EXPRESSO: País

26-05-2001
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Ataque à bioética

Casa da Imagem

EM PORTUGAL não há qualquer legislação que regule a reprodução medicamente assistida, existindo, por isso,, que podem estar simplesmente a ser destruídos, disse ao EXPRESSO o deputado do PSD Nuno Freitas, membro da Comissão Parlamentar de Saúde. Esta é uma das muitas situações que levaram os sociais-democratas a decidir propor a criação de uma Comissão de Bioética e Ciência, dependente da Assembleia da República, paraa investigação científica e a actividade clínica nesta área.

«É necessário criar uma agenda política da Bioética. Os avanços da investigação científica são brutais, constituindo uma verdadeira revolução invisível que está a passar ao nosso lado», defende Nuno Freitas, lembrando: «Nos outros países esta discussão já se faz há muito tempo».

Dos «velhos» para os «novos temas»

Aquele deputado considera que a agenda política continua atada aos temas das «listas de espera e da crise na Saúde - que é importante -, mas tem de acordar para uma outra, que tem a ver com a clonagem, a experimentação e manipulação genética, a procriação medicamente assistida, a dignidade do embrião»

Há cerca de dois anos, a Assembleia da República discutiu e aprovou uma proposta de Lei, que teve também o voto favorável do Conselho de Ministros, sobre reprodução medicamente assistida e bioética. Nesta proposta, estavam definidas as regras e os limites de todas as matérias que o PSD quer discutir agora. Mas um veto presidencial pôs fim ao consenso político conseguido então.

Jorge Sampaio justificou a devolução do diploma ao Parlamento com o argumento de que a comunidade científica não concordava com alguns dos limites impostos.

Desde então, estas matérias nunca mais voltaram a ser discutidas, a não ser pela Comissão Nacional de Ética para as Ciências da Vida, que, apesar disso, tem sido acusada de «não promover, como seria desejável, um debate público e suficientemente alargado» sobre o tema, como disse ao EXPRESSO Alexandre Quintanilha, cientista e um dos responsáveis do Instituto Abel Salazar, do Porto.

Regras, precisam-se!

De facto, é a própria comunidade científica e médica que reclama a urgente definição de regras. «Sem lei, tudo é possível porque nada está fora dela. É melhor ter uma legislação que não seja perfeita, do que não ter nenhuma», disse ao EXPRESSO Agostinho Almeida Santos, director do Departamento de Medicina Materno-Fetal da Faculdade de Medicina de Coimbra.

Também Alexandre Quintanilha reconhece que «a falta de legislação afaste cada vez mais da realidade aquilo que os políticos pensam discutir».

Mas o paradoxo da situação em Portugal vai ao ponto de existirem já portarias governamentais a definir preços para técnicas científicas sem sequer existir qualquer legislação que imponha limites éticos e que regulamente essas mesmas práticas científicas.

No passado dia 9 de Março, foi publicado em «Diário da República» a extensa tabela do Ministério da Saúde com o preço dos exames, técnicas e actos praticados pelos profissionais de Saúde, sendo uma das tabelas relativas à medicina da reprodução. Lá, pode ficar a saber-se o preço de uma inseminação artificial intra-uterina por dador, de uma congelação e de uma colheita de tecido testicular para micro-injecção - sendo que qualquer destas práticas seria proibida se a lei votada no Parlamento estivesse em vigor.

Outro exemplo: ainda que não haja qualquer regulamentação, existem cinco centros públicos de reprodução medicamente assistida e, pelo menos, dez clínicas privadas a operarem nesta área. Aliás, a actividade privada tem estado a crescer à custa da cada vez maior paralisação dos centros públicos, por falta de meios e de gente. As listas de espera nos serviços públicos ultrapassam os 18 meses.

Ao contrário, o licenciamento dos centros para inseminação artificial dos bovinos e toda a prática clínica nesta área da veterinária está regulamentada e a ser aplicada, conforme a legislação publicada em «Diário da República» em 1999.

O problema é tanto maior quanto se sabe que «a Ciência está a avançar depressa demais para a experimentação humana», considera Nuno Freitas. E acrescenta: «Ninguém sabe se em Portugal já há ou não ensaios com terapia génica ou com células embrionárias».

PSD avança no Parlamento

O desconhecimento da realidade leva o PSD a propor, por isso, que uma futura comissão de Bioética (não exclusivamente composta por deputados e aberta, portanto, a especialistas), tenha poderes de «fiscalização e regulamentação dos ensaios clínicos».

Além disso, o PSD tem já formulados três projectos de lei, na área da Bioética: um de Defesa e Salvaguarda da Informação Genética e Pessoal (que vai ser discutido no Parlamento no dia 7 de Junho), outro que altera a Lei de Colheita e Transplante de Órgãos e Tecidos de Origem Humana e outro sobre a Procriação Medicamente Assistida.

Quanto à informação genética, proíbe-se a descriminação de uma pessoa em virtude do seu património genético, bem como a utilização da informação genética pessoal para fins não médicos.

Na lei dos transplantes, pretende-se que os cônjuges passem a poder doar órgãos entre si e que o mesmo seja permitido entre pessoas sem relação de parentesco, mas com prévia autorização de uma entidade com competência para analisar e decidir sobre o caso. Além disso, deverá ser incluída uma norma que regule os transplantes de tecidos com origem em embriões.

Finalmente, o projecto da reprodução medicamente assistida, visa regular precisamente a fertilização «in vitro» e o destino dos embriões assim criados. E, sobretudo, regular o polémico aspecto da dignidade humana do embrião.

