EXPRESSO: Opinião

13-11-2001
marcar artigo

O dito e o feito

«Há duas semanas, o deputado avaliou a Televisão como a questão central da qualificação de uma política. E atirava-se de cabeça aos 18 milhões de contos que o Governo quer atribuir à RTP para 2002. 18 milhões que o nem são porque deles haverá a retirar o IVA, ou seja, sobram 15. Sem entrar na discussão sobre a hierarquia das políticas, parece razoável a opinião de que o mundo virtual da comunicação social de massas constitui uma prioridade. E que, sendo-o, dificilmente ela se afirma com uma regressão orçamental de 7 milhões de contos perante o ano transacto.»

«O voto dependente de um deputado intermitente»

M. Maria Carrilho, «DN», 7/11/01

NO MOMENTO em que escrevo, o Orçamento do Estado (OE) ainda não foi votado mas adivinha-se o resultado. A coisa passará com o queijo. O meu grilo falante jura tratar-se de uma má notícia. Porque o documento, além de irrealista nos seus pressupostos, é mau. E porque, no dizer de um deputado da maioria, agrava a «pantanização da nossa vida democrática», a qual, mesmo sem Orçamento, já estaria a caminhar no sentido de «uma perigosa regressão». Esse deputado, Manuel Maria Carrilho (MMC), ilustra esta opinião com os edificantes exemplos de Espinho e de Felgueiras. Se este é o contexto quase apetece perguntar: e porque não chumba ele o documento? Porque não tira a conclusão prática do que afirma?

Há três semanas, este deputado escreveu no «DN» que o principal problema do país é a ausência de um «imperativo maioritário absoluto». Discordo, mas retenha-se a coerência. Nas vésperas do debate parlamentar, MMC defende estar-se no «momento-limite de uma clarificação». «Ou se faz uma ruptura com o pântano político, abrindo caminho a um novo pacto, a um novo contrato com a nação» ou se entrega «a uma oposição até aqui sem bandeiras nem rasgos o precioso trunfo de tantas ilusões desfeitas». Com este dilema-«limite», porque não tira o deputado socialista a consequência? Porque não vota contra este Orçamento obrigando à clarificação, qualquer que ela seja, uma vez que a tal ruptura nem nos melhores sonhos do primeiro-ministro alguma vez lhe apareceu?

Prossigamos a senda argumentativa de MMC. Há duas semanas, o deputado avaliou a Televisão como a questão central da qualificação de uma política. E atirava-se de cabeça aos 18 milhões de contos que o Governo quer atribuir à RTP para 2002. 18 milhões que o nem são porque deles haverá a retirar o IVA, ou seja, sobram 15. Sem entrar na discussão sobre a hierarquia das políticas, parece razoável a opinião de que o mundo virtual da comunicação social de massas constitui uma prioridade. E que, sendo-o, dificilmente ela se afirma com uma regressão orçamental de 7 milhões de contos perante o ano transacto. Por outro lado, esta escolha é tanto mais incoerente quanto a tutela da RTP não hesitou em ir buscar a peso de ouro quadros para a dirigirem ou lhe darem rosto. Se assim é, não se descortina por que não retira o deputado a consequência da sua própria opinião. Porque não vota ele contra um Orçamento que desvaloriza o que ele pensa dever ser valorizado?

Acresce que MMC defendeu, esta semana, que a pantanização «atingiu o limite com o voto limiano de 2000». Por outras palavras, a reedição desse voto em 2001 já se encontra para lá das fronteiras por si mesmo admissíveis. Em abono da verdade, MMC não colocou em letra de forma nada que vários dirigentes socialistas não tivessem dito nos meses seguintes à primeira vergonha. Mas nenhum deles foi tão longe nas críticas nem as reafirmou tão próximo da segunda data fatídica da limianização da vida política portuguesa. Por isso me interrogo: será MMC, afinal, como os cães que ladram mas não mordem? Será assim já tão pêésse? Ou só não faz o que pensa por razões de processo?

A segunda hipótese é pouco provável. O deputado demarcou-se da tese que serve de desculpa ao voto favorável de outros críticos — que agora Campelo já é «independente». Assim o fazendo — e bem — perde, também ele, desculpa para o seu sentido de voto.

Será então uma questão de disciplina o que impede a coerência? Não creio, aquela nunca o impressionou particularmente. Imagino até quanto lhe agradaria ser ele o contrapeso dessa farsa da política nacional que dá pelo nome de Daniel Campelo. Só se não entende por que prescinde ele dessa prerrogativa. Em nome da defesa de «tantas ilusões desfeitas», as «prometidas pelos Estados Gerais da nova maioria», que melhor voto se aplicaria ao caso presente?

P. S. - DEPUTADOS do PSD faltaram ao voto. Serão amigos do professor Marcelo, coveiros de Durão Barroso ou novos Campelos?

