Um debate surrealista

17-07-2001
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Um Debate Surrealista

Por EUNICE LOURENÇO

Sábado, 30 de Junho de 2001

Despedida de Pina Moura no Parlamento

Remodelação dominou debate sobre Orçamento Rectificativo. Oposição critica desrespeito ao Parlamento

Ainda ao debate sobre o Orçamento Rectificativo não tinha meia hora e já o deputado comunista Lino de Carvalho dizia que se realizava em "condições surrealistas". "Inaceitável", "reprovável" e "caricato" foram outros adjectivos usados ontem no Parlamento por toda a oposição, para classificar as circunstâncias da discussão de um orçamento rectificativo, defendido por um ministro das Finanças, que tinha a seu lado o sucessor, e feito para resolver as dívidas da Saúde, cuja ministra saiu do plenário, a meio do debate, para dizer que já não era ministra.

Quem lançou a remodelação no plenário foi Celeste Cardona, do CDS-PP. Pina Moura tinha usado apenas nove minutos para apresentar a proposta do Governo e tinha respondido a um pedido de esclarecimento da social-democrata Manuela Ferreira Leite. O debate até parecia que se ia ficar de facto pela sua real razão de ser. Mas logo Cardona tratou de atear a discussão; "O que se está a passar neste momento, neste Parlamento, que é a sede da soberania, para mim é nada mais nada menos do que um pequeno teatro. (...) Estamos todos aqui a fazer uma brincadeira de mau gosto."

Pina Moura ignorou. Tal como ignoraria ao longo das cerca de quatro horas que decorreu o debate todas a referências às sua saída. A seu lado, Guilherme d'Oliveira Martins, o ainda ministro da Presidência, mas já indigitado para o substituir, fazia a defesa do Governo.

Face à situação, a oposição acabaria mesmo por elogiar Pina Moura, que acabou por sair como um herói do plenário. "Joaquim Pina Moura é um homem de grande coragem política e de grande capacidade de encaixe", elogiou Maria Celeste Cardona, As críticas iam directas para o primeiro-ministro, ausente. "No mínimo pedia-se ao primeiro-ministro que salvaguardasse as aparências", afirmou Lino de Carvalho.

O PSD, partido que viabilizou o rectificativo, andou afastado deste debate durante a sua primeira metade, optando por tratar do orçamento propriamente dito. Ferreira Leite e Pina Moura lá iam discutindo as opções de política económica, enquanto toda a gente pensava e falava de remodelação. Perante tantas críticas da oposição, Guilherme d'Oliveira Martins fez o que o líder da bancada comunista, Octávio Teixeira, chamou de "epitáfio" a Pina Moura: um elogio ao trabalho da equipa das Finanças e a garantia de que o Executivo "assume solidariamente" as medidas aprovadas.

O ministro da Presidência chegou mesmo a desmentir que o primeiro-ministro tivesse tratado da remodelação de manhã, depois de o presidente do grupo parlamentar do PSD, António Capucho, o ter confrontado com as imagens televisivas de Guterres a sair de Belém. "É público e notório que o sr. primeiro-ministro dedicou esta manhã à remodelação do Governo", disse Capucho, acrescentando: "Mesmo que não estivesse aqui, devia ter esperado pelo término deste debate."

Os socialistas argumentaram que nunca o primeiro-ministro vai aos debates dos orçamentos rectificativos e explicaram que Guterres estava ocupado com a reunião da Internacional Socialista. "Está a cuidar do seu futuro político e a descuidar o futuro de Portugal", respondia o centrista Basílio Horta, que se despediu de Pina Moura com um sentido abraço. No final do debate, o ex e o novo ministro das Finanças foram cumprimentados por vários deputados de todos os partidos. E como permaneciam lado a lado, até era prático: de um despediam-se, ao outro davam os parabéns.

Um Debate Surrealista

Por EUNICE LOURENÇO

Sábado, 30 de Junho de 2001

Despedida de Pina Moura no Parlamento

Remodelação dominou debate sobre Orçamento Rectificativo. Oposição critica desrespeito ao Parlamento

Ainda ao debate sobre o Orçamento Rectificativo não tinha meia hora e já o deputado comunista Lino de Carvalho dizia que se realizava em "condições surrealistas". "Inaceitável", "reprovável" e "caricato" foram outros adjectivos usados ontem no Parlamento por toda a oposição, para classificar as circunstâncias da discussão de um orçamento rectificativo, defendido por um ministro das Finanças, que tinha a seu lado o sucessor, e feito para resolver as dívidas da Saúde, cuja ministra saiu do plenário, a meio do debate, para dizer que já não era ministra.

Quem lançou a remodelação no plenário foi Celeste Cardona, do CDS-PP. Pina Moura tinha usado apenas nove minutos para apresentar a proposta do Governo e tinha respondido a um pedido de esclarecimento da social-democrata Manuela Ferreira Leite. O debate até parecia que se ia ficar de facto pela sua real razão de ser. Mas logo Cardona tratou de atear a discussão; "O que se está a passar neste momento, neste Parlamento, que é a sede da soberania, para mim é nada mais nada menos do que um pequeno teatro. (...) Estamos todos aqui a fazer uma brincadeira de mau gosto."

Pina Moura ignorou. Tal como ignoraria ao longo das cerca de quatro horas que decorreu o debate todas a referências às sua saída. A seu lado, Guilherme d'Oliveira Martins, o ainda ministro da Presidência, mas já indigitado para o substituir, fazia a defesa do Governo.

Face à situação, a oposição acabaria mesmo por elogiar Pina Moura, que acabou por sair como um herói do plenário. "Joaquim Pina Moura é um homem de grande coragem política e de grande capacidade de encaixe", elogiou Maria Celeste Cardona, As críticas iam directas para o primeiro-ministro, ausente. "No mínimo pedia-se ao primeiro-ministro que salvaguardasse as aparências", afirmou Lino de Carvalho.

O PSD, partido que viabilizou o rectificativo, andou afastado deste debate durante a sua primeira metade, optando por tratar do orçamento propriamente dito. Ferreira Leite e Pina Moura lá iam discutindo as opções de política económica, enquanto toda a gente pensava e falava de remodelação. Perante tantas críticas da oposição, Guilherme d'Oliveira Martins fez o que o líder da bancada comunista, Octávio Teixeira, chamou de "epitáfio" a Pina Moura: um elogio ao trabalho da equipa das Finanças e a garantia de que o Executivo "assume solidariamente" as medidas aprovadas.

O ministro da Presidência chegou mesmo a desmentir que o primeiro-ministro tivesse tratado da remodelação de manhã, depois de o presidente do grupo parlamentar do PSD, António Capucho, o ter confrontado com as imagens televisivas de Guterres a sair de Belém. "É público e notório que o sr. primeiro-ministro dedicou esta manhã à remodelação do Governo", disse Capucho, acrescentando: "Mesmo que não estivesse aqui, devia ter esperado pelo término deste debate."

Os socialistas argumentaram que nunca o primeiro-ministro vai aos debates dos orçamentos rectificativos e explicaram que Guterres estava ocupado com a reunião da Internacional Socialista. "Está a cuidar do seu futuro político e a descuidar o futuro de Portugal", respondia o centrista Basílio Horta, que se despediu de Pina Moura com um sentido abraço. No final do debate, o ex e o novo ministro das Finanças foram cumprimentados por vários deputados de todos os partidos. E como permaneciam lado a lado, até era prático: de um despediam-se, ao outro davam os parabéns.

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