Ataque à bioética

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EM PORTUGAL não há qualquer legislação que regule a reprodução medicamente assistida, existindo, por isso,, que podem estar simplesmente a ser destruídos, disse ao EXPRESSO o deputado do PSD Nuno Freitas, membro da Comissão Parlamentar de Saúde. Esta é uma das muitas situações que levaram os sociais-democratas a decidir propor a criação de uma Comissão de Bioética e Ciência, dependente da Assembleia da República, paraa investigação científica e a actividade clínica nesta área.

«É necessário criar uma agenda política da Bioética. Os avanços da investigação científica são brutais, constituindo uma verdadeira revolução invisível que está a passar ao nosso lado», defende Nuno Freitas, lembrando: «Nos outros países esta discussão já se faz há muito tempo».

Dos «velhos» para os «novos temas»

Aquele deputado considera que a agenda política continua atada aos temas das «listas de espera e da crise na Saúde - que é importante -, mas tem de acordar para uma outra, que tem a ver com a clonagem, a experimentação e manipulação genética, a procriação medicamente assistida, a dignidade do embrião»

Há cerca de dois anos, a Assembleia da República discutiu e aprovou uma proposta de Lei, que teve também o voto favorável do Conselho de Ministros, sobre reprodução medicamente assistida e bioética. Nesta proposta, estavam definidas as regras e os limites de todas as matérias que o PSD quer discutir agora. Mas um veto presidencial pôs fim ao consenso político conseguido então.

Jorge Sampaio justificou a devolução do diploma ao Parlamento com o argumento de que a comunidade científica não concordava com alguns dos limites impostos.

Desde então, estas matérias nunca mais voltaram a ser discutidas, a não ser pela Comissão Nacional de Ética para as Ciências da Vida, que, apesar disso, tem sido acusada de «não promover, como seria desejável, um debate público e suficientemente alargado» sobre o tema, como disse ao EXPRESSO Alexandre Quintanilha, cientista e um dos responsáveis do Instituto Abel Salazar, do Porto.

Regras, precisam-se!

De facto, é a própria comunidade científica e médica que reclama a urgente definição de regras. «Sem lei, tudo é possível porque nada está fora dela. É melhor ter uma legislação que não seja perfeita, do que não ter nenhuma», disse ao EXPRESSO Agostinho Almeida Santos, director do Departamento de Medicina Materno-Fetal da Faculdade de Medicina de Coimbra.

Também Alexandre Quintanilha reconhece que «a falta de legislação afaste cada vez mais da realidade aquilo que os políticos pensam discutir».

Mas o paradoxo da situação em Portugal vai ao ponto de existirem já portarias governamentais a definir preços para técnicas científicas sem sequer existir qualquer legislação que imponha limites éticos e que regulamente essas mesmas práticas científicas.

No passado dia 9 de Março, foi publicado em «Diário da República» a extensa tabela do Ministério da Saúde com o preço dos exames, técnicas e actos praticados pelos profissionais de Saúde, sendo uma das tabelas relativas à medicina da reprodução. Lá, pode ficar a saber-se o preço de uma inseminação artificial intra-uterina por dador, de uma congelação e de uma colheita de tecido testicular para micro-injecção - sendo que qualquer destas práticas seria proibida se a lei votada no Parlamento estivesse em vigor.

Outro exemplo: ainda que não haja qualquer regulamentação, existem cinco centros públicos de reprodução medicamente assistida e, pelo menos, dez clínicas privadas a operarem nesta área. Aliás, a actividade privada tem estado a crescer à custa da cada vez maior paralisação dos centros públicos, por falta de meios e de gente. As listas de espera nos serviços públicos ultrapassam os 18 meses.

Ao contrário, o licenciamento dos centros para inseminação artificial dos bovinos e toda a prática clínica nesta área da veterinária está regulamentada e a ser aplicada, conforme a legislação publicada em «Diário da República» em 1999.

O problema é tanto maior quanto se sabe que «a Ciência está a avançar depressa demais para a experimentação humana», considera Nuno Freitas. E acrescenta: «Ninguém sabe se em Portugal já há ou não ensaios com terapia génica ou com células embrionárias».

PSD avança no Parlamento

O desconhecimento da realidade leva o PSD a propor, por isso, que uma futura comissão de Bioética (não exclusivamente composta por deputados e aberta, portanto, a especialistas), tenha poderes de «fiscalização e regulamentação dos ensaios clínicos».

Além disso, o PSD tem já formulados três projectos de lei, na área da Bioética: um de Defesa e Salvaguarda da Informação Genética e Pessoal (que vai ser discutido no Parlamento no dia 7 de Junho), outro que altera a Lei de Colheita e Transplante de Órgãos e Tecidos de Origem Humana e outro sobre a Procriação Medicamente Assistida.

Quanto à informação genética, proíbe-se a descriminação de uma pessoa em virtude do seu património genético, bem como a utilização da informação genética pessoal para fins não médicos.

Na lei dos transplantes, pretende-se que os cônjuges passem a poder doar órgãos entre si e que o mesmo seja permitido entre pessoas sem relação de parentesco, mas com prévia autorização de uma entidade com competência para analisar e decidir sobre o caso. Além disso, deverá ser incluída uma norma que regule os transplantes de tecidos com origem em embriões.

Finalmente, o projecto da reprodução medicamente assistida, visa regular precisamente a fertilização «in vitro» e o destino dos embriões assim criados. E, sobretudo, regular o polémico aspecto da dignidade humana do embrião.

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