poder. Orlando Raimundo Um problema chamado 'Manuel 25' A BANCADA parlamentar do PS e a direcção nacional do partido têm um intrincado problema para resolver, decorrente da renúncia de Raul Rêgo ao lugar de deputado: o sucessor natural do antigo director do «República», no «top» de prioridades fixado pela colocação nas listas, é um truculento homem do povo, conhecido pela alcunha de «Manuel 25», que se tornou famoso no partido como segurança nos tempos de Mário Soares.

O problema pôs-se pela primeira vez em Outubro, quando Elisa Damião partiu para Bruxelas. «Manuel 25» era o terceiro suplente, mas Bento Feliz (o primeiro) não podia ocupar a vaga, por ter assumido a presidência da EMEL, e o jovem Alexandre Sargento (o segundo) era já vereador em Cascais. A solução foi encontrada por Jorge Coelho, que obrigou o jovem (substituído provisoriamente no cargo, durante o debate do Orçamento, por um especialista) a acumular funções. A renúncia de Raul Rêgo, já formalmente comunicada, coloca de novo o PS em apuros. Desta vez sem escapadela à vista.

Nascido no Bairro da Boavista e residente na Brandoa, «Manuel 25» (cujo verdadeiro apelido é Jerónimo) exerce as curiosas funções de presidente do Sindicato dos Reformados e não está minimamente disposto - garante quem o conhece de perto - a prescindir do direito de fazer ouvir a sua voz em S. Bento.

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