Assembleia da República não vai reconhecer estatuto social a homossexuais

14-02-2001
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Assembleia da República Não Vai Reconhecer Estatuto Social a Homossexuais

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Quarta-feira, 14 de Fevereiro de 2001 Parlamento discute projectos hoje Só os direitos de pessoas em economia comum deverão ser aprovados, os projectos que reconhecem as uniões de facto homossexuais deverão ser chumbados Dois anos depois da aprovação da lei que reconhece direitos sociais às uniões de facto heterossexuais, a Assembleia da República volta a discutir a atribuição de direitos sociais equiparados ao casamento. Desta vez, em causa está já a discussão pelo plenário, hoje, de direitos para casais homossexuais, proposto pelo PCP, pelo Bloco de Esquerda e por "Os Verdes", mas este debate é feito em conjunto com o do projecto da Juventude Socialista (JS), que propõe o reconhecimento de direitos a pessoas a viverem em regime de economia comum. À partida, tudo indica que na votação na generalidade, que se realiza amanhã, apenas o projecto socialista será aprovado. O PSD e o PP votarão contra os projectos que reconhecem o estatuto social aos casais homossexuais. E é de prever que os socialistas, usando a liberdade de voto que lhes foi atribuída, se dividam, pelo que apenas deverão ser assegurados votos suficientes para garantirem a aprovação do projecto da JS. O resultado da votação e o tipo de soluções em debate espelha assim uma divisão clara sobre a forma como a homossexualidade deve ser tratada do ponto de vista da lei ordinária. Em defesa da atribuição de estatuto social aos casais "homo" perfilham-se "Os Verdes", o Bloco de Esquerda e o PCP. Isabel Castro explicou ao PÚBLICO que a opção de "Os Verdes" - partido pioneiro na defesa dos direitos dos homossexuais em Portugal - foi a de acabar com o que consideram uma discriminação criada pela lei anteriormente aprovada para heterossexuais. Por isso, afirmou, eliminaram "aquilo que eram as palavras discriminatórias" no anterior diploma, ou seja, transformou em geral um universo de aplicação da lei que era limitado a pessoas de sexos diferentes. Diferenciando o tipo de soluções propostas, Isabel Castro sustenta que "a economia em comum pode ser uma forma de protecção interessante para quem, por razões económicas e logísticas, decide viver em comum", mas defende que isso "é uma forma de não assumir que os homossexuais que vivem em comum são uma família". E remata: "A economia comum é coabitação e é completamente tolo pensar que economia comum é uma forma de constituir família." E em defesa do seu projecto garante: "Não me interessa se os casais são homossexuais ou não, assim como não obrigo os homossexuais a beneficiarem do regime, quero é acabar com a discriminação." Com uma posição mais conciliadora apresenta-se neste debate o Bloco de Esquerda. Em declarações ao PÚBLICO na semana passada, Francisco Louçã assumia já que o BE admite que a lei final a sair da Assembleia contemple dois aspectos em dois capítulos diferentes: homossexuais e economia comum. A prioridade para o Bloco parece ser a da urgência de reconhecer o estatuto social da homossexualidade. Daí que Helena Neves tenha defendido em conversa com o PÚBLICO que "a proposta da JS é interessante, pois contempla situações que estão em crescendo na nossa sociedade, por exemplo na terceira idade verifica-se que há muitas mulheres com casa comum". Todavia, adverte: "É evidente que a economia comum acaba por estender-se aos casais homossexuais, mas é uma abordagem enviesada, envergonhada, que não reconhece a homossexualidade, que não reconhece as relações afectivas e que retira da lei a esfera do afectivo, que é o que interessa." Por isso, conclui, o BE optou por alterar a lei em vigor e aplicá-la indiferentemente, já que "homossexuais e heterossexuais são pessoas". No mesmo sentido se orienta a posição do PCP. Odete Santos defendeu em declarações ao PÚBLICO que os projectos deveriam baixar todos para que "não se cristalizem posições, senão ainda não passa nada e não há lei". Apontando críticas ao projecto da JS - "da economia em comum não devem ser excluídos os irmãos que vivem na mesma casa, como faz o PS" -, Odete Santos é peremptória na defesa do estatuto homossexual: "A lei deve assumir que é para homossexuais, se agora dermos um passo envergonhado, tem consequência na legislação futura. Acho que a sociedade está disposta a aceitar, não há nenhum movimento contra." PSD e PP contra uniões homossexuais Do outro lado da questão colocam-se PSD e PP. Os sociais-democratas preparam-se para votar contra, ainda que se algum deputado assim o pedir terá direito a exercer a sua liberdade de voto. Mas o líder parlamentar do PSD, António Capucho, foi directo ao declarar ao PÚBLICO: "Fomos desfavoráveis e votámos contra o diploma que adoptou uniões de facto. O que está em causa é o alargamento desse diploma e o registo histórico do partido é claríssimo neste domínio." Quanto ao projecto da JS, a orientação de voto do PSD é também o voto contra, mas a própria direcção da bancada social-democrata sabe que poderão surgir vários casos de deputados seus que optarão por se abster ou mesmo votar a favor da economia em comum. Pedro Duarte, líder da Juventude Social Democrata, afirmou ao PÚBLICO que até poderá votar a favor do diploma sobre economia em comum se o PS acrescentar um ponto em que revoga a lei 135/99 que cria as uniões de facto heterossexuais, a qual considera claramente discriminatória. "O Estado não tem nada a ver com a orientação sexual", diz Pedro Duarte, que acrescenta que "os homossexuais não têm de ter direitos específicos, pode é discutir-se o alargamento do casamento". Já o CDS-PP assume a sua oposição frontal em relação às uniões homossexuais. Mas admite viabilizar o diploma do PS, para mais quando foi a sua anterior líder parlamentar, Maria José Nogueira Pinto, que introduziu no debate parlamentar a ideia de economia comum, alegando que ninguém tem nada a ver com o que se passa para além do buraco da fechadura de uma casa. Ora é essa mesma tese que Luís Pedro Mota Soares retoma em declarações ao PÚBLICO, para afirmar que o CDS-PP admite "discutir direitos para a economia comum", mas frisa que "o Estado não deve discriminar nem negativa nem positivamente as pessoas em função da orientação sexual". Mota Soares sustenta, contudo, que o CDS pretende analisar com rigor questões como o direito à herança de contrato de arrendamento, que deve ser permitida com recurso a provas detalhadas. Bem como admite que o seu partido venha a "estudar a hipótese da responsabilidade passiva por dívidas", já que uma relação deste tipo "tem de ter também obrigações e não só direitos", conclui o deputado. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Assembleia da República não vai reconhecer estatuto social a homossexuais

