As provocações de Carrilho

08-05-2001
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As Provocações de Carrilho

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Domingo, 6 de Maio de 2001

O objectivo de Carrilho era consagrar a sua ruptura com Guterres. Conseguiu-o, tanto na sexta-feira como ontem. Provocando uma monumental vaia

Debaixo de uma vaia monumental e acenando com a mão direita para a plateia enquanto se afastava do palanque, Manuel Maria Carrilho terminava ontem a sua intervenção no Congresso do PS. Uma intervenção que ultrapassou em muito os três minutos reservados a cada orador - Almeida Santos chegou a assinalar os seis minutos muito antes de Carrilho se calar - e em que o ex-ministro da Cultura resistiu quanto pôde aos apupos e aos assobios bem como aos apelos do presidente do partido para que terminasse a intervenção.

Sem contemplações e também sem grandes expectativas sobre eventuais conciliações, Manuel Maria Carrilho entrou neste congresso do PS pronto a lavar a alma. E fê-lo tanto quanto lhe foi possível. Sem bases e sem aparelho, sem forças internas, usou tão-só a sua capacidade de esticar a corda até ao limite. Pouco depois de intervir, desceu do palco, falou à comunicação social tanto quanto esta quis. Ao PÚBLICO afirmou: "Fica provado o debate possível. É um eloquente exemplo do que é o debate no PS, se nos lembrarmos dos debates frontais do tempo de Mário Soares..."

O que é facto é que o Congresso não queria sequer ouvir Carrilho. Este começou por elogiar a intervenção de Guterres para depois lamentar que "se queira crucificar em congresso os camaradas que desde sempre o defenderam". Os delegados e convidados reagiram de pronto. E a partir daí foi uma operação de resistência. No palco, Carrilho procurava alinhavar ideias, que soavam desconexas. O Congresso assobiava-o e rejeitava-o. Almeida Santos pedia bom-senso e advertia: "Não posso fazer discriminações positivas."

A tarefa que levou Carrilho ao Congresso - consagrar a sua ruptura com António Guterres - começou a ser cumprida logo na noite de sexta-feira ao participar no debate sobre novos poderes e a importância e consequências da mediatização da política na democracia. Implacável criticou António Guterres, na cara deste.

Pouco depois do primeiro-ministro ter entrado na sala onde decorria o debate, Carrilho interveio sabendo claramente quem o ouvia. E tratou de despachar as críticas. Primeiro acusou a direcção do partido de há dois anos ter prometido um forum permanente de debate e só naquele dia, já em novo congresso, ter organizado uma discussão temática.

Passando ao tema do debate, destacou o que classificou como ausência de política para o audiovisual. Acusando o PS de não ter introduzido um papel regulador da acção das televisões criando um clima em que "o cidadão comum acha que quem manda no país são as televisões". Uma crítica que lembrou a força que o ex-ministro da Cultura fez para que, no segundo governo PS, a comunicação social do Estado, em particular a RTP ficasse sob a sua tutela e não na de Armando Vara.

Mas o pior estava para vir. Com Guterres sentado, na quarta fila, Carrilho, que se sentava na primeira, começou a dissertar sobre os perigos para a democracia que advêm do não exercício do poder e da vitimização que os políticos tem por hábito fazer de si mesmos, uma atitude que vê como contrária à responsabilização. E, sabendo quem estava sentado na sala a ouvi-lo, disparou: "Fiquei muito surpreendido quando ouvi o secretário-geral dizer, a propósito da regionalização: eu até gostava de ter menos poder." E recordou que o poder é para ser exercido. Depois multiplicou-se em declarações à comunicação social , com as televisões à cabeça, precisamente no corredor lateral em cuja coxia António Guterres estava sentado, ao lado de Rui Alarcão.

As Provocações de Carrilho

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Domingo, 6 de Maio de 2001

O objectivo de Carrilho era consagrar a sua ruptura com Guterres. Conseguiu-o, tanto na sexta-feira como ontem. Provocando uma monumental vaia

Debaixo de uma vaia monumental e acenando com a mão direita para a plateia enquanto se afastava do palanque, Manuel Maria Carrilho terminava ontem a sua intervenção no Congresso do PS. Uma intervenção que ultrapassou em muito os três minutos reservados a cada orador - Almeida Santos chegou a assinalar os seis minutos muito antes de Carrilho se calar - e em que o ex-ministro da Cultura resistiu quanto pôde aos apupos e aos assobios bem como aos apelos do presidente do partido para que terminasse a intervenção.

Sem contemplações e também sem grandes expectativas sobre eventuais conciliações, Manuel Maria Carrilho entrou neste congresso do PS pronto a lavar a alma. E fê-lo tanto quanto lhe foi possível. Sem bases e sem aparelho, sem forças internas, usou tão-só a sua capacidade de esticar a corda até ao limite. Pouco depois de intervir, desceu do palco, falou à comunicação social tanto quanto esta quis. Ao PÚBLICO afirmou: "Fica provado o debate possível. É um eloquente exemplo do que é o debate no PS, se nos lembrarmos dos debates frontais do tempo de Mário Soares..."

O que é facto é que o Congresso não queria sequer ouvir Carrilho. Este começou por elogiar a intervenção de Guterres para depois lamentar que "se queira crucificar em congresso os camaradas que desde sempre o defenderam". Os delegados e convidados reagiram de pronto. E a partir daí foi uma operação de resistência. No palco, Carrilho procurava alinhavar ideias, que soavam desconexas. O Congresso assobiava-o e rejeitava-o. Almeida Santos pedia bom-senso e advertia: "Não posso fazer discriminações positivas."

A tarefa que levou Carrilho ao Congresso - consagrar a sua ruptura com António Guterres - começou a ser cumprida logo na noite de sexta-feira ao participar no debate sobre novos poderes e a importância e consequências da mediatização da política na democracia. Implacável criticou António Guterres, na cara deste.

Pouco depois do primeiro-ministro ter entrado na sala onde decorria o debate, Carrilho interveio sabendo claramente quem o ouvia. E tratou de despachar as críticas. Primeiro acusou a direcção do partido de há dois anos ter prometido um forum permanente de debate e só naquele dia, já em novo congresso, ter organizado uma discussão temática.

Passando ao tema do debate, destacou o que classificou como ausência de política para o audiovisual. Acusando o PS de não ter introduzido um papel regulador da acção das televisões criando um clima em que "o cidadão comum acha que quem manda no país são as televisões". Uma crítica que lembrou a força que o ex-ministro da Cultura fez para que, no segundo governo PS, a comunicação social do Estado, em particular a RTP ficasse sob a sua tutela e não na de Armando Vara.

Mas o pior estava para vir. Com Guterres sentado, na quarta fila, Carrilho, que se sentava na primeira, começou a dissertar sobre os perigos para a democracia que advêm do não exercício do poder e da vitimização que os políticos tem por hábito fazer de si mesmos, uma atitude que vê como contrária à responsabilização. E, sabendo quem estava sentado na sala a ouvi-lo, disparou: "Fiquei muito surpreendido quando ouvi o secretário-geral dizer, a propósito da regionalização: eu até gostava de ter menos poder." E recordou que o poder é para ser exercido. Depois multiplicou-se em declarações à comunicação social , com as televisões à cabeça, precisamente no corredor lateral em cuja coxia António Guterres estava sentado, ao lado de Rui Alarcão.

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