"Talvez seja melhor caminhar para a despenalização total"

24-07-2001
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"Talvez Seja Melhor Caminhar para a Despenalização Total"

Terça-feira, 10 de Julho de 2001

Entrevista com Maria Antónia Almeida Santos

A presidente da Comissão de Dissuasão da Toxicodependência (CDT) de Lisboa, Maria Antónia Almeida Santos, diz que só lhe chegaram casos de consumidores ocasionais associados ao haxixe. Os processos foram suspensos porque a lei impõe a existência de casos anteriores registados. Durante bastante tempo, não serão aplicadas coimas aos casos de consumo esporádico. Afinal, a base de dados que faz os registos só foi inaugurada na semana passada.

Entrevista de Catarina Gomes

Maria Antónia Almeida Santos - Até hoje recebemos 10 processos. Recebemos os autos de ocorrência que a polícia nos envia. Há um período de 36 horas para o fazer, e depois [os consumidores] são notificados num prazo até 72 horas para se apresentarem na comissão.

E todas as pessoas aparecem depois de serem notificadas?

Nalguns casos não se apresentaram, mas temos um prazo de 15 dias para notificar segunda vez. Como a CDT começou há uma semana, não sei se vão parecer se não; é uma incógnita.

Não podem ser obrigados a aparecer?

Se faltaram, desde que tenham sido identificados, notificamos segunda vez. Mas imaginemos que mesmo assim não aparecem: o processo continua, mesmo sem a presença dele. Nós introduzimos os dados no registo central, depois há as várias fases, como outro processo de contra-ordenação normal.

Que tipo de situações recebem?

Até agora só apareceram não toxicodependentes, só consumidores ocasionais e só na posse de haxixe. Uns estudantes, outros desempregados, não têm um perfil definido.

Porque houve esta incidência? A polícia só procurou estes casos?

São os mais fáceis de abordar. A polícia tem várias missões e a sua principal missão é o combate ao tráfico. O tráfico não entra na nossa comissão.

Que destino tiveram esses casos?

A lei prevê que todos os casos sem registo prévio têm suspensão de processo, e o nosso registo central começou a funcionar no dia 1 de Julho. Foi isso que aconteceu até agora, porque não eram toxicodependentes. Se forem, é diferente.

Mas o principal alvo da comissão são os toxicodependentes e não os consumidores ocasionais?

Não só. A lei diz que o consumo de haxixe, por mais esporádico que seja, continua a ser um acto ilícito. Esta lei permite olhar de maneira diferente para os toxicodependentes e consumidores. Mas não houve despenalização completa: continuam a ser sancionados, só ainda não aconteceu porque não tinham registo prévio. Se reincidirem durante o período de suspensão, terá que ser aplicada uma coima.

As sanções pecuniáras serão de facto cobradas?

Quem tem obrigação de ver isso é o Governo Civil.

As multas muitas vezes não são pagas...

Se não são pagas, o processo segue. Aqui vai acontecer o mesmo. Mas a coima é sempre a última medida a aplicar.

Devia haver despenalização da droga?

Em termos de eficácia, é melhor [a droga] ser despenalizada completamente. Em termos de prevenção, tenho as minhas dúvidas. Sabemos que a via repressiva falhou completamente. Talvez seja melhor caminhar para a despenalização total, dando um passo de cada vez. Além do mais, esta comissão tem também um papel fundamental na área do rastreio de doenças infecto-contagiosas. Nós podemos mandar fazer análises.

Que meios é que a CDT tem para executar medidas alternativas como o trabalho a favor da comunidade?

Ainda não sei muito bem como é que isto vai funcionar. Há indicação no sentido de, quando propusermos a medida, falarmos com o Instituto de Reinserção Social, que tem instruções para nos ajudar e abrir as portas. Temos que desbloquear as situações todas caso a caso.

Quem faz a fiscalização destas medidas?

Quem é responsável pela execução da sanção é o Governo Civil e a CDT. Temos que estar sempre em ligação para dizer o que é que é melhor para o toxicodepente.

Como reage à crítica de que esta lei passa uma mensagem de desresponsabilização?

O que é que nós ganhámos quando isto foi crime? Qual foi a vantagem? A droga diminuiu? Não. Os crimes ligados à droga diminuíram? Pelo contrário. Quanto mais repressão, pior aconteceu. Vamos tentar isto, vamos ver.

