Primeiro comunicado foi a gota de água para onda de demissões

08-09-2001
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Primeiro Comunicado Foi a Gota de Água para Onda de Demissões

Por HELENA PEREIRA

Domingo, 19 de Agosto de 2001 Comunicado da Comissão Política colocou um ponto final nas ilusões de quem, há 10 anos, acreditava na renovação do partido O golpe de Estado na União Soviética foi a gota de água que fez transbordar a contestação interna às orientações político-ideológicas da direcção do PCP abrindo a maior crise do partido desde a saída da clandestinidade e dando origem a dezenas de demissões. O golpe de Moscovo apanhou o partido numa altura já difícil e, por isso, acelerou os processos de contestação interna. Em ano de eleições legislativas, vários militantes resolveram sair do PCP pelo seu próprio pé. Outros foram expulsos. Durante o mês de Agosto, já se tinham demitido vários militantes como Osvaldo de Castro, que explicava ao PÚBLICO, nessa altura, que o PCP estava "putrefacto" e numa situação de "absoluta irrecuperabilidade". Na sequência da reunião do Hotel Roma, Barros Moura - que já tinha abandonado o Parlamento Europeu -, Raimundo Narciso e Mário Lino são expulsos com quatro votos contra e uma abstenção. José Luís Judas não espera pela ordem de saída e demite-se antes. Esta reunião é ideia de elementos da "Terceira Via", um grupo que já estava organizado e que proclamava uma renovação organizativa e ideológica do PCP. A par do "Grupo dos Seis", que entretanto já tinha desaparecido, foi uma das mais sérias tentativas de mudar o PCP. Joaquim Pina Moura, que se opôs à posição assumida pelo PCP quanto ao golpe de Moscovo, demite-se ao mesmo tempo que vários ex-dirigentes estudantis comunistas, como Miguel Portas, António Teodoro, Rosa Brandão, João Leal, Eugénia Varela Gomes, José Maria Castro Caldas, Jorge Lemos e Olga Areosa. Na mesma altura, é a vez de Borges Coelho, Carlos Lopes, membro da direcção da Organização Regional do Algarve, Serafim Nunes, membro da DORP, António Graça e António Hespanha, apresentarem a demissão. Do "Grupo dos Seis", só Sousa Marques se mantém, então, como militante. O "Grupo dos Seis" tinha surgido em 1988, quando Veiga de Oliveira, Vital Moreira, Vítor Louro, Silva Graça, Sousa Marques e Dulce Martins elaboram um documento para a "democratização" do XII Congresso do PCP, que criticava o funcionamento interno do partido. Os subscritores queixam-se que o debate interno "é controlado" pelos responsáveis máximos. "A liberdade de expressão dentro do PCP continua a estar limitada e condicionada", escreveram, defendendo o voto secreto no congresso e criticando o facto de, nas teses preparadas para a reunião, os apoios à perestroika serem "recusados liminarmente". "Não se pode enfrentar o século XXI com princípios sistematizados dos anos 20 e 30", diziam. Aparece na mesma altura, fase preparatória do XII Congresso, um outro documento, assinado por Zita Seabra, que é entregue à direcção comunista. Pouco tempo depois surge um outro documento ligado à chamada "sensibilidade crítica" ou "Terceira Via". Pina Moura, Barros Moura e José Luís Judas estão aqui alinhados. Subscrito pela ala intelectual do PCP, o constitucionalista Gomes Canotilho, o historiador António Borges Coelho e o escritor José Saramago, o texto chegou a merecer a assinatura de cerca de 500 individualidades. Os subscritores propunham a eleição de delegados ao Congresso e a eleição do Comité Central através de voto secreto. Uma ampla difusão das posições surgidas nos debates preparatórios ao congresso e abertura da imprensa do partido eram outros dos objectivos. No congresso de 1988, o "Grupo dos Seis" é derrotado. Zita Seabra já tinha sido afastada do comité central (é expulsa do partido em 1990). Depois do conclave, Vital Moreira e Gomes Canotilho resolvem abandonar o partido, bem como Silva Graça, Veiga de Oliveira e Dulce Martins. A "Terceira Via" sobrevive até ao golpe de Moscovo. Para a história, os dois grupos ficaram conhecidos como os desvios social-democratizantes do PCP. Poucos meses depois do golpe, já em 1992, surge a Plataforma de Esquerda, que vem reunir uma série de ex-militantes comunistas, como Barros Moura, Judas, Pina Moura, Miguel Portas, Osvaldo Castro, Raimundo Narciso. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Os quatro dias que mudaram a Rússia

