Poder paternal a dois passa a ser a regra

10-04-2000
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Maria do Rosário Carneiro: autora do projecto aprovado

No entanto, e segundo foi acentuado no debate parlamentar de anteontem, a eficácia desta nova lógica de relação dos pais separados com os filhos dependerá mais de mudanças sociológicas do que de imperativos legais.

Menos «órfãos» de pais vivos

Trata-se, primeiro do que tudo, de uma questão de comportamento e responsabilidade social e familiar e a nova lei é entendida como barreira de defesa dos filhos, nas idades mais determinantes para o seu crescimento e formação humana.

Anteontem discutido, o projecto foi logo votado e aprovado por unanimidade, tendo subjacente a intenção, como acentuou a deputada comunista Odete Santos, de contribuir para que haja cada vez menos «órfãos de pais vivos», por efeitos do divórcio, na sociedade portuguesa. De acordo com as estatísticas oficiais, em 90% das separações, em Portugal, o juiz concede o poder paternal à mãe, sendo excepcional a atribuição dessa responsabilidade ao pai e, ainda mais, aos dois.

Isto não obstante uma lei de Agosto de 95 já ter admitido a partilha do poder paternal, em vez de o confiar só ao pai ou à mãe. Nos termos dessa lei, que alterou o art. 1906º do Código Civil, passou a ser possível aos pais separados decidirem por acordo sobre questões essenciais à vida dos filhos. A regra continuou a ser, porém, a de concentrar o poder paternal, num sistema de guarda única.

A última revisão constitucional deu o passo seguinte, para a solução anteontem discutida na Assembleia da República, ao determinar que «os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais, para com eles, e sempre mediante decisão judicial».

Aprovado agora na generalidade, o texto baixou à comissão de especialidade, para os aperfeiçoamentos admitidos pelos seus autores e que outros deputados sugeriram no debate.

Nomeadamente, segundo a deputada independente integrada na bancada do PS Maria do Rosário Carneiro, cumpre atender à situação de famílias com um historial de violência e abuso físico ou psíquico, nas relações entre pais e filhos ou só entre pais. E o texto original não contemplava esta questão.

No entender do PSD - disse-o o deputado Antonino Antunes -, o novo diploma é de alcance reduzido, uma vez que se limita «a alterar a redacção de um projecto de lei de 1995 sobre a mesma matéria».

Seria, assim, uma «simples operação de cosmética», organizada pela bancada socialista.

A recomendação do Conselho da Europa

Para a autora do projecto, Maria do Rosário Carneiro, não é bem assim, pois o que era excepção, até aqui, pela nova lei passa a valer como regra na atribuição do poder paternal.

Com a redução deste projecto a letra de lei, fica igualmente cumprida uma recomendação do Conselho da Europa que aguardava acolhimento no direito interno português. Essa recomendação foi aprovada em Fevereiro de 1984 e consubstancia os princípios inscritos na Convenção dos Direitos da Criança.

Segundo o novo sistema, o processo de partilha de responsabilidades decorre no âmbito do tribunal de família, começando pela tentativa de consenso prévio entre os pais.

Em caso de conflito evidente, embora a mediação caiba ao juiz, o papel conciliador pode também ser atribuído a familiares do casal.

Pensão de alimentos também partilhada

Persistindo o desacordo, o juiz decidirá pela tutela de um dos progenitores: mas fica igualmente obrigado por lei a estabelecer uma forma de os filhos passarem o mesmo tempo com o pai e com a mãe. Além da tutela, os pais partilham as despesas com os filhos, sendo a pensão de alimentos conjunta ou podendo, por isso, até deixar de existir.

«O divórcio apenas dissolve o casamento, mas não a relação de filiação e os seus efeitos», disse Nuno Baltasar Mendes ao plenário parlamentar, para justificar esta iniciativa da sua bancada. Acrescentou o deputado socialista que as crianças são frequentemente utilizadas por pais e mães, em processos de divórcio, «para servirem os seus interesses exclusivos, muitas vezes com o único objectivo de prolongarem os conflitos que marcaram a vida em comum».

A nova lei não tem efeitos rectroactivos e não abrange os processos de divórcio em curso. Nem contempla eventuais recursos sobre a custódia dos filhos, já decidida dos termos da legislação aplicável até agora.

