EXPRESSO: País

19-02-2002
marcar artigo

21/4/2001

Bases querem remodelação Ana Baião Jorge Coelho com Miguel Coelho, no encontro do PS-Lisboa, terça-feira à noite: «Pior do que decidir mal é não decidir nada» A URGÊNCIA de uma remodelação governamental que liberte o PS do elevado custo político de manter em funções ministros tão debilitados quanto Manuela Arcanjo ou Pina Moura foi esta semana equacionada pelas bases socialistas de Lisboa, num encontro com Jorge Coelho. A questão foi colada em termos veementes pelo líder do PS-Lisboa, Miguel Coelho, que dirigiu a reunião, assim que os jornalistas saíram da sala. Sob o mote «com eles, já não vamos lá», insistentemente repetido, o presidente da concelhia de Lisboa apelou aos visados para que tomem a iniciativa, eles próprios, de se demitirem, poupando o chefe do Governo e a direcção do partido ao desconforto de ter de correr com eles. A URGÊNCIA de uma remodelação governamental que liberte o PS do elevado custo político de manter em funções ministros tão debilitados quanto Manuela Arcanjo ou Pina Moura foi esta semana equacionada pelas bases socialistas de Lisboa, num encontro com Jorge Coelho. A questão foi colada em termos veementes pelo líder do PS-Lisboa, Miguel Coelho, que dirigiu a reunião, assim que os jornalistas saíram da sala. Sob o mote, insistentemente repetido, o presidente da concelhia de Lisboa apelou aos visados para que tomem a iniciativa, eles próprios, de se demitirem, poupando o chefe do Governo e a direcção do partido ao desconforto de ter de correr com eles. Embora não tenha chegado a citar nomes - por presumir que «todos sabem perfeitamente» a quem se está a referir, como fez questão de sublinhar -, Miguel Coelho fez crer estar a interpretar o sentimento das bases, que já não acreditam na recuperação da imagem de certos membros do Executivo. Nos «passos perdidos» do hotel onde correu o encontro, a descodificação da mensagem apontava não apenas para os ministros da Saúde e das Finanças, mas para outros mais como Augusto Santos Silva (Educação), Júlio Castro Caldas (Defesa) e José Sasportes (Cultura). Contra o Governo Aparentemente concordante, Jorge Coelho - que acabara de elogiar Manuel Maria Carrilho como «o melhor ministro da Cultura desde o 25 de Abril» - optou por não lançar mais achas para a fogueira da remodelação. Mas fez tantas críticas (a Guterres inclusive, lembrando nomeadamente que o PS o mandatou para fazer o que não faz: decidir) que a conclusão de que o partido está a ser mobilizado contra o Governo se afigura evidente. Atraídos pela presença de Jorge Coelho, que agora regressa ao controlo do aparelho como uma espécie de «secretário-geral sombra», participaram na reunião cerca de 300 militantes. Muitos eram presidentes de empresa, quadros superiores, «boys». E havia intelectuais, deputados, secretários de Estado, dirigentes de núcleos partidários de base. Uma boa parte deles terá seguramente lugar no Congresso, como delegados eleitos, o que poderá vir a desencadear tempestades perigosas para a segurança interna de Guterres. Culpados na TAP Uma das críticas mais contundentes à governação socialista foi feita pelo único militante do núcleo socialista da TAP presente, que acusou o Governo PS de ser o único e grande responsável pela crise em que a empresa se encontra mergulhada. O trabalhador da transportadora aérea não hesitou mesmo em lembrar que o Governo de Cavaco Silva deixou a situação controlada, após uma injecção de capital da ordem dos 180 milhões de contos, que permitiram saneá-la financeiramente e reduzir de onze para sete mil o número de efectivos. «Hoje - sublinhou - há já 10 mil trabalhadores outra vez e a situação está como toda a gente sabe, cabendo perguntar de quem é a culpa?». A resposta afigurava-se óbvia. E Coelho, ao não pegar na deixa, deixou a assembleia a pensar em João Cravinho, que o antecedeu no Ministério do Equipamento. A chamada de atenção fica como mais uma dor de cabeça para Ferro Rodrigues, o mais popular ministro de Guterres. Sem referir nenhum caso concreto, Coelho diria, porém, noutro dos momentos altos da reunião, que «pior do que decidir mal é não decidir nada», num disparo que tem como alvo primeiro e incontornável o próprio primeiro-ministro. Frontal e descontraído, como é seu hábito, o ex-ministro falou ainda de descentralização e dos «boys». Para lamentar que se tenha abandonado a reforma que deveria compensar a derrotada regionalização - «Nunca mais ninguém falou da descentralização... Nem nós...» -; e criticar gestores nomeados pelo PS de «poupar adversários políticos, na esperança de beneficiar disso se houver mudança» de Governo. «Não estou a defender um Estado clientelar, mas a lembrar que muitos desses homens fazem sabotagem às nossas decisões», explicou Coelho, ao jeito de quem faz pedagogia. A lição de Paris A necessidade de o partido se envolver num apoio militante a João Soares, no confronto com Pedro Santana Lopes, ocupou naturalmente parte da reunião. Ou não fosse ela do PS-Lisboa. Com Jorge Coelho a lembrar a lição de Paris. «Apesar de a direita francesa ter ganho a maior parte das cidades, o que passou como relevante para a opinião pública foi o facto de o PSF ter ganho a Câmara de Paris», lembrou, sublinhando a importância psicológica de uma vitória sobre o candidato à sucessão de Durão Barroso na liderança do PSD. Outra autarquia em evidência foi Setúbal, círculo eleitoral pelo qual Jorge Coelho foi cabeça-de-lista nas legislativas. A ideia de que o PS irá perder a Câmara para o comunista Carlos Sousa (actual presidente de Palmela), em resultado dos erros cometidos por Mata Cáceres no processo da co-incineração, foi dada como adquirida. Em clima de fim de festa, os socialistas caminham assim para um congresso que tanto pode limitar-se a cumprir calendário como a revelar-se surpreendente. A ver vamos.