"Talvez Seja Melhor Caminhar para a Despenalização Total"

Terça-feira, 10 de Julho de 2001

Entrevista com Maria Antónia Almeida Santos

A presidente da Comissão de Dissuasão da Toxicodependência (CDT) de Lisboa, Maria Antónia Almeida Santos, diz que só lhe chegaram casos de consumidores ocasionais associados ao haxixe. Os processos foram suspensos porque a lei impõe a existência de casos anteriores registados. Durante bastante tempo, não serão aplicadas coimas aos casos de consumo esporádico. Afinal, a base de dados que faz os registos só foi inaugurada na semana passada.

Entrevista de Catarina Gomes

Maria Antónia Almeida Santos - Até hoje recebemos 10 processos. Recebemos os autos de ocorrência que a polícia nos envia. Há um período de 36 horas para o fazer, e depois [os consumidores] são notificados num prazo até 72 horas para se apresentarem na comissão.

E todas as pessoas aparecem depois de serem notificadas?

Nalguns casos não se apresentaram, mas temos um prazo de 15 dias para notificar segunda vez. Como a CDT começou há uma semana, não sei se vão parecer se não; é uma incógnita.

Não podem ser obrigados a aparecer?

Se faltaram, desde que tenham sido identificados, notificamos segunda vez. Mas imaginemos que mesmo assim não aparecem: o processo continua, mesmo sem a presença dele. Nós introduzimos os dados no registo central, depois há as várias fases, como outro processo de contra-ordenação normal.

Que tipo de situações recebem?

Até agora só apareceram não toxicodependentes, só consumidores ocasionais e só na posse de haxixe. Uns estudantes, outros desempregados, não têm um perfil definido.

Porque houve esta incidência? A polícia só procurou estes casos?

São os mais fáceis de abordar. A polícia tem várias missões e a sua principal missão é o combate ao tráfico. O tráfico não entra na nossa comissão.

Que destino tiveram esses casos?

A lei prevê que todos os casos sem registo prévio têm suspensão de processo, e o nosso registo central começou a funcionar no dia 1 de Julho. Foi isso que aconteceu até agora, porque não eram toxicodependentes. Se forem, é diferente.

Mas o principal alvo da comissão são os toxicodependentes e não os consumidores ocasionais?

Não só. A lei diz que o consumo de haxixe, por mais esporádico que seja, continua a ser um acto ilícito. Esta lei permite olhar de maneira diferente para os toxicodependentes e consumidores. Mas não houve despenalização completa: continuam a ser sancionados, só ainda não aconteceu porque não tinham registo prévio. Se reincidirem durante o período de suspensão, terá que ser aplicada uma coima.

As sanções pecuniáras serão de facto cobradas?

Quem tem obrigação de ver isso é o Governo Civil.

As multas muitas vezes não são pagas...

Se não são pagas, o processo segue. Aqui vai acontecer o mesmo. Mas a coima é sempre a última medida a aplicar.

Devia haver despenalização da droga?

Em termos de eficácia, é melhor [a droga] ser despenalizada completamente. Em termos de prevenção, tenho as minhas dúvidas. Sabemos que a via repressiva falhou completamente. Talvez seja melhor caminhar para a despenalização total, dando um passo de cada vez. Além do mais, esta comissão tem também um papel fundamental na área do rastreio de doenças infecto-contagiosas. Nós podemos mandar fazer análises.

Que meios é que a CDT tem para executar medidas alternativas como o trabalho a favor da comunidade?

Ainda não sei muito bem como é que isto vai funcionar. Há indicação no sentido de, quando propusermos a medida, falarmos com o Instituto de Reinserção Social, que tem instruções para nos ajudar e abrir as portas. Temos que desbloquear as situações todas caso a caso.

Quem faz a fiscalização destas medidas?

Quem é responsável pela execução da sanção é o Governo Civil e a CDT. Temos que estar sempre em ligação para dizer o que é que é melhor para o toxicodepente.

Como reage à crítica de que esta lei passa uma mensagem de desresponsabilização?

O que é que nós ganhámos quando isto foi crime? Qual foi a vantagem? A droga diminuiu? Não. Os crimes ligados à droga diminuíram? Pelo contrário. Quanto mais repressão, pior aconteceu. Vamos tentar isto, vamos ver.

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