Os golpistas exigem reabilitação

EDITORIAL O longo caminho para a liberdade

A herança do império soviético

O sonho de voltar a ser uma superpotência

O léxico da URSS

PCP começou por apoiar o golpe, mas depois recuou

Primeiro comunicado foi a gota de água para onda de demissões

Primeiro Comunicado Foi a Gota de Água para Onda de Demissões

Por HELENA PEREIRA

Domingo, 19 de Agosto de 2001 Comunicado da Comissão Política colocou um ponto final nas ilusões de quem, há 10 anos, acreditava na renovação do partido O golpe de Estado na União Soviética foi a gota de água que fez transbordar a contestação interna às orientações político-ideológicas da direcção do PCP abrindo a maior crise do partido desde a saída da clandestinidade e dando origem a dezenas de demissões. O golpe de Moscovo apanhou o partido numa altura já difícil e, por isso, acelerou os processos de contestação interna. Em ano de eleições legislativas, vários militantes resolveram sair do PCP pelo seu próprio pé. Outros foram expulsos. Durante o mês de Agosto, já se tinham demitido vários militantes como Osvaldo de Castro, que explicava ao PÚBLICO, nessa altura, que o PCP estava "putrefacto" e numa situação de "absoluta irrecuperabilidade". Na sequência da reunião do Hotel Roma, Barros Moura - que já tinha abandonado o Parlamento Europeu -, Raimundo Narciso e Mário Lino são expulsos com quatro votos contra e uma abstenção. José Luís Judas não espera pela ordem de saída e demite-se antes. Esta reunião é ideia de elementos da "Terceira Via", um grupo que já estava organizado e que proclamava uma renovação organizativa e ideológica do PCP. A par do "Grupo dos Seis", que entretanto já tinha desaparecido, foi uma das mais sérias tentativas de mudar o PCP. Joaquim Pina Moura, que se opôs à posição assumida pelo PCP quanto ao golpe de Moscovo, demite-se ao mesmo tempo que vários ex-dirigentes estudantis comunistas, como Miguel Portas, António Teodoro, Rosa Brandão, João Leal, Eugénia Varela Gomes, José Maria Castro Caldas, Jorge Lemos e Olga Areosa. Na mesma altura, é a vez de Borges Coelho, Carlos Lopes, membro da direcção da Organização Regional do Algarve, Serafim Nunes, membro da DORP, António Graça e António Hespanha, apresentarem a demissão. Do "Grupo dos Seis", só Sousa Marques se mantém, então, como militante. O "Grupo dos Seis" tinha surgido em 1988, quando Veiga de Oliveira, Vital Moreira, Vítor Louro, Silva Graça, Sousa Marques e Dulce Martins elaboram um documento para a "democratização" do XII Congresso do PCP, que criticava o funcionamento interno do partido. Os subscritores queixam-se que o debate interno "é controlado" pelos responsáveis máximos. "A liberdade de expressão dentro do PCP continua a estar limitada e condicionada", escreveram, defendendo o voto secreto no congresso e criticando o facto de, nas teses preparadas para a reunião, os apoios à perestroika serem "recusados liminarmente". "Não se pode enfrentar o século XXI com princípios sistematizados dos anos 20 e 30", diziam. Aparece na mesma altura, fase preparatória do XII Congresso, um outro documento, assinado por Zita Seabra, que é entregue à direcção comunista. Pouco tempo depois surge um outro documento ligado à chamada "sensibilidade crítica" ou "Terceira Via". Pina Moura, Barros Moura e José Luís Judas estão aqui alinhados. Subscrito pela ala intelectual do PCP, o constitucionalista Gomes Canotilho, o historiador António Borges Coelho e o escritor José Saramago, o texto chegou a merecer a assinatura de cerca de 500 individualidades. Os subscritores propunham a eleição de delegados ao Congresso e a eleição do Comité Central através de voto secreto. Uma ampla difusão das posições surgidas nos debates preparatórios ao congresso e abertura da imprensa do partido eram outros dos objectivos. No congresso de 1988, o "Grupo dos Seis" é derrotado. Zita Seabra já tinha sido afastada do comité central (é expulsa do partido em 1990). Depois do conclave, Vital Moreira e Gomes Canotilho resolvem abandonar o partido, bem como Silva Graça, Veiga de Oliveira e Dulce Martins. A "Terceira Via" sobrevive até ao golpe de Moscovo. Para a história, os dois grupos ficaram conhecidos como os desvios social-democratizantes do PCP. Poucos meses depois do golpe, já em 1992, surge a Plataforma de Esquerda, que vem reunir uma série de ex-militantes comunistas, como Barros Moura, Judas, Pina Moura, Miguel Portas, Osvaldo Castro, Raimundo Narciso. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Os quatro dias que mudaram a Rússia

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