Um debate à medida de Portas e Guterres

05-11-2001
marcar artigo

Análise

Um Debate à Medida de Portas e Guterres

Por EUNICE LOURENÇO E HELENA PEREIRA

Quinta-feira, 1 de Novembro de 2001

Oposição já devia ter percebido que bombardear o primeiro-ministro com perguntas não é uma boa técnica.

Foi um debate de surdos aquele que ontem decorreu na Assembleia da República. Com um tema que tem provocado discussões interessantes nos meios políticos e académicos - "cultura democrática de segurança" -, os partidos passaram ao lado de opções que o Governo quer tomar e os portugueses ficaram sem saber, por exemplo, o que pensam de os militares poderem fazer acções de vigilância ao lado da PSP.

Guterres decidiu fazer a vontade ao CDS-PP e tratar de segurança. Durão Barroso preferiu usar o direito que tem de colocar perguntas ao primeiro-ministro sobre os temas que quiser. Só que bombardear Guterres com perguntas não é uma boa táctica, já que lhe permite fugir ao que não lhe interessa e responder ao que interessa, passando a imagem de que tem resposta para tudo na ponta da língua.

Apesar de ter conseguido levar o primeiro-ministro a assumir o segundo orçamento rectificativo para 2001, as perguntas de Durão acabaram mesmo por se virar contra o próprio. Foi o caso da sua questão sobre a taxa de alcoolemia. Na sessão legislativa passada, num outro debate com Guterres, o presidente do PSD fez um discurso no plenário em que defendeu que o alcoolismo devia ter a atenção do Governo e exigiu medidas. Agora o seu partido está contra os limites impostos pelo executivo. Ao levar o assunto ao debate de ontem, abriu a porta a que o primeiro-ministro insinuasse que o PSD anda a reboque do lobby dos produtores vinícolas.

Também o recurso ao que Guterres dizia das forças de segurança quando era líder da oposição não deu muitos frutos, pois o primeiro-ministro retorquiu que nesse tempo os portugueses viam as polícias como um instrumento político do Governo cavaquista. Acusado de ignorante, por Guterres, e de esquizofrénico por Jorge Lacão, Durão ficou-se. Para ganhar debates, o presidente do PSD tem que perceber que deve usar todas as armas e que abdicar da defesa da honra, quando é insultado, não é a melhor forma de dar uma imagem combativa.

Com o debate a fugir-lhes, os sociais-democratas optaram pela vitimização, repetindo um número habitual nos debates mensais com o primeiro-ministro: acusar o primeiro-ministro de querer condicionar a agenda da Assembleia da República e de não permitir à oposição falar do que quer. O número está gasto e já se provou que não resulta, se bem que seja verdade que a atitude de Guterres também não é de louvar. O primeiro-ministro chega com um tema preparado, tendo avisado previamente a oposição de qual e, perante as perguntas que fogem ao seu esquema, desvaloriza-as e diz que não é a altura certa.

Num debate em que PCP e BE não marcaram - quando se trata de segurança, têm logo receio das alterações à custa dos direitos dos cidadãos e não conseguem libertar-se de chavões -, o CDS-PP saiu satisfeito, ou não tivesse sido este um debate à medida de Paulo Portas e do Governo.

Análise

Um Debate à Medida de Portas e Guterres

Por EUNICE LOURENÇO E HELENA PEREIRA

Quinta-feira, 1 de Novembro de 2001

Oposição já devia ter percebido que bombardear o primeiro-ministro com perguntas não é uma boa técnica.

Foi um debate de surdos aquele que ontem decorreu na Assembleia da República. Com um tema que tem provocado discussões interessantes nos meios políticos e académicos - "cultura democrática de segurança" -, os partidos passaram ao lado de opções que o Governo quer tomar e os portugueses ficaram sem saber, por exemplo, o que pensam de os militares poderem fazer acções de vigilância ao lado da PSP.

Guterres decidiu fazer a vontade ao CDS-PP e tratar de segurança. Durão Barroso preferiu usar o direito que tem de colocar perguntas ao primeiro-ministro sobre os temas que quiser. Só que bombardear Guterres com perguntas não é uma boa táctica, já que lhe permite fugir ao que não lhe interessa e responder ao que interessa, passando a imagem de que tem resposta para tudo na ponta da língua.

Apesar de ter conseguido levar o primeiro-ministro a assumir o segundo orçamento rectificativo para 2001, as perguntas de Durão acabaram mesmo por se virar contra o próprio. Foi o caso da sua questão sobre a taxa de alcoolemia. Na sessão legislativa passada, num outro debate com Guterres, o presidente do PSD fez um discurso no plenário em que defendeu que o alcoolismo devia ter a atenção do Governo e exigiu medidas. Agora o seu partido está contra os limites impostos pelo executivo. Ao levar o assunto ao debate de ontem, abriu a porta a que o primeiro-ministro insinuasse que o PSD anda a reboque do lobby dos produtores vinícolas.

Também o recurso ao que Guterres dizia das forças de segurança quando era líder da oposição não deu muitos frutos, pois o primeiro-ministro retorquiu que nesse tempo os portugueses viam as polícias como um instrumento político do Governo cavaquista. Acusado de ignorante, por Guterres, e de esquizofrénico por Jorge Lacão, Durão ficou-se. Para ganhar debates, o presidente do PSD tem que perceber que deve usar todas as armas e que abdicar da defesa da honra, quando é insultado, não é a melhor forma de dar uma imagem combativa.

Com o debate a fugir-lhes, os sociais-democratas optaram pela vitimização, repetindo um número habitual nos debates mensais com o primeiro-ministro: acusar o primeiro-ministro de querer condicionar a agenda da Assembleia da República e de não permitir à oposição falar do que quer. O número está gasto e já se provou que não resulta, se bem que seja verdade que a atitude de Guterres também não é de louvar. O primeiro-ministro chega com um tema preparado, tendo avisado previamente a oposição de qual e, perante as perguntas que fogem ao seu esquema, desvaloriza-as e diz que não é a altura certa.

Num debate em que PCP e BE não marcaram - quando se trata de segurança, têm logo receio das alterações à custa dos direitos dos cidadãos e não conseguem libertar-se de chavões -, o CDS-PP saiu satisfeito, ou não tivesse sido este um debate à medida de Paulo Portas e do Governo.

marcar artigo