ORLANDO RAIMUNDO

Assis de saída O DESTINO de Francisco Assis está traçado: o líder parlamentar socialista já não o será na próxima sessão legislativa, podendo mesmo vir a sair logo a seguir ao congresso - conforme o EXPRESSO noticiou há meses e ele desmentiu -, cedendo às crescentes pressões de deputados da sua própria bancada para que deixe o cargo. O socialista nortenho vai assim regressar ao seu ambiente de origem, candidatando-se a uma autarquia no distrito do Porto (Valongo é a hipótese mais provável, dum rol que compreende também Maia e Gondomar). E saia ou não vencedor do desafio - para o qual, de resto, se disponibilizou há já algum tempo -, é praticamente certo que a bancada socialista conhecerá novo presidente a partir pelo menos de Setembro. Assis nunca foi um líder pacífico, numa bancada difícil, que por diversas vezes o desautorizou. A sua substituição tem sido, por isso mesmo, um cenário mais ou menos recorrente, ganhando nova actualidade nas duas últimas semanas, a pretexto duma alegada «falta de autoridade». A divisão dos socialistas sobre temas como a paridade, a Lei de Bases da família ou a Lei da Liberdade Religiosa tornava a crítica justa. Por ironia do destino, a inevitabilidade da sua substituição - não se sabe ainda por quem, sendo certo que Jorge Coelho recusa liminarmente o lugar - ganha peso numa altura em que «isto está finalmente a ficar tudo coordenado», como diz ao EXPRESSO fonte da Comissão Permanente do PS, admitindo falhas no funcionamento recente do triângulo Governo/partido/grupo parlamentar. Na reunião desta terça-feira com as bases de Lisboa, Jorge Coelho fez-lhe uma crítica violenta, ao lamentar perante 300 militantes que o PS ande a reboque do PP, a propósito da Lei de Bases da Família. «Como é que se compreende que um partido que teve 44% dos votos e 115 deputados se deixe enredar por um partido que tem 15 deputados e apresenta propostas que dividem os socialistas, em vez apresentar o seu próprio projecto de lei?» - interrogou-se Jorge Coelho, pondo indignação na voz. A direcção do grupo parlamentar e a Comissão Permanente do PS vão reunir-se, logo depois do congresso, para «afinar estratégias».

C.F. e O.R.