DANIEL REIS

Maria do Rosário Carneiro: autora do projecto aprovado

No entanto, e segundo foi acentuado no debate parlamentar de anteontem, a eficácia desta nova lógica de relação dos pais separados com os filhos dependerá mais de mudanças sociológicas do que de imperativos legais.

Menos «órfãos» de pais vivos

Trata-se, primeiro do que tudo, de uma questão de comportamento e responsabilidade social e familiar e a nova lei é entendida como barreira de defesa dos filhos, nas idades mais determinantes para o seu crescimento e formação humana.

Anteontem discutido, o projecto foi logo votado e aprovado por unanimidade, tendo subjacente a intenção, como acentuou a deputada comunista Odete Santos, de contribuir para que haja cada vez menos «órfãos de pais vivos», por efeitos do divórcio, na sociedade portuguesa. De acordo com as estatísticas oficiais, em 90% das separações, em Portugal, o juiz concede o poder paternal à mãe, sendo excepcional a atribuição dessa responsabilidade ao pai e, ainda mais, aos dois.

Isto não obstante uma lei de Agosto de 95 já ter admitido a partilha do poder paternal, em vez de o confiar só ao pai ou à mãe. Nos termos dessa lei, que alterou o art. 1906º do Código Civil, passou a ser possível aos pais separados decidirem por acordo sobre questões essenciais à vida dos filhos. A regra continuou a ser, porém, a de concentrar o poder paternal, num sistema de guarda única.

A última revisão constitucional deu o passo seguinte, para a solução anteontem discutida na Assembleia da República, ao determinar que «os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais, para com eles, e sempre mediante decisão judicial».

Aprovado agora na generalidade, o texto baixou à comissão de especialidade, para os aperfeiçoamentos admitidos pelos seus autores e que outros deputados sugeriram no debate.

Nomeadamente, segundo a deputada independente integrada na bancada do PS Maria do Rosário Carneiro, cumpre atender à situação de famílias com um historial de violência e abuso físico ou psíquico, nas relações entre pais e filhos ou só entre pais. E o texto original não contemplava esta questão.

No entender do PSD - disse-o o deputado Antonino Antunes -, o novo diploma é de alcance reduzido, uma vez que se limita «a alterar a redacção de um projecto de lei de 1995 sobre a mesma matéria».

Seria, assim, uma «simples operação de cosmética», organizada pela bancada socialista.

A recomendação do Conselho da Europa

Para a autora do projecto, Maria do Rosário Carneiro, não é bem assim, pois o que era excepção, até aqui, pela nova lei passa a valer como regra na atribuição do poder paternal.

Com a redução deste projecto a letra de lei, fica igualmente cumprida uma recomendação do Conselho da Europa que aguardava acolhimento no direito interno português. Essa recomendação foi aprovada em Fevereiro de 1984 e consubstancia os princípios inscritos na Convenção dos Direitos da Criança.

Segundo o novo sistema, o processo de partilha de responsabilidades decorre no âmbito do tribunal de família, começando pela tentativa de consenso prévio entre os pais.

Em caso de conflito evidente, embora a mediação caiba ao juiz, o papel conciliador pode também ser atribuído a familiares do casal.

Pensão de alimentos também partilhada

Persistindo o desacordo, o juiz decidirá pela tutela de um dos progenitores: mas fica igualmente obrigado por lei a estabelecer uma forma de os filhos passarem o mesmo tempo com o pai e com a mãe. Além da tutela, os pais partilham as despesas com os filhos, sendo a pensão de alimentos conjunta ou podendo, por isso, até deixar de existir.

«O divórcio apenas dissolve o casamento, mas não a relação de filiação e os seus efeitos», disse Nuno Baltasar Mendes ao plenário parlamentar, para justificar esta iniciativa da sua bancada. Acrescentou o deputado socialista que as crianças são frequentemente utilizadas por pais e mães, em processos de divórcio, «para servirem os seus interesses exclusivos, muitas vezes com o único objectivo de prolongarem os conflitos que marcaram a vida em comum».

A nova lei não tem efeitos rectroactivos e não abrange os processos de divórcio em curso. Nem contempla eventuais recursos sobre a custódia dos filhos, já decidida dos termos da legislação aplicável até agora.

DANIEL REIS

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