Autismo auto-satisfeito

08-05-2001
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EDITORIAL

Autismo Auto-satisfeito

Por JOSÉ MANUEL FERNANDES

Domingo, 6 de Maio de 2001

Um Congresso socialista não deve ser uma liturgia de auto-satisfação, nem, como já foi dito, "uma sessão de propaganda".

Era assim que abria, há dois anos, a moção de Manuel Alegre ao Congresso socialista do Coliseu. Um Manuel Alegre que, então, funcionou como a cereja no bolo da auto-satisfação, reduzindo de moto próprio à inutilidade as suas diferenças de pontos de vista.

Agora o poeta decidiu nem sequer vir ao Congresso. E este, por seu turno, também não quis ouvir vozes divergentes. Assobiou Manuel Maria Carrilho e apoiou a decisão de lhe tirar a palavra quando excedeu o tempo que lhe estava destinado. Suportou Helena Roseta, mas fugiu de subscrever a sua moção, para evitar sarilhos e comprometimentos. Distraiu-se com alguns convidados chamadas a abrilhantar uns tantos debates, mas calou-se sempre que chegava a altura de duvidar, de divergir, de separar águas. Comportou-se, em algumas ocasiões, com menos tolerância e mais rigidez do que o próprio PCP.

Quanto a António Guterres, o líder esteve ao seu pior nível. Inchado de auto-satisfação, gorduroso quase, fez um discurso a chamar à alma socialista que só podia agradar a iniciados ou a "marretas" (e tantos que eles eram, por aquelas bancadas...) Atacou os que o criticam não em nome da diferença de ideias, mas em nome do amor à camisola. Desafiou os divergentes não a exporem as suas divergências, mas candidatarem-se ao seu lugar, como se para criticar ao Governo fosse necessário, em simultâneo, apresentar credenciais de candidato a primeiro ministro.

É por isso que, no Pavilhão Atlântico, tudo está a ser triste, muito triste. Aparelhístico. Autista. Distante do país e dos seus problemas.

Assim como tudo está a ser tão liturgicamente perfeito como inútil. Frio. Distante. Com esgares no lugar de sorrisos. Com palmas pasmadas tocadas por obrigação e abraços de ocasião. Com delegados a abanar as cabeças tão obedientes e tão autómatos como os cãezinhos dos automóveis.

A expectativa era baixa, o entusiasmo quase nenhum, mas este congresso do PS está a ser ainda pior do que se imaginava. Muito pior.

EDITORIAL

Autismo Auto-satisfeito

Por JOSÉ MANUEL FERNANDES

Domingo, 6 de Maio de 2001

Um Congresso socialista não deve ser uma liturgia de auto-satisfação, nem, como já foi dito, "uma sessão de propaganda".

Era assim que abria, há dois anos, a moção de Manuel Alegre ao Congresso socialista do Coliseu. Um Manuel Alegre que, então, funcionou como a cereja no bolo da auto-satisfação, reduzindo de moto próprio à inutilidade as suas diferenças de pontos de vista.

Agora o poeta decidiu nem sequer vir ao Congresso. E este, por seu turno, também não quis ouvir vozes divergentes. Assobiou Manuel Maria Carrilho e apoiou a decisão de lhe tirar a palavra quando excedeu o tempo que lhe estava destinado. Suportou Helena Roseta, mas fugiu de subscrever a sua moção, para evitar sarilhos e comprometimentos. Distraiu-se com alguns convidados chamadas a abrilhantar uns tantos debates, mas calou-se sempre que chegava a altura de duvidar, de divergir, de separar águas. Comportou-se, em algumas ocasiões, com menos tolerância e mais rigidez do que o próprio PCP.

Quanto a António Guterres, o líder esteve ao seu pior nível. Inchado de auto-satisfação, gorduroso quase, fez um discurso a chamar à alma socialista que só podia agradar a iniciados ou a "marretas" (e tantos que eles eram, por aquelas bancadas...) Atacou os que o criticam não em nome da diferença de ideias, mas em nome do amor à camisola. Desafiou os divergentes não a exporem as suas divergências, mas candidatarem-se ao seu lugar, como se para criticar ao Governo fosse necessário, em simultâneo, apresentar credenciais de candidato a primeiro ministro.

É por isso que, no Pavilhão Atlântico, tudo está a ser triste, muito triste. Aparelhístico. Autista. Distante do país e dos seus problemas.

Assim como tudo está a ser tão liturgicamente perfeito como inútil. Frio. Distante. Com esgares no lugar de sorrisos. Com palmas pasmadas tocadas por obrigação e abraços de ocasião. Com delegados a abanar as cabeças tão obedientes e tão autómatos como os cãezinhos dos automóveis.

A expectativa era baixa, o entusiasmo quase nenhum, mas este congresso do PS está a ser ainda pior do que se imaginava. Muito pior.

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