ARTIGOS RELACIONADOS Estratégia arriscada

Bases querem remodelação

COMENTÁRIOS AO ARTIGO (1)

ANTERIOR TOPO

21/4/2001

Bases querem remodelação Ana Baião Jorge Coelho com Miguel Coelho, no encontro do PS-Lisboa, terça-feira à noite: «Pior do que decidir mal é não decidir nada» A URGÊNCIA de uma remodelação governamental que liberte o PS do elevado custo político de manter em funções ministros tão debilitados quanto Manuela Arcanjo ou Pina Moura foi esta semana equacionada pelas bases socialistas de Lisboa, num encontro com Jorge Coelho. A questão foi colada em termos veementes pelo líder do PS-Lisboa, Miguel Coelho, que dirigiu a reunião, assim que os jornalistas saíram da sala. Sob o mote «com eles, já não vamos lá», insistentemente repetido, o presidente da concelhia de Lisboa apelou aos visados para que tomem a iniciativa, eles próprios, de se demitirem, poupando o chefe do Governo e a direcção do partido ao desconforto de ter de correr com eles. A URGÊNCIA de uma remodelação governamental que liberte o PS do elevado custo político de manter em funções ministros tão debilitados quanto Manuela Arcanjo ou Pina Moura foi esta semana equacionada pelas bases socialistas de Lisboa, num encontro com Jorge Coelho. A questão foi colada em termos veementes pelo líder do PS-Lisboa, Miguel Coelho, que dirigiu a reunião, assim que os jornalistas saíram da sala. Sob o mote, insistentemente repetido, o presidente da concelhia de Lisboa apelou aos visados para que tomem a iniciativa, eles próprios, de se demitirem, poupando o chefe do Governo e a direcção do partido ao desconforto de ter de correr com eles. Embora não tenha chegado a citar nomes - por presumir que «todos sabem perfeitamente» a quem se está a referir, como fez questão de sublinhar -, Miguel Coelho fez crer estar a interpretar o sentimento das bases, que já não acreditam na recuperação da imagem de certos membros do Executivo. Nos «passos perdidos» do hotel onde correu o encontro, a descodificação da mensagem apontava não apenas para os ministros da Saúde e das Finanças, mas para outros mais como Augusto Santos Silva (Educação), Júlio Castro Caldas (Defesa) e José Sasportes (Cultura). Contra o Governo Aparentemente concordante, Jorge Coelho - que acabara de elogiar Manuel Maria Carrilho como «o melhor ministro da Cultura desde o 25 de Abril» - optou por não lançar mais achas para a fogueira da remodelação. Mas fez tantas críticas (a Guterres inclusive, lembrando nomeadamente que o PS o mandatou para fazer o que não faz: decidir) que a conclusão de que o partido está a ser mobilizado contra o Governo se afigura evidente. Atraídos pela presença de Jorge Coelho, que agora regressa ao controlo do aparelho como uma espécie de «secretário-geral sombra», participaram na reunião cerca de 300 militantes. Muitos eram presidentes de empresa, quadros superiores, «boys». E havia intelectuais, deputados, secretários de Estado, dirigentes de núcleos partidários de base. Uma boa parte deles terá seguramente lugar no Congresso, como delegados eleitos, o que poderá vir a desencadear tempestades perigosas para a segurança interna de Guterres. Culpados na TAP Uma das críticas mais contundentes à governação socialista foi feita pelo único militante do núcleo socialista da TAP presente, que acusou o Governo PS de ser o único e grande responsável pela crise em que a empresa se encontra mergulhada. O trabalhador da transportadora aérea não hesitou mesmo em lembrar que o Governo de Cavaco Silva deixou a situação controlada, após uma injecção de capital da ordem dos 180 milhões de contos, que permitiram saneá-la financeiramente e reduzir de onze para sete mil o número de efectivos. «Hoje - sublinhou - há já 10 mil trabalhadores outra vez e a situação está como toda a gente sabe, cabendo perguntar de quem é a culpa?». A resposta afigurava-se óbvia. E Coelho, ao não pegar na deixa, deixou a assembleia a pensar em João Cravinho, que o antecedeu no Ministério do Equipamento. A chamada de atenção fica como mais uma dor de cabeça para Ferro Rodrigues, o mais popular ministro de Guterres. Sem referir nenhum caso concreto, Coelho diria, porém, noutro dos momentos altos da reunião, que «pior do que decidir mal é não decidir nada», num disparo que tem como alvo primeiro e incontornável o próprio primeiro-ministro. Frontal e descontraído, como é seu hábito, o ex-ministro falou ainda de descentralização e dos «boys». Para lamentar que se tenha abandonado a reforma que deveria compensar a derrotada regionalização - «Nunca mais ninguém falou da descentralização... Nem nós...» -; e criticar gestores nomeados pelo PS de «poupar adversários políticos, na esperança de beneficiar disso se houver mudança» de Governo. «Não estou a defender um Estado clientelar, mas a lembrar que muitos desses homens fazem sabotagem às nossas decisões», explicou Coelho, ao jeito de quem faz pedagogia. A lição de Paris A necessidade de o partido se envolver num apoio militante a João Soares, no confronto com Pedro Santana Lopes, ocupou naturalmente parte da reunião. Ou não fosse ela do PS-Lisboa. Com Jorge Coelho a lembrar a lição de Paris. «Apesar de a direita francesa ter ganho a maior parte das cidades, o que passou como relevante para a opinião pública foi o facto de o PSF ter ganho a Câmara de Paris», lembrou, sublinhando a importância psicológica de uma vitória sobre o candidato à sucessão de Durão Barroso na liderança do PSD. Outra autarquia em evidência foi Setúbal, círculo eleitoral pelo qual Jorge Coelho foi cabeça-de-lista nas legislativas. A ideia de que o PS irá perder a Câmara para o comunista Carlos Sousa (actual presidente de Palmela), em resultado dos erros cometidos por Mata Cáceres no processo da co-incineração, foi dada como adquirida. Em clima de fim de festa, os socialistas caminham assim para um congresso que tanto pode limitar-se a cumprir calendário como a revelar-se surpreendente. A ver vamos.