E-mail: miguel.portas@netc.pt

O dito e o feito

«Há duas semanas, o deputado avaliou a Televisão como a questão central da qualificação de uma política. E atirava-se de cabeça aos 18 milhões de contos que o Governo quer atribuir à RTP para 2002. 18 milhões que o nem são porque deles haverá a retirar o IVA, ou seja, sobram 15. Sem entrar na discussão sobre a hierarquia das políticas, parece razoável a opinião de que o mundo virtual da comunicação social de massas constitui uma prioridade. E que, sendo-o, dificilmente ela se afirma com uma regressão orçamental de 7 milhões de contos perante o ano transacto.»

«O voto dependente de um deputado intermitente»

M. Maria Carrilho, «DN», 7/11/01

NO MOMENTO em que escrevo, o Orçamento do Estado (OE) ainda não foi votado mas adivinha-se o resultado. A coisa passará com o queijo. O meu grilo falante jura tratar-se de uma má notícia. Porque o documento, além de irrealista nos seus pressupostos, é mau. E porque, no dizer de um deputado da maioria, agrava a «pantanização da nossa vida democrática», a qual, mesmo sem Orçamento, já estaria a caminhar no sentido de «uma perigosa regressão». Esse deputado, Manuel Maria Carrilho (MMC), ilustra esta opinião com os edificantes exemplos de Espinho e de Felgueiras. Se este é o contexto quase apetece perguntar: e porque não chumba ele o documento? Porque não tira a conclusão prática do que afirma?

Há três semanas, este deputado escreveu no «DN» que o principal problema do país é a ausência de um «imperativo maioritário absoluto». Discordo, mas retenha-se a coerência. Nas vésperas do debate parlamentar, MMC defende estar-se no «momento-limite de uma clarificação». «Ou se faz uma ruptura com o pântano político, abrindo caminho a um novo pacto, a um novo contrato com a nação» ou se entrega «a uma oposição até aqui sem bandeiras nem rasgos o precioso trunfo de tantas ilusões desfeitas». Com este dilema-«limite», porque não tira o deputado socialista a consequência? Porque não vota contra este Orçamento obrigando à clarificação, qualquer que ela seja, uma vez que a tal ruptura nem nos melhores sonhos do primeiro-ministro alguma vez lhe apareceu?

Prossigamos a senda argumentativa de MMC. Há duas semanas, o deputado avaliou a Televisão como a questão central da qualificação de uma política. E atirava-se de cabeça aos 18 milhões de contos que o Governo quer atribuir à RTP para 2002. 18 milhões que o nem são porque deles haverá a retirar o IVA, ou seja, sobram 15. Sem entrar na discussão sobre a hierarquia das políticas, parece razoável a opinião de que o mundo virtual da comunicação social de massas constitui uma prioridade. E que, sendo-o, dificilmente ela se afirma com uma regressão orçamental de 7 milhões de contos perante o ano transacto. Por outro lado, esta escolha é tanto mais incoerente quanto a tutela da RTP não hesitou em ir buscar a peso de ouro quadros para a dirigirem ou lhe darem rosto. Se assim é, não se descortina por que não retira o deputado a consequência da sua própria opinião. Porque não vota ele contra um Orçamento que desvaloriza o que ele pensa dever ser valorizado?

Acresce que MMC defendeu, esta semana, que a pantanização «atingiu o limite com o voto limiano de 2000». Por outras palavras, a reedição desse voto em 2001 já se encontra para lá das fronteiras por si mesmo admissíveis. Em abono da verdade, MMC não colocou em letra de forma nada que vários dirigentes socialistas não tivessem dito nos meses seguintes à primeira vergonha. Mas nenhum deles foi tão longe nas críticas nem as reafirmou tão próximo da segunda data fatídica da limianização da vida política portuguesa. Por isso me interrogo: será MMC, afinal, como os cães que ladram mas não mordem? Será assim já tão pêésse? Ou só não faz o que pensa por razões de processo?

A segunda hipótese é pouco provável. O deputado demarcou-se da tese que serve de desculpa ao voto favorável de outros críticos — que agora Campelo já é «independente». Assim o fazendo — e bem — perde, também ele, desculpa para o seu sentido de voto.

Será então uma questão de disciplina o que impede a coerência? Não creio, aquela nunca o impressionou particularmente. Imagino até quanto lhe agradaria ser ele o contrapeso dessa farsa da política nacional que dá pelo nome de Daniel Campelo. Só se não entende por que prescinde ele dessa prerrogativa. Em nome da defesa de «tantas ilusões desfeitas», as «prometidas pelos Estados Gerais da nova maioria», que melhor voto se aplicaria ao caso presente?

P. S. - DEPUTADOS do PSD faltaram ao voto. Serão amigos do professor Marcelo, coveiros de Durão Barroso ou novos Campelos?

E-mail: miguel.portas@netc.pt

marcar artigo