Socialistas estão profundamente divididos

Abaixo-assinado e manifestação

EDITORIAL Direitos e deveres

Vítor e Artur desiludidos com o PS

"Os heterossexuais ficariam satisfeitos com a economia comum?"

A actual lei e as novas propostas

Pacto Civil de Solidariedade tem um ano e muitos adeptos em França

COMENTÁRIO Coragem e democracia

Assembleia da República Não Vai Reconhecer Estatuto Social a Homossexuais

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Quarta-feira, 14 de Fevereiro de 2001 Parlamento discute projectos hoje Só os direitos de pessoas em economia comum deverão ser aprovados, os projectos que reconhecem as uniões de facto homossexuais deverão ser chumbados Dois anos depois da aprovação da lei que reconhece direitos sociais às uniões de facto heterossexuais, a Assembleia da República volta a discutir a atribuição de direitos sociais equiparados ao casamento. Desta vez, em causa está já a discussão pelo plenário, hoje, de direitos para casais homossexuais, proposto pelo PCP, pelo Bloco de Esquerda e por "Os Verdes", mas este debate é feito em conjunto com o do projecto da Juventude Socialista (JS), que propõe o reconhecimento de direitos a pessoas a viverem em regime de economia comum. À partida, tudo indica que na votação na generalidade, que se realiza amanhã, apenas o projecto socialista será aprovado. O PSD e o PP votarão contra os projectos que reconhecem o estatuto social aos casais homossexuais. E é de prever que os socialistas, usando a liberdade de voto que lhes foi atribuída, se dividam, pelo que apenas deverão ser assegurados votos suficientes para garantirem a aprovação do projecto da JS. O resultado da votação e o tipo de soluções em debate espelha assim uma divisão clara sobre a forma como a homossexualidade deve ser tratada do ponto de vista da lei ordinária. Em defesa da atribuição de estatuto social aos casais "homo" perfilham-se "Os Verdes", o Bloco de Esquerda e o PCP. Isabel Castro explicou ao PÚBLICO que a opção de "Os Verdes" - partido pioneiro na defesa dos direitos dos homossexuais em Portugal - foi a de acabar com o que consideram uma discriminação criada pela lei anteriormente aprovada para heterossexuais. Por isso, afirmou, eliminaram "aquilo que eram as palavras discriminatórias" no anterior diploma, ou seja, transformou em geral um universo de aplicação da lei que era limitado a pessoas de sexos diferentes. Diferenciando o tipo de soluções propostas, Isabel Castro sustenta que "a economia em comum pode ser uma forma de protecção interessante para quem, por razões económicas e logísticas, decide viver em comum", mas defende que isso "é uma forma de não assumir que os homossexuais que vivem em comum são uma família". E remata: "A economia comum é coabitação e é completamente tolo pensar que economia comum é uma forma de constituir família." E em defesa do seu projecto garante: "Não me interessa se os casais são homossexuais ou não, assim como não obrigo os homossexuais a beneficiarem do regime, quero é acabar com a discriminação." Com uma posição mais conciliadora apresenta-se neste debate o Bloco de Esquerda. Em declarações ao PÚBLICO na semana passada, Francisco Louçã assumia já que o BE admite que a lei final a sair da Assembleia contemple dois aspectos em dois capítulos diferentes: homossexuais e economia comum. A prioridade para o Bloco parece ser a da urgência de reconhecer o estatuto social da homossexualidade. Daí que Helena Neves tenha defendido em conversa com o PÚBLICO que "a proposta da JS é