EXPRESSO

23-04-2001
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«O desejo de agradar a todos exige muita capacidade de adaptação e grande poder de síntese. O nosso engenheiro tem essa capacidade e esse poder. Aliás, entre o frenético Blair, o patético Schroeder e o prudente Jospin, só um 'travesti' político 'do caraças' lograria atingir a presidência da Internacional Socialista. 'It's done'!»

O rajá, a cigarra e a arte de agradar

MAIS escandalosa ainda do que a arrogância pomposa do prepotente ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, é a vacuidade patética da inefável ministra da Igualdade, Maria de Belém Roseira. Incansável na sua ânsia de protagonismo mediático, o ministro Manuel Maria não dá tréguas à ambição pessoal de erguer um elefante branco no Palácio da Ajuda. Cansada do seu protagonismo político no Ministério da Saúde, a ministra Maria de Belém já não quer mais do que «um gabinete de ministra» - que «não é propriamente um Ministério» - desde que isso lhe permita permanecer no Governo sobraçando uma pasta sem conteúdo político real. Sobram ao ministro Manuel Maria os directores-gerais que faltam à ministra Maria de Belém - cerca de 20 para ele e nenhum para ela. O ministro Manuel Maria aposta no insustentável peso de um Ministério da Cultura centralizado, burocrático e tentacular. A ministra Maria de Belém aposta na insustentável leveza de um ministério que nem sequer existe. O ministro Manuel Maria comporta-se como um rajá sentado em cima de um enorme elefante branco. A ministra Maria de Belém comporta-se como uma cigarra sentada em cima de um modesto «strapontin», na coxia das reuniões do Conselho de Ministros. O irreprimível desejo do engenheiro Guterres de agradar aos amigos só lhe fica bem - e não se fica por aqui. António José Seguro, durante tanto tempo o seu cotovelo direito no PS e no Governo, afirmou publicamente que já estava cansado - e foi logo descansar para o Parlamento Europeu como eurodeputado. O doutor Luís Patrão, esforçado chefe de Gabinete do nosso primeiro-ministro, também deu inequívocos sinais de cansaço na função - e foi logo descansar para o Ministério da Administração Interna como secretário de Estado da propriamente dita. O sempiterno e incontornável autarca de Matosinhos, Narciso Miranda, ansiava há muito por um ano sabático - e foi imediatamente repousar o corpo e o espírito para esse idílico porto de abrigo que é o governo da Pátria, precisamente como secretário de Estado da Administração Portuária. E o pudor impede-me de imaginar mais casos em que a fadiga terá sido o critério decisivo para usar o Governo como estância termal. Tão generosos impulsos do engenheiro Guterres fazem-me irresistivelmente lembrar essa fabulosa personagem do último filme de Pedro Almodóvar (Tudo Sobre a Minha Mãe) que se chama Agrado: «Yo soy Agrado y siempre me gusta mucho agradar a los otros». A frase não será exactamente assim, mas é seguramente esta a ideia que Agrado nos transmite ao longo do filme. Agrado é um «travesti» natural de finíssima água. O engenheiro Guterres é um «travesti» político de primeira grandeza. O propósito de ambos é sempre o mesmo: agradar aos outros. No admirável filme de Almodóvar, Agrado quer e consegue agradar a todos os homens e mulheres que passam pela sua vida. Nesse outro filme que é a política virtual, o engenheiro Guterres também quer e consegue agradar a todos (pelo menos àqueles que «riscam» ou «pesam» alguma coisa): empresários, banqueiros, autarcas, intelectuais orgânicos, amigos políticos de primeira e de segunda, adversários políticos complacentes, partidários e adversários dos bombardeamentos da NATO na Jugoslávia, adeptos da social-democracia e adeptos da democracia cristã, membros da Maçonaria e membros da Opus Dei, aficionados da festa brava e amigos dos animais, sócios do Benfica, caciques do FC Porto, ministros do Sporting - e por aí adiante. O desejo de agradar a todos exige muita capacidade de adaptação e grande poder de síntese. O nosso engenheiro tem essa capacidade e esse poder. Aliás, entre o frenético Blair, o patético Schroeder e o prudente Jospin, só um «travesti» político «do caraças» lograria atingir a presidência da Internacional Socialista. «It's done»! Ao contrário da política, o cinema ainda consegue ser fonte de grande inspiração. À míngua de ideias e de directores-gerais, acho que a ministra Maria de Belém bem podia promover excursões às salas onde está a passar Tudo Sobre a Minha Mãe, em louvor da liberdade e da dignidade da condição feminina. Ao ministro Manuel Maria não aconselho filme algum, mas confesso que me divertiria imenso se toda a tropa fandanga do fabuloso Gato preto, Gato branco, de Emir Kusturica, invadisse o Palácio da Ajuda, virasse tudo de pernas para o ar e pusesse «em fanicos» o elefante branco em que o rajá está sentado!