ORLANDO RAIMUNDO

Assis de saída O DESTINO de Francisco Assis está traçado: o líder parlamentar socialista já não o será na próxima sessão legislativa, podendo mesmo vir a sair logo a seguir ao congresso - conforme o EXPRESSO noticiou há meses e ele desmentiu -, cedendo às crescentes pressões de deputados da sua própria bancada para que deixe o cargo. O socialista nortenho vai assim regressar ao seu ambiente de origem, candidatando-se a uma autarquia no distrito do Porto (Valongo é a hipótese mais provável, dum rol que compreende também Maia e Gondomar). E saia ou não vencedor do desafio - para o qual, de resto, se disponibilizou há já algum tempo -, é praticamente certo que a bancada socialista conhecerá novo presidente a partir pelo menos de Setembro. Assis nunca foi um líder pacífico, numa bancada difícil, que por diversas vezes o desautorizou. A sua substituição tem sido, por isso mesmo, um cenário mais ou menos recorrente, ganhando nova actualidade nas duas últimas semanas, a pretexto duma alegada «falta de autoridade». A divisão dos socialistas sobre temas como a paridade, a Lei de Bases da família ou a Lei da Liberdade Religiosa tornava a crítica justa. Por ironia do destino, a inevitabilidade da sua substituição - não se sabe ainda por quem, sendo certo que Jorge Coelho recusa liminarmente o lugar - ganha peso numa altura em que «isto está finalmente a ficar tudo coordenado», como diz ao EXPRESSO fonte da Comissão Permanente do PS, admitindo falhas no funcionamento recente do triângulo Governo/partido/grupo parlamentar. Na reunião desta terça-feira com as bases de Lisboa, Jorge Coelho fez-lhe uma crítica violenta, ao lamentar perante 300 militantes que o PS ande a reboque do PP, a propósito da Lei de Bases da Família. «Como é que se compreende que um partido que teve 44% dos votos e 115 deputados se deixe enredar por um partido que tem 15 deputados e apresenta propostas que dividem os socialistas, em vez apresentar o seu próprio projecto de lei?» - interrogou-se Jorge Coelho, pondo indignação na voz. A direcção do grupo parlamentar e a Comissão Permanente do PS vão reunir-se, logo depois do congresso, para «afinar estratégias».

C.F. e O.R.

ARTIGOS RELACIONADOS Estratégia arriscada

Bases querem remodelação

COMENTÁRIOS AO ARTIGO (1)

ANTERIOR TOPO

marcar artigo