interessante, pois contempla situações que estão em crescendo na nossa sociedade, por exemplo na terceira idade verifica-se que há muitas mulheres com casa comum". Todavia, adverte: "É evidente que a economia comum acaba por estender-se aos casais homossexuais, mas é uma abordagem enviesada, envergonhada, que não reconhece a homossexualidade, que não reconhece as relações afectivas e que retira da lei a esfera do afectivo, que é o que interessa." Por isso, conclui, o BE optou por alterar a lei em vigor e aplicá-la indiferentemente, já que "homossexuais e heterossexuais são pessoas". No mesmo sentido se orienta a posição do PCP. Odete Santos defendeu em declarações ao PÚBLICO que os projectos deveriam baixar todos para que "não se cristalizem posições, senão ainda não passa nada e não há lei". Apontando críticas ao projecto da JS - "da economia em comum não devem ser excluídos os irmãos que vivem na mesma casa, como faz o PS" -, Odete Santos é peremptória na defesa do estatuto homossexual: "A lei deve assumir que é para homossexuais, se agora dermos um passo envergonhado, tem consequência na legislação futura. Acho que a sociedade está disposta a aceitar, não há nenhum movimento contra." PSD e PP contra uniões homossexuais Do outro lado da questão colocam-se PSD e PP. Os sociais-democratas preparam-se para votar contra, ainda que se algum deputado assim o pedir terá direito a exercer a sua liberdade de voto. Mas o líder parlamentar do PSD, António Capucho, foi directo ao declarar ao PÚBLICO: "Fomos desfavoráveis e votámos contra o diploma que adoptou uniões de facto. O que está em causa é o alargamento desse diploma e o registo histórico do partido é claríssimo neste domínio." Quanto ao projecto da JS, a orientação de voto do PSD é também o voto contra, mas a própria direcção da bancada social-democrata sabe que poderão surgir vários casos de deputados seus que optarão por se abster ou mesmo votar a favor da economia em comum. Pedro Duarte, líder da Juventude Social Democrata, afirmou ao PÚBLICO que até poderá votar a favor do diploma sobre economia em comum se o PS acrescentar um ponto em que revoga a lei 135/99 que cria as uniões de facto heterossexuais, a qual considera claramente discriminatória. "O Estado não tem nada a ver com a orientação sexual", diz Pedro Duarte, que acrescenta que "os homossexuais não têm de ter direitos específicos, pode é discutir-se o alargamento do casamento". Já o CDS-PP assume a sua oposição frontal em relação às uniões homossexuais. Mas admite viabilizar o diploma do PS, para mais quando foi a sua anterior líder parlamentar, Maria José Nogueira Pinto, que introduziu no debate parlamentar a ideia de economia comum, alegando que ninguém tem nada a ver com o que se passa para além do buraco da fechadura de uma casa. Ora é essa mesma tese que Luís Pedro Mota Soares retoma em declarações ao PÚBLICO, para afirmar que o CDS-PP admite "discutir direitos para a economia comum", mas frisa que "o Estado não deve discriminar nem negativa nem positivamente as pessoas em função da orientação sexual". Mota Soares sustenta, contudo, que o CDS pretende analisar com rigor questões como o direito à herança de contrato de arrendamento, que deve ser permitida com recurso a provas detalhadas. Bem como admite que o seu partido venha a "estudar a hipótese da responsabilidade passiva por dívidas", já que uma relação deste tipo "tem de ter também obrigações e não só direitos", conclui o deputado. 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