«O desejo de agradar a todos exige muita capacidade de adaptação e grande poder de síntese. O nosso engenheiro tem essa capacidade e esse poder. Aliás, entre o frenético Blair, o patético Schroeder e o prudente Jospin, só um 'travesti' político 'do caraças' lograria atingir a presidência da Internacional Socialista. 'It's done'!»

O rajá, a cigarra e a arte de agradar

MAIS escandalosa ainda do que a arrogância pomposa do prepotente ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, é a vacuidade patética da inefável ministra da Igualdade, Maria de Belém Roseira. Incansável na sua ânsia de protagonismo mediático, o ministro Manuel Maria não dá tréguas à ambição pessoal de erguer um elefante branco no Palácio da Ajuda. Cansada do seu protagonismo político no Ministério da Saúde, a ministra Maria de Belém já não quer mais do que «um gabinete de ministra» - que «não é propriamente um Ministério» - desde que isso lhe permita permanecer no Governo sobraçando uma pasta sem conteúdo político real. Sobram ao ministro Manuel Maria os directores-gerais que faltam à ministra Maria de Belém - cerca de 20 para ele e nenhum para ela. O ministro Manuel Maria aposta no insustentável peso de um Ministério da Cultura centralizado, burocrático e tentacular. A ministra Maria de Belém aposta na insustentável leveza de um ministério que nem sequer existe. O ministro Manuel Maria comporta-se como um rajá sentado em cima de um enorme elefante branco. A ministra Maria de Belém comporta-se como uma cigarra sentada em cima de um modesto «strapontin», na coxia das reuniões do Conselho de Ministros. O irreprimível desejo do engenheiro Guterres de agradar aos amigos só lhe fica bem - e não se fica por aqui. António José Seguro, durante tanto tempo o seu cotovelo direito no PS e no Governo, afirmou publicamente que já estava cansado - e foi logo descansar para o Parlamento Europeu como eurodeputado. O doutor Luís Patrão, esforçado chefe de Gabinete do nosso primeiro-ministro, também deu inequívocos sinais de cansaço na função - e foi logo descansar para o Ministério da Administração Interna como secretário de Estado da propriamente dita. O sempiterno e incontornável autarca de Matosinhos, Narciso Miranda, ansiava há muito por um ano sabático - e foi imediatamente repousar o corpo e o espírito para esse idílico porto de abrigo que é o governo da Pátria, precisamente como secretário de Estado da Administração Portuária. E o pudor impede-me de imaginar mais casos em que a fadiga terá sido o critério decisivo para usar o Governo como estância termal. Tão generosos impulsos do engenheiro Guterres fazem-me irresistivelmente lembrar essa fabulosa personagem do último filme de Pedro Almodóvar (Tudo Sobre a Minha Mãe) que se chama Agrado: «Yo soy Agrado y siempre me gusta mucho agradar a los otros». A frase não será exactamente assim, mas é seguramente esta a ideia que Agrado nos transmite ao longo do filme. Agrado é um «travesti» natural de finíssima água. O engenheiro Guterres é um «travesti» político de primeira grandeza. O propósito de ambos é sempre o mesmo: agradar aos outros. No admirável filme de Almodóvar, Agrado quer e consegue agradar a todos os homens e mulheres que passam pela sua vida. Nesse outro filme que é a política virtual, o engenheiro Guterres também quer e consegue agradar a todos (pelo menos àqueles que «riscam» ou «pesam» alguma coisa): empresários, banqueiros, autarcas, intelectuais orgânicos, amigos políticos de primeira e de segunda, adversários políticos complacentes, partidários e adversários dos bombardeamentos da NATO na Jugoslávia, adeptos da social-democracia e adeptos da democracia cristã, membros da Maçonaria e membros da Opus Dei, aficionados da festa brava e amigos dos animais, sócios do Benfica, caciques do FC Porto, ministros do Sporting - e por aí adiante. O desejo de agradar a todos exige muita capacidade de adaptação e grande poder de síntese. O nosso engenheiro tem essa capacidade e esse poder. Aliás, entre o frenético Blair, o patético Schroeder e o prudente Jospin, só um «travesti» político «do caraças» lograria atingir a presidência da Internacional Socialista. «It's done»! Ao contrário da política, o cinema ainda consegue ser fonte de grande inspiração. À míngua de ideias e de directores-gerais, acho que a ministra Maria de Belém bem podia promover excursões às salas onde está a passar Tudo Sobre a Minha Mãe, em louvor da liberdade e da dignidade da condição feminina. Ao ministro Manuel Maria não aconselho filme algum, mas confesso que me divertiria imenso se toda a tropa fandanga do fabuloso Gato preto, Gato branco, de Emir Kusturica, invadisse o Palácio da Ajuda, virasse tudo de pernas para o ar e pusesse «em fanicos» o elefante branco em que o rajá está sentado!

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