O mais difícil é calá-los

22-12-2001
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O Mais Difícil É Calá-los

Por LINO DE CARVALHO, deputado do PCP

Segunda-feira, 3 de Dezembro de 2001

Os governos do eng. Guterres introduziram uma novidade no país. Raro é o ministro que o deixe de ser que não venha dizer mal dos governos de que fez parte, da Assembleia da República e dos deputados, do funcionamento das instituições democráticas. Deste modo, atingem rapidamente uma notoriedade pública e mediática que não tinham conseguido enquanto membros do Governo e dão largas aos pequenos desejos de vindicta, que lhes atormentam a alma, contra quem os despediu ou de quem tiveram que ouvir críticas. Foi assim com Manuel Maria Carrilho, Fernando Gomes, Armando Vara e, agora, com Marçal Grilo. Quando este último fala, por exemplo, nos deputados da última e da primeira fila, deveria ter a coragem de dizer que tal se passa exactamente no Partido Socialista que forma o Governo de que ele fez parte.

Alguns destes ex-ministros, designadamente Marçal Grilo, nunca esconderam o enfado e a irritação que lhes causava a obrigação de terem que responder no Parlamento pelos seus actos e pelas suas políticas, designadamente quando, no debate orçamental, os deputados desmontavam um discurso político que não correspondia nem à obra feita nem às dotações disponíveis. Do alto da sua cátedra, o debate parlamentar era demasiado pesado para uma certa arrogância intelectual atrás da qual procuravam esconder o fracasso das suas opções e o total desconhecimento que alguns deles revelavam em relação ao orçamento do respectivo ministério. Na Saúde, na Educação ou na Cultura, já se tornou uma rotina orçamental verificar e debater as muitas divergências havidas entre a retórica e a obra, entre os discursos e os números.

No debate do Orçamento para 2002 e no segundo "rectificativo" de 2001, também estas cenas se repetiram, designadamente com a nova equipa das Finanças. Suspeito mesmo que alguns jovens membros do Governo também pensavam que no Parlamento são todos uns tontos e que com meia dúzia de larachas davam conta desta obrigação constitucional. Depois, demasiado tarde, verificam que afinal não é bem assim, e fazem algumas figuras tristes.

Parece, pois, estar na ordem do dia bater no Parlamento e nos deputados. É fácil, é barato e dá colunas nos jornais. Diga-se que, muitas vezes, aqueles colocam-se a jeito. Mas tal como nem todos os ministros ou todos os jornalistas são tontos, também em relação ao Parlamento há que distinguir o trigo do joio, pondo os nomes concretos onde devem ser colocados. Ou isso seria muito incómodo politicamente? O que é irresponsável é esta generalização fácil que vai contribuindo para cavar a sepultura da própria democracia.

Se, em relação aos deputados, o mais difícil é sentá-los, como diz Marçal Grilo, em relação a alguns ex-ministros o mais difícil para o eng. Guterres é calá-los para não dizerem tantos disparates. Como também para certos órgãos de comunicação social ou certos jornalistas (alguns dos quais só vão ao Parlamento nos dias mais mediáticos e mais "jet-set") o mais difícil é descobrirem temas que também façam vender jornais ou subir as audiências.

Lino de Carvalho, deputado do PCP

O Mais Difícil É Calá-los

Por LINO DE CARVALHO, deputado do PCP

Segunda-feira, 3 de Dezembro de 2001

Os governos do eng. Guterres introduziram uma novidade no país. Raro é o ministro que o deixe de ser que não venha dizer mal dos governos de que fez parte, da Assembleia da República e dos deputados, do funcionamento das instituições democráticas. Deste modo, atingem rapidamente uma notoriedade pública e mediática que não tinham conseguido enquanto membros do Governo e dão largas aos pequenos desejos de vindicta, que lhes atormentam a alma, contra quem os despediu ou de quem tiveram que ouvir críticas. Foi assim com Manuel Maria Carrilho, Fernando Gomes, Armando Vara e, agora, com Marçal Grilo. Quando este último fala, por exemplo, nos deputados da última e da primeira fila, deveria ter a coragem de dizer que tal se passa exactamente no Partido Socialista que forma o Governo de que ele fez parte.

Alguns destes ex-ministros, designadamente Marçal Grilo, nunca esconderam o enfado e a irritação que lhes causava a obrigação de terem que responder no Parlamento pelos seus actos e pelas suas políticas, designadamente quando, no debate orçamental, os deputados desmontavam um discurso político que não correspondia nem à obra feita nem às dotações disponíveis. Do alto da sua cátedra, o debate parlamentar era demasiado pesado para uma certa arrogância intelectual atrás da qual procuravam esconder o fracasso das suas opções e o total desconhecimento que alguns deles revelavam em relação ao orçamento do respectivo ministério. Na Saúde, na Educação ou na Cultura, já se tornou uma rotina orçamental verificar e debater as muitas divergências havidas entre a retórica e a obra, entre os discursos e os números.

No debate do Orçamento para 2002 e no segundo "rectificativo" de 2001, também estas cenas se repetiram, designadamente com a nova equipa das Finanças. Suspeito mesmo que alguns jovens membros do Governo também pensavam que no Parlamento são todos uns tontos e que com meia dúzia de larachas davam conta desta obrigação constitucional. Depois, demasiado tarde, verificam que afinal não é bem assim, e fazem algumas figuras tristes.

Parece, pois, estar na ordem do dia bater no Parlamento e nos deputados. É fácil, é barato e dá colunas nos jornais. Diga-se que, muitas vezes, aqueles colocam-se a jeito. Mas tal como nem todos os ministros ou todos os jornalistas são tontos, também em relação ao Parlamento há que distinguir o trigo do joio, pondo os nomes concretos onde devem ser colocados. Ou isso seria muito incómodo politicamente? O que é irresponsável é esta generalização fácil que vai contribuindo para cavar a sepultura da própria democracia.

Se, em relação aos deputados, o mais difícil é sentá-los, como diz Marçal Grilo, em relação a alguns ex-ministros o mais difícil para o eng. Guterres é calá-los para não dizerem tantos disparates. Como também para certos órgãos de comunicação social ou certos jornalistas (alguns dos quais só vão ao Parlamento nos dias mais mediáticos e mais "jet-set") o mais difícil é descobrirem temas que também façam vender jornais ou subir as audiências.

Lino de Carvalho, deputado do PCP

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